26 fevereiro 2010

Falso Amor pela Terra, Tradicionalismo Vão e Mônica leal


O gaúcho, o brasileiro em geral, ama sua terra. Mentira! Ama coisa nenhuma! O que é amar a terra? O que é a terra? Como sou gaúcho, para não me estender em demasia, não vou falar aqui das terras amazônicas, das terras do cerrado, das terras do sertão, enfim, lugares esses onde a morte e a destruição sopram implacáveis há muito tempo, como demonstração sublime de todo amor que o brasileiro sente por sua terra. Vou falar da terra onde vivo, do pampa. Onde está o amor que os gaúchos tanto apregoam possuir por sua tão querida terra? Onde?!

Esses dias fui ao show do músico tradicionalista Leonel Gomes em uma fazenda no interior de Santiago. O show foi à noite, e durante o dia havia rodeio. Não vi o rodeio, apenas o show. Mas o que vi também foi um campo imundo, coberto de latas de cerveja, de garrafas plásticas, de papéis de picolé, de plásticos de todos os tipos, enfim, os senhores da tradição que dizem tanto amar a terra gaúcha, cobriram essa mesma terra de lixo. De lixo!

Isso é amar a terra? É transformar o pampa numa lixeira? Amar a terra é cobrir o campo de eucaliptos? É encharcar as lavouras de agrotóxicos? Amar a terra é entupir os rios de venenos, de esgotos, de detergentes? É assoreá-los devastando todas as matas que os protegem? Claro, rio não é terra, é água. Amar a terra é transformar campo em deserto de tanto explorar sem a mínima piedade? Amar a terra é massacrar os animais que nela vivem? É atropelar graxains, e tatus, e capivaras, e gambás e deixá-los estrebuchando pelas estradas? Amar a terra é varrer dela toda a vida?

E depois vêm com esses vãos tradicionalismos alardear que amam a terra gaúcha, que amam o pampa? Com raras e louváveis exceções, isso é uma mentira deslavada. Adoram andar ostentando suas pilchas, suas botas, seus lenços, suas bandeiras sobre o lombo de um pobre cavalo, mas por exibicionismo, não por amor. Adoram tomar seus tragos, fumar seu palheiros, dar seus gritos pelos campos, no mesmo campo que no outro dia irão pisar em cima, irão esmagá-lo, aniquilá-lo com toda a vacuidade e vergonha da ganância, da indiferença e da inconsciência.

Agora esses vãos tradicionalistas mataram cavalos em uma cavalgada imbecil para exibir o seu amor pela terra. Tudo isso é uma palhaçada. Uma cruel palhaçada que custou a vida de animais inocentes e indefesos, animais esses que deveriam ser amados pelo gaúcho, em sinal da infinita gratidão que deveríamos ter por eles. Os cavalos, que ajudaram a construir nossa história. E o verdadeiro gaúcho tem essa gratidão, sem dúvida, ama sua terra e os animais que nela vivem. E quem ama, cuida do que ama. O verdadeiro gaúcho não precisa andar pilchado para sê-lo. O autêntico gaúcho demonstra o seu "gauchismo" pela alma e pela consciência, não com exibicionismo barato. Ou melhor, caro, porque além de custar a vida de animais, custa o dinheiro do nosso bolso, que, como sempre, pagamos pelas palhaçadas deste governo vergonhoso que aí está.

Palhaçada sob os aplausos da Secretária de Cultura Mônica Leal. Uma incompetente, que só entrou para a secretaria porque era amiga da governadora. No embate entre Juremir Machado da Silva e Mônica Leal, fico com o primeiro. Ele tem toda razão. O que a Mônica fez pela real cultura em nosso estado? Eu até agora não vi nada. Só o que vejo nos reais campos culturais e artísticos são pesadas críticas ao trabalho (ou seria destrabalho?) da secretária.

A seguir transcrevo o trecho de um texto publicado no blog de Milton Ribeiro http://miltonribeiro.opsblog.org/2008/09/19/monica-leal-a-amiga-de-yeda-crusius/ :

“Mônica Leal foi colocada como Secretária de Cultura do Rio Grande do Sul por ser amiga de Yeda Crusius. Yeda afirmou que Mônica era alguém de sua confiança, uma amiga com quem tomava chá e chimarrão, enquanto Mônica replicava que estava encantada com o convite, apesar de não saber nada sobre política cultural, cultura, artistas, leis de incentivo, etc., mas que aprenderia, pois tinha boa vontade. Antes deste convite, Mônica Leal dizia “carregar a bandeira da Segurança Pública e a herança política de seu pai”. Nada mais próximo à cultura.


Em suas primeiras entrevistas, notei que Mônica tinha problemas maiores. Como dizê-los? Bem, parecia que a luz da inteligência não havia brilhado muito para ela, seus discursos eram vazios e, pior, sem o palavreado político habitual; ou seja, eram tolos. Uma vez, na abertura de um concerto da OSPA, o maestro Isaac Karabtchevsky, vendo que ela se perdia de forma constrangedora na frente de uma platéia que começava a rir, saiu em sua ajuda, aplicando os termos corretos: concerto, solistas, maestro, sinfonia, etc. A boa vontade de aprender cultura da secretária não estava à altura daqueles termos.

Mônica Leal é filha de um dos políticos mais truculentos e involuntariamente cômicos de nosso estado. Seu pai, Pedro Américo Leal, foi certamente o coronel mais entusiasmado com a ditadura militar. Era ele quem costumava ir aos jornais e TVs para, sempre aos gritos, afirmar que não havia tortura, que a ditadura realizava milagres em todos os campos e conclamava os comunistas a saírem de sob seus colchões. Ouvi-o muitíssimas vezes. Ele não aceitava apartes, era uma patrola.

Com a finalidade de defender a memória de papai, Mônica Leal já tentou retirar do Memorial do Rio Grande do Sul o Acervo da Luta Contra a Ditadura, desmembrando-o entre outras instituições. Ora, esta documentação — que ao que eu saiba nem está catalogada –, deve conter o nome de Pedro Américo Leal por todo lado.”

Essa é a nossa Secretária de Cultura... Vejam bem, meus amigos, de CULTURA! Sem mais.

25 fevereiro 2010

Inebriei-me de Ocaso...

flecha de Fim varou-me no peito
rasgando a carne como a água do mar
avança sobre a praia frágil:
insanamente lenta.

pé por pé
me lancei em lentidão da noite
e cada passo
era cada passo um século
cada século
era de sangue a gota
gota a gota
lacrimejava a vida
e passo a passo
me arrastava largo
vago arrastando
lento em adágio
formei-me vãos lagos
a cada compasso
lasso sangrado
e passo a gota
a marcha marcava
o rastro marcado
da morte alagada
lento inundado
do que desmorona
fúnebre marcha
em rastejo de cobra
sangue por sangue
sequei-me de alma
aos poucos do lento
em quase ao eterno
gole por gole
inebriei-me de ocaso
e ninguém viu que meu peito
que meu peito esvaziava

e devagar agonizo...
como a Terra nos morre...

23 fevereiro 2010

Fernando Pessoa e seus Passos da Cruz VIII


Continuo postando os sonetos de Passos da Cruz de Fernando Pessoa, conforme explicado na seguinte postagem: http://artedofim.blogspot.com/2009/12/fernando-pessoa-o-predestinado-passos.html . Na próxima semana, o 9º passo. Na imagem que acompanha o poema, o quadro "A Morte de Cleópatra" de Guido Cagnacci.

Passos da Cruz - Soneto VIII

Ignorado ficasse o meu destino
Entre pálios (e a ponte sempre à vista),
E anel concluso a chispas de ametista
A frase falha do meu póstumo hino...

Florescesse em meu glabro desatino
O himeneu das escadas da conquista
Cuja preguiça, arrecadada, dista
Almas do meu impulso cristalino...

Meus ócios ricos assim fossem, vilas
Pelo campo romano, e a toga traça
No meu soslaio anônimas (desgraça

A vida) curvas sob mãos intranqüilas...
E tudo sem Cleópatra teria
Findado perto de onde raia o dia...

21 fevereiro 2010

Sobre o Sangue

construí meu verso sobre o sangue
derramado duro na nua terra aberta
coagulado sangue seco pelo pó da enxada
que deserticamente escorre...

construí meu verso sobre o sangue
de água morta em rio derramado humano
sangue viscoso-negro entre a beira acabada
que poluidamente escorre...

construí meu verso sobre o sangue
de seiva-lágrima em derramada queda
esverdeado sangue de vastidão tombada
que devastadamente escorre...

construí meu verso sobre o sangue
do guará atropelado pelo horizonte
sangue vivo-lago derramado das estradas
que extintamente escorre...

meu verso é só uma expressão sangrada
de tudo aquilo que morre.

19 fevereiro 2010

Francesca da Rimini: Dante e Tchaikovsky unidos


Dante Alighieri e Piotr Tchaikovsky uniram-se para criar uma magnífica obra em conjunto. Claro que não pessoalmente. Dante morreu quase cinco séculos antes de Tchaikovsky nascer. Mas em 1876, Tchaikovsky compôs o poema sinfônico Francesca da Rimini, baseando-se no V canto do Inferno da Divina Comédia de Dante. Trata-se de uma das obras mais trágicas e violentas da história da música.

Porém, convém antes comentar brevemente sobre o que é um poema sinfônico. É uma composição para orquestra cuja intenção é descrever e expressar alguma obra literária. Ela pode ser baseada em toda obra ou em apenas em um trecho dela. Não confundir com a ópera, esta é cantada e teatralizada. O poema sinfônico é predominantemente instrumental e não teatralizado. Beethoven é considerado o precursor do poema sinfônico, mas foi Liszt quem o desenvolveu, criando inúmeras obras nesse gênero. Tchaikovsky, Richard Strauss, Cesar Franck, entre outros, foram também expoentes do poema sinfônico.

Francesca da Rimini está entre os maiores poemas sinfônicos já compostos. Mas quem é Francesca da Rimini? É um personagem do Inferno de Dante, cuja existência é verídica durante a Itália medieval. O genial poeta italiano encontra a sombra de Francesca a vagar no Inferno. Francesca fora condenada por trair seu marido, o qual era de desagradável aparência, com o próprio irmão deste. Os adúlteros foram condenados, no 2º círculo infernal, a serem carregados por uma brutal tempestade, um terrível vendaval, e estavam totalmente impedidos de voltar a se tocarem. No entanto, mantinham as recordações dos momentos felizes em que ainda podiam abraçar-se na entrega a seu amor proibido. E tais sensações eram fonte de indizível tortura.

Tortura essa que foi magistralmente expressa na obra de Tchaikovsky. O poema começa de forma absolutamente sombria, onde o clima infernal parece ser palpável no ar. Estamos entrando no Inferno dantesco. Em seguida surge o lúgubre soprar da tempestade, o qual vai crescendo assustadoramente, até se transformar em algo como um devastador e incessante furacão. A orquestra explode em impiedosos acordes de condenação.

Após, surge um momento de soturna calmaria, onde se apresenta o melancólico tema de amor do casal condenado. Trata-se de uma melodia escura e comovente, que vai tomando contornos cada vez mais intensos ao longo da obra, sob um fundo de sonho e pesadelo, de ternura e desgraça, de paixão e desolação. Porém, aos poucos, o clima do amor proibido dá lugar à devastação infrene da tempestade, que volta a soprar com toda fúria arrastando as almas dos condenados.

O obra encaminha-se então para o seu apocalíptico final, onde a força da orquestra torna-se absolutamente avassaladora, fazendo recair todo o peso da culpa sobre o casal de maneira insana e implacável. Ao finalizar-se, o poema sinfônico Francesca da Rimini deixa-nos a tremenda sensação de que acabamos de sair do mais profundo, mais sentencioso e mais invencível inferno. A obra é composta de um único movimento com mais de 25 minutos de duração. (na imagem, o quadro "A Barca de Dante", de Delacroix)

18 fevereiro 2010

Ninguém Pode Sabê-lo

o teu Mistério
ninguém pode sabê-lo nem vencê-lo
rosto de mar que se esvai pelas tênebras
e lá onde as verdes vozes ciclonam
o teu mistério ninguém pode sê-lo

que se espalha pelo azul dos mais vastos
em beijos de folhas que serenam perfumes
água da noite que se luz no não-dito
a um verso de ave inundando até sonhos...
o teu mistério ninguém pode vê-lo

ninguém pode ser o que vê sem ter sido
e nem pode saber se não vence o não-visto:
agora estou vago e do sol sinto um halo...
o teu Mistério ninguém pode sabê-lo...
só misteriá-lo.

16 fevereiro 2010

Fernando Pessoa e Seus Passos da Cruz VII


Continuo postando os sonetos de Passos da Cruz de Fernando Pessoa, conforme explicado na seguinte postagem: http://artedofim.blogspot.com/2009/12/fernando-pessoa-o-predestinado-passos.html . Na próxima semana, o 8º passo. Na imagem que acompanha o poema, o quadro "Incêndio nas Casas do Parlamento", de William Turner

Passos da Cruz - Soneto VII

Fosse eu apenas, não sei onde ou como,
Uma coisa existente sem viver,
Noite de Vida sem amanhecer
Entre as sirtes do meu doirado assomo…

Fada maliciosa ou incerto gnomo
Fadado houvesse de não pertencer
Meu intuito gloríola com Ter
A árvore do meu uso o único pomo…

Fosse eu uma metáfora somente
Escrita nalgum livro insubsistente
Dum poeta antigo, de alma em outras gamas,

Mas doente, e, num crepúsculo de espadas,
Morrendo entre bandeiras desfraldadas
Na última tarde de um império em chamas…

13 fevereiro 2010

Meu Livro Poemas do Fim e do Princípio – Uma Aposta no Livro Digital


Apresento aos leitores e amigos meu 2º livro, intitulado Poemas do Fim e do Princípio. O livro foi editado pela editora Livros Ilimitados e está em pré-venda em seu site, em duas versões: digital (e-book) e impressa. Poemas do Fim e do Princípio conta com 245 poemas em quase 250 páginas, o qual resulta de uma seleção realizada por mim mesmo entre a minha produção poética dos últimos cinco anos. A capa da obra é ilustrada com a pintura “A Tentação de Santo Antônio”, do gênio da pintura holandês Hieronymus Bosch. O quadro é considerado um dos mais apocalípticos da história.

Poemas do Fim e do Princípio ainda não foi lançado oficialmente, visto que os exemplares impressos que pedi somente ficarão prontos na semana seguinte ao carnaval. Seu lançamento ocorrerá em Santiago na 1ª quinzena de março, porém ainda não há data e local definidos.

Quanto à publicação do livro, resolvi fazer diferente desta vez. Ao invés de publicar um livro independente, encomendando determinado número de cópias a serem vendidas posteriormente, optei por publicá-lo por uma editora, realizando um livro totalmente profissional , com registro na Biblioteca Nacional e tudo mais. O livro será comercializado diretamente pela editora, o que não significa que não poderá ser adquirido por mim.

Sendo publicado por uma editora, a versão impressa sairá por um preço mais elevado do que se fosse editado de forma independente. Porém, a minha grande aposta está na versão digital do livro, a qual é bem mais barata que a impressa (inclusive se fosse uma edição independente), não necessita de frete (o que o barateia ainda mais), é prático, e, o que é muito importante, não agride o meio-ambiente. O livro digital, ou e-book, após efetuado o pagamento, será enviado para o e-mail do cliente informado durante a compra. Além disso, um livro digital publicado por uma editora possui um universo de divulgação muito mais amplo do que um livro independente. Para o autor mesmo é muito mais fácil, rápido e eficiente realizar a divulgação de um livro digital.

Hoje em dia, as pessoas leem bem mais poesia na tela do computador do que em livros impressos, principalmente os jovens, que passam horas e horas diárias ligados à internet. Tendência que só tende a crescer. E para aqueles que preferem ler o livro na forma tradicional, basta imprimi-lo. Portanto, eu recomendo a todos os leitores que adquiram o livro em sua versão digital.

Mesmo assim, o livro também poderá ser adquirido no formato impresso. Eu encomendei alguns poucos exemplares para o lançamento do livro em março. Durante o lançamento, os livros impressos estarão por um preço um pouco inferior ao preço de venda no site. No momento que estiverem determinados local e data para o lançamento, eu enviarei os convites.

Para quem já quiser adquirir o livro, esta é a minha página na editora Livros Ilimitados: http://www.livrosilimitados.com.br/loja/autores_descricao.asp?codigo_autor=7 .

Ali há um link que direciona para os livros em seus dois formatos. Então, convido todos a conhecerem o meu 1º livro de poemas. Qualquer dúvida, entre em contato pelo e-mail reiffer@gmail.com. Obrigado.

11 fevereiro 2010

Ao Fim da Rosa


rosa que paira pelo meu sonho
quem foi que sangrou-te à tormenta
quem foi que matou-te em meu sangue
rosa que sonha pelo meu grave?

quem foi que falou-te de amar-te
daquilo que voa e sempre te parte
quem foi que arrancou-te da noite
rosa que doente pelo meu sempre?

quem te atormenta pelas espadas
do vasto martelo firme na morte
quem te vaza do lago que canta
rosa que morre pela minha veia?

quem te disse que tu és passado
rosa que afoga em tudo que chove
em medo que corta tu te consomes
rosa que vai-te em tudo que corre?

quem é que te lança na faca que mata
rosa que vaga em tudo que é podre
rosa que finda em todo meu nada...?
rosa esmagada.


(na imagem, o quadro "A Rosa Meditativa" de Salvador Dalí)

09 fevereiro 2010

A Noite é o Seio

Noite...
negra flâmula do Fim...
és romântica, simbolista e pós-moderna:
a Noite é eterna.

quem pode impedir
o teu sempre ser?
quem além pode ver
entre o mistério que tens?
Tu sempre vens.

por mais sol
que brilhe nos olhos da bela
os olhos dela
hão de sempre fechar...
que de tudo há noite:
anoitece a vida
anoitece o sonho...
anoitece amar.

em tudo e no todo
cai a sombra divina:
as alegrias tombam
os sorrisos se fecham
e o romance termina.

o adeus aguarda no trono do tempo
e o seu aceno de réquiem
sempre nos alcança:
tudo descansa.

há a noite do dia
a noite do mundo
noite do Cosmos:
a Noite é a origem
Deusa de onde tudo veio...
e a Noite é o destino:
iremos todos repousar
no seu imortal seio...

(na imagem, o quadro “Noite Estrelada sobre o Rhone” de Van Gogh)

07 fevereiro 2010

Fernando Pessoa e Seus Passos da Cruz VI


Continuo postando os sonetos de Passos da Cruz de Fernando Pessoa, conforme explicado na seguinte postagem: http://artedofim.blogspot.com/2009/12/fernando-pessoa-o-predestinado-passos.html . Na próxima semana, o 7º passo. Na imagem que acompanha o poema, o quadro "Caminhante Sobre o Mar de Névoa" de Caspar David Friedrich.


Passos da Cruz - Soneto VI

Venho de longe e trago no perfil,
Em forma nevoenta e afastada,
O perfil de outro ser que desagrada
Ao meu atual recorte humano e vil.

Outrora fui talvez, não Boabdil,
Mas o seu mero último olhar, da estrada
Dado ao deixado vulto de Granada,
Recorte frio sob o unido anil...

Hoje sou a saudade imperial
Do que já na distância de mim vi...
Eu próprio sou aquilo que perdi...

E nesta estrada para Desigual
Florem em esguia glória marginal
Os girassóis do império que morri...

06 fevereiro 2010

O Meu Pessimismo

conhecer o humano e a humanidade
é neles não acreditar:
saber é ser pessimista.

ter otimismo
é crer que a árvore
que nasceu e cresceu torta
vai se endireitar
depois de velha...
não adianta, que eu te conheço,
por conseguinte não te acredito.

o meu pessimismo
é como um velho professor antipático
chato e inconveniente
sério e irritante
seco e indiferente
que traz um irônico sorriso no rosto
e chega sempre no meio da festa
trazendo consigo um livro de Não:

ninguém gosta dele
porque todos sabem
no fundo...
que ele tem toda a razão...

05 fevereiro 2010

A Cidade Fétida e a Estranha Doença do Senhor Noite - Final


Já durante a madrugada, passei em frente a uma boate e pude captar os sons das músicas que de lá provinham. O resultado foi que percebi aqueles sons tão doentiamente que meus ouvidos gotejaram sangue por várias quadras. Felizmente, tinha sempre ao meu lado meu amigo lobo, que me consolava, contando-me histórias de um mundo muito além do nosso, o que tranquilizava meu espírito atormentado.

Quando tentava fugir a todas as pessoas, pois já me era intolerável o que o normal comportamento humano sintomaticamente despertava em mim devido à enfermidade, tive a má-sorte de cruzar por um grupo de pessoas eufóricas e muito falantes. Durante arrastados minutos, pude ouvir tudo o que disseram, mesmo que deles me afastasse rapidamente, pois meus tímpanos tornaram-se superexcitados após o sangramento. E essa extrema sensibilidade de meus ouvidos permitiu que eu ouvisse não só as suas frívolas conversas, mas também, e sem dúvida isso é mais uma alucinação de minha doença, algo como uma outra voz simultânea que soava ao fundo das vozes normais e transmitiam a impressão intuitiva de que eram emitidas pelo interior dos falantes. Enquanto aquele grupo comentava sobre diversões e festas, as vozes ao fundo, num tom rouquenho, monstruoso, falavam de dor e desespero, de solidão e vazio. Enquanto eles abordavam suas atividades de seus empregos, as vozes ao fundo se diziam escravas de um trabalho inútil e embrutecedor; e ao falar o grupo sobre dinheiro, as vozes diabólicas grunhiam sobre a total falta de sentido na vida e a maquinização do ser humano; enquanto aquelas pessoas tratavam de suas alegrias e felicidades, as lúgubres vozes interiores rugiam e gemiam infinitas tristezas, desesperanças e fatalidades. E eu, ao ouvir todo aquele infernal espetáculo de horror, senti-me perigosamente asfixiado, e lágrimas infrenes brotaram de meus olhos e uma dor de cabeça lancinante torturou-me ao máximo.

Psiquicamente dilacerado pelos sintomas de minha enfermidade, subi às costas do lobo e saí da cidade. Minutos depois, avistamos uma imensa carruagem de aspecto mitológico, puxada por sete cavalos possantes e imponentes, certamente, outra alucinação oriunda da doença. Sobre o primeiro dos cavalos, estava um homem de longo cabelo, trajando vestes, de vermelho vivo, típicas de um guerreiro romano. Sobre a carruagem, avistei uma imensa águia de asas abertas, com o agudo olhar fixo no horizonte. Dentro do carro mitológico havia alguns indivíduos, e, ao lado de cada um, um lobo ou um leopardo. O cavaleiro de trajes vermelhos parou a carruagem e convidou-me a subir. Eu o fiz, juntamente com o lobo. A carruagem prosseguiu até subir um alto monte, onde um frio vento soprava incessante. No cume do monte, olhamos para trás e avistamos ao longe a cidade, envolta em uma fumaça negra e mórbida. Com o vento, um fedor indescritivelmente insuportável foi trazido daquela decadente região urbana. E eu pensei comigo que até então fizera parte daquela completa degeneração. Graças a Deus, enlouqueci.
(Na imagem, o quadro "A Loba dando de Mamar a Rômulo e Remo" de Agostino Carraci)

04 fevereiro 2010

A Cidade Fétida e a Estranha Doença do Senhor Noite


Sou conhecido como o senhor Louis Noite. Claro que meu sobrenome não é esse, mas assim tornei-me conhecido devido ao estranho caráter dos impiedosos sintomas de minha enfermidade, os quais me impedem de sair às ruas durante o dia. Não que os raios solares sejam a mim nocivos, o que ocorre é que o sofrimento causado pela desconhecida patologia torna-se inexplicavelmente insuportável durante o dia, amenizando-se pelas horas noturnas.

Outras características e sintomas de minha doença são ainda mais absurdos, frutos de uma inquietante alteração de consciência, que muito se assemelha a uma esquizofrenia, com a diferença essencial de que sempre mantenho-me consciente de tudo o que comigo ocorre. Para exemplificar claramente o comportamento de minha enfermidade, relatarei os acontecimentos daquela terrível noite, da qual julgo desnecessário mencionar sua data.

Realizava eu uma de minhas longas caminhadas noturnas, que é quando intento buscar momentâneo alívio à dor física e psicológica ocasionadas pela doença, e, costumeiramente, meu lobo negro juntou-se a mim. Sim, em minhas caminhadas, sempre tenho a companhia de um imenso lobo de espessa pelagem negra, que comigo dialoga durante toda a noite. Esse é mais um sintoma da enfermidade, a visão de um lobo que conversa como um humano e que, obviamente, não é visto por ninguém mais, e, assim, todos pensam que converso sozinho, mas quem me conhece já está acostumado com minha loucura. Às vezes, subo às costas do lobo, e ele carrega-me por estranhos e magnificentes lugares oníricos, os quais não é meu objetivo descrevê-los agora. Outro sintoma, que ao longo daquela noite encontrava-se um tanto exaltado, consiste no fato de, ao passar por qualquer árvore, invariavelmente, perceber um vulto luminoso ao lado, acima, ou interpenetrado na mesma. Identifico tal vulto como a alma da árvore e com ela mantenho um absurdo diálogo.

Contudo, como ia dizendo, aquela noite foi verdadeiramente terrível. Não diferiu muito das outras em sua essência, mas na intensidade e dramaticidade dos acontecimentos. Talvez por ser lua cheia, dizem que isso afeta os loucos. Passava eu por um grupo de jovens quando, involuntariamente, pude ouvir sobre o que se tratavam os assuntos de suas conversas. Ao fazê-lo, senti um tremendo choque em meu cérebro, uma febre alucinante que me transmitia a insuportável sensação de que meu crânio iria derreter. Atribuo tal choque à imensa quantidade de bobagens e de futilidades contidas nas conversas daqueles jovens, tão agressivas a minha mente enferma que a acometeu de uma febre vulcânica.

Prosseguindo em meu sinistro passeio, avistei em uma esquina um homem alto que muito chamava a atenção. Ele conversava com outros dois homens, e, aproximando-me, percebi que se tratava de um respeitável candidato a deputado. Então, outro sintoma de minha enfermidade principiou a se manifestar, agora na forma de estarrecedores distúrbios visuais. Meus olhos doentes e insanos não viam ali somente um alegre e eloquente político, mas um ser monstruoso, de cuja boca gotejava uma baba amarelada e purulenta, de cujos olhos brotavam horripilantes ejaculações gangrenosas. E ainda tive a nítida impressão de que ao fundo da boca bestial daquele ser para mim desprezível havia algo como um maligno deboche. Aquele ar perverso e vazio que o político irradiava perturbou sobremaneira minha demente psique, e eu não conseguia entender como que os outros não se davam conta de nada disso, como tudo era tão normal para os outros e tão horrível para mim.


(Amanhã, o final) - Na imagem o quadro "Isaac Von Amburgh e Seus Animais" de Landseer

03 fevereiro 2010

1ª Antologia Beco dos Poetas


O site Beco dos Poetas, que reúne poetas e escritores de todo o Brasil e Portugal, publicou sua primeira antologia, para a qual foram selecionados três de meus poemas, foram eles: TRECHO DE UM INSTANTE DE SONO, ENTÃO É SÓ ISSO? e MINHA ABSURDA LIRA. Para os interessados em adquirir a antologia, o endereço é este: http://www.gbmidia.com.br/ch/prod/1297/i-antologia-beco-dos-poetas.aspx

02 fevereiro 2010

Sobre o Jornal Expresso Ilustrado


Recebi, em uma de minhas postagens abaixo, o seguinte comentário, do sr. Edson Munaro:

Estranhas tuas críticas ao Expresso Ilustrado. Se tu criticas e tanto desdenhas o Jornal, por que é queres aparecer lá? Está certo o Editor João LEMES em mandar te cortar, eu faria o mesmo. Mas não podes dizer que o Jornal não dá cobertura ao Evento do Poetas. Att

Sr. Edson: eu não o conheço, não sei quem é o senhor. Mas agradeço o seu comentário, o qual foi bastante oportuno. Devido a ele, farei alguns esclarecimentos. Antes de mais nada, eu não "quero tanto aparecer lá". O que ocorre é que há algum tempo o amigo Márcio Brasil teve a louvável ideia de criar o espaço "Rotação Literária" para divulgar escritores santiaguenses. Ele me convidou a enviar textos para o espaço. E eu, agradecido, aceitei, por que não aceitaria o seu convite? O Márcio sempre deu força a meu trabalho, e a ele sou muito grato. Enviei textos que ele publicou. Passaram-se vários meses, e eu não mais enviei qualquer texto para o Rotação. Até que dias atrás lembrei-me que poderia mandar mais algum para o Márcio, e o fiz, mais em consideração a ele, que me fez amigavelmente o convite. Porém, fiquei então sabendo que meus textos não poderiam mais ser publicados no Rotação Literára, mesmo sendo eu um dos mais prolíficos e divulgados escritores santiaguenses da atualidade. Fui censurado? Isso é atitude de um jornal que se diz sério e respeitável?

O sr. João Lemes tem todo o direito de não gostar de mim. Mas se ele fizesse qualquer comentário em meu blog, ele seria publicado. O comentário dele e de qualquer outra pessoa, como publiquei o seu, sr. Edson. Meu blog é democrático. O jornal Expresso não é. E é isso que eu critico. Eu não sou o único a ser cortado lá, não é mesmo? Parece-me que pessoas que não concordam com a visão do chefe do Expresso algumas vezes são "podadas". Ou isso não procede?

Felizmente, eu não preciso do Expresso Ilustrado para divulgar minhas obras. Meu blog tem centenas de acessos diários, leitores assíduos não só em Santiago, mas em todo o Brasil. E também fora do Brasil, como em Portugal, Espanha, Argentina, Uruguai, México, Chile, França e até na Romênia. Publico obras nos mais diversos sites do Brasil, participo de revistas, jornais e antologias, meus zines são distribuídos em várias cidades, tenho um livro publicado e logo sairá o segundo por uma editora, de modo que não preciso do Expresso.

Mas eu não desdenho o jornal, como o senhor afirma. Eu nunca afirmei que o desdenhava. Eu faço críticas a ele, o que é diferente. Ou será que não tenho o direito de criticá-lo? Não vivemos em uma sociedade dita democrática? Ou será que todos os santiaguenses têm que ficar com a boca calada quando não concordam com alguma coisa? Eu critico o Expresso, e critico qualquer coisa que eu julgar merecedora de críticas. E não sou só eu quem critica o mencionado jornal. Há inúmeras pessoas que o fazem, apenas não tornam público suas opiniões, por motivos que não me compete julgar.

O jornal Expresso tem seus méritos, é claro. A princípio, possui um ótimo time de colunistas, vários deles meus amigos, como o Márcio Brasil, o Ruy Gessinger, o Pasini, o Froilam. Todos escrevem muito bem. O jornal soube conquistar seu espaço e tem um grande número de leitores na região. Não tiro o seu valor. No entanto, na minha opinião também apresenta graves defeitos.
Pelo seu espaço e alcance, poderia, e deveria, apresentar matérias bem mais profundas e substanciais. Dar mais atenção à cultura e a questões mais sérias. No entanto, prefere colocar algumas frivolidades, matérias de entretenimento, dar um espaço demasiado a badalações sociais, enfim, todas essas coisinhas fúteis para satisfazer a imbecilidade e a vaidade vã do povo.
Todos sabem, por exemplo, que "Os Melhores do Ano" não passa de uma palhaçada, de um puxa-saquismo para vender, para ganhar dinheiro. Não creio ser essa a missão de um jornal. Mas se o senhor João Lemes julga que é, está no seu direito.

Além do mais, eu mesmo já encontrei vários erros de informação no Expresso Ilustrado. Isso não pode ocorrer em um jrnal respeitável. Sem falar nas omissões de algumas informações e fatos da sociedade santiaguense. Tais omissões são propositais ou por desconhecimento? Seja qual for o caso, é altamente condenável em um jornal. Por falta de espaço, certamente não é...

Por ser um importante veículo de imprensa em Santiago, o jornal Expresso deveria preocupar-se mais com sua qualidade e com a seriedade de suas atitudes para com os leitores e para com a sociedade.

01 fevereiro 2010

Não Tens Certeza de Nada...

tens certeza?
não, não tens certeza de nada.
ter certeza é ilusão
é projeçao equivocada:
achar que o hoje é o amanhã
e que tu serás sempre
o mesmo de agora
é julgar que não muda o clima
ou que não passa a hora

amanhã serás outro:
e o teu outro eu
te dirá: menti!
pensarás o que não pensas
e o que hoje sentes
não estará mais em ti

amanhã negarás tranquilo
o que ontem disseste
emocionado de certeza
amanhã viverás planos que não sabias
amanhã tua felicidade será tristeza

tens certeza?
não, não tens certeza de nada.
verás que o tempo
desmentirá tudo
e que viver é saber
com a alma enganada

nem a morte é certa:
que ela pode estar longe
ou pode ser já.
só é certeza o Fim:
por mais sol que tenha o dia
é certo que sempre
anoitecerá...

30 janeiro 2010

Felicidade Não se Busca

quem busca a felicidade
jamais a encontra
e muito menos a encontra
quem a encontra na busca

a felicidade não se busca
porque não pode ser buscado
o que não está em um ponto
a ser alcançado

quem alcança o ponto almejado
logo vê o outro ponto mais adiante
e naquele ponto visto e não-chegado
mora a felicidade imaginada
e delirante

quem feliz futilmente se julga
apenas um largo gole de vinho
traga:
segura uma vela de chama fugaz
que a primeira ventania
fatalmente apaga

a felicidade
é como para o colecionador
o ato de encontrar
um raro selo:
só dura o momento do ato

só pode ser feliz
quem sabe que não pode sê-lo
de fato

29 janeiro 2010

Fernando Pessoa e seus Passos da Cruz V


Continuo postando os sonetos de Passos da Cruz de Fernando Pessoa, conforme explicado na seguinte postagem: http://artedofim.blogspot.com/2009/12/fernando-pessoa-o-predestinado-passos.html . Na próxima semana, o 6º passo. Na imagem que acompanha o poema, o quadro "A Morte de Ofélia" de Millais.


Passos da Cruz - Soneto V

Tênue, roçando sedas pelas horas,
Teu vulto ciciante passa e esquece,
E dia a dia adias para prece
O rito cujo ritmo só decoras...

Um mar longínquo e próximo umedece
Teus lábios onde, mais que em ti, descoras...
E, alada, leve, sobre a dor que choras,
Sem querer saber de ti a tarde desce...

Erra no anteluar a voz dos tanques...
Na quinta imensa gorgolejam águas,
Na treva vaga ao meu ter dor estanques...

Meu império é das horas desiguais
E dei meu gesto lasso a algas mágoas
Que há para além de sermos outonais...

28 janeiro 2010

Sobre a Casa do Poeta: e-mail enviado a Júlio Prates

Prezado Júlio: a divulgação para a mídia não cabia a mim, não era minha função, e, com toda a sinceridade, não sei como ela foi feita. Apenas divulguei em meu blog, e convidei assim a todos os meus leitores, deixei isso bem claro em minhas postagens. Convites particulares para eventos desse tipo eu não mando e nunca vou mandar, pois entendo que convites individuais para essa categoria de evento não são necessários. E eu não afirmei que não houve envolvimento de recursos públicos em nenhum momento. Mas não fui eu quem os buscou, até porque, sempre que fui buscá-los como auxílio para meus livros, foram-me negados, enquanto para outros, foram dados. Para os seus foram dados? Faço a mesma pergunta que você me fez. Por que para uns sim e para outros não? Isso não é também uma panelinha? Por que você não fala também desse tipo de panelinha? Ou da panelinha do Expresso? Eu não ando atrás de ajuda de políticos para nada, não sou responsável pela busca de recursos dentro da Casa do Poeta. Sou o diretor de Literatura. Posso falar de qualquer político porque não tenho o rabo preso com nenhum deles. Falo inclusve de nosso prefeito atual: ele gosta muito de usar o nome de Terra dos Poetas, mas na hora de apoiar efetivamente os poetas que produzem em nossa terra, e eu não tenho medo de dizer que atualmente sou um dos poetas mais produtivos de Santiago e um dos que mais têm divulgação fora daqui, na hora de ajudar os poetas, ele não o faz. No meu caso, não o fez.

Você diz que é necessário dar ciência à sociedade da diretoria da Casa dos Poetas. Até onde sei, foi dado, de acordo com as possibilidades da Casa, inclusive financeiras. Só que a sociedade também não se interessa em saber. E você diz que não pode se enfiar nas reuniões da diretoria sem ser convidado. Claro que não, você não faz parte da diretoria. E eu não disse que você poderia participar delas. Disse que você pode participar de qualquer evento aberto, como cafezinhos literários e o fórum sem necessitar de convite individual. Pode participar e expor todas as suas opiniões sobre a Casa. Pode participar e se associar a qualquer momento, e uma vez sócio, pode formar uma chapa para formar uma diretoria para concorrer na próxima eleição. Se você tem argumentos contra a Casa, por favor, participe do próximo cafezinho e exponha seus argumentos para todos nós. Eu mesmo o avisarei de quando for ocorrer o próximo cafezinho. Gostaria muito que você participasse, pois admiro muito todo seu senso crítico.

Como disse, de minha parte, a Casa do Poeta estará sempre aberta a todos que quiserem participar. Mas convites particulares, em meu nome, ninguém vai receber. Se vai receber em nome de outros membros da diretoria ou da presidência, isso é com eles.

Sobre a Casa do Poeta de Santiago: eu não formo panelinhas.

Não sou homem de cobrar nada dos outros. E detesto que cobrem de mim. Os únicos que devem ser cobrados sem tréguas são os políticos, pois em sua maioria são parasitas que vivem e enriquecem à custa do dinheiro, do sofrimento e da ignorância do povo.
Dito isso, não concordo com cobranças para com aqueles que não foram ao Fórum de Literatura promovido pela Casa do Poeta de Santiago, entre outras instituições. Quem não quer ir, não vai, ninguém é obrigado. Eu mesmo não fui em vários eventos ditos literários. Se eu não quero, não vou.
Mas também não concordo com o julgamento do amigo Júlio Prates de que era necessáro convite particular para ir ao evento. O evento era aberto para todo mundo, nunca foi fechado ou eletista como ele afirma. Os convites particulares podem ou não ser enviados nesse caso. Não é algo imprescindível, muito pelo contrário, a maioria das pessoas que foram não receberam convites particulares. Eu, sendo parte da diretoria, não enviei convite para ninguém. Não sei se o presidente, o Pasini, enviou. Se enviou, ele tinha o direito, e eu não tenho nada a ver com isso. O Pasini tem o pensamento dele, e eu, o meu. Eu não o fiz porque julgo que seria uma forma de pressão para com a pessoa, e detesto pressões. Qualquer um era livre para ir ou não. O evento foi divulgado a todos, eu mesmo divulguei em meu blog várias vezes. Não era um lançamento particular de livro, que aí sim necessitaria de convite.
Quem quisesse participar, bastaria chegar ao local, fazer a inscrição, que seria muito bem recebido. E se quisesse vender seus livros ali, era só falar comigo mesmo, eu era o responsável para isso, junto com o Luiz Paulo Milani, outro membro da diretoria. Mas não enviei convites para tanto. A ninguém. Isso era aberto a todos os participantes do evento. Para que convites particulares para um evento que era aberto a toda a sociedade? Isso sim seria eletista.
E não sei por que essa história de que a Casa do Poeta é uma panelinha, se todos podem participar dos cafezinhos literários, e de qualquer outro evento, sem precisar fazer parte da Casa, sem precisar se associar, sem precisar de nada. Basta ir e expor sua opinião, o seu pensamento, o seu sentimento, a sua obra. E se quiser continuar a ir sem se associar, pode fazê-lo. E se quiser se associar, na hora mesmo isso será feito. Liberdade total e absoluta. Falta divulgação dos dias e horários dos cafezinhos? Talvez poderia haver uma divulgação maior por parte da imprensa, pois a divulgação é feita pela internet. Por que a imprensa não divulga? Panelinha é o que ocorre, por exemplo, no jornal Expresso Ilustrado, que possui a coluna Rotação Literária da qual fui proibido de participar pelo chefe do jornal. No entanto, o chefe desse jornal pode, tranquilamente, participar da Casa do Poeta.
Será que não gostam da diretoria da Casa do Poeta? Tudo bem, ninguém é obrigado a gostar dela. Se alguém quiser mudar a diretoria, basta se associar à Casa e compor uma chapa. Qualquer santiaguense pode fazer isso, basta se associar. A associação é muito barata, apenas três reais por mês. Não cobre nem as despesas da Casa. Qualquer um pode se associar, seja escritor ou não. Depois haverá a eleição. E todos os sócios votam. Quem não vai é porque não quer, não por falta de conhecimento, ou por qualquer outro impedimento. E se ainda não tinha conhecimento, agora está tendo. E se não quer ir, não serei eu que irei pressionar a fazê-lo. Nunca o farei.
Não posso admitir que afirmem que faço parte de uma panelinha. Detesto panelinhas, e sempre lutei contra elas. Lutei, sozinho diga-se de passagem, contra a panelinha formada pelo Oracy Dornelles e seus sequazes em torno da literatura em Santiago. Não será agora que formarei uma panelinha, ou que contribuirei para que ela se forme. Apenas não sou uma pessoa de andar atrás dos outros para que façam isso ou aquilo. Se alguém quiser participar da Casa do Poeta, de minha parte, será absolutamente muito bem recebido. Quem quer que seja. Inclusive o Oracy. Eu mesmo farei a associação. O convite está feito. Mas se não quiser, eu não irei correr atrás. E ponto final.

27 janeiro 2010

Poema Leve

minha obra que é nada leve
deixo que o furacão a leve
leve com tudo que a mim é nada
leve de nada que no fundo é tudo
que do todo não vivo me livro
como a mais trágica página
arrancada do mais trágico livro

que se apague essa funesta vela
o olhar sentença que meu sonho vela
arraste o meu peito em lava
às correntezas onde a água o lava
a água livre de lavado pranto

deixo que leve leve em descanso
a minha alma a nadar em vale
a minha a alma que nada vale...

25 janeiro 2010

Imortal

imortal
amor
amor tal
amoral
mal

amortal
imorre douro
que morre
sem ouro

imoral
não d’ouros
não duras
aah amor tal
amor tão...
em vão...
aah!
ah mortal!

23 janeiro 2010

A Lenta Morte da Mulher Bela - Final


Os gritos da bela mulher não eram reações desesperadas somente às suas dores excruciantes, mas ela reagia também às terríveis chagas que surgiam em todo o seu corpo e sangravam de forma inclemente, espargindo um sangue pútrido e mau-cheiroso, que se derramava por toda a cama, maculando os brancos lençóis e carregando o ar impuro de pestilentas emanações. As chagas desapareciam com o passar dos arrastados dias, mas sempre retornavam, cada vez piores, em cores mórbidas que iam do vermelho, ao roxo e finalmente ao negro.

E as pessoas ali respiravam aquela atmosfera mefítica, com uma imbecil tranquilidade sorridente. A mulher ardia em febre, e sua febre irradiava-se pelo ar, elevando a temperatura gradativamente. Ondas de enfermidade visivelmente partiam de seus entristecidos olhares de negras olheiras. Suas lágrimas não cessavam de escorrer como orvalhos de desgraça por seus miríficos cabelos negros. Sua face pálida e cadavérica implorava por misericórdia. No entanto, aqueles que viviam em seu quarto apresentavam um comportamento tão estúpido, tão indiferente, tão agressivo e miserável, que faziam, ainda que inconscientemente, com que a moléstia da mulher se agravasse ainda mais.

Em um instante soou um luto deprimente. E nas atmosferas ensombrecidas, mornas de enfermidade, densas de pesadelos, assomou pelo ambiente degradado a tensão desesperada de uma trágica marcha fúnebre. E suas notas noturnas vibravam como sinos agourentos de palpáveis maldições. Simultaneamente, adejaram pela janela as asas de um corvo que surgiu da noite distante, do espaço longínquo, e fitou seus olhos fundos de sentenças nas pessoas que ali no quarto estavam. O corvo assemelhava-se a um anjo. Trazia uma carta no bico.

Às vezes, os dias transcorriam em aparente serenidade. A serenidade funesta que antecede as mais devastadoras tormentas. E nos dias lentos, rastejantes, de tensão insuportável, relâmpagos e trovões, por vezes distantes, por vezes próximos, espargiam horrores e deixavam um odor ominoso pelo ambiente do quarto. E o clima obscurecia-se paulatinamente.

Ataques golfejantes de tosse assediavam os pulmões da bela mulher. Golfadas espessas de sangue espalhavam-se por todo o aposento. Um catarro amarelecido descia canhestramente de seu nariz. Ela debatia-se e revirava-se na cama inundada de um suor ardente, pegajoso e febril.

Pela janela semiaberta do quarto, uma estranha luminosidade avermelhada penetrou no ambiente de dúvidas e desesperos adejantes. A bela mulher desvairava, inebriada das mais absurdas catástrofes. Contorcendo-se de dor em todos os seus órgãos, ela levava as mãos amareladas e ressequidas, de veias proeminentes, à cabeça que latejava freneticamente.

Um sopro anômalo e rubro de sangue entrou com diabólica violência pela janela entreaberta. Tal sopro deve ter afetado a sanidade da bela mulher. Agonizante, como um furacão ela redobrou suas forças para erguer-se da cama sanguinolenta. Insana, descontrolada, enlouquecida, ela agarrou com suas mãos crispadas, de unhas crescidas e ensanguentadas, um por um o pescoço daqueles que viviam em seu quarto e os estrangulou com fúria alucinante. Nove dos dez moradores do quarto foram mortos dessa forma. Apenas aquela mulher que sinceramente tentava ajudar a bela enferma foi poupada. E, nesse instante, uma tênue fagulha de vida refulgiu em seus enormes olhos verdes. E o nome da bela mulher era Terra.
(na imagem, o quadro "O Pesadelo", de Füssli.)

22 janeiro 2010

A Morte Lenta da Bela Mulher


A magnífica beleza daquela mulher deslumbrava a todos. Mesmo agora, gravemente doente, sua beleza ainda encantava. Mas um intenso sofrimento era plenamente visível em seu rosto de olhos fundos e encovados. Sua doença era verdadeiramente terrível, impiedosa, e, aos poucos, bem aos poucos, em uma extrema e quase imperceptível lentidão de brutal angústia, seu organismo ia sendo consumido pela absurda enfermidade. Era como a mais desolada e arrastada das marchas fúnebres.

Enfermidade que a definhava de uma forma digna da mais elevada comiseração. Seus sintomas algumas vezes surgiam, noutras, desapareciam por completo. Porém, quando retornavam, eram ainda mais violentos. Dores insuportáveis em todas as partes do corpo. Ela chorava copiosamente nestes momentos. Mas o que assombrava ainda mais era a inexplicável indiferença com que quase todos observavam a sua agonia.

Das dez pessoas que viviam em seu quarto, apenas uma delas sentia verdadeira piedade ao vê-la morrer de maneira tão lenta e sofrível. As outras aparentavam não se dar conta da devastadora desolação que acometia a bela e pobre mulher. No entanto, todos afirmavam que conheciam sua doença, que sabiam de suas causas a fundo e que possuíam a cura para a pavorosa e fatal enfermidade. Consideravam-se médicos de extrema perspicácia e inteligência. Havia até alguns que diziam que a doença não era grave, que seria facilmente curada e que exageravam no julgamento da intensidade de seus sintomas. Mas ainda não a haviam curado, apesar de todas as tentativas de fazê-lo, tentativas em realidade estúpidas, vergonhosamente insuficientes, enfim, absolutamente inúteis.

Todos os dez indivíduos também afirmavam com total segurança que conheciam o fato de que eles, todos eles, eram os responsáveis, os culpados pela bela mulher agora se encontrar enferma. Sim, a moléstia que a afetava foi causada pelas dez pessoas que viviam em seu quarto. Viviam em seu quarto e dependiam da bela mulher para tudo, para absolutamente tudo, inclusive para viver. Não viveriam sem ela. Daí então a urgente necessidade de curá-la. Se ela morresse, todos os dez morreriam com ela.

De modo que assombrava, era quase inacreditável a indiferença com que seus companheiros de quarto contemplavam a sobrenatural agonia que a passos de anômala marcha fúnebre levava aquela linda mulher a uma morte dolorosa e implacável. Algo realmente incompreensível. O que passaria pela mente dos cinco homens e das cinco mulheres que ali naquele quarto de doença viviam? O que passaria por seus sentimentos?

Talvez os moradores do quarto já estivessem tão habituados com a doença que causaram à mulher que já nem eram capazes de se emocionar com o vagaroso, lento, gradual sofrimento que ela irradiava. Havia ali somente uma pessoa que ainda agia intentando acender os sentimentos dos outros para que realmente tomassem consciência da iminente situação em que se encontravam. Porém, sempre inútil.

Mais e mais o clima reinante naquele quarto tornava-se pesado e nervoso. Sombras pesarosas iam surgindo dos cantos do ambiente carregado de densos espectros de ocaso. Lentamente, numa lentidão que parecia eterna. Em alguns momentos, luzes cintilavam em algumas pequenas reentrâncias quase ocultas que traziam consigo determinada esperança. Porém, em pouco tempo eram rapidamente subjugadas por nuvens escuras de uma fumaça de ignota origem.

Sistematicamente, a bela mulher em sua suprema agonia emitia gritos horripilantes, gemidos dilaceradores, que ensurdeciam e inflamavam os ouvidos dos seus companheiros de quarto, a ponto de sangrá-los. Mesmo assim, raramente se emocionavam, bem raramente...
Amanhã, o final.
(na imagem, o quadro "Mulher Morta" de Reinhardt Sobye)

21 janeiro 2010

I Fórum de Literatura e Meu Primeiro Livro de Poesias


Amanhã, dia 22/01/10, às 19h, ocorrerá, na câmara de vereadores de Santiago, a abertura do I Fórum de Literatura e II Encontro de Escritores do Mercosul. Ainda é possível realizar inscrições. É uma ótima oportunidade para os amantes da cultura. E até para os que não a amam tanto. Para maiores informações: http://www.casadopoetadesantiago.com.br/ . Confira no quadro acima o cronograma do evento.

Meu primeiro livro de poesias, intitulado Poemas do Fim e do Princípio, seria lançado durante o evento, mas infelizmente, por motivos de forças maiores, isso não será possível. O livro não ficou pronto a tempo. Ele está, no momento, sendo preparado pela editora Livros Ilimitados e deverá ser lançado no final de fevereiro ou, no máximo, no início de março. Contará com 246 poemas escolhidos dentro de minha produção dos últimos cinco anos, de acordo com critérios de qualidade e de temática por mim estabelecidos. A publicação do livro será uma inovação em Santiago dentro do campo literário. Tal inovação será conhecida no dia de seu lançamento.

20 janeiro 2010

Fernando Pessoa e Seus Passos da Cruz (IV)


Continuo postando os sonetos de Passo da Cruz de Fernando Pessoa, conforme explicado na seguinte postagem: http://artedofim.blogspot.com/2009/12/fernando-pessoa-o-predestinado-passos.html. Na próxima semana, o 5º passo. Na imagem que acompanha o poema, o quadro "Mignon" de Von Schadow.

Passos da Cruz - Soneto IV

Ó tocadora de harpa, se eu beijasse
Teu gesto, sem beijar as tuas mãos!,
E, beijando-o, descesse p'los desvãos
Do sonho, até que enfim eu o encontrasse.

Tornado Puro Gesto, gesto-face
Da medalha sinistra - reis cristãos
Ajoelhando, inimigos e irmãos,
Quando processional o andor passasse!...

Teu gesto que arrepanha e se extasia...
O teu gesto completo, lua fria
Subindo, e em baixo, negros, os juncais...

Caverna em estalactites o teu gesto...
Não poder eu prendê-lo, fazer mais
Que vê-lo e perdê-lo!... E o sonho é o resto...

18 janeiro 2010

Poema Inebriado

e que no além seja tudo aquilo
que caí de ser além de tudo:
me deixando em tudo que não fui
seja minha arte o além mais alto...

o além de mais belo
do vasto que andei
chama que te li
tragos do que busco
ave que clarei
sempre que te bebo
mais do que te vejo
sonho que não li
beijo do que vou
verso mais que flor
olho que me noite
nada do que sou...

lá me alto e passo
lá sou só o que sinto:

céu e vinho tinto

17 janeiro 2010

do Destino

o coelho sai tranquilo
da toca e...
de repente o lobo o abocanha

o lobo vai tranquilo
com o coelho e...
de repente o pega a armadilha

o caçador vai tranquilo
com o lobo e...
de repente o pica a serpente

(...)

e era um dia nublado
chuvoso e...
de repente saiu sol

ninguém esperava...

15 janeiro 2010

Uma Pergunta:

mas o que foi que fizeste da tua alma?
quer dizer que a sabes
mas não a ouves?
quer dizes que a tens
mas não a lês?
quer dizer que a vês
mas não a pensas?
quer dizer que a amas
mas não a sentes?

de que adianta
noivar através das flores
se o perfume evapora
pela indiferença do nada?

de que adianta
luzir por entre olhares
se os sonhos escapam
pelo deixar cair das asas?

se achas que vives ter alma
é melhor que a esqueças:
pois só vive a alma
quem por ela morre...

14 janeiro 2010

Letras Aos Corvos (Antologia)


A Editora Literata está realizando uma antologia de poemas góticos e grotescos, com a organização dos escritores Ana Carolina Giorgion e M. D. Amado, e a participação é aberta a qualquer poeta.

Terei a honra de ser o prefaciador do livro, e também serei um dos participantes. Para informações mais detalhadas, tais como o regulamento para participação, comunidade no orkut, acesse o site http://www.letrasaoscorvos.blogspot.com/.


13 janeiro 2010

Fernando Pessoa e Seus Passos da Cruz (III)


Continuo postando os sonetos de Passo da Cruz de Fernando Pessoa, conforme explicado na seguinte postagem: http://artedofim.blogspot.com/2009/12/fernando-pessoa-o-predestinado-passos.html. Na próxima semana, o 4º passo. Na imagem que acompanha o poema, o quadro "Vênus" de Velázquez.


Passos da Cruz - Soneto III
Adagas cujas jóias velhas galas...
Opalesci amar-me entre mãos raras,
E fluido a febres entre um lembrar de aras,
O convés sem ninguém cheio de malas...

O íntimo silêncio das opalas
Conduz orientes até jóias caras,
E o meu anseio vai nas rotas claras
De um grande sonho cheio de ócio e salas...

Passa o cortejo imperial, e ao longe
O povo só pelo cessar das lanças
Sabe que passa o seu tirano, e estruge

Sua ovação, e erguem as crianças
Mas o teclado as tuas mãos pararam
E indefinidamente repousaram...

12 janeiro 2010

Eu Não Sirvo a Ninguém

como exemplo
não me siga
que eu a ninguém sou exemplo:
irias arrancar os cabelos
se visses o que trago por dentro

quanto mais belo é o que escrevo
mais de horrores me inundo...
eu não passo
de um vagabundo
e em todos meus passos
nos mais altos
abismos me afundo

o que eu faço da vida
não sei
sei
que meu peito estraçalhei
que quanto melhor é a Arte
mais grave é o enfarte

sou tão nada
que escrevo como escreveram
todos os poetas:
não passo de um triste
a minha própria alma
de tão funda
nem existe

construí catedrais inúteis
do que sinto
ergui minha alma
nos alicerces do que nunca vem
e tudo que digo
minto

do meu trono de miséria
olho-te cheio de orgulho e desdém
por isso não me siga
não me admire
que eu não sirvo pra nada
e não sirvo a ninguém.

10 janeiro 2010

Fatal

na minha boca
sangue de estrelas
sobre meus ombros
todo sol cai
tudo se esvai
lutando à luz do ocaso
trompas de arcanjos
cortam-me a testa
sobre meus olhos
vem todo céu
rasga-se o véu
olhando o fim pra sempre
rabos de raios
dando-me coices
na minha voz
pesa-me a lua
e a noite nua
amando a marcha e a morte
mundos não-críveis
trevas de luzes
cósmicos trezes
na minha alma
voou toda calma
se indo pelo Mistério

08 janeiro 2010

Não Melodio por Mim...

a final melodia que mais criei
é mais triste que tudo que crio
que é a melodia que não criei
que melodias não rio
mas melodias finais
é tudo que faço
e traço

fracasso
que não crio tudo que faço
só o que é cada vez mais trágico
e escuro
só traço o final mais puro
o estrago
a melodia que for mais triste
que é claro
não existe
e o final que for mais duro
e trago

o vinho que for mais largo
de cansaço
amarguro
e de sangue
na desgraça do braço
em pulso

foi com ele que (al)cansei o laço
errado
onde ando arrastando
o rastro
ondeando em vão
para lassar teu astro
na minha passada de vasto
em passados abraços
de finais e últimos
(com)passos...

07 janeiro 2010

"Eis o mal dos senhores, os políticos. Nem mesmo chegam a pensar em coisas importantes."


Acompanhando o intenso blog do Ruy Gessinger, li: "A Conta Está Chegando". Refere-se aos desastres ambientais que vêm assolando o RS, sendo o último a queda da ponte de Agudo pela devastadora enchente. Diz Gessinger:


"Mas a conta dos anos 70, do milagre soja-trigo, do desmatamento; a fatura do crescimento demográfico incontrolado ; a destruição de matas nativas e florestas ciliares não podia ficar impune. A Natureza se sente ameaçada, ela é um ser vivo, ela raciocina em termos de milênios, mas decidiu não ter mais paciência com esse serzinho ignóbil, com” suicidal tendences”. "

Faço minhas as suas trágicas palavras. A conta está chegando. E será alta, muito alta, altíssima! Mas não adianta avisar. Adianta? A destruição impiedosa e imbecil da natureza prosseguirá a passos de gigante. E virá a conta, em parcelas cada vez mais caras. E tanto não adianta avisar, que em 1928, eu disse em 1928!, quando ainda não havia preocupações ambientais reais por parte da humanidade, em seu livro "Contraponto", o genial escritor inglês Aldous Huxley advertiu sobre a desgraça que o "progresso" traria ao planeta. A seguir, um trecho da obra:

"Com essa agricultura intensiva, os senhores estão roubando ao solo o seu fósforo. Ele vai desaparecendo completamente de circulação. Depois, basta ver como os senhores deitam fora centenas de milhares de toneladas de anidrido fosfórico nesses esgotos! Derramando-o dentro do mar. E a isso os senhores chamam progresso. (...)

Eis o mal dos senhores, os políticos. Nem mesmo chegam a pensar em coisas importantes. Vivem a falar do progresso e deixam que todos os anos milhões de toneladas de anidrido fosfórico corram para o mar. É idiota, é criminoso, é... é o mesmo que tanger a lira enquanto Roma arde. Mais duzentos anos apenas e os depósitos se extinguirão. Os senhores julgam que estamos em progresso porque vivemos do nosso capital. Fosfato, carvão, petróleo, salitre, esbanje-se tudo! Eis a política dos senhores. (...)

O único resultado desse progresso dos senhores será que dentro de algumas gerações há de vir uma revolução verdadeira - uma revolução natural, cósmica. Os senhores estão transtornando o equilíbrio. Ao cabo, a natureza o há de restabelecer. E o processo será muito desagradável para os senhores. A queda será tão rápida como o foi a ascensão."

E essas palavras proféticas de Huxley já estão se cumprindo.

Para finalizar, republico um de meus poemas, escrito em outubro de 2009:

Enxurrada

olho para a humanidade
e rio
rio que me leva
leve
em suas correntezas
sem correntes

por que devo combater
o que não deve ser combatido?
o que não deve ser combatido
não deve ser combatido
por que já está vencido
o simplesmente é deixar assim
que tudo nasce
e corre ao Fim

não digo
que não irei com a enxurrada
digo que choveu forte vasto e além
e que a enxurrada vem...

06 janeiro 2010

da Sabedoria

uma nota sinfônica
sabe
por toda altura
acima
de cada letra filosófica

uma pintura mágica
filtra
sol e lua
avante
de quaisquer gases científicos

uma poesia trágica
rufla
suas negras asas
além
de toda poeira teórica

05 janeiro 2010

Fernando Pessoa e seus Passos da Cruz (II)


Publico, conforme anunciei na postagem do dia 28/12/09, o segundo da série de 14 sonetos de Passos da Cruz, de Fernando Pessoa. Semana que vem, o 3º soneto.


Passos da Cruz - Soneto II


Há um poeta em mim que Deus me disse...
A Primavera esquece nos barrancos
As grinaldas que trouxe dos arrancos
Da sua efémera e espectral ledice...

Pelo prado orvalhado a meninice
Faz soar a alegria os seus tamancos...
Pobre de anseios teu ficar nos bancos
Olhando a hora como quem sorrisse...

Florir do dia a capitéis de Luz...
Violinos do silêncio enternecidos...
Tédio onde o só ter tédio nos seduz...

Minha alma beija o quadro que pintou...
Sento-me ao pé dos séculos perdidos
E cismo o seu perfil de inércia e voo...
(na imagem, o quadro "João Batista" de Leonardo Da Vinci)

03 janeiro 2010

Frases para 2010

A seguir, deixo 13 trechos literários para reflexão neste ano que está principiando...



1)“Não é ilógico supor que, numa existência futura, possamos considerar esta vida terrestre como um sonho.”

Edgar Allan Poe

2)“A lembrança da felicidade passada é a angústia de hoje, as amarguras que existem agora têm sua origem nas alegrias que podiam ter existido.”

Edgar Allan Poe

3)“O corpo é a sombra das vestes
que encobrem teu ser profundo.”

Fernando Pessoa

4)“A morte é a curva da estrada,
morrer é só não ser visto.”

Fernando Pessoa

5)“Deus costuma usar o fogo, para nos ensinar sobre água.”

Fernando Pessoa

6)“Querer não é poder. Quem pôde, quis antes de poder só depois de poder. Quem quer nunca há-de poder, porque se perde em querer.”

Fernando Pessoa

7)“Como a arte é longa, e como a vida é breve!”

Johann Wolfgang Von Goethe

8)“Um prazer demasiadamente repetido produz a insensibilidade; não o sentimos mais como prazer.”

Aldous Huxley

9)“Por trás de toda grande fortuna há um crime.”

Honoré de Balzac

10)“Para não serdes os martirizados escravos do Tempo, embriagai-vos;embriagai-vos sem tréguas! De vinho, de poesia ou de virtude, à vossa escolha.”

Charles Baudelaire

11)“Que minha guerra contra o homem se eternize, já que cada um de nós reconhece no outro sua própria degradação.”

Conde de Lautréamont


12)"O homem não é o único a falar, o universo fala, tudo fala, linguagens infinitas.”

Novalis

13)“Tu és O Poeta, o grande assinalado
Que povoas o mundo despovoado,
De belezas eternas, pouco a pouco.”

Cruz e Sousa

02 janeiro 2010

Soneto Ainda Mais ao Fim

Mas da minha alma, Deus, que faço agora,
se mais e mais sou um louco isolado,
se toda esperança é sonho acabado,
se nenhum olho pelo Cosmos chora?

Pois de ocultar-me vejo chegar a hora:
tão somente um coração massacrado
é o que trago caminhando ao meu lado,
é o que te deixo... Sim, devo ir embora.

Exauri as cordas do meu violino
na tentativa de elevar-te além,
na luta insana contra o Gran Destino.

Voto agora ao homem total desdém
e uma carta a um corvo em febre eu assino
na Noite quieta que matar-nos vem...

31 dezembro 2009

Ou Para Apagá-la...

a Arte não pode
dar concessões:
há que se voar ao extremo
e se descer ao abismo

se tens medo
de que o fogo do sol
ou do inferno
incendeie teus olhos
ou que morra na queda
quando a tua asa cansar...

é melhor sentar
deitar
repousar...

na Arte não há meio-termos
não se pode equilibrá-la:
a Arte é para incendiar a chama do peito
ou para apagá-la...

30 dezembro 2009

Soneto ao Não

o longe além dos dias que não vieram
veem como se eu não estivesse cá
todas esperanças que não me deram
é aquela estrela que não está lá

a estrela olho com olho que não é
no alto em promessa como um não perdida
e o seu não fitei com imensa fé
na janela que não foi construída

e a luz que desce ao não ser da janela
vem não a mim em sim de solidão
à chama em não ter aceso uma vela

em paz não beija a minha alma emoção
e me vou sonhar-te em não voo com ela
até os céus de um catastrófico Não

28 dezembro 2009

Fernando Pessoa - O Predestinado - Passos da Cruz I

"Um dia,
lá para o fim do futuro,
alguém escreverá sobre mim um poema,
e talvez só então eu comece
a reinar no meu Reino."

Fernando Pessoa


Entre 1914 e 1916, Fernando Pessoa compôs os 14 sonetos de "Passos da Cruz". Trata-se de sonetos absolutamente perfeitos e inovadores em nossa língua, avançando do Simbolismo para o Modernismo, numa linguagem das mais profundas e enigmáticas, por isso, pouco populares, se levarmos em conta que a obra de Pessoa é muito difundida na atualidade.

Nesses sonetos, o gênio português expressou a sua dramática visão de sua missão como poeta, como artista. Julgava-se um predestinado, solitário e incompreendido, cuja missão ele ainda não conhecia totalmente, mas que seria cumprida de qualquer forma e legada à posteridade.

E assim, de fato o foi. Pessoa jamais teve reconhecimento em vida, publicou apenas um livro, fracassou em seus projetos profissionais, viveu em relativa pobreza, sendo sustentado por amigos e parentes, mas hoje é visto como um dos maiores poetas da literatura universal. Hoje anda de boca em boca, amantes e não amantes de poesia conhecem pelo menos alguns de seus versos e não se cansam de expressá-los em blogs, orkuts, twitter, enviar para os amados e amadas, ainda que não os compreendam inteiramente. Seus livros são incansavelmente editados, reorganizados, espalhados pelo mundo todo. Suas obras estudadas e analisadas infatigavelmente. De modo que Fernando Pessoa tinha razão. Ele era um predestinado.

A partir de hoje, sendo um por semana, publicarei aqui os 14 sonetos de Passos da Cruz, sem comentá-los, deixando que o leitor tenha suas próprias sensações.


Passos da Cruz - Soneto I

Esqueço-me das horas transviadas…
O Outono mora mágoas nos outeiros
E põe um roxo vago nos ribeiros…
Hóstia de assombro a alma, e toda estradas...
Aconteceu-me esta paisagem, fadas
De sepulcros a orgíaco… Trigueiros
Os céus da tua face, e os derradeiros
Tons do poente segredam nas arcadas…

No claustro sequestrando a lucidez
Um espasmo apagado em ódio à ânsia
Põe dias de ilhas vistas do convés

No meu cansaço perdido entre os gelos,
E a cor do Outono é um funeral de apelos
Pela estrada da minha dissonância…

27 dezembro 2009

Poema Fúnebre


deixa assim...
que de nota em nota
a Marcha Fúnebre
chegará ao fim

enquanto eles falam
e gritam e riem e gestam
e sobem e descem e sabem
e vencem e caem e cegam
transpiram publicam rastejam

eu calo-me
num canto
canto sombrio e só
não-visto por todos
ouvido por nada
e só recebi um não
por ter a razão

o Fim
é uma marcha fúnebre
e fúnebre sendo
seu lento andamento
é lento...
lento...
bem lento...

então deixa assim
que eu não falo por mim:
quem fala é o Tempo...

26 dezembro 2009

“Não tive filhos, não transmiti a nenhuma criatura o legado da nossa miséria.”


Com essa sentença, o nosso maior romancista, Machado de Assis, encerrou o seu genial “Memórias Póstumas de Brás Cubas”. O livro foi escrito há quase 130 anos, e hoje tal frase deveria ser seguida como lei. Explico-me...

Irei direto ao ponto, não há muito que ser dito sobre este assunto. As pessoas falam em preservar o planeta com redução da poluição, com preservação da vegetação natural, com conscientização da população, com desenvolvimento sustentável, enfim, todas essas utopias que qualquer ser humano com o mínimo de inteligência sabe que são irrealizáveis. O fracasso de todas as conferências sobre clima e preservação ambiental está aí para provar o que digo. Ter esperanças de que o ser humano vai conseguir reverter a situação com tais atitudes é uma ingenuidade, ou imbecilidade mesmo.

Então, nossa civilização não tem saída? Tem. É só ninguém mais ter filhos. Pronto. Isso é um absurdo? Claro que é. E só esse absurdo pode salvar nossa atual civilização. É tão absurdo que ninguém toca nesse assunto. Já viram alguém falar que essa é nossa única solução? Não, ninguém tem coragem de afirmar tal inaceitabilidade. Eu tenho. E meu raciocínio é de uma impiedosa simplicidade.

Segundo os cálculos científicos, dentro de 40 anos, o mundo, mantendo o atual índice de crescimento populacional, com o aumento da expectativa de vida, terá cerca de 10 bilhões de habitantes. Nosso planeta não está suportando 6, vai suportar 10 bilhões de pessoas? Calcula-se que para sustentar tal população sem que ninguém passe fome, tenha-se que quase triplicar a produção de alimentos. E tirar de onde tantos alimentos, se a atual produção já é insustentável para o planeta? E de onde tirar mais água, se ela já está escasseando? E mais energia? Ou quem sabe as pessoas que nascerem não deverão se alimentar, nem tomar água, nem se vestir, nem acender uma lâmpada? Talvez nem devam respirar...

A verdade simples, lógica, matemática - e cruel - é esta: a humanidade não pode aumentar, se aumentar, o planeta morre, porque ele já nem com o que tem está aguentando. É o mesmo que dar mais sal para um hipertenso que está tendo um infarto. Qual será o resultado? Então, ninguém mais pode ter filhos. Ou, para cada criança que nascer, alguém deverá morrer. E como eu sei que isso não vai acontecer, explica-se todo o meu pessimismo... Esta civilização não tem futuro. Terá que acabar para recomeçar. Ponto final.

25 dezembro 2009

Poemas do Término e Contos do Fim 37


A edição 37 do zine literário Poemas do Término e Contos do Fim será lançada amanhã, dia 26/12. Incluirá os contos "Conto Violento e Inútil" e "De Sangue" e mais 4 poemas insensatos.


Em Santiago, os pontos de distribuição são os seguintes: locadoras Fox, Classic e Stop, biblioteca pública, biblioteca da Uri, Ponto Cópias e Livraria Santiago. Pode ser enviado para qualquer cidade do Brasil ou exterior, mediante o pagamento das despesas de correio.

Agradeço à colaboração dos seguintes amigos na distribuição do zine em outras cidades: Liziane Serafini (Santa Cruz do Sul/RS), Luana Serafini (Santa Maria/RS), Alberto Ritter (Porto Alegre/RS), Gracieli Persich (Santo Ângelo/RS), Louise Wagner (São Leopoldo/RS), Lilene Leverdi (São Gonçalo/RJ), Héder Duarte (São Gonçalo/RJ), Agnes Mirra (Goiana/PE) e Paulo Soriano (Salvador/BA). Agradeço também ao amigo Guilhermes Damian pelo excelente trabalho de design do zine.

24 dezembro 2009

Poema de Natal II


talvez te desejasse felicidades
a felicidade que ânsia pelos dramáticos angelicais
anos-luz de desejos que se afogam
nos impossíveis das idades...
mas não vou te desejar felicidades.

talvez te desejasse saúde
a saúde que sol pelos campos em tons azuis
verdes-luz de paisagens que se somem
nas contradanças do alaúde...
mas não vou te desejar saúde.

talvez te desejasse amor
o amor que céus pelas lunáticas infinitais
beijos-luz de sonhar-te que se vagam
ao som da mais clara cor...
mas não vou te desejar amor.

não, não vou desejar...
nem felicidades
nem saúde
nem amor
nem paz
nem calma

eu só te desejo Alma.
(na imagem, o quadro "Anunciação" de Botticelli)

22 dezembro 2009

Poema de Natal

não deixarei agora em verso
nem espalharei pelo universo
a mínima desgraça andante
golfejarei meu próprio sangue
que tudo é vão e decadente
que tudo é falsa e vã semente
cala-te ânsia pelo meu pranto
suma comigo em teu espanto
nada fique da minha história
que é vão o amor o sonho a glória
que abisme o desejo em meu peito
morra o horror em mim desfeito
mergulhem-me no que é fatal...

brilha puro o astro de Natal.

21 dezembro 2009

Aspire Fundo... e Solte...

se eu tivesse
um pouco mais de inspiração
talvez transformasse em sonho
o ar medonho
que respiro
se eu tivesse um pouco mais
de respiração...
se eu chegasse
a um alto mais de aspiração
talvez transmutasse em dança
o chumbo da esperança
que suspiro
se eu tivesse um alto mais
de inspiração...

se a tua respiração eu inspirasse
talvez aspirasse o ar que me inspira
talvez ventasse a luz que suspira
em tua boca soprada

mas aspirei a tudo
e aspirei o nada

19 dezembro 2009

Visão Final

de tuas fantásticas visões
trago o peito (de) amor... tecido
e sempre irei afoguear-me
no mar de fogo da arte
na cura de chamas românticas
das quais sempre morti... fiquei-me
morri-me vezes várias
e consegui-me curar-me jamais

contigo e tuas pupilas
de íris ocultas de sonhos
a cristais de horizontes
carregados rubros de Fim
meu espírito
que nunca será (demo)lido
verá o Final pelo Início
sublimado
em vapores de lágrima
de teu olho emocio...
nado
no teu choro ao infinito
que é onde vou-me ao jamais...
sonhado

17 dezembro 2009

Versos Erguidos

sempre distante de teu sucesso tedioso
sentenciei-me acabando por entre meus sonhos
e quanto mais fundo me acabo
ergo-me cada vez melhor acabado

sempre longínquo de teu marasmo sensato
acabei-me flechado por trágico orgulho
e quanto mais me dispo de orgulho
ergo-me cada vez mais exaltado

sempre em desprezo de teu saudável sorriso
orgulhei-me de insano em dramática doença
e quanto mais em violência adoeço
ergo-me cada vez mais inflamado

sempre em desgraça de teu vazio perfeito
adoeci-me em tormentas de arcanjos rebeldes
e quanto mais sem consolo rebelo-me
ergo-me cada vez mais rebelado

sempre em fracasso de teu destino traçado
rebelei-me sendo Rei sempre ao descer
e quanto mais aos abismos me desço
ergo-me cada vez mais elevado

Agradecimento Geral

Agradeço aos amigos que estão divulgando o texto abaixo em seus blogs pelo Estado afora. Obrigado.

16 dezembro 2009

Eu Acredito em Papai Noel, Yeda Crusius, Marco Peixoto e Expresso Ilustrado


Como o Natal está chegando, quero, agora, solenemente, afirmar que acredito no Papai Noel. Sim, é verdade. Ele trouxe-me vários presentes quando eu era criança. Alguns invejosos insistem em tentar fazer-me crer que era meu pai vestido de Papai Noel, mas não... Era o bom velhinho sim! Eu apenas ainda não descobri de onde ele conseguiu os presentes, mas estou certo que vou descobrir em breve, pois pretendo adicionar o Papai Noel no msn, ou no orkut, se ele não quiser me passar o msn.


E além do Papai Noel, acredito na nossa querida governadora Yeda Crusius, sempre tão sincera, bondosa, pacífica e amiga do funcionalismo. Dizem que ela comprou uma casinha com dinheiro de campanha, que participou ou encobriu esquemas de corrupção, mas eu duvido. Para mim, que tenho um imenso coração sempre pronto a perdoar os erros humanos e perdoo os que falam mal da governadora, a Dona Yeda não fez nada disso, muito pelo contrário, ela está se sacrificando para colocar o Estado em equilíbrio e para acabar com as farras dos professores, esses desabusados, preguiçosos, que só sabem reclamar. Tudo bem, admito que não vejo equilíbrio em parte alguma no Estado, mas a culpa é minha. Eu fico só na internet e não acompanho os jornais. E na internet dizem que o aumento para os professores dado pela governadora é uma farsa. Mas que absurdo! Essa gente nunca está contente com nada. Querem decerto ganhar uns dois mil por mês! Só para dar umas aulinhas bestas para uns aluninhos que já sabem tudo? Pobre da governadora, só ela para aguentar tanta chateação. É uma santa!


E santo também é o deputado Marco Peixoto, grande homem, eu me orgulho de ser santiaguense como ele, e para mim tudo o que ele diz é verdade, pois eu o conheço, é um gaúcho do pampa, um homem de confiança, que honra o fio do bigode, mesmo que ele não tenha bigode. Ele não mente nunca! Isso é fato. Agora não queriam que ele fosse conselheiro do Tribunal de Contas do Estado... Mas por quê? Dizem que ele está ou esteve envolvido em algumas coisinhas meio ilegais, algumas continhas meio obscuras, uns envolvimentozinhos meio feinhos, mas isso quem é que não tem? Tais coisas é que deixam a vida emocionante. Mas mesmo assim, estou certo que ele não tem envolvimento nenhum. Sabem por quê? Por que ele já chegou a chorar no plenário. Que homem santo! Não te preocupa, estou contigo, Marcão! Mas quando eu te pedir, vê se me ajuda, né!


E acredito no jornal Expresso Ilustrado como um veículo de informação absolutamente confiável, que jamais omitiria uma informação da população santiaguense. Assim, se o deputado Marco Peixoto, ou qualquer outra pessoa, tivesse algum podre, todos nós já saberíamos. Estou absolutamente certo de que o ilibado jornal Expresso Ilustrado divulgaria. Tal jornal é a fina flor da sociedade santiaguense, e nele não há lugar para omissões, puxa-saquismos ou censuras. Sim, jamais alguém, seja quem for, será censurado por este jornal, baluarte e símbolo da democracia brasileira. Por mais que alguém diga certas verdades inconvenientes que não estão de acordo com a orientação deste pomposo veículo de imprensa, o que é absolutamente normal dentro do estado democrático, ele sempre permitirá a livre expressão humana em suas páginas. E viva Santiago!


Finalmente, acredito que todos os que acima mencionei, dentro de 50 anos, serão lembrados como grandes filhos da humanidade, terão suas vidas estudadas nas escolas e seus feitos glorificados aos quatro ventos.


Ah, e o Coelhinho da Páscoa está aqui comigo agora. Quem disse que ele não existe? Quem quer um ovinho?


15 dezembro 2009

Cruz e Sousa: o Maior Poeta Brasileiro


Considero Cruz e Sousa como o maior poeta entre os brasileiros. Estou certo que bem poucos, pouquíssimos, concordarão comigo. O Simbolismo, em nossas terras, não é visto com bons olhos, geralmente. Justifico minha opinião. Cruz e Sousa é um dos raros poetas no Brasil que conseguiu unir perfeição formal com uma expressão absolutamente profunda e original. Se considerarmos o contexto em que criou sua obra, dominada pelo artificialismo parnasiano, a obra angustiada e sincera de Cruz e Sousa surge de forma ainda mais surpreendente.


Para mim, o Poeta Negro é tão elevado quanto os grandes simbolistas franceses. Certa vez, um crítico de que não me recordo o nome, afirmou que se Cruz e Sousa fosse europeu e branco, seria tão reconhecido como os maiores simbolistas do mundo. Dizia ainda o crítico que o poeta brasileiro é mais sublime que Baudelaire, mais profundo que Verlaine, mais sincero que Mallarmé. E eu concordo totalmente.


O que mais impressiona foram as condições em que a obra de Cruz e Sousa foi criada. Não bastasse ele ser negro e sofrer com o preconceito que era muito mais intenso na época, ou mais evidente, pois hoje ele é mais mascarado, ainda sofria de tuberculose (doença que também vitimou três de seus filhos), sua esposa Gavita, que tanto amava, enlouquecera, e recebia um mísero salário da Estrada de Ferro Central do Brasil.


E foi assim que o "Cisne Negro" nos legou uma das obras mais autênticas de nossa literatura, intensamente espiritual, versos advindos da alma capazes de enternecer nosso coração. Uma poesia pulsante de luz e sombra, trágica, angustiada, inquietante, de incomparável musicalidade, mergulhada no mistério da vida e do universo. Abaixo, um de seus Últimos Sonetos.



COGITAÇÃO


Ah! mas então tudo será baldado?!
Tudo desfeito e tudo consumido?!
No Ergástulo d'ergástulos perdido
Tanto desejo e sonho soluçado?!


Tudo se abismará desesperado,
Do desespero do Viver batido,
Na convulsão de um único Gemido
Nas entranhas da Terra concentrado?!


Nas espirais tremendas dos suspiros
A alma congelará nos grandes giros,
Rastejará e rugirá rolando?!


Ou entre estranhas sensações sombrias,
Melancolias e melancolias,
No eixo da alma de Hamlet irá girando?!

14 dezembro 2009

Decepção

é como se fosse
a noite sem fim do Fim que me embriaga
esperanças que correm pelas luas claras
poções de sonhos das mais santas magas
olhos profundos das corujas altas
promessa em luz em catedrais mais vastas
cantos de ave em imensidões tão largas
rezas de anjo de pulsar tão gratas
amor em deuses por mais belas almas
enfim estrela alva iluminada...
é como se fosse tudo!

mas não é nada.