09 abril 2012

Soneto ao Após

palavra que sinto quando me esqueço
o que é que de ti lembrar-me te faz?
água que alonga ao instante fugaz
nada que traga o meu não ao avesso

seja comigo ao altar do teu preço
verbo-destino que segue-me atrás
silêncio que os muros quebra do mas
sonata que cala ao som do que esqueço

ah se eu corresse em teu rio sempre em chama
íris que fosse no som desta voz
braço sanguíneo que se ergue da lama

verso de nunca que se alta no após
ah se teu quem fosse o onde me chama:
deixa esquecer-me e lembrar-te entre nós...

06 abril 2012

Sexta-Feira Fúnebre

tristeza de não-antídoto
e sorriso de fundo trágico:
o que é o afinal do que seja válido?
o que me importa é teu gesto lânguido
o que me sonha é teu rosto sânguino:
o resto se arrasta rápido...

no horizonte de roxo há um pórtico
e o grave da vela na agonia da lâmpada
sombra escarlate cálida e tântrica
e halos à lua pulsando em céu dístico

o longínquo-ausência de um ósculo
e o algo de fim no teu olhar crístico

04 abril 2012

O Político (Ou do Justo Motivo de um Político Necessitar Desviar as Verbas Públicas)

Agora, estão dizendo que sou desonesto. Nada sabem sobre os desígnios de um grande político. Queria que os que me criticam estivessem em meu lugar. Eu também já fui um grande idealista. Em minha juventude, queria mudar, não, mais que isso, queria revolucionar minha cidade, meu Estado, minha Pátria, e, por que não? o mundo. Eu me sentia capaz das maiores realizações, dos feitos mais nobres e grandiosos, dos atos de heroísmo, do sacrifício pela nação... E eu me via, em meu magnânimo futuro, rodeado de todas as glórias, adorado pelo povo, um símbolo do que é correto, justo, enfim, um grande homem, o maior dos políticos.

Mas não pensem, meus senhores, minhas senhoras, não pensem que eu abri mão de todos esses ideais sublimes. Não, eu apenas os adaptei aos nossos tempos, às necessidades da sobrevivência. Ao contexto de nossa sociedade. De nossa civilização moderna, onde não há espaço para ingenuidades. Os ideais de um grande homem continuam vivos e ativos em meu interior, em minhas atitudes, sempre arraigadas na honra e na dignidade. Isso é que é ser honesto, honesto em manter a minha palavra de homem, qual seja, a que um dia prometeu lutar pelo bem-estar e pelo progresso do povo e da nação. Isso, eu estou certo que realizo com todos os méritos.

E nos meus discursos, qualquer um poderá comprovar a verdade intrínseca do que afirmo. Vejam, percebam como o meu verbo é forte, intenso, inflamado! Quem poderá duvidar da veracidade das minhas palavras? Quando discurso para o meu povo, eu encarno o espírito dos grandes estadistas, dos paladinos do passado, dos bem-feitores da humanidade. Muitas vezes, já chorei, derramei as minhas lágrimas, lágrimas sinceras, profundas, sentidas, quando me dirigia àquelas pessoas, vendo-as ali, com os olhos brilhantes de esperança, crentes no meu poder de melhorar suas vidas. Ah, como isso é belo, como é emocionante! E eu nunca as decepcionei!

Mas agora, agora vêm esses inimigos do povo, inimigos dos batalhadores da Pátria, atirar pedras na minha vida exemplar, acusar-me de roubo, de corrupção, de tráfico de influência, de crime de responsabilidade, de desvio de verbas... É como sempre digo: quem não está no poder, não sabe como deve agir quando se está no poder. Acreditam que podem ser um grande político sendo um reles santinho. Assim, serão esmagados. Devem entender, esses ingênuos, que estamos no meio de lobos. Entre feras. Já dizia o poeta que quem vive entre feras sente necessidade de também ser fera. Isso não é ser corrupto. É apenas ter consciência do lugar em que nos encontramos. Já que estou aqui e que cumpro com o meu dever, por que não? É justo que eu seja muito bem pago pelo meu serviço, que é fruto de anos, anos! de esforço, de dedicação, de reflexão sobre a vida, de criação de laços de amizade, de enfrentamento de inimigos, de sacrifícios voluntários, de dias e dias longe da família, da pessoa amada, para ficar ali, em meio a homens sórdidos, raposas ardilosas, criando pactos, alianças, sabendo a hora certa de apertar o gatilho. E aí, então, depois disso, eu sou um ladrão? Mas o que é isso? Onde é que estamos?

Meus amigos, tudo depende do ponto de vista. O que é desviar uma verba? O que é uma verba? Entendo que a verba pública, e os senhores hão de concordar comigo, é para o bem-estar do povo. Então, digamos que eu tenha me apropriado de alguma verba pública. Se o fiz, foi porque considero que foi para o bem-estar de todas aquelas pessoas as quais represento. Exatamente. Compreendo perfeitamente a importância da minha pessoa para a nação. Deixemos de falsa modéstia. Eu merecia aquele dinheiro. Merecia, primeiro por que batalhei muito para estar onde estou. E cumpro as obrigações de um homem eleito pelo povo. Estou dia e noite preocupado com o bem-estar da população, com o desenvolvimento do país. O que mais desejo nesta vida é contemplar a felicidade do meu povo, dos meus eleitores. E estou trabalhando para isso. E quero trabalhar ainda mais. Então, agora, entendam este ponto fundamental: para isso eu preciso de dinheiro.

Sim, eu sei que dirão que deputados e senadores já ganham muito. Mas dizem apenas por ignorância.  Por absoluto desconhecimento das inúmeras funções e atribuições de um bom político. Nosso salário não dá para nada, no que se refere ao exercício de nossas funções. Se eu não fosse um grande político tão cheio de responsabilidades, se não necessitasse de tantos assessores, de tantas pessoas de confiança, de tantas amizades imprescindíveis para o devido desempenho do meu cargo, tudo bem, o salário seria ótimo. Porém, infelizmente, não é assim. Eu preciso comprar pessoas. Digam o que quiserem, mas é assim. Se eu não comprar pessoas, que político serei? Quem estará do meu lado? Quem apoiará minhas ideias? Quem divulgará o meu nome, as minhas promessas, as minhas inúmeras realizações? Quem alardeará para toda a nação o grande homem, o genial político que sou?

Percebam, eu precisava daquele dinheiro, daquela pequena, exígua parcela daquela verba para continuar a realizar o bem para o povo. Foi uma necessidade que somente os grandes homens compreendem. Eu tenho que fazer favores para aqueles que me auxiliam nesta dificílima empreitada que é engrandecer a nação e tirar o povo da miséria. Ou será que não sabem que ninguém faz nada de graça? Aqueles homens e mulheres que me auxiliam, que possibilitam a minha atuação pelo povo, também necessitam da sua parte. Do seu pagamento. Claro que esse pagamento nem sempre se refere a uma soma em dinheiro. Às vezes é alguma outra necessidade dessas pobres pessoas, tão serviçais, que dão suor e sangue pelo nosso Brasil. Eu, como o homem justo que sou, devo atender justamente às reivindicações dessa gente que vende os seus prestimosos serviços, os serviços de suas empresas, de seus jornais, de seus blogs, que vendem as suas valiosas opiniões, enfim, que vendem a si próprias! Observem o gigantismo de tamanhos sacrifícios! E isso nem sempre sai barato, naturalmente.

Claro, às vezes, apenas pedem como pagamento um empreguinho aqui, uma informaçãozinha ali, uma participaçãozinha acolá, um patrociniozinho mixuruca, enfim, essas coisas simples, nada de mais. Porém como que vou possibilitar tais coisas a essas pessoas tão úteis, que são tantas, se eu não tiver dinheiro, poder econômico, influência política? E vou tirar dinheiro de onde? Ora, claro que das verbas públicas, exatamente pelo motivo de que eu as usarei para o bem da nação, e isso é algo inquestionável, indubitável, irrebatível, conforme atestam meus argumentos. Não é um desvio de dinheiro, é um emprego inteligente de uma verba que seria desperdiçada em alguma obra desnecessária. E que depois ainda acabaria abandonada. E esse dinheiro indevidamente definido como “desviado” nem ficou em minhas mãos. Foi para quem mais necessitava: aqueles que estão sempre do meu lado (e, por conseguinte, do lado do povo), auxiliando-me na minha divina missão.

Ah, irão dizer que isso a lei não permite? Ora, os grandes homens, os gênios devem estar acima da parca lei humana. Quantos feitos grandiosos nunca teriam sido realizados se não houvesse os corajosos que enfrentam todas as leis, nem sempre justas, os padrões estabelecidos, o senso comum, que vão contra todos os preconceitos e julgamentos ofensivos? Sei que este é o meu caso. Sim, podem me classificar como um ladrão, um salafrário, um cafajeste, seja o que for, eu aceito, em nome da nação pela qual sofro e me sacrifico. A minha consciência resplandece em absoluta tranquilidade. A tranquilidade do dever cumprido.

03 abril 2012

Década 2001 - 2011 foi a Mais Quente já Registrada, segundo a ONU

Apenas transcrevo a notícia veiculada no jornal Correio do Povo do dia 24 de março deste ano, na página 14:

"A década de 2001-2011 foi a mais quente registrada desde 1850 (ano em que tiveram início os registros climáticos) em todos os continentes do globo, indicou a Organização Metereológica Mundial (OMM), organismo ligado às Nações Unidas. A temperatura média durante esta década foi de 14,46 ºC, ante 14,25°C em 1991-2000 e 14,12ºC em 1981-1990. 

'As mudanças climáticas se aceleraram durante esta década', afirmou a OMM, acrescentando que o 'ritmo de aquecimento desde 1971 é notável'. Segundo a OMM, o retrocesso constante da camada de gelo do Ártico é uma das principais características da evolução do clima nos últimos dez anos.

Em relação à década 2001-2010, o ano de 2010 foi o mais quente observado desde 1850, com uma média de 14,53ºC, seguido de perto por 2005 (14,51). Fenômenos atmosféricos como o La Niña 'esfriaram o clima em alguns anos', mas não interromperam a 'tendência geral do reaquecimento'. 'O mundo está aquecendo por causa da atividades humana e isto está resultando em um impacto potencialmente irreversível', declarou o secretário-geral da OMM, Michel Jarraud." Até aqui a notíciaa do referido jornal.

Com relação à irreversibilidade do aquecimento, conforme notícia veiculada pela Reuters (aqui), o cientista Will Steffen, diretor-executivo do instituto para a mudança climática da Universidade Nacional Australiana, em uma conferência em Londres, "Essa é uma década crítica. Se não revertermos as curvas nesta década, vamos ultrapassar esses limites".  Steffen continua: "Estamos no limiar de algumas grandes mudanças. Podemos... limitar o aumento das temperaturas a 2ºC, ou cruzar o limite além do qual o sistema passa para um estado bem mais quente."

De acordo com a Reuters, "no caso das camadas de gelo, cruciais para desacelerar o aquecimento, esse limiar provavelmente já foi ultrapassado, segundo Steffen. A capa de gelo da Antártida ocidental já encolheu na última década, e a região da Groenlândia perde 200 quilômetros cúbicos de cobertura por ano desde a década de 1990.

A maioria dos especialistas prevê também que a Amazônia se tornará mais seca em decorrência do aquecimento. Uma estiagem que tem matado muitas árvores motiva temores de que a floresta também poderia estar perto de um ponto irreversível, a partir do qual deixará de absorver emissões de carbono e passará a contribuir com elas.
Cerca de 1,6 bilhão de toneladas de carbono foram perdidas em 2005 na floresta tropical, e 2,2 bilhões de toneladas em 2010, o que reverte cerca de dez anos de atividade como "ralo" de carbono."
Sem mais.  

02 abril 2012

O Meu Ato

é alto o perigo em ser poeta
(ah quem dera
fosse só perigo...)
há que se andar sobre o rio da navalha
(ah quem dera
fosse um sol comigo...)
a que me destino
e a voz rouca do infortúnio mudo
há que virar hino...

para esperar-te no onde me esperam
de minhas esperanças
ao vento
tornado assassino
perdi-me
encontrando para outros
o intento
tornado escravo
dos versos livres
que me imagino...

lá nos confins do que se finda
em busca do que não estava
“vim, vi e venci”
e o deixei
sobre o leito de granizo
e piso
e parto
(partindo sem fato)
um após deixando
como meu ato

mas não pedirei nem um não
de gratidão

31 março 2012

Imagem sob uma Melodia de Brahms

imagem que vejo o que tu não és
em teu não-ser é que estou:
a felicidade
(assim, isolada)
é aquilo que imagino que está
no que não está em ti
sou feliz no reflexo de mim
que reflexiono em tua ausência:
tu só podes ser
se te sinto na minha consciência

imagem que vejo o que te projeto
o meu sonho é o sonho que tu não tens
eu que sinto o teu não sentir
e tu vives por sentir em mim
e tu sonhas quando vivo em ti
sorrio quando povoo a tua ausência
tu só podes ser
se eu te sou a tua essência

imagem que vejo o que desejo
há outro mundo em ti que não habitas:
sou eu que astro o teu éter
eu que piano o teu canto
uma lágrima ao que em ti silência
imagem do meu alto
a minha alma
compensa a tua ausência

29 março 2012

Rinocerontes a um Passo da Extinção

Prossigo com aquelas notícias que enobrecem a humanidade. Como já sabem os que acompanhem o blog, não farei nenhum comentário. Limito-me a dizer que algumas pessoas não dão a mínima à extinção de alguma espécie, desde que o homem continue parasitando a Terra. Já eu, sofro muito com isso. Sou um retrógrado sentimental.
Ao final da noticia, deixei uma petição da Avaaz, que tem o intuito de ajudar a frear a matança de rinocerontes. Se interessar ao amigo leitor, pediria que assinasse. Agradeço. 

Demanda asiática faz caça de rinoceronte bater recorde na África

"Um número recorde de rinocerontes foi caçado neste ano na África do Sul, país que tem a maior população mundial desse animal, num reflexo da crescente demanda asiática por seus chifres.


Pelo menos 443 rinocerontes foram mortos neste ano na África do Sul, 110 a mais do que em 2010, segundo conservacionistas e autoridades dos parques nacionais sul-africanos.
O valor de mercado dos chifres de rinoceronte disparou para cerca de 65 mil dólares por quilo, o que torna esse produto mais valioso que o ouro, a platina e, em muitos casos, a cocaína. Isso se deve à crença que se espalhou nos últimos anos na Ásia, embora sem fundamento científico, de que a ingestão do pó de chifre pode curar ou prevenir o câncer.
Mais de 20 mil rinocerontes vivem na África do Sul. Há uma década, apenas cerca de 15 animais morriam por ano. Mas por volta de 2007 a caça passou a aumentar drasticamente, por causa do aumento do poder de compra de parte das populações de países como Vietnã e Tailândia.
Agora, o número de rinocerontes abatidos legal ou ilegalmente chegou a um ponto que ameaça levar ao declínio populacional, segundo estudo realizado pelo especialista Richar Emslie.
Especialistas dizem que uma "corrida armamentista" está acontecendo no parque, pois quadrilhas internacionais oferecem aos caçadores recursos como armas de alta potência, óculos de visão noturna e até helicópteros.
Em outro estudo divulgado nesta semana, conservacionistas apontavam que 2011 será um ano recorde em grandes apreensões de marfim na África, o que também reflete a demanda asiática pelas presas de elefantes, usadas em joias e adornos."
A Avaaz esclarece: 


Nas próximas semanas, a UE definirá sua agenda para o grande encontro mundial que acontece dentro de poucos meses. Será a nossa melhor chance de virar a maré contra essa matança. Sabemos que os rinocerontes estarão em sua agenda, mas apenas nossa pressão pode garantir que eles discutam o problema em sua essência. Vamos criar um protesto gigante e fazer uma ação de forma espetacular. 


Fonte: http://www.estadao.com.br/noticias/internacional,demanda-asiatica-faz-caca-de-rinoceronte-bater-recorde-na-africa,816778,0.htm

28 março 2012

O que está à Frente

todo passo a ser dado
já é passado
lá em alguma esfera
(tudo é outra era)
o futuro é o esquecimento do agora
(ah o homem
que não sente sentir a hora...)

cada segundo que vem
já foi
era
o que já havia se acontecido
antes de nos acontecer
que viver
é dar passos de um ponto
do começo do círculo
para passar a um ponto
do começo do círculo

a vida é uma hora
que sempre foi embora
e aquele que faz
é quem se sabe fugaz
na eternidade do instante:
o que há muito passou
é o que está mais adiante

olhei então para os montes
aqueles longínquos a frentes
enfrentando horizontens...

27 março 2012

De Rato

então
ele sentiu aquele gosto de esgoto
que quando é tragado
traga a quem traga
como se almoçasse a própria praga
com um suco de álcool de posto

então sentiu aquele gosto de rato
como se um deles mijasse no prato
e um pedaço de merda no copo
ardendo pelo vazio do esôfago
e ouviu o baque báquico
de sua queda
na pulcra úlcera do estômago

então sentiu aquele gosto do tarde
como se mastigasse o cáustico
(tremendo as mãos dormentes)
com o farelo da quebra dos dentes
e sangue de porca num jarro
no desespero do erro
inflamado pelo catarro

então sentiu aquele gosto de gente
e garganta de traqueia exposta
(a lição de não vomitar bosta)
naquele ato do após que falava
quer era engolir
palavra por palavra

25 março 2012

Da Imbecilidade Acadêmica

Amigos leitores, acompanhem a notícia abaixo: 

"Carlos Camacho Espíndula, 25 anos, residente no município de Francisco Beltrão, localizado na região sudoeste do Paraná, entrou em convulsão e evoluiu para óbito após uma maratona de 12 horas de leitura de obras científicas para a finalização de seu Trabalho de Conclusão de Curso.(...)
Sua monografia deveria ser entregue na próxima segunda-feira (12/03) para o Prof. Helvécio Dias Barroso, que está sendo investigado por homicídio culposo em função das excessivas cobranças em relação a leituras e correções na redação do TCC."  Aqui, pode-se saber mais a respeito.



Muitos blogs divulgaram essa notícia, inclusive este, a partir de outros blogs.  No entanto, algumas pessoas que residem em Francisco Beltrão, PR, estão afirmando que esta notícia é falsa, que o estudante e o professor na verdade não existem, que ninguém morreu de estudar. Bem, talvez não. No entanto, o que escrevi sobre a imbecilidade acadêmica abaixo é independente de alguém morrer ou não devido a exigências absurdas de professores que matam a criatividade. Essa sim, morre diariamente em nossas universidades. Portanto, não retiro uma palavra do que escrevi abaixo.

Absurdos como esses (sejam reais ou não) é o que se pode esperar de professores e universidades que não ajudam a construir seres pensantes e criativos, mas apenas alguns medíocres repetidores de ideias de outros, profissionais mecânicos, robóticos, imbecilizados. Os cursos acadêmicos em geral, em especial mestrado e doutorado, em uma grande parcela, já se tornaram ou estão se tornando destruidores de cérebros e corações. Destruidores de humanidade. Com a desculpa de severidade e exigência para manter-se um alto nível de qualidade, os estudantes não têm o direito de pensar por si próprios. Como dizem, são "podados" em suas ideias e ideais, em sua criatividade e imaginação. 

Já não se pode mais ser original.  A originalidade é um crime em nossos dias. "Deus-o-livre" afirmar algo que já não tenha sido afirmado antes por alguém de autoridade reconhecida. O embasamento teórico deixou de ser um meio para a criação, agora é um fim em si mesmo. Deve-se ler 500 livros em um mês (não há nem tempo para se pensar sobre o livro), saber exatamente o que outros autores pensam e pensar exatamente como eles. "Tu disseste algo? Mas baseado em quê? Em quem? Quem foi que disse isso? A tua ideia simples e pura não pode ser, não pode estar aqui."  

É claro que todo estudante sério deve possuir um conhecimento profundo de sua área. Mas isso não é e nunca será o mais importante. A criação, o novo, o original, seja da área que for, não surge de leituras estéreis e de textos artificiosos, não nasce de uma mente abarrotada de informações e teorias. Eu nunca soube de um autêntico gênio que tivesse saído diretamente das cadeiras das academias. Pelo contrário. Os gênios, ainda que tenham frequentado universidades, sempre foram combatentes do pensamento "bitolado" que impera entre o ranço dos acadêmicos. Se não combatessem, jamais teriam criado. Seriam como todos os outros, meros papagaios que só sabem repetir, sem a mínima personalidade. 

A criação é fruto da vida e da alma. De ambas vividas e sentidas da forma mais intensa e profunda. O resto é conversa fiada. 


24 março 2012

O Silêncio é Ouro...

melhor que afirmar
é sugerir...
quem afirma tudo o que fala
(pavão a empenar-se  na sala)
viola as portas de violino do silêncio
com a violência de um touro...
que se deixe o silêncio dizer de si:
o que se silencia
vale seu som em ouro...

gosto de (não) dizer
o que  não está (ou sim)
pelo entre do que digo
não quero que quem me leia
esteja lendo de si para comigo
e melhor ainda
é aquilo que nunca disse
verso sorrateiro furtivo
sussurro selado pelo vento
que nem sequer existisse...

a verdade nunca se sempre de frente
há que se por um porém
entre o que ela é
e o que dela se vê
verdade é o que está sempre latente
a possibilidade ainda não alcançada
(a protegê-la do que é gente)
por isso só
sólita em signos
e criptografada

há um só sentido
(mas que são vários
ou  vários...)
e para provar
que não afirmei nada
poderia ter dito tudo isso
pelos contrários...

(Revisão do poema de mesmo título publicado em 5 de julho de 2011.)

23 março 2012

22 de Março, Dia Mundial da Água, e 50% da Vida Marinha Aniquilada

O que ocorre com a água do nosso planeta, desde rios, lagos, aquíferos até mares e oceanos, é uma verdadeira catástrofe. A vida aquática está sendo exterminada a uma velocidade espantosa. E o ritmo de destruição é maior do que a mais pessimista das estimativas. 

É o que afirma um levantamento realizado por especialistas que integram o Programa Internacional sobre o Estado dos Oceanos (IPSO, na sigla em inglês), uma entidade formada por cientistas e outros especialistas no assunto. Concluiu-se que fatores como a pesca excessiva, a poluição e as mudanças climáticas estão agindo de uma forma tão destrutiva que não havia sido antecipada. Segundo dados e cálculos científicos, já quase 50% da vida marinha está aniquilada, com milhares de espécies já extintas ou em risco iminente de extinção. Da vida dos rios, eu preciso dizer alguma coisa? Basta lembrar-se de como eram os nossos rios, aqui mesmo da nossa região, e como se encontram hoje.

Alex Rogers, diretor científico do IPSO e professor da Universidade de Oxford, comentou: As conclusões são chocantes. Estamos vendo mudanças que estão acontecendo mais rápido do que estávamos esperando e de formas que não esperávamos que fossem acontecer por centenas de anos. Ainda contamos com boa parte da biodiversidade mundial, mas o ritmo atual da extinção é muito mais alto (do que no passado) e o que estamos enfrentando é, certamente, um evento de extinção global significativa”. Sobre esse assunto, mais aqui.

Será que nem falando em perdas financeiras, que é a única coisa para a qual a humanidade dispensa alguma atenção, algo será feito? O editorial do jornal Correio do Povo do dia 21 deste mês trata exatamente dessa questão. Segundo um estudo  do Instituto Ambiental de Estocolmo, as emissões de gases ao redor do planeta podem causar danos de mais de 2 trilhões de dólares devido a perdas na vida marinha, causadas por acidificação dos oceanos e diminuição dos níveis de oxigênio das águas.

O grande oceanólogo Jacques Costeau advertiu-nos certo dia: 

"A última consequencia, de trinta a cinquenta anos depois que os oceanos morressem, seria a extinção da espécie humana. Confinados às áreas entre os mares mortos e montanhas estéries, sofrendo de desnutrição, epidemias e sem abrigo, os humanos finalmente sucumbiriam à anoxia, ou à falta de oxigênio. Então, a vida na terra ficaria reduzida a bactérias e algumas espécies de insetos remanescentes."

21 março 2012

Do que me restou de Humanidade...

o que me restou de humanidade
é o que me foi sem ser tirado
dos debaixos dos meus pés

o que os homens conhecimento dizem
é caminho sempre mais para vazio
e punhados de gotas de pós

o embrutecimento de todos os sentidos
no sem-sentido que proclama flâmulas
por  horizonte que não é

o solene sufocamento do que Ideal
que substituídos por  feijões no prato
nos queima desde lá de céu

intelectos entupindo éteres coronários
e pedaços de nadas em palavra morta
querendo dizer o que não são

o que foi que viveram no lugar da vida?
e que me dizem do som de que esfera há?
mas eu ainda acredito em Bach.

(Minha humilde homenagem ao Pai da Música Moderna, Johann Sebastian Bach, que hoje, 21 de março, completa 327 anos.)

20 março 2012

de Números e de Cosmos

há sempre (o) um que é o último
(último não no ser do que é
mas para aquele que sabe do que é
sem saber do seu ser)

por mais infinitos que sejam os números
ninguém os conta para sempre...
por mais infinito que seja o cosmos
ninguém o percorre no seu todo...
(ao menos não como sendo o que se é)

mas se o cosmos é infinito
o que é afinal isso de ser?
se eu estou aqui
por que um outro não pode estar lá?
e por que um outro lá e não eu?
o que existe infinitamente
pode existir e ser como sem-limite
e tudo pode (deve) ser possível:
dizer “é infinito”
é sustentar que tudo existe

mais ainda assim
há um momento
em que não mais
há sempre um último
em tudo que é
(ou que não foi)
que pode ser o primeiro
de um outro outro
mais acima
ou mais abaixo
em que não acho...

mas (e) há uma inviável volta
após uma derradeira vinda...
quem dera este poema
ainda dissesse mais
(e talvez diga)
mas ele aqui se finda

 (Revisão do poema de mesmo título publicado em 20/06/2011.)

17 março 2012

Ainda mais Comigo

aquilo que é dito
é dito apenas para si mesmo
e para quem é como o si mesmo
porque já o era assim
antes daquilo que foi dito

ninguém quer ser con(vencido)
e menos ainda
quem já é convencido

cada um tem sua própria verdade
e só se convence daquilo
que convence sua própria verdade

quem sabe
sabe apenas para quem sabe

então
por que é que digo?
para que a minha verdade
seja ainda mais comigo