17 novembro 2018

Soneto no Modo Ultrarromântico

ela que sempre esteve do meu lado
e na paz me passava a mão no rosto
ela sabia do meu sol já posto
e que de vinho eu era consolado

só ela aceitou sangue no meu fado
e sempre amou o meu olhar de corvo
e agora que só o não eu absorvo
me declarei por ela apaixonado

ouço Brahms e Schubert demais
doença que sempre me tornou mais forte
me encheu a vida de fins e finais

só ela lambe o fundo deste corte
e me chora amor entre coisa e tais...
me emociono ao ouvir seu nome: Morte.


15 novembro 2018

A Esperança Existe

a Esperança existe.
veio me visitar ontem
e disse que ficaria para o jantar
não trouxe um gole de bebida
e não ajudou com a pizza
não parava um segundo de falar
entre assuntos sérios
coisas lindas
absurdos merdas e bobagens

seja como for
a conversa até que era envolvente
mas a Esperança ficou bêbada muito rápido
e logo passou mal
vomitou por todo o banheiro
desmaiou por alguns minutos
e quando voltou a si
disse que tinha que ir
mas que voltaria amanhã

amanhã é hoje
e agora a Esperança está ali
num canto da parede
na forma de um gafanhoto verde

13 novembro 2018

de Governos e de Leis

I - governo
(quando ditadura)
é alguém dos alguns
metido a força
que pensa poder mandar em todos
para benefício desses alguns
que inclui a si e aos seus

governo
(quando má-democracia)
é o empregado
autorizado e pago
pelo povo
para mandar em todos
em benefício dos mesmos alguns
que querem fazer do povo
um bando de nadas
e de nenhuns

II - lei
é estabelecer
que todos são iguais
desde que não
sejam os alguns
para que o povo
se iguale sempre ao povo
e jamais
se desiguale do seu nada
a lei é a ordem dos alguns
e para estes
lei é sempre se manter
dentro dos limitados
limites da estrada

11 novembro 2018

Maldição vem de berço

Maldição vem de berço.
não é pra qualquer um.
quem é maldito nunca perde a maldição:
ser maldito é um estado de espírito
um existir de alma
uma forma de vida
não há filosofia que seja melhor

poeta não é quem tem inspiração
até um político pode se inspirar às vezes
poeta é quem tem maldição

nem a luz nem a escuridão
estão sempre presentes
mas a maldição está:
tu olhas e lá está ela
sempre ali a te olhar de volta

tem que ser muito maldito
pra aguentar ter alma
há que se viver muito horror
pra se tocar no coração
tem que se conhecer muito bem o mal
para se saber o que é amor

maldição não é para melhorar ninguém:
maldição é para se criar Arte.
arte de verdade e ausência de maldição
são termos irreconciliáveis

Maldição vem de berço
ou antes.

09 novembro 2018

Dois Noturnos

I - é a lua que nasce para todos
bem mais que o sol: 
não é para todos que o sol brilha 
mas não há quem não tenha noite 
e não há quem não sinta sono 

II - o teu canto 
coruja hermética 
de olhos autônomos 
equivale a um tratado de filósofos 

e há mais sabedoria no teu pio 
do que em todo os autômatos 
do povo do Brasil

07 novembro 2018

Rastro de Ser Humano

por onde quer que o ser humano passe
deixa um rastro de destruição e morte
tudo para poder manter sua bunda rica
sobre o banco de couro do seu carrão do ano
matas devastadas campos miseráveis
paisagens desoladas rios apodrecidos
tudo em nome da ostentação do sucesso
por onde quer que o ser humano cruze
deixa um banho de horror e sangue
animais caçados torturados massacrados
atropelados queimados extintos
tribos perdidas escravizadas dizimadas 
tudo em nome da enganação do progresso
o rastro do ser humano
é um rastro de fedor e doença
o homem cospe em tudo mija em tudo caga em tudo
a tudo estraga a tudo acaba
desconstrói sonhos afunda paraísos
enegrece as águas enfumaça os céus
o rastro do ser humano é de óleo e de injustiça
de agrotóxicos e de lágrimas
de horrores e de aço
tudo para que uns se afoguem em moedas
e outros mergulhem em restos
e o que me resta de mim ser humano
é um rastro de cansaço

05 novembro 2018

Há Mordaças no Canto dos Pássaros

olho para o azul do céu azul
mas não há nenhum azul a ser olhado
o sol que brilha queima sem brilhar
quilômetros e quilômetros de matas amarelas como ouro
há mordaças no canto dos pássaros
o som das águas que correm
paira em névoas de barulhos negros
e eu afundo meus pés
em cadáveres de felinos

levo minhas mãos ao rosto
e elas estão sujas de barro e veneno
mas eu ainda acredito
acredito no Horror
em tudo que rasteja e afunda

um bando de porcos berra com gosto de gordura e sangue
ao longe eu vejo um prédio de 16 andares
e do seu alto pessoas se atiram
e caem com o pescoço quebrado
sobre um verde lago de merdas
como se não houvesse esperança
mas há esperança por entre os vermes

eu acredito no Fim
em tudo que agoniza e morre
e a minha crença se derrama
como sangue quente
de golfinhos mortos pelas praias
357 cavalos brancos se atiram em poços
quebram as patas e caem de ponta cabeça
quando de repente vejo um espelho
e ali estou eu:
zumbi acreditando no futuro


04 novembro 2018

De uma Influência de Edgar Allan Poe

quem garante
que o real não é sonho
e que o sonho é o que é?
há lagos em que o fundo
nunca alcança a existência de nosso pé

o que existe existe
ou existe
porque eu penso que existe?
dependendo de como
e quando
se vê
a mesma flor
pode ser alegre
ou pode ser triste

só se sente
que o sonho é sonho
quando o sonho chega ao fim
e mesmo quando sinto
não domino o que vem-me aos sentidos
e até mesmo o vinho tinto
só é tinto
porque meus olhos humanos
o percebem assim

e mesmo quando penso 
quantos pensam ao mesmo tempo
dentro de mim?
e mesmo quando escrevo
um verso que diz não 
quem garante
que ele dizendo não
não disse sim?

01 novembro 2018

Desaforadas (Ou Após ouvir Shostakovich)

porque há risos gargalhadas
em cascatas cataratas
sanguinadas pelas pragas

são cantatas de gargalhas
das risadas alastradas
zombarias pelas águas

são compassos de risadas
entre asas garras brasas
pelas rubras russas geadas

o deboche dos abutres
o gaguejo de macacos
gorgolejo de galinhas

graves línguas de lagartos
entre o sarcástico dos asnos
pelas gárgulas e cabras

ironias desbocadas
em metralhas e sarcasmos
em grotescos e catarras

há danças valsas facas
essa desgraça de engraçada
a lembrar que a humanidade

é só uma piada

31 outubro 2018

Governo Bolsonárico

piadas
cagadas
desgraças
desertos
caçadas

riquinhos
tirinhos
milicos
patentes
pinicos

usura
censura
tortura
tragédia
amargura

acéfalos
hipócritas
suásticas
patéticas
dos trópicos

e os três Phoderes:

o Cômico
o Estúpido
e o Catastrófico


29 outubro 2018

A Era da Maldade

Trump e Bolsonaro venceram. Isso, para ficar nos casos mais representativos nas Américas. Bolsonaro é um Trump piorado. Ou uma caricatura tosca de Trump. Mas apesar das diferenças pró Trump (tem mais história, mais feitos, é mais culto e mais inteligente, traz uma base muito mais sólida que a de Bolsonaro), ambos têm algo em comum: a maldade.

Vivemos um outro momento na humanidade. Ou o retorno de um outro momento que se configurava há cerca de 100 anos atrás. Momento em que o egoísmo e o desumano prevalecem. O egoísmo fala em um pseudo-nacionalismo de ódio ao diferente, o qual é visto como ameaça, utilizando-se de falsos conceitos de família, pátria e Deus, que se tornam apenas eficientes instrumentos de controle.

O desumano nos fala de uma ordem, na realidade impossível e de fachada, mas que seria necessário  se implantar a todo custo através da opressão, da repressão, da redução dos direitos individuais, do controle da liberdade de muitos para o benefício de poucos. É ostensível que o discurso de fachada desses novos governantes é um, e seus atos, são outros. Falam através da liberdade e da democracia, mas tentam convencer que para se "manter a liberdade e a democracia", é necessário que se "reduza a liberdade e a democracia". Exatamente como fez Hitler nas primeiras décadas do século XX.

O egoísmo também  nos fala do lucro a qualquer custo. O custo é mais e mais destruição ambiental e exploração do trabalho humano. Vivemos uma nova era da impiedade e do medo, da ausência de compaixão e de solidariedade. Nosso coração morre a cada dia. Voltamos à era da redução das áreas de preservação ambiental, do massacre dos povos nativos, da liberação da caça e da aniquilação da vida selvagem, pois isso não tem valor para o neoliberalismo, a não ser o valor financeiro. A poluição desenfreada não terá limites, a vida será cada vez mais subjugada pelos meios de produção. Vivemos a era em que os recursos naturais, desde campos, florestas, até a água ficarão nas mãos de muito poucos, assustadoramente poucos. 

O capitalismo agonizante tenta sobreviver através da morte, sugando a última gota de sangue que restar em nosso planeta. Vivemos a era em que o trabalho humano voltará a perder valor. Direitos trabalhistas são e serão retirados ao limite máximo. Com a justificativa de que é para gerar empregos e pelo excesso de mão de obra. Mas é apenas para gerar mais lucros. E não se poderá se pronunciar contra essa "ordem" estabelecida. Como previram Aldous Huxley e George Orwell, uma falsa necessidade de ordem criada artificialmente trará o autoritarismo disfarçado de democracia. 

Vivemos a era da insensibilidade. A era em que a inteligência, a cultura e a arte serão vistas como um perigo por ameaçarem a farsa da necessidade da "ordem". Vivemos a era do ódio ao próximo, se o próximo não vive ou não pensa ou não concorda com o que é tido como "correto". Mas tudo encharcado da hipocrisia dos papinhos moles e dos melosos sorrisos de falsa amizade, nos discursos de fingimento religiosos, naquela velha coisa de "isso vai ser bom pra você". 

É a era das sentenças arbitrárias e dos julgamentos por interesse. Dos bodes expiatórios. A era em que o culpado de tudo é sempre o outro. Principalmente, se o outro for diferente. E, portanto, o outro deve ser eliminado ou excluído. Caminhamos para uma 3ª Guerra Mundial. Vivemos a Era da Pós-Humanidade. A Era do Fim.

24 outubro 2018

Sem Fundamento

as pessoas se habituaram
a viver a vida que vivem
como se a vida fosse isso que vivem

a vida?
por que assim?
quem levanta de sua cama
levanta para quê?
o trabalho
é um trabalho para qual objetivo?
e alcançado o objetivo
o que é que resta do que fica?

quem dorme
descansa de qual cansaço?
e para que se cansou?

saímos todos os dias
para viver a vida
dentro do mundo
e estamos convencidos
de que a vida é essa que se vive
e de que o mundo é esse que se tem
e de que o que fazemos
é o que deve ser feito

saímos todos os dias
para a morrer a vida
e ninguém se pergunta nada
e não se faz nenhum questionamento

mas errado sou eu
quando digo que tudo isso
não tem nenhum fundamento

23 outubro 2018

Da Mediocridade

I - a humanidade é a soma geométrica
de todas as merdas de cada um de nós:
progredimos pelo bueiro avante.
mas não é esse o problema
o problema é que os humanos
tomaram laxante

II - as pessoas dizem:
“a humanidade é medíocre”
mas a humanidade
é formada pelas pessoas
logo
as pessoas são medíocres.
mas alguém diz:
"eu sou uma pessoa
logo
eu sou medíocre..."
?
o medíocre começa
em não se perceber que o é.

20 outubro 2018

O Meu Lado

eu sempre estarei do lado dos que não têm lado
dos oprimidos dos esquecidos dos explorados
dos combalidos dos excluídos dos exilados
eu nunca serei pelos lucros das empresas
eu nunca serei pelas lavouras dos latifúndios
eu nunca serei pelos produtos das indústrias
eu nunca serei pelo ouro das mineradoras
eu nunca serei pelos tanques dos exércitos

eu estou do lado de quem paga a conta
e não de quem cobra o juro
eu estou do lado de quem cuida a planta pra crescer
e não de quem a enche de veneno
eu estou do lado do animal que é caçado
e não de quem dá o tiro
eu estou do lado dos que sofrem pela vida
e não dos que vivem para a morte

eu sempre estarei do lado 
dos que não têm vez:
é o único lado
que representa um poeta

17 outubro 2018

Tempos - Sombra

não há esperança pra vida ou pra massa
nosso Horror nos domina a fogo e a ferro
Shostakovich sangra ácido berro
e Beethoven se ergue além da fumaça

tempos-sombra assomam atrás das desgraças
homens tropeçam no seu desespero
tudo o que é luz desmorona no erro:
nos restam o vinho o whisky a cachaça

mundos de caos nos espreitam na lama
tudo o que somos não passa de falha
máquinas pisam por todas as gramas

resta-me a arte por som e navalha
resta-me um algo que é mais do que chama
que chama o que fúria: triunfo e mortalha

15 outubro 2018

Sangue de Porco

a humanidade
está acabada.
(é, eu sei, alguns  irão protestar,
o que não muda nada)

então que estas levas 
de palavras em lavas
larvas de palavras não-livres
livros não lavrados mal-lidos
me deixam mais leve

estas palavras
largarei letra a letra
pingos de vela
granos de areia
e uma cabeça de ovelha

a humanidade acabada:
aquele jorro
de sangue de porco
da garganta esfaqueada

que estas levas
de palavras em lama
me deixem mais breve:
que o diabo as carregue
e o sangue as te leve

12 outubro 2018

A Esperança Curvada ao Desumano

Poema escrito e publicado em novembro de 2015. Mas parece que escrevi hoje.

derradeira decadência das massas
pela invicta derrota do que humano
vontades que naufragam ano a ano
nos fundos tormentados das não-taças

o não-haver de tudo que se faça
o em-vão irrevogável de um Engano
a esperança curvada ao desumano
nas vastas pradarias da desgraça

passo a passo de um algo que maldito
sobre as patas-arcanjos de um cavalo
entre os olhos sedentos do inaudito...

a nulidade do ato de salvá-lo
dessangra entre vermelhos de infinito
e o Horror levanta a força do seu falo...

10 outubro 2018

Os Olhos Grelados da Morte

o rosto longo e fundo da morte
e aqueles olhos calmos e grandes e grelados
que há muito tempo nos observam
por trás da última árvore
que nos restou no quintal

quem olha da janela dos fundos da cozinha
vê a morte lá sentada
num pedaço escuro e descascado de muro
nos sinalizando com seu dedo indicador
se movendo pra cima e pra baixo
(como quem diz: "sim, é contigo mesmo...")

então fingimos que não é com a gente
jogamos os restos de comida pela janela
apagamos as luzes da cozinha
e vamos ver TV
e pensamos nos planos do dia seguinte
enquanto mexemos no celular
nos enchendo de certezas

e quando olhamos sem querer
para a janela da sala
lá está o rosto longo e fundo da morte
aqueles olhos grandes e grelados e calados
a nos olhar como se fôssemos
o futuro morto da nossa nação


08 outubro 2018

Bolsonaro: atestado de Óbito para o nosso Meio Ambiente

Quem ama a natureza não vota em Bolsonaro. Se vota, ou está pouco ligando para a vida em seu amplo sentido ou está mal informado. E muito mal informado. Pensem bem no que ele pretende fazer com nosso meio ambiente, caso ocorra a catástrofe da sua eleição:

- Bolsonaro quer acabar com o ministério do Meio Ambiente 

- Quer colocar o poder de decisão da questão ambiental nas mãos gananciosas e predatórias de ruralistas e mineradoras. 

- Declarou apoio irrestrito a caçadores. Lembre de sua declaração: "A caça é um esporte saudável". 

- Declarou que pretende tirar o poder do IBAMA de fiscalização e multa (Talvez, porque ele foi multado pelo IBAMA por pescar em área proibida).


- Pretende por fim às ONGs que defendem nossas florestas.

- Quer acabar com reservas indígenas e de preservação permanente . Há um vídeo, de uma entrevista rápida para a Globo, em que ele afirma claramente que pretende acabar com reservas naturais e indígenas.

- Quer tirar o poder do IBAMA para o licenciamento ambiental. Se com a existência do licenciamento, já existe tanta destruição, imagina sem.

- Quer ampliar sem limites a exploração da Amazônia, acabando com reservas, sem nenhum respeito à vida, à grandiosidade, à importância fundamental da maior floresta tropical do mundo. 

Bolsonaro não tem a mínima consciência ecológica, nenhum sentimento pela vida natural. Quem respeita nossa flora e nossa fauna, e compreende sua importância para nossas vidas, não pode votar em Bolsonaro em hipótese alguma. A não ser que esteja sob efeito de uma histeria, de uma hipnose coletiva, que é, sem dúvida o que está acontecendo com grande parte da população brasileira, sob efeito da histeria bolsonariana. Estes somente sairão dessa histeria após um grande choque, com a ocorrência de uma tragédia, de uma catástrofe. Não podemos esperar que isso aconteça. Mas aqueles que ainda não caíram nessa hipnose, não podem, nesse momento ameaçador para nossa nação, omitirem-se.

Entrem no Facebook e assistam ao vídeo:https://www.facebook.com/luiz.pires.39/posts/1836893913012535

03 outubro 2018

Jantar entre Amigos

o Horror veio  e jantou comigo
e com ele vinham todos os que já não
(apesar de antipático
era meu melhor amigo)
e falamos como se insanos
entre um trago de água quente
(daquela, água ardente)
e um prato de sangue com feijão

e alguma coisa não estava bem
(era como se um algo me olhasse além
ou de frente)
e gritei
- oh Ser do que me era
para onde foi o teu sempre?
e agora qual dos sete é que me é?

entre uma e outra ironia
naquele ambiente doentio e brutal
era vasto o cheiro de extinto e de ferro
quando uma voz
me sorriu estranha
(e o Caos me servia
outro gole negro de canha)

era o Horror que me perguntava
se (r)indo:
“mas por que mesmo
amar
não está mais na moda?”

- ah, sei lá, é que... (respondi)

é foda!