29 janeiro 2010

Fernando Pessoa e seus Passos da Cruz V


Continuo postando os sonetos de Passos da Cruz de Fernando Pessoa, conforme explicado na seguinte postagem: http://artedofim.blogspot.com/2009/12/fernando-pessoa-o-predestinado-passos.html . Na próxima semana, o 6º passo. Na imagem que acompanha o poema, o quadro "A Morte de Ofélia" de Millais.


Passos da Cruz - Soneto V

Tênue, roçando sedas pelas horas,
Teu vulto ciciante passa e esquece,
E dia a dia adias para prece
O rito cujo ritmo só decoras...

Um mar longínquo e próximo umedece
Teus lábios onde, mais que em ti, descoras...
E, alada, leve, sobre a dor que choras,
Sem querer saber de ti a tarde desce...

Erra no anteluar a voz dos tanques...
Na quinta imensa gorgolejam águas,
Na treva vaga ao meu ter dor estanques...

Meu império é das horas desiguais
E dei meu gesto lasso a algas mágoas
Que há para além de sermos outonais...

28 janeiro 2010

Sobre a Casa do Poeta: e-mail enviado a Júlio Prates

Prezado Júlio: a divulgação para a mídia não cabia a mim, não era minha função, e, com toda a sinceridade, não sei como ela foi feita. Apenas divulguei em meu blog, e convidei assim a todos os meus leitores, deixei isso bem claro em minhas postagens. Convites particulares para eventos desse tipo eu não mando e nunca vou mandar, pois entendo que convites individuais para essa categoria de evento não são necessários. E eu não afirmei que não houve envolvimento de recursos públicos em nenhum momento. Mas não fui eu quem os buscou, até porque, sempre que fui buscá-los como auxílio para meus livros, foram-me negados, enquanto para outros, foram dados. Para os seus foram dados? Faço a mesma pergunta que você me fez. Por que para uns sim e para outros não? Isso não é também uma panelinha? Por que você não fala também desse tipo de panelinha? Ou da panelinha do Expresso? Eu não ando atrás de ajuda de políticos para nada, não sou responsável pela busca de recursos dentro da Casa do Poeta. Sou o diretor de Literatura. Posso falar de qualquer político porque não tenho o rabo preso com nenhum deles. Falo inclusve de nosso prefeito atual: ele gosta muito de usar o nome de Terra dos Poetas, mas na hora de apoiar efetivamente os poetas que produzem em nossa terra, e eu não tenho medo de dizer que atualmente sou um dos poetas mais produtivos de Santiago e um dos que mais têm divulgação fora daqui, na hora de ajudar os poetas, ele não o faz. No meu caso, não o fez.

Você diz que é necessário dar ciência à sociedade da diretoria da Casa dos Poetas. Até onde sei, foi dado, de acordo com as possibilidades da Casa, inclusive financeiras. Só que a sociedade também não se interessa em saber. E você diz que não pode se enfiar nas reuniões da diretoria sem ser convidado. Claro que não, você não faz parte da diretoria. E eu não disse que você poderia participar delas. Disse que você pode participar de qualquer evento aberto, como cafezinhos literários e o fórum sem necessitar de convite individual. Pode participar e expor todas as suas opiniões sobre a Casa. Pode participar e se associar a qualquer momento, e uma vez sócio, pode formar uma chapa para formar uma diretoria para concorrer na próxima eleição. Se você tem argumentos contra a Casa, por favor, participe do próximo cafezinho e exponha seus argumentos para todos nós. Eu mesmo o avisarei de quando for ocorrer o próximo cafezinho. Gostaria muito que você participasse, pois admiro muito todo seu senso crítico.

Como disse, de minha parte, a Casa do Poeta estará sempre aberta a todos que quiserem participar. Mas convites particulares, em meu nome, ninguém vai receber. Se vai receber em nome de outros membros da diretoria ou da presidência, isso é com eles.

Sobre a Casa do Poeta de Santiago: eu não formo panelinhas.

Não sou homem de cobrar nada dos outros. E detesto que cobrem de mim. Os únicos que devem ser cobrados sem tréguas são os políticos, pois em sua maioria são parasitas que vivem e enriquecem à custa do dinheiro, do sofrimento e da ignorância do povo.
Dito isso, não concordo com cobranças para com aqueles que não foram ao Fórum de Literatura promovido pela Casa do Poeta de Santiago, entre outras instituições. Quem não quer ir, não vai, ninguém é obrigado. Eu mesmo não fui em vários eventos ditos literários. Se eu não quero, não vou.
Mas também não concordo com o julgamento do amigo Júlio Prates de que era necessáro convite particular para ir ao evento. O evento era aberto para todo mundo, nunca foi fechado ou eletista como ele afirma. Os convites particulares podem ou não ser enviados nesse caso. Não é algo imprescindível, muito pelo contrário, a maioria das pessoas que foram não receberam convites particulares. Eu, sendo parte da diretoria, não enviei convite para ninguém. Não sei se o presidente, o Pasini, enviou. Se enviou, ele tinha o direito, e eu não tenho nada a ver com isso. O Pasini tem o pensamento dele, e eu, o meu. Eu não o fiz porque julgo que seria uma forma de pressão para com a pessoa, e detesto pressões. Qualquer um era livre para ir ou não. O evento foi divulgado a todos, eu mesmo divulguei em meu blog várias vezes. Não era um lançamento particular de livro, que aí sim necessitaria de convite.
Quem quisesse participar, bastaria chegar ao local, fazer a inscrição, que seria muito bem recebido. E se quisesse vender seus livros ali, era só falar comigo mesmo, eu era o responsável para isso, junto com o Luiz Paulo Milani, outro membro da diretoria. Mas não enviei convites para tanto. A ninguém. Isso era aberto a todos os participantes do evento. Para que convites particulares para um evento que era aberto a toda a sociedade? Isso sim seria eletista.
E não sei por que essa história de que a Casa do Poeta é uma panelinha, se todos podem participar dos cafezinhos literários, e de qualquer outro evento, sem precisar fazer parte da Casa, sem precisar se associar, sem precisar de nada. Basta ir e expor sua opinião, o seu pensamento, o seu sentimento, a sua obra. E se quiser continuar a ir sem se associar, pode fazê-lo. E se quiser se associar, na hora mesmo isso será feito. Liberdade total e absoluta. Falta divulgação dos dias e horários dos cafezinhos? Talvez poderia haver uma divulgação maior por parte da imprensa, pois a divulgação é feita pela internet. Por que a imprensa não divulga? Panelinha é o que ocorre, por exemplo, no jornal Expresso Ilustrado, que possui a coluna Rotação Literária da qual fui proibido de participar pelo chefe do jornal. No entanto, o chefe desse jornal pode, tranquilamente, participar da Casa do Poeta.
Será que não gostam da diretoria da Casa do Poeta? Tudo bem, ninguém é obrigado a gostar dela. Se alguém quiser mudar a diretoria, basta se associar à Casa e compor uma chapa. Qualquer santiaguense pode fazer isso, basta se associar. A associação é muito barata, apenas três reais por mês. Não cobre nem as despesas da Casa. Qualquer um pode se associar, seja escritor ou não. Depois haverá a eleição. E todos os sócios votam. Quem não vai é porque não quer, não por falta de conhecimento, ou por qualquer outro impedimento. E se ainda não tinha conhecimento, agora está tendo. E se não quer ir, não serei eu que irei pressionar a fazê-lo. Nunca o farei.
Não posso admitir que afirmem que faço parte de uma panelinha. Detesto panelinhas, e sempre lutei contra elas. Lutei, sozinho diga-se de passagem, contra a panelinha formada pelo Oracy Dornelles e seus sequazes em torno da literatura em Santiago. Não será agora que formarei uma panelinha, ou que contribuirei para que ela se forme. Apenas não sou uma pessoa de andar atrás dos outros para que façam isso ou aquilo. Se alguém quiser participar da Casa do Poeta, de minha parte, será absolutamente muito bem recebido. Quem quer que seja. Inclusive o Oracy. Eu mesmo farei a associação. O convite está feito. Mas se não quiser, eu não irei correr atrás. E ponto final.

27 janeiro 2010

Poema Leve

minha obra que é nada leve
deixo que o furacão a leve
leve com tudo que a mim é nada
leve de nada que no fundo é tudo
que do todo não vivo me livro
como a mais trágica página
arrancada do mais trágico livro

que se apague essa funesta vela
o olhar sentença que meu sonho vela
arraste o meu peito em lava
às correntezas onde a água o lava
a água livre de lavado pranto

deixo que leve leve em descanso
a minha alma a nadar em vale
a minha a alma que nada vale...

25 janeiro 2010

Imortal

imortal
amor
amor tal
amoral
mal

amortal
imorre douro
que morre
sem ouro

imoral
não d’ouros
não duras
aah amor tal
amor tão...
em vão...
aah!
ah mortal!

23 janeiro 2010

A Lenta Morte da Mulher Bela - Final


Os gritos da bela mulher não eram reações desesperadas somente às suas dores excruciantes, mas ela reagia também às terríveis chagas que surgiam em todo o seu corpo e sangravam de forma inclemente, espargindo um sangue pútrido e mau-cheiroso, que se derramava por toda a cama, maculando os brancos lençóis e carregando o ar impuro de pestilentas emanações. As chagas desapareciam com o passar dos arrastados dias, mas sempre retornavam, cada vez piores, em cores mórbidas que iam do vermelho, ao roxo e finalmente ao negro.

E as pessoas ali respiravam aquela atmosfera mefítica, com uma imbecil tranquilidade sorridente. A mulher ardia em febre, e sua febre irradiava-se pelo ar, elevando a temperatura gradativamente. Ondas de enfermidade visivelmente partiam de seus entristecidos olhares de negras olheiras. Suas lágrimas não cessavam de escorrer como orvalhos de desgraça por seus miríficos cabelos negros. Sua face pálida e cadavérica implorava por misericórdia. No entanto, aqueles que viviam em seu quarto apresentavam um comportamento tão estúpido, tão indiferente, tão agressivo e miserável, que faziam, ainda que inconscientemente, com que a moléstia da mulher se agravasse ainda mais.

Em um instante soou um luto deprimente. E nas atmosferas ensombrecidas, mornas de enfermidade, densas de pesadelos, assomou pelo ambiente degradado a tensão desesperada de uma trágica marcha fúnebre. E suas notas noturnas vibravam como sinos agourentos de palpáveis maldições. Simultaneamente, adejaram pela janela as asas de um corvo que surgiu da noite distante, do espaço longínquo, e fitou seus olhos fundos de sentenças nas pessoas que ali no quarto estavam. O corvo assemelhava-se a um anjo. Trazia uma carta no bico.

Às vezes, os dias transcorriam em aparente serenidade. A serenidade funesta que antecede as mais devastadoras tormentas. E nos dias lentos, rastejantes, de tensão insuportável, relâmpagos e trovões, por vezes distantes, por vezes próximos, espargiam horrores e deixavam um odor ominoso pelo ambiente do quarto. E o clima obscurecia-se paulatinamente.

Ataques golfejantes de tosse assediavam os pulmões da bela mulher. Golfadas espessas de sangue espalhavam-se por todo o aposento. Um catarro amarelecido descia canhestramente de seu nariz. Ela debatia-se e revirava-se na cama inundada de um suor ardente, pegajoso e febril.

Pela janela semiaberta do quarto, uma estranha luminosidade avermelhada penetrou no ambiente de dúvidas e desesperos adejantes. A bela mulher desvairava, inebriada das mais absurdas catástrofes. Contorcendo-se de dor em todos os seus órgãos, ela levava as mãos amareladas e ressequidas, de veias proeminentes, à cabeça que latejava freneticamente.

Um sopro anômalo e rubro de sangue entrou com diabólica violência pela janela entreaberta. Tal sopro deve ter afetado a sanidade da bela mulher. Agonizante, como um furacão ela redobrou suas forças para erguer-se da cama sanguinolenta. Insana, descontrolada, enlouquecida, ela agarrou com suas mãos crispadas, de unhas crescidas e ensanguentadas, um por um o pescoço daqueles que viviam em seu quarto e os estrangulou com fúria alucinante. Nove dos dez moradores do quarto foram mortos dessa forma. Apenas aquela mulher que sinceramente tentava ajudar a bela enferma foi poupada. E, nesse instante, uma tênue fagulha de vida refulgiu em seus enormes olhos verdes. E o nome da bela mulher era Terra.
(na imagem, o quadro "O Pesadelo", de Füssli.)

22 janeiro 2010

A Morte Lenta da Bela Mulher


A magnífica beleza daquela mulher deslumbrava a todos. Mesmo agora, gravemente doente, sua beleza ainda encantava. Mas um intenso sofrimento era plenamente visível em seu rosto de olhos fundos e encovados. Sua doença era verdadeiramente terrível, impiedosa, e, aos poucos, bem aos poucos, em uma extrema e quase imperceptível lentidão de brutal angústia, seu organismo ia sendo consumido pela absurda enfermidade. Era como a mais desolada e arrastada das marchas fúnebres.

Enfermidade que a definhava de uma forma digna da mais elevada comiseração. Seus sintomas algumas vezes surgiam, noutras, desapareciam por completo. Porém, quando retornavam, eram ainda mais violentos. Dores insuportáveis em todas as partes do corpo. Ela chorava copiosamente nestes momentos. Mas o que assombrava ainda mais era a inexplicável indiferença com que quase todos observavam a sua agonia.

Das dez pessoas que viviam em seu quarto, apenas uma delas sentia verdadeira piedade ao vê-la morrer de maneira tão lenta e sofrível. As outras aparentavam não se dar conta da devastadora desolação que acometia a bela e pobre mulher. No entanto, todos afirmavam que conheciam sua doença, que sabiam de suas causas a fundo e que possuíam a cura para a pavorosa e fatal enfermidade. Consideravam-se médicos de extrema perspicácia e inteligência. Havia até alguns que diziam que a doença não era grave, que seria facilmente curada e que exageravam no julgamento da intensidade de seus sintomas. Mas ainda não a haviam curado, apesar de todas as tentativas de fazê-lo, tentativas em realidade estúpidas, vergonhosamente insuficientes, enfim, absolutamente inúteis.

Todos os dez indivíduos também afirmavam com total segurança que conheciam o fato de que eles, todos eles, eram os responsáveis, os culpados pela bela mulher agora se encontrar enferma. Sim, a moléstia que a afetava foi causada pelas dez pessoas que viviam em seu quarto. Viviam em seu quarto e dependiam da bela mulher para tudo, para absolutamente tudo, inclusive para viver. Não viveriam sem ela. Daí então a urgente necessidade de curá-la. Se ela morresse, todos os dez morreriam com ela.

De modo que assombrava, era quase inacreditável a indiferença com que seus companheiros de quarto contemplavam a sobrenatural agonia que a passos de anômala marcha fúnebre levava aquela linda mulher a uma morte dolorosa e implacável. Algo realmente incompreensível. O que passaria pela mente dos cinco homens e das cinco mulheres que ali naquele quarto de doença viviam? O que passaria por seus sentimentos?

Talvez os moradores do quarto já estivessem tão habituados com a doença que causaram à mulher que já nem eram capazes de se emocionar com o vagaroso, lento, gradual sofrimento que ela irradiava. Havia ali somente uma pessoa que ainda agia intentando acender os sentimentos dos outros para que realmente tomassem consciência da iminente situação em que se encontravam. Porém, sempre inútil.

Mais e mais o clima reinante naquele quarto tornava-se pesado e nervoso. Sombras pesarosas iam surgindo dos cantos do ambiente carregado de densos espectros de ocaso. Lentamente, numa lentidão que parecia eterna. Em alguns momentos, luzes cintilavam em algumas pequenas reentrâncias quase ocultas que traziam consigo determinada esperança. Porém, em pouco tempo eram rapidamente subjugadas por nuvens escuras de uma fumaça de ignota origem.

Sistematicamente, a bela mulher em sua suprema agonia emitia gritos horripilantes, gemidos dilaceradores, que ensurdeciam e inflamavam os ouvidos dos seus companheiros de quarto, a ponto de sangrá-los. Mesmo assim, raramente se emocionavam, bem raramente...
Amanhã, o final.
(na imagem, o quadro "Mulher Morta" de Reinhardt Sobye)

21 janeiro 2010

I Fórum de Literatura e Meu Primeiro Livro de Poesias


Amanhã, dia 22/01/10, às 19h, ocorrerá, na câmara de vereadores de Santiago, a abertura do I Fórum de Literatura e II Encontro de Escritores do Mercosul. Ainda é possível realizar inscrições. É uma ótima oportunidade para os amantes da cultura. E até para os que não a amam tanto. Para maiores informações: http://www.casadopoetadesantiago.com.br/ . Confira no quadro acima o cronograma do evento.

Meu primeiro livro de poesias, intitulado Poemas do Fim e do Princípio, seria lançado durante o evento, mas infelizmente, por motivos de forças maiores, isso não será possível. O livro não ficou pronto a tempo. Ele está, no momento, sendo preparado pela editora Livros Ilimitados e deverá ser lançado no final de fevereiro ou, no máximo, no início de março. Contará com 246 poemas escolhidos dentro de minha produção dos últimos cinco anos, de acordo com critérios de qualidade e de temática por mim estabelecidos. A publicação do livro será uma inovação em Santiago dentro do campo literário. Tal inovação será conhecida no dia de seu lançamento.

20 janeiro 2010

Fernando Pessoa e Seus Passos da Cruz (IV)


Continuo postando os sonetos de Passo da Cruz de Fernando Pessoa, conforme explicado na seguinte postagem: http://artedofim.blogspot.com/2009/12/fernando-pessoa-o-predestinado-passos.html. Na próxima semana, o 5º passo. Na imagem que acompanha o poema, o quadro "Mignon" de Von Schadow.

Passos da Cruz - Soneto IV

Ó tocadora de harpa, se eu beijasse
Teu gesto, sem beijar as tuas mãos!,
E, beijando-o, descesse p'los desvãos
Do sonho, até que enfim eu o encontrasse.

Tornado Puro Gesto, gesto-face
Da medalha sinistra - reis cristãos
Ajoelhando, inimigos e irmãos,
Quando processional o andor passasse!...

Teu gesto que arrepanha e se extasia...
O teu gesto completo, lua fria
Subindo, e em baixo, negros, os juncais...

Caverna em estalactites o teu gesto...
Não poder eu prendê-lo, fazer mais
Que vê-lo e perdê-lo!... E o sonho é o resto...

18 janeiro 2010

Poema Inebriado

e que no além seja tudo aquilo
que caí de ser além de tudo:
me deixando em tudo que não fui
seja minha arte o além mais alto...

o além de mais belo
do vasto que andei
chama que te li
tragos do que busco
ave que clarei
sempre que te bebo
mais do que te vejo
sonho que não li
beijo do que vou
verso mais que flor
olho que me noite
nada do que sou...

lá me alto e passo
lá sou só o que sinto:

céu e vinho tinto

17 janeiro 2010

do Destino

o coelho sai tranquilo
da toca e...
de repente o lobo o abocanha

o lobo vai tranquilo
com o coelho e...
de repente o pega a armadilha

o caçador vai tranquilo
com o lobo e...
de repente o pica a serpente

(...)

e era um dia nublado
chuvoso e...
de repente saiu sol

ninguém esperava...

15 janeiro 2010

Uma Pergunta:

mas o que foi que fizeste da tua alma?
quer dizer que a sabes
mas não a ouves?
quer dizes que a tens
mas não a lês?
quer dizer que a vês
mas não a pensas?
quer dizer que a amas
mas não a sentes?

de que adianta
noivar através das flores
se o perfume evapora
pela indiferença do nada?

de que adianta
luzir por entre olhares
se os sonhos escapam
pelo deixar cair das asas?

se achas que vives ter alma
é melhor que a esqueças:
pois só vive a alma
quem por ela morre...

14 janeiro 2010

Letras Aos Corvos (Antologia)


A Editora Literata está realizando uma antologia de poemas góticos e grotescos, com a organização dos escritores Ana Carolina Giorgion e M. D. Amado, e a participação é aberta a qualquer poeta.

Terei a honra de ser o prefaciador do livro, e também serei um dos participantes. Para informações mais detalhadas, tais como o regulamento para participação, comunidade no orkut, acesse o site http://www.letrasaoscorvos.blogspot.com/.


13 janeiro 2010

Fernando Pessoa e Seus Passos da Cruz (III)


Continuo postando os sonetos de Passo da Cruz de Fernando Pessoa, conforme explicado na seguinte postagem: http://artedofim.blogspot.com/2009/12/fernando-pessoa-o-predestinado-passos.html. Na próxima semana, o 4º passo. Na imagem que acompanha o poema, o quadro "Vênus" de Velázquez.


Passos da Cruz - Soneto III
Adagas cujas jóias velhas galas...
Opalesci amar-me entre mãos raras,
E fluido a febres entre um lembrar de aras,
O convés sem ninguém cheio de malas...

O íntimo silêncio das opalas
Conduz orientes até jóias caras,
E o meu anseio vai nas rotas claras
De um grande sonho cheio de ócio e salas...

Passa o cortejo imperial, e ao longe
O povo só pelo cessar das lanças
Sabe que passa o seu tirano, e estruge

Sua ovação, e erguem as crianças
Mas o teclado as tuas mãos pararam
E indefinidamente repousaram...

12 janeiro 2010

Eu Não Sirvo a Ninguém

como exemplo
não me siga
que eu a ninguém sou exemplo:
irias arrancar os cabelos
se visses o que trago por dentro

quanto mais belo é o que escrevo
mais de horrores me inundo...
eu não passo
de um vagabundo
e em todos meus passos
nos mais altos
abismos me afundo

o que eu faço da vida
não sei
sei
que meu peito estraçalhei
que quanto melhor é a Arte
mais grave é o enfarte

sou tão nada
que escrevo como escreveram
todos os poetas:
não passo de um triste
a minha própria alma
de tão funda
nem existe

construí catedrais inúteis
do que sinto
ergui minha alma
nos alicerces do que nunca vem
e tudo que digo
minto

do meu trono de miséria
olho-te cheio de orgulho e desdém
por isso não me siga
não me admire
que eu não sirvo pra nada
e não sirvo a ninguém.

10 janeiro 2010

Fatal

na minha boca
sangue de estrelas
sobre meus ombros
todo sol cai
tudo se esvai
lutando à luz do ocaso
trompas de arcanjos
cortam-me a testa
sobre meus olhos
vem todo céu
rasga-se o véu
olhando o fim pra sempre
rabos de raios
dando-me coices
na minha voz
pesa-me a lua
e a noite nua
amando a marcha e a morte
mundos não-críveis
trevas de luzes
cósmicos trezes
na minha alma
voou toda calma
se indo pelo Mistério

08 janeiro 2010

Não Melodio por Mim...

a final melodia que mais criei
é mais triste que tudo que crio
que é a melodia que não criei
que melodias não rio
mas melodias finais
é tudo que faço
e traço

fracasso
que não crio tudo que faço
só o que é cada vez mais trágico
e escuro
só traço o final mais puro
o estrago
a melodia que for mais triste
que é claro
não existe
e o final que for mais duro
e trago

o vinho que for mais largo
de cansaço
amarguro
e de sangue
na desgraça do braço
em pulso

foi com ele que (al)cansei o laço
errado
onde ando arrastando
o rastro
ondeando em vão
para lassar teu astro
na minha passada de vasto
em passados abraços
de finais e últimos
(com)passos...

07 janeiro 2010

"Eis o mal dos senhores, os políticos. Nem mesmo chegam a pensar em coisas importantes."


Acompanhando o intenso blog do Ruy Gessinger, li: "A Conta Está Chegando". Refere-se aos desastres ambientais que vêm assolando o RS, sendo o último a queda da ponte de Agudo pela devastadora enchente. Diz Gessinger:


"Mas a conta dos anos 70, do milagre soja-trigo, do desmatamento; a fatura do crescimento demográfico incontrolado ; a destruição de matas nativas e florestas ciliares não podia ficar impune. A Natureza se sente ameaçada, ela é um ser vivo, ela raciocina em termos de milênios, mas decidiu não ter mais paciência com esse serzinho ignóbil, com” suicidal tendences”. "

Faço minhas as suas trágicas palavras. A conta está chegando. E será alta, muito alta, altíssima! Mas não adianta avisar. Adianta? A destruição impiedosa e imbecil da natureza prosseguirá a passos de gigante. E virá a conta, em parcelas cada vez mais caras. E tanto não adianta avisar, que em 1928, eu disse em 1928!, quando ainda não havia preocupações ambientais reais por parte da humanidade, em seu livro "Contraponto", o genial escritor inglês Aldous Huxley advertiu sobre a desgraça que o "progresso" traria ao planeta. A seguir, um trecho da obra:

"Com essa agricultura intensiva, os senhores estão roubando ao solo o seu fósforo. Ele vai desaparecendo completamente de circulação. Depois, basta ver como os senhores deitam fora centenas de milhares de toneladas de anidrido fosfórico nesses esgotos! Derramando-o dentro do mar. E a isso os senhores chamam progresso. (...)

Eis o mal dos senhores, os políticos. Nem mesmo chegam a pensar em coisas importantes. Vivem a falar do progresso e deixam que todos os anos milhões de toneladas de anidrido fosfórico corram para o mar. É idiota, é criminoso, é... é o mesmo que tanger a lira enquanto Roma arde. Mais duzentos anos apenas e os depósitos se extinguirão. Os senhores julgam que estamos em progresso porque vivemos do nosso capital. Fosfato, carvão, petróleo, salitre, esbanje-se tudo! Eis a política dos senhores. (...)

O único resultado desse progresso dos senhores será que dentro de algumas gerações há de vir uma revolução verdadeira - uma revolução natural, cósmica. Os senhores estão transtornando o equilíbrio. Ao cabo, a natureza o há de restabelecer. E o processo será muito desagradável para os senhores. A queda será tão rápida como o foi a ascensão."

E essas palavras proféticas de Huxley já estão se cumprindo.

Para finalizar, republico um de meus poemas, escrito em outubro de 2009:

Enxurrada

olho para a humanidade
e rio
rio que me leva
leve
em suas correntezas
sem correntes

por que devo combater
o que não deve ser combatido?
o que não deve ser combatido
não deve ser combatido
por que já está vencido
o simplesmente é deixar assim
que tudo nasce
e corre ao Fim

não digo
que não irei com a enxurrada
digo que choveu forte vasto e além
e que a enxurrada vem...

06 janeiro 2010

da Sabedoria

uma nota sinfônica
sabe
por toda altura
acima
de cada letra filosófica

uma pintura mágica
filtra
sol e lua
avante
de quaisquer gases científicos

uma poesia trágica
rufla
suas negras asas
além
de toda poeira teórica

05 janeiro 2010

Fernando Pessoa e seus Passos da Cruz (II)


Publico, conforme anunciei na postagem do dia 28/12/09, o segundo da série de 14 sonetos de Passos da Cruz, de Fernando Pessoa. Semana que vem, o 3º soneto.


Passos da Cruz - Soneto II


Há um poeta em mim que Deus me disse...
A Primavera esquece nos barrancos
As grinaldas que trouxe dos arrancos
Da sua efémera e espectral ledice...

Pelo prado orvalhado a meninice
Faz soar a alegria os seus tamancos...
Pobre de anseios teu ficar nos bancos
Olhando a hora como quem sorrisse...

Florir do dia a capitéis de Luz...
Violinos do silêncio enternecidos...
Tédio onde o só ter tédio nos seduz...

Minha alma beija o quadro que pintou...
Sento-me ao pé dos séculos perdidos
E cismo o seu perfil de inércia e voo...
(na imagem, o quadro "João Batista" de Leonardo Da Vinci)

03 janeiro 2010

Frases para 2010

A seguir, deixo 13 trechos literários para reflexão neste ano que está principiando...



1)“Não é ilógico supor que, numa existência futura, possamos considerar esta vida terrestre como um sonho.”

Edgar Allan Poe

2)“A lembrança da felicidade passada é a angústia de hoje, as amarguras que existem agora têm sua origem nas alegrias que podiam ter existido.”

Edgar Allan Poe

3)“O corpo é a sombra das vestes
que encobrem teu ser profundo.”

Fernando Pessoa

4)“A morte é a curva da estrada,
morrer é só não ser visto.”

Fernando Pessoa

5)“Deus costuma usar o fogo, para nos ensinar sobre água.”

Fernando Pessoa

6)“Querer não é poder. Quem pôde, quis antes de poder só depois de poder. Quem quer nunca há-de poder, porque se perde em querer.”

Fernando Pessoa

7)“Como a arte é longa, e como a vida é breve!”

Johann Wolfgang Von Goethe

8)“Um prazer demasiadamente repetido produz a insensibilidade; não o sentimos mais como prazer.”

Aldous Huxley

9)“Por trás de toda grande fortuna há um crime.”

Honoré de Balzac

10)“Para não serdes os martirizados escravos do Tempo, embriagai-vos;embriagai-vos sem tréguas! De vinho, de poesia ou de virtude, à vossa escolha.”

Charles Baudelaire

11)“Que minha guerra contra o homem se eternize, já que cada um de nós reconhece no outro sua própria degradação.”

Conde de Lautréamont


12)"O homem não é o único a falar, o universo fala, tudo fala, linguagens infinitas.”

Novalis

13)“Tu és O Poeta, o grande assinalado
Que povoas o mundo despovoado,
De belezas eternas, pouco a pouco.”

Cruz e Sousa

02 janeiro 2010

Soneto Ainda Mais ao Fim

Mas da minha alma, Deus, que faço agora,
se mais e mais sou um louco isolado,
se toda esperança é sonho acabado,
se nenhum olho pelo Cosmos chora?

Pois de ocultar-me vejo chegar a hora:
tão somente um coração massacrado
é o que trago caminhando ao meu lado,
é o que te deixo... Sim, devo ir embora.

Exauri as cordas do meu violino
na tentativa de elevar-te além,
na luta insana contra o Gran Destino.

Voto agora ao homem total desdém
e uma carta a um corvo em febre eu assino
na Noite quieta que matar-nos vem...

31 dezembro 2009

Ou Para Apagá-la...

a Arte não pode
dar concessões:
há que se voar ao extremo
e se descer ao abismo

se tens medo
de que o fogo do sol
ou do inferno
incendeie teus olhos
ou que morra na queda
quando a tua asa cansar...

é melhor sentar
deitar
repousar...

na Arte não há meio-termos
não se pode equilibrá-la:
a Arte é para incendiar a chama do peito
ou para apagá-la...

30 dezembro 2009

Soneto ao Não

o longe além dos dias que não vieram
veem como se eu não estivesse cá
todas esperanças que não me deram
é aquela estrela que não está lá

a estrela olho com olho que não é
no alto em promessa como um não perdida
e o seu não fitei com imensa fé
na janela que não foi construída

e a luz que desce ao não ser da janela
vem não a mim em sim de solidão
à chama em não ter aceso uma vela

em paz não beija a minha alma emoção
e me vou sonhar-te em não voo com ela
até os céus de um catastrófico Não

28 dezembro 2009

Fernando Pessoa - O Predestinado - Passos da Cruz I

"Um dia,
lá para o fim do futuro,
alguém escreverá sobre mim um poema,
e talvez só então eu comece
a reinar no meu Reino."

Fernando Pessoa


Entre 1914 e 1916, Fernando Pessoa compôs os 14 sonetos de "Passos da Cruz". Trata-se de sonetos absolutamente perfeitos e inovadores em nossa língua, avançando do Simbolismo para o Modernismo, numa linguagem das mais profundas e enigmáticas, por isso, pouco populares, se levarmos em conta que a obra de Pessoa é muito difundida na atualidade.

Nesses sonetos, o gênio português expressou a sua dramática visão de sua missão como poeta, como artista. Julgava-se um predestinado, solitário e incompreendido, cuja missão ele ainda não conhecia totalmente, mas que seria cumprida de qualquer forma e legada à posteridade.

E assim, de fato o foi. Pessoa jamais teve reconhecimento em vida, publicou apenas um livro, fracassou em seus projetos profissionais, viveu em relativa pobreza, sendo sustentado por amigos e parentes, mas hoje é visto como um dos maiores poetas da literatura universal. Hoje anda de boca em boca, amantes e não amantes de poesia conhecem pelo menos alguns de seus versos e não se cansam de expressá-los em blogs, orkuts, twitter, enviar para os amados e amadas, ainda que não os compreendam inteiramente. Seus livros são incansavelmente editados, reorganizados, espalhados pelo mundo todo. Suas obras estudadas e analisadas infatigavelmente. De modo que Fernando Pessoa tinha razão. Ele era um predestinado.

A partir de hoje, sendo um por semana, publicarei aqui os 14 sonetos de Passos da Cruz, sem comentá-los, deixando que o leitor tenha suas próprias sensações.


Passos da Cruz - Soneto I

Esqueço-me das horas transviadas…
O Outono mora mágoas nos outeiros
E põe um roxo vago nos ribeiros…
Hóstia de assombro a alma, e toda estradas...
Aconteceu-me esta paisagem, fadas
De sepulcros a orgíaco… Trigueiros
Os céus da tua face, e os derradeiros
Tons do poente segredam nas arcadas…

No claustro sequestrando a lucidez
Um espasmo apagado em ódio à ânsia
Põe dias de ilhas vistas do convés

No meu cansaço perdido entre os gelos,
E a cor do Outono é um funeral de apelos
Pela estrada da minha dissonância…

27 dezembro 2009

Poema Fúnebre


deixa assim...
que de nota em nota
a Marcha Fúnebre
chegará ao fim

enquanto eles falam
e gritam e riem e gestam
e sobem e descem e sabem
e vencem e caem e cegam
transpiram publicam rastejam

eu calo-me
num canto
canto sombrio e só
não-visto por todos
ouvido por nada
e só recebi um não
por ter a razão

o Fim
é uma marcha fúnebre
e fúnebre sendo
seu lento andamento
é lento...
lento...
bem lento...

então deixa assim
que eu não falo por mim:
quem fala é o Tempo...

26 dezembro 2009

“Não tive filhos, não transmiti a nenhuma criatura o legado da nossa miséria.”


Com essa sentença, o nosso maior romancista, Machado de Assis, encerrou o seu genial “Memórias Póstumas de Brás Cubas”. O livro foi escrito há quase 130 anos, e hoje tal frase deveria ser seguida como lei. Explico-me...

Irei direto ao ponto, não há muito que ser dito sobre este assunto. As pessoas falam em preservar o planeta com redução da poluição, com preservação da vegetação natural, com conscientização da população, com desenvolvimento sustentável, enfim, todas essas utopias que qualquer ser humano com o mínimo de inteligência sabe que são irrealizáveis. O fracasso de todas as conferências sobre clima e preservação ambiental está aí para provar o que digo. Ter esperanças de que o ser humano vai conseguir reverter a situação com tais atitudes é uma ingenuidade, ou imbecilidade mesmo.

Então, nossa civilização não tem saída? Tem. É só ninguém mais ter filhos. Pronto. Isso é um absurdo? Claro que é. E só esse absurdo pode salvar nossa atual civilização. É tão absurdo que ninguém toca nesse assunto. Já viram alguém falar que essa é nossa única solução? Não, ninguém tem coragem de afirmar tal inaceitabilidade. Eu tenho. E meu raciocínio é de uma impiedosa simplicidade.

Segundo os cálculos científicos, dentro de 40 anos, o mundo, mantendo o atual índice de crescimento populacional, com o aumento da expectativa de vida, terá cerca de 10 bilhões de habitantes. Nosso planeta não está suportando 6, vai suportar 10 bilhões de pessoas? Calcula-se que para sustentar tal população sem que ninguém passe fome, tenha-se que quase triplicar a produção de alimentos. E tirar de onde tantos alimentos, se a atual produção já é insustentável para o planeta? E de onde tirar mais água, se ela já está escasseando? E mais energia? Ou quem sabe as pessoas que nascerem não deverão se alimentar, nem tomar água, nem se vestir, nem acender uma lâmpada? Talvez nem devam respirar...

A verdade simples, lógica, matemática - e cruel - é esta: a humanidade não pode aumentar, se aumentar, o planeta morre, porque ele já nem com o que tem está aguentando. É o mesmo que dar mais sal para um hipertenso que está tendo um infarto. Qual será o resultado? Então, ninguém mais pode ter filhos. Ou, para cada criança que nascer, alguém deverá morrer. E como eu sei que isso não vai acontecer, explica-se todo o meu pessimismo... Esta civilização não tem futuro. Terá que acabar para recomeçar. Ponto final.

25 dezembro 2009

Poemas do Término e Contos do Fim 37


A edição 37 do zine literário Poemas do Término e Contos do Fim será lançada amanhã, dia 26/12. Incluirá os contos "Conto Violento e Inútil" e "De Sangue" e mais 4 poemas insensatos.


Em Santiago, os pontos de distribuição são os seguintes: locadoras Fox, Classic e Stop, biblioteca pública, biblioteca da Uri, Ponto Cópias e Livraria Santiago. Pode ser enviado para qualquer cidade do Brasil ou exterior, mediante o pagamento das despesas de correio.

Agradeço à colaboração dos seguintes amigos na distribuição do zine em outras cidades: Liziane Serafini (Santa Cruz do Sul/RS), Luana Serafini (Santa Maria/RS), Alberto Ritter (Porto Alegre/RS), Gracieli Persich (Santo Ângelo/RS), Louise Wagner (São Leopoldo/RS), Lilene Leverdi (São Gonçalo/RJ), Héder Duarte (São Gonçalo/RJ), Agnes Mirra (Goiana/PE) e Paulo Soriano (Salvador/BA). Agradeço também ao amigo Guilhermes Damian pelo excelente trabalho de design do zine.

24 dezembro 2009

Poema de Natal II


talvez te desejasse felicidades
a felicidade que ânsia pelos dramáticos angelicais
anos-luz de desejos que se afogam
nos impossíveis das idades...
mas não vou te desejar felicidades.

talvez te desejasse saúde
a saúde que sol pelos campos em tons azuis
verdes-luz de paisagens que se somem
nas contradanças do alaúde...
mas não vou te desejar saúde.

talvez te desejasse amor
o amor que céus pelas lunáticas infinitais
beijos-luz de sonhar-te que se vagam
ao som da mais clara cor...
mas não vou te desejar amor.

não, não vou desejar...
nem felicidades
nem saúde
nem amor
nem paz
nem calma

eu só te desejo Alma.
(na imagem, o quadro "Anunciação" de Botticelli)

22 dezembro 2009

Poema de Natal

não deixarei agora em verso
nem espalharei pelo universo
a mínima desgraça andante
golfejarei meu próprio sangue
que tudo é vão e decadente
que tudo é falsa e vã semente
cala-te ânsia pelo meu pranto
suma comigo em teu espanto
nada fique da minha história
que é vão o amor o sonho a glória
que abisme o desejo em meu peito
morra o horror em mim desfeito
mergulhem-me no que é fatal...

brilha puro o astro de Natal.

21 dezembro 2009

Aspire Fundo... e Solte...

se eu tivesse
um pouco mais de inspiração
talvez transformasse em sonho
o ar medonho
que respiro
se eu tivesse um pouco mais
de respiração...
se eu chegasse
a um alto mais de aspiração
talvez transmutasse em dança
o chumbo da esperança
que suspiro
se eu tivesse um alto mais
de inspiração...

se a tua respiração eu inspirasse
talvez aspirasse o ar que me inspira
talvez ventasse a luz que suspira
em tua boca soprada

mas aspirei a tudo
e aspirei o nada

19 dezembro 2009

Visão Final

de tuas fantásticas visões
trago o peito (de) amor... tecido
e sempre irei afoguear-me
no mar de fogo da arte
na cura de chamas românticas
das quais sempre morti... fiquei-me
morri-me vezes várias
e consegui-me curar-me jamais

contigo e tuas pupilas
de íris ocultas de sonhos
a cristais de horizontes
carregados rubros de Fim
meu espírito
que nunca será (demo)lido
verá o Final pelo Início
sublimado
em vapores de lágrima
de teu olho emocio...
nado
no teu choro ao infinito
que é onde vou-me ao jamais...
sonhado

17 dezembro 2009

Versos Erguidos

sempre distante de teu sucesso tedioso
sentenciei-me acabando por entre meus sonhos
e quanto mais fundo me acabo
ergo-me cada vez melhor acabado

sempre longínquo de teu marasmo sensato
acabei-me flechado por trágico orgulho
e quanto mais me dispo de orgulho
ergo-me cada vez mais exaltado

sempre em desprezo de teu saudável sorriso
orgulhei-me de insano em dramática doença
e quanto mais em violência adoeço
ergo-me cada vez mais inflamado

sempre em desgraça de teu vazio perfeito
adoeci-me em tormentas de arcanjos rebeldes
e quanto mais sem consolo rebelo-me
ergo-me cada vez mais rebelado

sempre em fracasso de teu destino traçado
rebelei-me sendo Rei sempre ao descer
e quanto mais aos abismos me desço
ergo-me cada vez mais elevado

Agradecimento Geral

Agradeço aos amigos que estão divulgando o texto abaixo em seus blogs pelo Estado afora. Obrigado.

16 dezembro 2009

Eu Acredito em Papai Noel, Yeda Crusius, Marco Peixoto e Expresso Ilustrado


Como o Natal está chegando, quero, agora, solenemente, afirmar que acredito no Papai Noel. Sim, é verdade. Ele trouxe-me vários presentes quando eu era criança. Alguns invejosos insistem em tentar fazer-me crer que era meu pai vestido de Papai Noel, mas não... Era o bom velhinho sim! Eu apenas ainda não descobri de onde ele conseguiu os presentes, mas estou certo que vou descobrir em breve, pois pretendo adicionar o Papai Noel no msn, ou no orkut, se ele não quiser me passar o msn.


E além do Papai Noel, acredito na nossa querida governadora Yeda Crusius, sempre tão sincera, bondosa, pacífica e amiga do funcionalismo. Dizem que ela comprou uma casinha com dinheiro de campanha, que participou ou encobriu esquemas de corrupção, mas eu duvido. Para mim, que tenho um imenso coração sempre pronto a perdoar os erros humanos e perdoo os que falam mal da governadora, a Dona Yeda não fez nada disso, muito pelo contrário, ela está se sacrificando para colocar o Estado em equilíbrio e para acabar com as farras dos professores, esses desabusados, preguiçosos, que só sabem reclamar. Tudo bem, admito que não vejo equilíbrio em parte alguma no Estado, mas a culpa é minha. Eu fico só na internet e não acompanho os jornais. E na internet dizem que o aumento para os professores dado pela governadora é uma farsa. Mas que absurdo! Essa gente nunca está contente com nada. Querem decerto ganhar uns dois mil por mês! Só para dar umas aulinhas bestas para uns aluninhos que já sabem tudo? Pobre da governadora, só ela para aguentar tanta chateação. É uma santa!


E santo também é o deputado Marco Peixoto, grande homem, eu me orgulho de ser santiaguense como ele, e para mim tudo o que ele diz é verdade, pois eu o conheço, é um gaúcho do pampa, um homem de confiança, que honra o fio do bigode, mesmo que ele não tenha bigode. Ele não mente nunca! Isso é fato. Agora não queriam que ele fosse conselheiro do Tribunal de Contas do Estado... Mas por quê? Dizem que ele está ou esteve envolvido em algumas coisinhas meio ilegais, algumas continhas meio obscuras, uns envolvimentozinhos meio feinhos, mas isso quem é que não tem? Tais coisas é que deixam a vida emocionante. Mas mesmo assim, estou certo que ele não tem envolvimento nenhum. Sabem por quê? Por que ele já chegou a chorar no plenário. Que homem santo! Não te preocupa, estou contigo, Marcão! Mas quando eu te pedir, vê se me ajuda, né!


E acredito no jornal Expresso Ilustrado como um veículo de informação absolutamente confiável, que jamais omitiria uma informação da população santiaguense. Assim, se o deputado Marco Peixoto, ou qualquer outra pessoa, tivesse algum podre, todos nós já saberíamos. Estou absolutamente certo de que o ilibado jornal Expresso Ilustrado divulgaria. Tal jornal é a fina flor da sociedade santiaguense, e nele não há lugar para omissões, puxa-saquismos ou censuras. Sim, jamais alguém, seja quem for, será censurado por este jornal, baluarte e símbolo da democracia brasileira. Por mais que alguém diga certas verdades inconvenientes que não estão de acordo com a orientação deste pomposo veículo de imprensa, o que é absolutamente normal dentro do estado democrático, ele sempre permitirá a livre expressão humana em suas páginas. E viva Santiago!


Finalmente, acredito que todos os que acima mencionei, dentro de 50 anos, serão lembrados como grandes filhos da humanidade, terão suas vidas estudadas nas escolas e seus feitos glorificados aos quatro ventos.


Ah, e o Coelhinho da Páscoa está aqui comigo agora. Quem disse que ele não existe? Quem quer um ovinho?


15 dezembro 2009

Cruz e Sousa: o Maior Poeta Brasileiro


Considero Cruz e Sousa como o maior poeta entre os brasileiros. Estou certo que bem poucos, pouquíssimos, concordarão comigo. O Simbolismo, em nossas terras, não é visto com bons olhos, geralmente. Justifico minha opinião. Cruz e Sousa é um dos raros poetas no Brasil que conseguiu unir perfeição formal com uma expressão absolutamente profunda e original. Se considerarmos o contexto em que criou sua obra, dominada pelo artificialismo parnasiano, a obra angustiada e sincera de Cruz e Sousa surge de forma ainda mais surpreendente.


Para mim, o Poeta Negro é tão elevado quanto os grandes simbolistas franceses. Certa vez, um crítico de que não me recordo o nome, afirmou que se Cruz e Sousa fosse europeu e branco, seria tão reconhecido como os maiores simbolistas do mundo. Dizia ainda o crítico que o poeta brasileiro é mais sublime que Baudelaire, mais profundo que Verlaine, mais sincero que Mallarmé. E eu concordo totalmente.


O que mais impressiona foram as condições em que a obra de Cruz e Sousa foi criada. Não bastasse ele ser negro e sofrer com o preconceito que era muito mais intenso na época, ou mais evidente, pois hoje ele é mais mascarado, ainda sofria de tuberculose (doença que também vitimou três de seus filhos), sua esposa Gavita, que tanto amava, enlouquecera, e recebia um mísero salário da Estrada de Ferro Central do Brasil.


E foi assim que o "Cisne Negro" nos legou uma das obras mais autênticas de nossa literatura, intensamente espiritual, versos advindos da alma capazes de enternecer nosso coração. Uma poesia pulsante de luz e sombra, trágica, angustiada, inquietante, de incomparável musicalidade, mergulhada no mistério da vida e do universo. Abaixo, um de seus Últimos Sonetos.



COGITAÇÃO


Ah! mas então tudo será baldado?!
Tudo desfeito e tudo consumido?!
No Ergástulo d'ergástulos perdido
Tanto desejo e sonho soluçado?!


Tudo se abismará desesperado,
Do desespero do Viver batido,
Na convulsão de um único Gemido
Nas entranhas da Terra concentrado?!


Nas espirais tremendas dos suspiros
A alma congelará nos grandes giros,
Rastejará e rugirá rolando?!


Ou entre estranhas sensações sombrias,
Melancolias e melancolias,
No eixo da alma de Hamlet irá girando?!

14 dezembro 2009

Decepção

é como se fosse
a noite sem fim do Fim que me embriaga
esperanças que correm pelas luas claras
poções de sonhos das mais santas magas
olhos profundos das corujas altas
promessa em luz em catedrais mais vastas
cantos de ave em imensidões tão largas
rezas de anjo de pulsar tão gratas
amor em deuses por mais belas almas
enfim estrela alva iluminada...
é como se fosse tudo!

mas não é nada.

12 dezembro 2009

Otimismo (piada)

acredito
na humanidade...

o homem se a(pro)funda
no ato de merditar
e usa as folhas das árvores massacradas
pra bem limpar

... a consciência

a Merda
é o fruto
sublime
da humanidade:
é algo sólido
prático
concreto
palpável
bem material

é o nosso futuro
espe... rançoso

11 dezembro 2009

Projeto Pequenas Histórias

Fui convidado pela editora Cidadela, de Porto Alegre, para participar da coletânea do projeto Pequenas Histórias, a qual lançou dois livros dia 7/12/2009, um de contos e outro de poesias. Participo dos dois, com 5 contos e 7 poemas, uma vez que não houve ônus para os autores convidados na publicação do livro.

Venho então fazer a propaganda dos mesmos. Caso o leitor tenha interesse em adquirir um dos livros, ou os dois, pode fazê-lo através do seguinte link:
http://www.cidadelaeditorial.com.br/euautor.htm

Anexando ao pedido do livro o código Arte e Fim, o leitor obterá um desconto de 10%. Agradeço imensamente aos que se interessarem pelas publicações.

10 dezembro 2009

Escolha a sua Opção

não ter esperança
é sofrer à vista:
sofre-se um pouco
e depois passa
e até se pode ganhar um desconto...

ter esperança
é sofrer a prazo:
adiar a desgraça
com um cheque
de sonhos sem fundos
com um cartão de crédito
com limite de sorte excedido
para 30 dias
30 meses
30 anos...

mas um dia tem que se pagar
com juros
e acréscimos

escolha a sua opção...

09 dezembro 2009

I Fórum Latino-Americano de Literatura Contemporânea


Venho convidar a todos para participarem do I Fórum Latino-Americano de Literatura Contemporânea, que será realizado em Santiago nos dias 22, 23 e 24 de janeiro de 2010. O investimento para participar do evento é de apenas R$ 20,00, um valor baixo para um evento desta magnitude e que, obviamente, fornecerá certificados aos participantes. Confira o seu cronograma aqui publicado. Durante o evento, devo lançar meu segundo livro, Poemas do Fim e do Princípio, que contará com mais de 230 poemas selecionados dentro da minha produção dos últimos 5 anos. Maiores informações no site da Casa do Poeta de Santiago: www.casadopoetadesantiago.com.br

08 dezembro 2009

Aquecimento Global, Caos Planetário e a Cegueira Humana


O recente escândalo do "Climategate", como vem sendo chamado, onde haveria fraude nas medições de temperatura para que fosse intensificado os dados do aquecimento global, está sendo usado, mais uma vez, para justificar a continuidade infrene da destruição ambiental, como se uma possível fraude encobrisse todos os fatos gritantes que estão diante de nossos olhos.


Já cansei de citar em meus textos uma frase de um filósofo: "O homem não aprende as lições da vida nem a canhonaços." Não aprende nem vai aprender, até que desabe o teto sobre a sua cabeça, ou seja, quando já for tarde demais. A humanidade tem uma fé tão fanática nesta ciência equivocada, que se ela afirmar algo hoje, tudo é exatamente como ela afirmou. E se amanhã ela se desdizer completamente, então tudo passa a ser do outro jeito. E jamais direcionam seus olhos do corpo, da mente e da alma ao seu redor. O que são os homens? Nada mais que marionetes, que se comportam conforme o movimento das cordas. Os fanáticos da ciência costumam criticar os fanáticos religiosos, mas o grau de fanatismo é o mesmo, apenas oscilando em polos opostos.


Na verdade, não importa se há ou não aquecimento global, o certo é que o planeta inteiro passa por um descontrole climático nunca antes visto pela civilização, e que está aqui, diante de nós, e nós fingimos que tudo é natural, e que o homem não tem culpa nenhuma nisso tudo. E sabem por quê? Por que esse descontrole, esse caos, é lento, é progressivo, é insidioso, como um câncer que se manifesta lentamente, os seus sintomas surgem de vez em quando, e depois passam, e depois voltam, o indivíduo nem dá atenção, até que quando percebe a gravidade da situação, o câncer já tomou conta do organismo, e então é tarde demais. A humanidade é como a velha história dos sapos sendo cozinhados na panela de água quente. Os sapos não percebem a água esquentando, porque ela sobe muito gradualmente, quase que imperceptivelmente, até que quando se dão conta (ou até que quando não se dão conta), estão cozidos, estão mortos.


O que quero dizer com isso? Não, isso não é uma analogia ao aquecimento global. Quero dizer que o homem vem enganando a si mesmo, dando desculpas, buscando evasivas, escapatórias, fugindo à sua responsabilidade quanto à vida do planeta. Parece que era isso que todos estavam esperando, o "climategate", uma fraude ainda não comprovada em relação ao aquecimento global, para que todos pudessem "respirar aliviado" e se sentir livres para poluir, explorar e aniquilar o planeta como sempre vêm fazendo, afinal, "a ciência mentiu".


Agora, porque um cientista mentiu, tudo o mais é mentira. Não confiam nos olhos de vocês? Eu confio nos meus. Não preciso que um cientista venha me dizer "verdades" que eu mesmo estou constatando. Não percebem alguns seres humanos o que salta aos olhos: o desequilíbrio do clima planetário, cada vez mais retumbante.


Eu aprendi, por exemplo, quando estudante do então 1º grau, que o clima do RS era um dos mais constantes do Brasil, com raros períodos de grandes cheias ou grandes secas, que havia aqui uma das melhores distribuição de chuvas do país. Eu aprendi isso. E meus pais e meus avós confirmam que as secas e as enchentes extremas aconteciam, mas era de vez em quando. Pois agora, não tem um ano que nós não tenhamos ou uma seca ou uma enchente de proporções catastróficas. Isso é mentira? Eu aprendi que na Amazônia nunca havia seca. Pois em 2005 houve a maior seca da história da Amazônia, que chegou a matar uma pequena parcela da floresta. E agora, em 2009, outra seca assolou a região. Isso é mentira? É mentira que as tempestades, tornados, ciclones no RS estão cada vez mais intensos? É mentira que nossos rios estão morrendo? Havia, por exemplo, sangas em que meu avô tomava banho quando criança e agora não existem mais. É mentira do meu avô? É mentira o registro do primeiro furacão da história do Brasil, que devastou RS e SC? É mentira a desertificação no interior gaúcho, onde o pampa está virando dunas? É mentira que tivemos a maior epidemia de febre amarela no interior gaúcho da história, que exterminou com os nossos pobres bugios? É mentira que o mosquito transmissor da doença se reproduz com o aumento do calor? É mentira que o RS passou de área livre para área sujeita a epidemias de dengue? E é mentira que o mosquito da dengue não se prolifera com o calor?


Eu nem vou falar no resto do mundo, vou só ficar no RS, porque o que divulgam as revistas e os jornais mundo afora deve ser tudo mentira. Deve ser mentira que os desertos avançam implacáveis na África e na Ásia. Deve ser mentira os pinguins que são encontrados em locais cada vez mais distantes para fugir do aquecimento na Antártida . Deve ser mentira a redução drástica da população de ursos polares pelo derretimento progressivo do polo norte. Quem sabe alguém vá até lá e grite nos ouvidos do urso da foto: "para com isso, não fica fazendo poses dramáticas, que eu sei que tu estás te fazendo para aparecer na foto!" Deve ser mentira a extinção maciça de sapos e rãs em vários países devido ao buraco na camada de ozônio. Deve ser mentira a redução em quase 1 terço de toda a vida nos mares. Deve ser mentira a proliferação de algas tóxicas devido ao calor excessivo nos oceanos. Deve ser mentira que cientistas russos vão evacuar um centro de pesquisas que explorava um campo de gelo que vai derreter e andar à deriva no oceano ártico ocidental.


Sim, tudo isso, e mais um pouco, deve ser mentira. O clima do planeta está perfeito. Ontem tivemos seca, hoje, enchente, e assim as coisas se equilibram. Não vai acontecer nada. "Homem!" grito do alto da minha tolice, "pode continuar a explorar, a devastar, a destruir, enfim, acabem logo com o planeta, é isso que todos vocês querem, a humanidade precisa do desenvolvimento, vamos lá, acabem logo com tudo". Apenas recordem que a morte é lenta e dolorosa. Vem aos pouquinhos, bem "devagarzinho..." E lembrem-se que o doente, logo antes de morrer, geralmente dá sinais de recuperação, falsos sinais. Parece que está bem, que vai se curar, e então morre. Lembrem-se que há 50 anos, falar em mudanças climáticas era um absurdo. Hoje é um absurdo NÃO se falar em mudanças climáticas. Mas hoje é um absurdo dizer que elas já estão ocorrendo e vieram para ficar. Mas daqui a 50 anos, será um absurdo dizer que o planeta NÃO está sendo destruído pelas mudanças climáticas.


07 dezembro 2009

Se a Alma Foi?

há quatro porquês
que faço-te a mim
e faço-me a Ti
de quatro porquês sem princípio nem fim
porque silenciar não posso
porque te gritar não devo
além de tudo que pergunto ao mundo
além do todo que responde e afundo
neste meu poço onde tudo posso
neste meu posso com um porquê no fundo
por que a vida se viver não há?
por que esta alma se a alma foi?
por que a arte se minha arte só?
por que meu sonho se teu beijo não?

só um olho em verbo
que nada ganha e tudo vê:
uma verdade em dúvida...
por quê?

05 dezembro 2009

Crueldade Contra Animais na UFSM - Parte II

O jornal Diário de Santa Maria publica neste fim de semana a notícia sobre a morte de um gato nas dependências da UFSM com procedimentos no mínimo cruéis por dois estudantes de Zootecnia, um da graduação e outro do mestrado. Segundo o jornal, o mestrando admite que matou o gato. Abaixo, confira a versão do próprio estudante sobre o caso, conforme foi publicada pelo jornal Diário de Santa Maria em seu site:

"Ele caminhava meio desengonçado, mal mesmo fisicamente. Aí, peguei-o para ver o que tinha. Peguei uma faca e fiz a sangria, para evitar que ele ficasse sofrendo. E quando fiz isso, não fiz questão de mostrar."
Esta é a versão de um dos estudantes. O leitor acredita nela? Bem, isso a justiça vai decidir. Mas vamos admitir que ela seja verdadeira. Se for, significa que um MESTRANDO em ZOOTECNIA (percebam amigos, mestrando em Zootecnia) vê um gato, segundo ele, mal fisicamente e decide ver o que ele tem, e vendo o que ele tem (afinal, o que é que o gato tinha? era doença ou era fome?) decide que o melhor para o gato é morrer, e morrer com uma sangria, e faz a sangria com uma faca!!! Meu Deus! Ele sangra o animal para morrer! Até eu, que sou um leigo em fisiologia animal, sei que não se mata um animal dessa forma quando ele está doente, um MESTRANDO EM ZOOTECNIA faz isso? Mas o que é que ele aprendeu em todo o curso? E no mestrado? Será que na UFSM não ensinaram a ele que existem métodos menos dolorosos e menos cruéis para se tirar a vida de um animal quando necessário?. O leitor acredita que ele não tenha aprendido isso? Eu não acredito. Ou então ele teve preguiça de ir buscar uma injeção letal que mata sem dor?
Percebam, amigos leitores, que mesmo sendo verdadeira a história contada pelo estudante, ela é um completo absurdo. Um zootecnista sangra um animal para ele morrer... E sem o sedar, ao menos. Ele não sabia que isso causaria uma dor e um desespero horríveis no animal? Vamos ver o que dizem os procedimentos e técnicas de eutanásia em animais, em seu artigo 14:


Art. 14. São considerados métodos inaceitáveis:

I - Embolia Gasosa;

II - Traumatismo Craniano;

III - Incineração in vivo;

IV - Hidrato de Cloral (para pequenos animais);

V - Clorofórmio;

VI - Gás Cianídrico e Cianuretos;

VII - Descompressão;

VIII - Afogamento;

IX - EXSANGUINAÇÃO (SEM SEDAÇÃO PRÉVIA)

X - Imersão em Formol;

XI - Bloqueadores Neuromusculares (uso isolado de nicotina, sulfato de magnésio, cloreto de potássio e todos os curarizantes);

XII - Estricnina.

Atentem, leitores, para o inciso IX: é um método INACEITÁVEL de eutanásia a exsanguinação sem sedação prévia. O mestrando sedou o animal antes de o sangrar com uma faca? Parece claro que não. Ele não sabia que deveria sedar? O MESTRANDO não sabia? Se não sabia, como chegou ao mestrado? Ou sabia e teve preguiça? Se teve preguiça, foi vergonhosamente negligente. Que profissional teremos no futuro? Ou sabia, mas quis ser propositalmente cruel? Queria se divertir com o sofrimento do gato? São perguntas que faço.

Então, amigos leitores, mesmo sendo verdadeira a história desse estudante, ela ainda é absurda, ainda é desumana, ainda é cruel. Sangrar um gato sem sedar, vendo o sangue escorrer, esguichar, espalhando o sangue por todo o local, seja ele qual for, estando o animal CONSCIENTE de tudo, sofrendo em desespero, sem nem ao menos ter certeza do que tinha o pobre gato, sem nem levá-lo para fazer um exame, sem nem tentar tratá-lo, sem nem tentar alimentá-lo, e ainda dizer que o matou por PIEDADE!!! Francamente...

04 dezembro 2009

Ainda sobre o Equívoco no Método Científico

O leitor Pablo fez um comentário bastante pertinente e oportuno sobre o texto abaixo, que merece uma nova postagem. Lembrou-me ele que devo reconhecer que graças ao método científico hoje podemos esperar uma vida de quase 80 anos, sendo que antigamente essa mesma vida não passava dos 30. Reconheço. Porém, com algumas ressalvas. Primeiramente, a média de vida era tão baixa em séculos anteriores porque havia alto índice de mortalidade infantil, o que trazia para baixo a média. Aqueles que sobreviviam aos primeiros anos de vida tinham uma expectativa maior, em torno de 50 a 60. Mas não há dúvida que a diminuição drástica no índice de mortalidade infantil é uma grande conquista da ciência.

Outra ressalva que faço é que mesmo nos dias de hoje há vários países da África e da Ásia em que a expectativa de vida não passa dos 30 anos. Até mesmo na América.
Não nos esqueçamos do 1 bilhão de miseráveis... Será que eles vivem 80 anos?

E uma última ressalva. Na Idade Média, por exemplo, um homem que vivesse 30 anos não teria vivido uma vida mais autêntica que um homem que hoje vive 80? Hoje vivemos sempre cheios de compromissos, sem tempo para nada, numa vida mecânica, robótica, sempre reclamando que a vida “voa”, que é como se um ano passasse como um mês e que 10 anos atrás “é como se fosse hoje”? Esses 80 anos não passaram como se fossem apenas 30? São questionamentos que deixo...

Mas tudo bem, reconheço sim, o aumento na expectativa de vida é uma conquista do atual método científico, negá-lo seria um absurdo. Mas percebam que no texto abaixo não neguei os avanços materiais e físicos da ciência com seu método. O que questiono é no que tais avanços tornaram o homem realmente melhor? Ou a ciência não é para tornar o homem melhor? Por que não, pergunto eu? Por que ela não pode modificar sua visão puramente racionalista e mecanicista para outra mais holística, que englobe outras capacidades e necessidades humanas.

Como afirmei abaixo, Einstein também questionava sobre isso, e não só ele, mas também outros grandes cientistas, como Carl Jung. Este afirmou que a ciência ocidental obscurece a visão quando apregoa que a única forma de conhecimento é o conhecimento racional. Por que a ciência insiste em sua visão mecânica das coisas? É isso que questiono. Creio que a ciência poderia ser mais e melhor se não se mantivesse arrogantemente nessa visão retrógrada. O pensamento medieval, ainda que com vários pontos em atraso, possuía um bem mais avançado que o atual: o de que o homem devia ver a si mesmo como uma parte integrada da natureza e não como seu dominador e explorador.

Que fique bem claro que não sou contra a ciência, somente um idiota é contra o conhecimento. Sou contra a maneira como a ciência é vista pelos cientistas e intelectuais em geral, questiono seu método, que para mim é realmente atrasado. Ninguém é obrigado a concordar comigo, obviamente. E o blog está aberto a outras visões.

Mas o que não se pode negar é a responsabilidade que recai sobre o corrente método científico na destruição do planeta, pelos motivos que mencionei abaixo. Claro que a responsabilidade não é só dele, mas sua parcela de culpa é imensa. A natureza sempre foi vista pela ciência como algo a ser explorado, algo a ser torturado até que nos contasse seus mais íntimos segredos. Tanta exploração levou-nos a que caminho? De nada adianta vivermos 80, 100, 200 anos se não houver um planeta para vivermos...

03 dezembro 2009

O Método Científico é Responsável Pela Destruição do Planeta?


Qual a relação entre o método científico em vigor e a destruição ambiental? Haveria alguma? Para mim está claro que sim. Antes de qualquer coisa, o que é método científico? Ou o que é ciência? Para que serve a ciência? Qual é ou deveria ser o seu maior objetivo?

A meu ver, a ciência deve buscar a verdade, o conhecimento sobre as coisas, sejam elas materiais ou não. E utilizar tal conhecimento para melhorar a humanidade. Mas o que vemos hoje? Vemos uma ciência cujo objetivo maior tornou-se apenas desenvolver técnicas ou fazer descobertas para tornar nossa vida mais cômoda ou mais “saudável”, ainda que esse “saudável” seja um tanto discutível. E ainda que essas “conquistas científicas” somente sejam acessíveis aos que têm condições financeiras de bancá-las. E o mais de 1 bilhão de miseráveis do mundo? O que a ciência faz por eles? No que a ciência contribuiu para tornar o homem melhor? O mundo melhor? A ciência não serve para isso?

Então, para a ciência, somente o que é mensurável, material, e adquirível materialmente é que pode e deve ser científico? É o que diz o método científico? Então, ao meu entender, o método científico está equivocado. Quem disse que ele deve estar necessariamente correto? Pois eu estou o contestando. O método científico é como a ciência atua, e para mim a ciência está atuando de forma equivocada.

O próprio Einstein condenava essa visão materialista e racionalista da ciência, inclusive não foi com esse método, ou unicamente com ele, que Einstein chegou à Teoria da Relatividade. Einstein, segundo suas próprias declarações, chegou a essa genial teoria inicialmente através da imaginação, através de uma sensibilidade artística que trouxe geniais insights ao cientista, os quais mais tarde se transformaram em uma teoria revolucionária. Einstein foi antes de tudo humano, sensível, não somente frio e racionalista. Não é à toa que uma das frases mais célebres de Einstein é esta: “A imaginação é mais importante que o conhecimento.”

Este método científico em vigor é absolutamente mecânico. Assim construiu uma ciência mecânica, que não está preocupada, comprometida com o verdadeiro desenvolvimento humano. De onde provém o atual método científico? Em grande parte, ele é oriundo da filosofia de Descartes. Descartes pensava que tudo era material ou explicável pela matéria, que tudo era mecânico, mensurável, que o universo inteiro poderia ser reduzido às leis físicas já conhecidas, e que o homem poderia fazer o que quisesse com o planeta e com os seres nele existentes, inclusive torturá-los em prol da ciência, pois não haveria alma nenhuma neles. Descartes afirmou: “o grito dos animais sendo torturados em prol da ciência é como o som do funcionamento de uma fábrica”.

Um absurdo? Um método um tanto atrasado? Pois é o método que ainda está em vigor na ciência. E o seu resultado está diante de nossos olhos. Uma civilização que destrói seu planeta a passos largos, afinal foi ensinada pela ciência com seu método que a natureza deve ser explorada ao máximo, pois ela não teria alma e nós, os homens, seríamos seus donos. Esse é o resultado mais elevado deste método científico.

02 dezembro 2009

dos Fins

dos Fins descendo
desci descendente e desço
em queda
livre a serviço

mal sei o que soube em fim
mal vim de saber não sendo
mal sendo me vou e toco...
de sina em sinos
ao som me ensino
silencio
e sinto...

vela em crepúsculo
de chama à morte
aos Fins a(s)cendo...

01 dezembro 2009

Crueldade Contra Animais na UFSM

Um ato de barbárie foi cometido dentro dos limites da UFSM, no departamento de Zootecnia. Trata-se da morte com requintes de crueldade de um gato indefeso por indivíduos que ainda não foram identificados com provas claras, embora existam suspeitos...
O animal, que vivia na dependências da UFSM, foi covardemente capturado e teve sua garganta cortada. No entanto, não morreu. Lutando desesperado pela vida, conseguiu escapar. O gato saiu caminhando e esguichando sangue para todos os lados, tudo sob os risos de alguns indivíduos, que se divertiam com o impiedoso espetáculo. Até que foi recapturado e teve sua cabeça decepada enquanto ele AINDA VIVIA.


O que devo comentar sobre isso? Apenas digo que a UFSM é uma universidade séria e respeitada, e estou certo de que dará uma punição exemplar a esses indivíduos, para que episódios vergonhosos como esse jamais se repitam. Quem foram eles? Quem foi envolvido no crime? Por que motivo o gato foi morto? É claro que a culpa não é do curso de Zootecnia, mas dos indivíduos que cometeram a atrocidade ou foram cúmplices dela. E o curso e a universidade devem tomar alguma providência. É seu dever. Caso contrário, se não houver a identificação e punição dos culpados, quantos atos desse tipo poderão vir a ser perpetrados? Atos como esse não podem ser abafados. Maus tratos a animais é crime previsto em lei, com pena de 3 meses a 1 ano de detenção. Que a lei seja cumprida. E ponto final.


Sugiro que escrevam a este e-mail, para a obtenção de informações: lovatto@smail.ufsm.br

Bateram em Tua Porta...

bateram em tua porta
e tu não atendeste
foi alguém ou foi algo
e tu nunca soubeste
e tu nunca tentaste
e tu sempre temeste
o que foi que perdeste?
pela noite descendo
bateram em tua porta
mas não foi duas vezes
e teus olhos fechaste
e de novo dormiste
é tão cômodo o sono
do qual nunca acordaste
é tão cômoda a vida
como não se findasse
mas a noite caía
e tão alta era a treva
e tão firme a batida
sinfonia em Beethoven
e tu nunca a ouviste
nem pensaste na morte
mas bateram na porta
e saber não quiseste
te viraste de lado
e o olhar não provaste
que o temor era forte
e o final te falava...

mas tu não atendeste

29 novembro 2009

Schubert - Um Gênio Não Reconhecido


Alguns leitores, após lerem a postagem sobre a trágica canção "Der Atlas" de Schubert, pediram-me para que escrevesse algo mais sobre o compositor. Prometi que o faria. Cumpro agora o prometido.

Franz Peter Schubert nasceu em 1797, em Viena, na Áustria. Foi um dos pioneiros do Romantismo na música, porém, quase que no anonimato, nunca tendo sua genialidade reconhecida em vida. Vida que foi curta, pois Schubert morreu em 1828 , com apenas 31 anos de idade, demonstrando uma precocidade raras vezes conhecida no mundo musical, comparável à de Mozart.

Com apenas 17 anos de idade, Schubert, que é considerado o maior compositor de lieder (a canção clássica) da história, compôs o famoso lied "Gretchen am Spinnrade", um dos maiores lieder de todos os tempos. Já na adolescência, Schubert prova toda a sua assombrosa facilidade para a criação de melodias e dá mostras da veia trágica que lhe possibilitaria a criação de sublimes obras-primas no final de sua existência.

A sua capacidade criativa era infinita, espontânea, poética, lírica, viva de inspiração. Pode-se dividir sua obra em duas grandes fases: a 1ª, ainda classicista e fortemente influenciada por Mozart, e a romântica, onde a influência de Beethoven se torna preponderante. Assim, Schubert é um dos compositores responsáveis pela transição do Classicismo para o Romantismo, dando continuidade à revolução beethoveniana. É na fase romântica que se encontra a grande maioria de suas obras-primas.

Porém, a imensa criação de Schubert foi silenciosa, sem a grandiloquência de Beethoven. Nunca atingiu reconhecimento em vida, ninguém o considerava um gênio, a não ser seus amigos mais próximos, e o próprio Beethoven, que antes de falecer reconheceu todo o raro talento de Schubert. Grande parte das obras máximas de Schubert nunca foram executadas durante a vida do compositor. Seu imenso sucesso em todo o mundo artístico só veio décadas depois. Suas músicas não lhe traziam uma renda suficiente para a sobrevivência, tendo que ser por várias vezes sustentado por amigos e familiares, morrendo na pobreza. No entanto, possuía um círculo de fiéis admiradores em Viena. Bem mais tarde, graças a esses amigos e a alguns músicos e musicólogos, sua obra foi resgatada, e Schubert tornou-se um dos maiores gênios do Romantismo.

Em 1822, com 25 anos, Schubert descobriu que estava com sífilis. A partir de então, como se a sombra da doença lhe intensificasse ainda mais a inspiração, Schubert passou a compor num ritmo febril. Ao mesmo tempo, aprofunda-se no Romantismo, iniciando sua última fase de criação, marcada pela produção de uma obra-prima atrás da outra, como se pretendesse deixar ao mundo o maior número possível de obras, pressentindo a aproximação da morte. As composições desse período caracterizam-se pela grande originalidade, pelo caráter trágico, melancólico e sentencioso, embriagado de um clima de fim, sem perder, no entanto, a espontaneidade e a beleza melódicas, que sempre caracterizaram as músicas de Schubert.

São dessa época a enigmática Sinfonia Inacabada, os terríveis últimos quartetos para cordas, as sublimes últimas sonatas para piano, de uma misteriosa originalidade, uma infinidade de lieder de absoluta maestria, além de uma série impressionante de outras obras-primas, como óperas, composições de câmara, composições sacras (entre elas a comovente Ave-Maria, capaz de enternecer o mais empedernido coração), as quais mais tarde serviriam de inspiração para inúmeros compositores, românticos ou não.

Em 19 de novembro de 1828, vítima provavelmente de febre tifóide, Schubert faleceu, deixando para um mundo um dos mais ricos legados da música clássica, sem nunca, no entanto, poder ouvir grande parte desse legado. Não por ter perdido a audição, como Beethoven, mas porque as obras nunca foram executadas.

28 novembro 2009

Não Gosto de Praia*

não gosto de praia
da praia infestada
de vazio humano
tal praia
é a profanação do mar

o que busco
é o oculto da sanga
entre o escuro do mato
como é escuro e oculto
o destino do meu olhar

com o que restou
do sopro livre de minha alma
quero o que restou
do vento livre destes campos:
o meu peito que nada espera
busca os capões brabos
peraus de cobras
onde há mosquitos
da febre amarela
há muito as febres me consomem
que eu só sou vacinado
contra o homem
e meu coração é uma tapera
quero me sumir pelos banhados
com os mistérios
que em mim somem
liberto de tudo que vi
quero me perder
por entre sapos
louco e bem longe de ti

até que se forme
a ventania em mim...
cumprir-se-á então
o que já está cumprido
do começo ao fim

*poema republicado com 2 versos a mais

27 novembro 2009

Campanha Publicitária - Casa dos Poetas

Hoje, dia 27/11, às 20h, na Câmara de Vereadores de Santiago, ocorre o lançamento da campanha de marketing do I Fórum Latino-americano de Literatura e II Encontro de Escritores do Mercosul, promovido pela Casa dos Poetas de Santiago. Infelizmente, não poderei estar presente, pois me encontro, desde ontem, em Santa Cruz do Sul. No entanto, desejo os votos de total sucesso ao evento, e que todo o pessoal constantemente presente em nossos "cafezinhos poéticos" também esteja lá apoiando essa importante realização.

26 novembro 2009

Esta é a Tua História (ou O Pesadelo) - Parte Final

Finalmente, o momento de deixar o escritório. Alívio. Poder pensar em outras questões... Talvez mais profundas... Talvez mais sublimes... Mas o que há de mais profundo e sublime que o trabalho? E aquele relatório, que não há maneira de concluir, não te abandona a racionalidade. E jamais se finda aquela angústia de ter que fazer o que tens que fazer pelo simples fato de que tens que fazer.

Eras o que pensavas enquanto conduzias dormindo o veículo pelas ruas povoadas. Dormindo não de dormir, embora com os sonhos já sonhasses. Com os sonhos não da vida, mas do sono. Pouco sono, aliás. Que o teu pesadelo voltará... Tu sabes. Mas os sonhos da vida... Estes não germinam na alma empedrada de compromissos.

Na avenida de intenso movimento, um acidente. O motorista da moto morreu. Contemplaste como se nunca morrerás. Com piedade do morto. E refletiste sobre o que iria acontecer com o motorista. Talvez nada. Talvez tudo. O homem pensa em tudo para ter uma vida cada vez mais cômoda. Mais tecnológica. Tecno lógica. Tudo deve ser lógico e confortável... Para isso o dinheiro. Para explicar tudo. Aliás, amanhã deves comprar um sofá novo. Dás duro. Mereces. Mas o motoqueiro morreu. O vermelho do sangue congestionando teus olhos. Para onde ele haverá de ir? Foi no que pensaste. Sabes? Não queres nem saber. Não sabes o porquê de saber? Rapidamente substituído pelos olhos da moça do escritório. Rapidamente substituídos pelo relatório de amanhã.

Chegaste. Belíssimo jardim ostenta tua casa. Mal pisaste nele desde que foi construído. Para não matar as gramas, argumentas para ti mesmo. Sabes que mente. Para não matar teu tempo. Tempo é trabalho. Exausto, a cerveja desceu aliviando teus músculos e nervos. Isso é reconfortante Principalmente antes da academia, para revigorar.

Tua esposa também chegou. Os olhos da moça do escritório são mais doces que o da tua esposa. Aliás, ela também está muito cansada. Até porque recém chegara da academia. Agora é a tua vez de ir. Beijo no rosto. Tchau. De carro para a academia. Por que não a pé? Ah, a violência. Estás certo. A violência das grandes cidades não combina com a preservação ambiental. Nada combina com a preservação ambiental. Principalmente o homem. Principalmente o mundo de que o homem necessita. Mas não é coisa para se pensar agora. É coisa para se pensar no nunca. Agora pensarás na academia, pois já estás nela. Não, pensas no relatório de amanhã, no sofá que irás comprar, no dinheiro que estão te devendo, no crescente da tua empresa. Estás conseguindo. Mesmo. Só não consegues o que não sabes que queres.

Academia é um saco, pensaste. Já não aguentas mais. Mas é necessário. Assim como trabalhar. Não fosse a academia, talvez a moça do escritório não teria te olhado. Ainda assim, terias bolso.

Em casa, outra vez, que alívio. Nas impossibilidades da vida, os rios límpidos e serenos emitem as vozes aéreas dançantes de tudo que não podes. E elas queimam rápido no teu sentir. Mas é noite, e a noite nunca tarda, e a noite é um réquiem. Descanso. Delicioso jantar escorreu mecânico pelo teu esôfago. Até te sentiste um pouco mal. O jeito foi deitares mais cedo na noite, mesmo com o medo do pesadelo... Na noite que convidava ao amor... Que espécie de amor? O que sentes pela tua esposa? Sentes? Ou o desejo que se intensifica pelo olhar da moça do escritório? Não sabes. Mas certamente era esse tipo de amor que a cumplicidade da lua, que a violência emocional em silêncio da noite te convida. O sonho...

Dormiste pensando em coisas importantes... No relatório de amanhã, por exemplo. No sucesso da tua vida, sem dúvida, plena de sucesso. Mas o pesadelo te despertou. Pesadelos têm por princípio despertar os homens que dormem. Agora, o silêncio da noite era fúnebre como a morte. Havia algo de estranho pairando no ar. Pensaste lento em coisas distantes. O pesadelo foi absolutamente misterioso. Mistério era tudo o que respiravas agora... Estavas certo que nele, alguém ou algo chamou teu nome. No pesadelo, tu não eras tu. Tu fingias que era feliz, mas sabias que não eras. Tentavas enganar a ti mesmo. Em outro momento de teu pesadelo, enlouquecias, eras o mais insensato dos homens, e então te sentias bem.

Acordava sempre imerso na dúvida. Alguma coisa esquisita vibrava em tua alma. Lembravas da música do pesadelo. Estavas certo que era Bach. Talvez não fosse pesadelo, talvez fosse um sonho mirífico. Alguém batia na porta, pesadas batidas. Não tinhas coragem de atender. Sinuoso e enigmático. Densificou-se o alimento de tua respiração. Algo de impalpável te alarmava.

O sopro das narinas em sono de tua mulher intensificava a tensão. Algum oculto flutuava no desconhecido da noite. O Desconhecido... Um sino soava como uma voz de fêmea. O mistério que te falava e que eternamente sustinha suas asas negras sobre tua alma. Que crescia e fitava-te nos olhos, em paroxismos e apoteoses, dizendo-te de tudo que nunca fizeste, que nunca tentaste, que nunca viveste, que nunca beijaste...

Mas amanhã é dia de trabalho. Deves dormir. Tentando esquecer o pesadelo, conseguiste. E horas depois, acordaste para o teu novo dia. Novo... Como seria o teu novo dia? Basta que releias esta história, que é a tua história...
(Na imagem, o quadro "Homem e Mulher Contemplando a Lua" de Caspar David Friedrich)