Matei-o alguns meses depois do início de nossa “amizade”. Necessitei de uma paciência de Jó para suportar todo esse tempo fingindo concordar com todas suas baboseiras intelectualizadas. Aconteceu em uma noite sem lua, como quase todos os meus assassinatos. Não há nada de místico nisso, era apenas para evitar ser visto à luz do luar. Eu sempre escolhia as noites mais obscuras. Obviamente, com grande antecedência, escolhia a mais apropriada noite para o crime, escura, sem movimentação nas ruas (geralmente nas madrugadas de segunda para terça, durante o inverno) e quando sabia que a polícia estava muito ocupada com algum crime de elevada importância. Logicamente, procurava me garantir que a vítima estivesse sozinha em casa. Minhas vítimas, na maioria das vezes, moravam sozinhas. É claro que eu já avaliava esse detalhe antes de escolher quem mataria. O momento mais propício, que comportasse todos os quesitos mencionados, poderia demorar a chegar. Mas eu era paciente.
Eu havia comprado duas pistolas e um silenciador no mercado negro. Isso, vários meses antes de cometer o primeiro crime. Naquela noite, levei os três artefatos comigo, nos bolsos do sobretudo. Vesti minhas luvas. Não estava nervoso. Talvez, apenas excitado pelo momento de triunfo que se aproximava. Fui a pé até a casa de meu “amigo”, esgueirando-me pelas sombras das ruas. A quietude naquela noite fria era completa. Estava praticamente certo que ninguém me vira. Bati suavemente em sua janela, sabia que ele tinha um sono bastante leve. Imediatamente, acordou. Declarei que precisava falar com ele sobre algo muito importante. Meu amigo abriu a porta, estava bastante surpreso e parecia um pouco preocupado.
Entrei e sentei-me calmamente na sala. Ele perguntou do que se tratava, deveria ser algo grave para eu estar lá naquela hora, com aquele frio. Procurei tranquilizá-lo, dizendo que não era algo realmente grave, mas apenas uma informação importante que soubera há pouco sobre ele e que julguei adequado transmitir-lhe o mais rápido possível. Perguntou curioso e tenso qual seria a informação. Declarei que havia alguém que o odiava infinitamente. Ele questionou-me, visivelmente nervoso, quem seria, e o porquê de tanto ódio contra ele. Antes de continuar, pedi para ir ao banheiro. Fui. Lá, coloquei o silenciador na pistola e guardei-a novamente no bolso do casaco.
Tão logo retornei, comecei a explanar os motivos de alguém o odiar tanto, aqueles meus motivos já mencionados. Meu amigo ficou atônito, não parecia acreditar. Garanti-lhe que era verdade. Perguntou com ansiedade e autoritarismo quem seria a pessoa. Meu ódio por aquele soberbo imbecil atingiu então o auge. Disse, friamente, que preferia lhe dizer ao ouvido. Levantei-me com arrastada calma, para intencionalmente lhe irritar, e sussurrei: “sou eu”. Tirei a pistola do casaco e encostei o cano com o silenciador no centro da sua testa. Ele julgou que eu estivesse brincando e esboçou um abjeto sorriso amarelo. “Mas o que é isso?” perguntou, ainda sorrindo. “Além de idiota, é cego?” retorqui ferozmente. Finalmente, ele se deu conta do que estava acontecendo. Então, por um átimo, pude ver o medo real e suplicante em seu olhar, até então sempre vidrado de orgulho. Mas antes que ele tivesse tempo de soltar um grito imundo, desferi dois tiros na cabeça.
Cuidei para que nenhum respingo de sangue ficasse em minha roupa. Em seguida, sem perder a calma em nenhum momento, limpei a arma com um pano que ali estava e a tornei a guardar no casaco. Era o momento da prática de magia negra. Sua execução não levou mais que 7 minutos. Até porque o seu ponto principal era assassinar uma pessoa sentindo-se um ódio extremo pela mesma. E isso, já fora feito. Restava pronunciar as fórmulas e mantrans secretos e realizar algumas gesticulações estranhas. Concluí o breve ritual e voltei para casa sorrateiramente. Agora, eu era um assassino. Sentia-me bem. E, se a magia negra estivesse certa (ou a minha loucura), dentro de quatro dias eu teria a alma daquele idiota servindo-me como uma escrava...
(Amanhã, a parte 7)