O jornalista e escritor Juremir Machado da Silva, em sua coluna no jornal Correio do Povo, de ontem, dia 13/02, escreve o seguinte:
“Toda vez que ouço as sonatas de Beethoven, o que faço com frequência, tenho certeza que a humanidade vale a pena. Desacreditar dela é um clichê tratado com ironia por alguns filósofos deliciosamente rabugentos e com rabugice por algumas pessoas com preguiça de pensar na complexidade do ser.”
Creio ser oportuno deixar algumas considerações aqui no blog sobre a afirmação do escritor. Eu posso concordar ou discordar dela. De que humanidade Juremir fala? Da humanidade no sentido da existência do ser humano na Terra, ou desta humanidade atual como aí está, de nossa atual civilização? Nesta humanidade, da forma como vive o atual ser humano, eu não acredito definitivamente. Mas acredito nas possibilidades humanas. Sejam elas mentais ou espirituais. No Ser que reside em cada ser humano, e quase sempre é por nós mesmos negligenciado.
Alguns pensam, devido a uma leitura desatenta de meus textos, que eu julgo que a humanidade será varrida da face da Terra dentro em breve. Na verdade, o que acredito é que surgirá uma nova humanidade após o fim desta civilização atual. Que está condenada ao fracasso. Não é uma questão de “moda de falar mal dos homens”, ou de “clichês de desacreditar na humanidade”, como afirma o Juremir. Creio que a questão é muito mais complexa. Os homens falam mal dos humanos porque estão percebendo consciente ou inconscientemente que como está não pode continuar. Os fatos estão aí para demonstrar. Não são clichês, são fatos. Tudo isso pulula em nosso inconsciente coletivo. Sabemos de forma velada, não devidamente manifesta, que algo está por terminar, sentimos isso, embora muitas vezes não sabemos ou não queremos deixar esse “sentimento” de forma expressa.
Nada se mantém eternamente. Isso é algo óbvio, mas a mente racional parece não se dar conta e está certa que pode manter todas as coisas pelo tempo que desejar, assim como cada um de nós tem em mente que viverá para sempre, muito embora saibamos que vamos morrer. Temos a ilusão de eternidade física. Há o dia é há a noite. Um sempre regride em favor do outro. Há a evolução e a involução, e nada evolui ou involui para sempre. Acredito que a humanidade está involuindo no atual momento, principalmente no aspecto psíquico-espiritual. Isso não significa que ela vai acabar. A todo fim sucede um princípio. Outros podem pensar que a humanidade está melhorando. Para tal pensamento, o tempo e os fatos se encarregarão de responder. Estamos como aqueles sapos na panela de água fervente, que não percebem a temperatura subindo lentamente, até que são cozinhados.
O ritmo de degradação ambiental é absurdo. O planeta já não está suportando a população humana que nele vive com seus hábitos de vida baseados em um nível de consumo irrefreável e devastador. População que não cessa de crescer e de consumir cada vez mais. É uma questão clara, exata, matemática. Um dia não haverá possibilidades físicas de nos sustentarmos. As nações ricas somente são ricas graças ao consumismo desenfreado de todos em todas as partes do mundo. Aí estão as multinacionais para provar, que ajudam a enriquecer seus países de origem servindo-se de nosso consumismo que não dá sinais reais de que irá regredir. Também não podemos esquecer que muitos dos países ricos conseguiram firmar seu desenvolvimento através, também, do colonialismo dos séculos passados (que ainda não acabou, diga-se de passagem).
Por tais motivos, não creio NESTA humanidade, na forma como está edificada, nas “pedras” em que se assentam suas bases. Mas é claro que acredito no ser humano, eu sou um deles, acredito em mim. Acredito em Beethoven, em Bach, em Goethe, em Da Vinci, em Bosch, em Dante, em Victor Hugo. Acredito principalmente na arte. Ela é, na minha opinião, a melhor criação humana. Somente a arte leva o homem além do homem. É isso do que precisamos. Ir além de nós mesmos. E os artistas são os que melhor percebem a nossa decadência psíquica. Alguns gênios o fizeram com inacreditável antecedência, como é o caso de Bosch, de Poe, de Baudelaire. Os artistas são a antena da humanidade. Eles sabem perfeitamente o que está acontecendo. E o expressam, sem que sejam, no entanto, na maior parte das vezes, devidamente compreendidos. E a maior prova de que o homem involui está na qualidade da arte de nossos dias. Ou daquilo a que se chama “arte”.
Para finalizar, não hesito em deixar esta afirmação: a maior parte da humanidade deverá ser destruída pelas próprias mãos humanas e pelas forças naturais nas próximas décadas. O universo sempre mantém o seu equilíbrio. Como disse o próprio Juremir, não somos o centro do universo, apenas fazemos parte dele e
estamos sujeitos às suas leis.
(Na imagem, detalhe do quadro "O Julgamento Final" de Hieronymus Bosch.)