11 abril 2010

Ameaça

ao sentenciar silente do Ocaso
um vivo silvo de sino
sai pela selva sangrada
como sonata solene e soturna
como sublime aviso seráfico:
o som do sol que se esvai...

é o selo sombrio e sagrado
segredo que se arrasta em sussurros
a morte sutil que se assoma
na saliva universal e simbólica...

silêncio... sente que soa em teu sonho
o sibilar o silvar o assovio
e sinal de sangue e de sono
do ameaçar triunfal da Serpente...

é melhor que tu a escutes...

09 abril 2010

Fernando Pessoa e Seus Passos Da Cruz XIII


Continuo postando os sonetos de Passos da Cruz de Fernando Pessoa, conforme explicado na seguinte postagem: http://artedofim.blogspot.com/2009/12/fernando-pessoa-o-predestinado-passos.html . Na próxima semana, o 14º, e último, passo. Na imagem, o quadro " "Ascensão ao Sagrado" de Hieronymus Bosch.

Passos da Cruz - Soneto XIII

Emissário de um Rei desconhecido,
Eu cumpro informes instruções de além,
E as bruscas frases que aos meus lábios vêm
Soam-me a um outro e anômalo sentido...

Inconscientemente me divido
Entre mim e a missão que o meu ser tem,
E a glória do meu Rei dá-me desdém
Por este humano povo entre quem lido...

Não sei se existe o Rei que me mandou.
Minha missão será eu a esquecer,
Meu orgulho o deserto em que em mim estou...

Mas há ! Eu sinto-me altas tradições
De antes de tempo e espaço e vida e ser...
Já viram Deus as minhas sensações...

08 abril 2010

Símbolo

sinto desejos de me ir
mas não me sigo:
tudo pesa sobre mim

tenho desejos de me rir
mas não consigo:
tudo é grave ao meu clarim

meu coração que nada em vales
é o tudo do todo que trago
um trago de vinho vago e amargo

meu coração que nada vale...

meu coração cravei nesta espada
esta espada cravei na montanha
a montanha cravei pelo nada
como símbolo oniricamente acabado
de tudo aquilo que acaba...

vêm-me desejos de dormir
mas só comigo:
tudo nada no (en)Fim

(Receba gratuitamente o zine literário Poemas do Término e Contos do Fim em sua versão digital. Basta deixar aqui o seu email, ou enviá-lo para reiffer@gmail.com. Obrigado.)

07 abril 2010

Versos Poluídos

a água do teu lábio
agora já é saliva
a saliva de uma lepra
a saliva do teu lábio
agora já é uma lágrima
e essa lágrima tu sorves
a lágrima do teu lábio
agora já é um sangue
o sangue que te nutre
o sangue do teu lábio
agora já é veneno
o veneno que te vive
o veneno do teu lábio
é a água que tu bebes
e estes versos que vomito
são à água do planeta...

06 abril 2010

A 4ª Sinfonia, de Brahms


Johannes Brahms compôs apenas 4 sinfonias. Mas todas elas absolutamente magistrais e estão no ápice da música sinfônica romântica. Brahms foi um exímio sinfonista. Dos maiores. Não é à toa que sua 1ª sinfonia foi considerada como sendo a 10ª de Beethoven. E todos sabem que Beethoven foi o maior de todos os sinfonistas.

Porém, entre as 4 sinfonias de Brahms, a última, a 4ª, Opus 98, é a minha preferida. Na minha opinião, é a mais madura, a mais bem acabada e a que melhor expressa a profunda alma de Brahms. É para mim uma das sinfonias mais trágicas e melancólicas já criadas. Os acordes iniciais de seu primeiro movimento já carregam o ar de uma densidade emocional escura e apaixonada. É uma música pesada, tensa, sem, no entanto, perder por um instante sequer o seu obstinado lirismo, a sua poesia introspectiva.

Este movimento desenvolve-se com absoluta perfeição, para desaguar em uma verdadeira catástrofe sonora, em um clímax furioso, marcial, devastador, que nos deixa a impressão de que o teto vai desabar sobre nossas cabeças.

O segundo movimento, dominado por um sentimento de outono, de inverno, é, ao mesmo tempo, lírico e solene, melodioso e taciturno, terno e misterioso. Passando pela vivacidade ensolarada e enérgica do 3º movimento, atingimos o 4º, onde a dilaceração emocional atinge o extremo, em notas carregadas de força e de tragédia. O breve instante de sol do movimento anterior dá lugar às sentenciosas sombras do final da sinfonia, onde se percebe uma forte influência de Bach. O 4º movimento afirma de forma indubitável o caráter sombrio e pessimista da obra, mas também ergue-se imenso, imponente, majestoso, como uma montanha castigada entre a tempestade. É uma definitiva obra de crepúsculo, o sol se põe ao final da sinfonia em um horizonte avermelhado...

Certa vez, escrevi um pequeno poema após ouvir a 4ª sinfonia. Eu o incluí em meu livro lançado recentemente, Poemas do Fim e do Princípio. Certamente, o poema não está à altura da obra de Brahms, mas creio que diz algo sobre ela. Aqui está ele:

Sinfonia nº 4

pelo outono do inverno de amar
atemporal tempestade
na sede que sedia meu sonho
a tormenta atormenta de sede

vós temporais sede
a sede de minh’alma acabada
a última de Brahms
que brames na última
tempes-tarde demais
não me a(l)mas
como não cometas
do céu caídos
em fim-nados
que vir já há-de
em mar-revolta
revolto
resignado
morrer de sede
na Tempestade

04 abril 2010

Adeus aos Gorilas (e Outras Notícias Tristes)


Talvez isso pouco importe aos leitores. Talvez não importe quase nada. Tudo bem, talvez não importe coisa nenhuma. Mas vou dar a notícia mesmo assim. Eu, como sou alguém trágico em demasia, dou atenção a tais futilidades.

Bem, os gorilas, aqueles macacos gigantes e que criaram fama nos filmes do Tarzan, estão a um passo do fim definitivo na natureza. É, estão quase extintos. Dentro de menos de 10 anos, dizem os biológos, essa gente chata, não haverá mais nenhum na natureza, só poderão ser vistos em zoológicos.

Os gorilas vivem (por enquanto) nas selvas equatorias da África Central. O que acontece lá? Só horrores e barbaridades. Primeiramente, as guerras civis e limpezas étnicas obrigaram multidões a se refugiarem nas selvas para não serem mortos. E lá, essa gente não tem ajuda nenhuma. Não sei por que os países ricos que tanto gostavam de explorar a África, como a França, a Inglaterra, a Bélgica, a Alemanha, Portugal, não ajudam esse pessoal agora. Que ingratidão... E os EUA, por que não se metem lá também? Eu não entendo.

Pois a gente que foge para a selva, não tem ajuda nenhuma, mas tem fome. Caçam os gorilas. E mesmo que não caçassem, o desmatamento para vender madeira para os ricos está acabando com as reservas dos simpáticos macacos. E mesmo que não houvesse madeireiras, há as companhias de mineração, que querem, é claro, o ouro nosso de cada dia. E já poluíram sabem quantos rios lá na África Central? 250. Isso, poluíram com mercúrio e outros venenos 250 rios. 250 rios... Eu, que sou melodramático, tenho vontade de chorar. Assim, não há gorila que aguente. Nem gorila, nem qualquer outro bicho.

Os governos de lá até que pagam uns pobres guardas esfomeados e heróicos (heróicos mesmo, viu, Pedro Bial, seu imbecil...) pra vigiar as reservas, mas os mineradores e madeireiros já mataram nos últimos anos mais de 150 guardas. Alguém teria coragem de ir pra lá vigiar os gorilas? Eu, que sou muito cínico, confesso: eu não.

De modo, que não há esperanças pra esses bichos, amigos leitores. Os gorilas, assim do jeito que está, logo deixarão de existir. Grande coisa, né? Olhem que talvez seja... Esperem pra ver....

Bem, eu ainda teria mais notícias tristes, por exemplo: sobre os corais da Austrália, sobre os ursos do Ártico, sobre os orangotangos da Indonésia, sobre os diabos da Tasmânia, sobre os guepardos do Quênia, sobre os elefantes da Índia, sobre os lobos do Canadá, sobre os tigres da Rússia, sobre os guarás do Brasil... mas... deixa pra lá, eu sou triste demais mesmo...

E assim caminha a humanidade...

03 abril 2010

Agora é Tarde...

morreste
e já não sabes
que não és o que foste
e talvez nem foste
aquilo que em ti te morreste
deixaste acabar-te os olhares
e quando olhaste ao acima
já te estavas abaixo
do palmo a palmo do sonho enterrado

morreste
e por morreres pensas que vives
temendo tudo que é alto
te contentaste em varrer o teu pó
deixaste escorrer os teus astros
desbotaste todas tuas noites
naufragaste pelos teus castelos
e defecaste sobre teus lagos

e tudo isso enquanto sorrias
por entre as certezas suínas
que enlamearam o céu da tua boca
enquanto degustava o açúcar...

fitaste a arte
com os olhos fechados...

morreste
e agora já é tarde:
teu sol já não bate
e teu peito não arde.

02 abril 2010

Um Cavalo que me Espia

Certa noite, dormia tranquilo em minha cama, quando acordei de súbito. Acordou-me a respiração ofegante de um cavalo me espiando pela porta do quarto. Ainda lembro de seus olhos profundos e esbugalhados, negros, mas de um negro esverdeado que causava anômalos calafrios. Calafrios estes que não me eram desagradáveis, mas apenas estranhos. O cavalo fitava-me intensamente, como se quisesse dizer algo, mas não emitia nem um som além do de sua respiração. Em seguida, abriu-se com uma forte lufada de vento a janela de meu quarto. A fria aragem noturna penetrou em forma de uma névoa esbranquiçada...

Não entendia por que aquele cavalo permanecia ali imóvel, olhando-me de forma tão insistente, apenas movimentando a cauda e as patas, vez que outra. Tinha certeza absoluta que estava acordado, toda hipótese de que tudo fosse um sonho foi totalmente descartada. O que sei é que de maneira canhestra aqueles olhares espectrais em meio à névoa levavam-me a pensar e a sentir coisas completamente absurdas, sem o mínimo sentido.

Pensei, em um momento, em uma música que eu havia composto, música sublime, da mais alta inspiração, que nos transmitia sensações inefáveis... Mas ninguém gostou dela. Aliás, ninguém queria escutá-la, diziam que era perda de tempo, que a música era longa demais, de difícil audição... Ninguém a escutou, ninguém a sentiu. É que a música falava de coisas tristes, falava da morte, e ninguém quer saber da morte. Porém, há um detalhe crucial nesta música que fiz: eu nunca a fiz. O cavalo que me fazia pensar que havia feito. E era como se fosse verdade. Talvez fosse verdade.

Agora o cavalo movimentou seus olhos. São maiores do que pensei. Alguma alma se movimentou por trás daqueles olhares fantasmagóricos. Ele os dirigiu para algum canto de meu quarto. Havia algo ali que eu não podia distinguir. Pela janela escancarada pude contemplar a angústia da lua cheia. Estava maior do que o normal. A névoa pálida permanecia entrando, cada vez mais densa. Foi só nesse instante que pude divisar algo sobre o cavalo, um vulto, um ser movimentava-se em seu dorso. Mas era como se ele não estivesse ali, e creio, todavia, que estava desde o início, muito embora eu houvesse visto vazio o dorso marrom do cavalo. Repito, o dorso estava vazio, eu tinha tanta certeza...

Mas agora eu ali vislumbro uma mulher vestida de verde, extremamente bela, cabelos longos e verdes, olhos verdes, pele levemente esverdeada, lábios verdes, sustentando em suas mãos uma taça contendo um líquido verde. Ela e o cavalo me olham fixamente. Ela vai dizer algo... Vou fechar a janela...

(Pode não parecer, mas este conto encerra-se aqui.)

Poema Publicado em Zero Hora


Meu poema "Lembrança" foi publicado na edição de ontem do jornal Zero Hora, no Almanaque Gaúcho. Agradeço ao almanaque pela publicação. No entanto, infelizmente, faltou o último verso, o qual é importantíssimo para a total compreensão do poema. Aqui está o link de meu blog com o poema completo: http://artedofim.blogspot.com/2010/03/lembranca.html

A última estrofe do poema, com o último verso, seria esta:

"se cada vez mais
me aprofundo na sombra
é pra fincar tua bandeira
nos abismos em que hás de brilhar
inclusive
dentro de mim"

01 abril 2010

Fernando Pessoa e Seus Passos da Cruz XII


Continuo postando os sonetos de Passos da Cruz de Fernando Pessoa, conforme explicado na seguinte postagem: http://artedofim.blogspot.com/2009/12/fernando-pessoa-o-predestinado-passos.html . Na próxima semana, o 13º passo. Na imagem, o quadro "Jovem Camponesa com Um Bastão", de Camille Pissarro.

Passos da Cruz - Soneto XII

Ela ia, tranquila pastorinha,
Pela estrada da minha imperfeição.
Segui-a, como um gesto de perdão,
O seu rebanho, a saudade minha...

"Em longes terras hás de ser rainha
Um dia lhe disseram, mas em vão...
Seu vulto perde-se na escuridão...
Só sua sombra ante meus pés caminha...

Deus te dê lírios em vez desta hora,
E em terras longe do que eu hoje sinto
Serás, rainha não, mas só pastora _

Só sempre a mesma pastorinha a ir,
E eu serei teu regresso, esse indistinto
Abismo entre o meu sonho e o meu porvir...


(Receba gratuitamente o zine Poemas do Término e Contos do Fim em sua versão digital. Para receber a edição 38, basta deixar aqui seu e-mail)

31 março 2010

"O Brasil Não é Um País Sério"


"Le Brésil n’est pas um pays sérieux"(O Brasil não é um país sério). Foi o ex-presidente da França, Charles de Gaulle, que afirmou tal verdade, nos anos 60. Sim, desgraçadamente, é uma verdade. Eu poderia dar mil e um motivos para isso. E estou certo que o leitor conheceria todos eles. Mas vou deixar apenas um exemplo, um vergonhoso exemplo.

Acessando um site de notícias, a excepcional manchete que me saltou aos olhos, com destaque, dizia algo de uma importância extrema... Dizia que a aluna que foi à aula com uma minissaia que permitia ver suas calcinhas (lembram dela?) vai agora lançar uma grife de vestidos "provocantes", aproveitando-se da polêmica e de todo o destaque dado pela mídia ao caso, com o objetivo de ganhar muito dinheiro.

Não lembro o nome da moça, e faço questão de não lembrar, nem vou me dar ao trabalho de procurar no google. Muito menos gostaria de estar falando sobre isso. Mas isso prova o que afirmou De Gaulle: O Brasil não é um país sério. Não é, não pode ser. Se fosse sério, não aconteceria aqui de uma moça que vai com uma minissaia à aula virar manchete nacional. E pior, ficando famosa com tamanho absurdo, aproveitando-se de todo seu destaque, lançar uma grife e, provavelmente, enriquecer por um dia ter mostrado as calcinhas na faculdade.

Aqui, enriquece-se por mostrar as calcinhas. Ou enriquece-se por ficar alguns meses trancado em uma casa de luxo transando e falando imbecilidades. E pior: enriquece-se, fica-se famoso, torna-se manchete em todos os jornais e vira-se herói ou heroína nacional. Não, o Brasil não é um país sério.

Agora, os verdadeiros heróis brasileiros, aqueles que produzem nas artes, nas ciências, na cultura em geral, na educação, os que defendem nosso meio-ambiente com unhas e dentes, esses não viram manchetes, não têm "ibope", não enriquecem, não ficam famosos, não são reconhecidos como aquilo que autenticamente são: heróis. E depois querem que eu não concordem com o de Gaulle? Querem que afirme uma patriotada idiota: sim, o Brasil é sério sim... Gostaria de dizer isso, mas os fatos me impedem. O povo me impede. Povo idiota, país idiota.

E, para completar, naquele site onde a manchete principal era sobre a grife "provocante" da moça que mostrou as calcinhas, lá, num canto, bem pequeno, dizia algo sem importância: "Brasil ainda é o país que mais desmata no mundo". Sim, isso não tem importância nenhuma, em um país que não é sério. O Brasil é uma piada.

29 março 2010

Destino...

animais-irmãos que vos extinguis
a que oculto
o mistério vos leva...?
o que vos leva
a que mistério é oculto?...

quando vos fordes
ocultai convosco
o que me mistério
quando partirdes
deixai que parta o que deixo
o que se parte em meu peito
carregai ao longe
o longe que pulsou no que sinto
não deixeis comigo
meu pulso que sangrou pela terra
o derramar do meu verso
pela morte que erra
escondei o que me esperanço
nos confins a que vos destinais...

quero esquecer-me de mim
em vossos eternos jamais...

mas guardai em vossas almas
a minha arte dos tardes
guardai-a
para quando voltardes...

28 março 2010

As Almas do Fantástico na História do RS – História 6ª: O Último (Final)

- Eu sei que vou morrer. Não preciso da tua ajuda. Eu sou o último. E quando eu morrer, morrerá comigo o meu povo. O meu povo era o mais bravo desta terra que tu agora pisas. O meu povo era o dono desta terra. E o meu sangue, que se mistura a ela agora, faz parte dela e a ela voltará. Vocês, que agora pisam na terra que era nossa, são uns covardes. Não souberam lutar como verdadeiros guerreiros, vieram aos milhares para massacrar meu povo com armas de covardes. Mas nós resistimos até a última gota de sangue, e a última gota será a minha.

- Sim, mas isso faz muito tempo, eu nem era nascido, nem meus avós o eram. Eu não tenho nada a ver com isso, sinto muito pelo teu povo, mas só o que posso fazer agora é te ajudar...

- Eu desprezo a tua ajuda. Vocês queriam nos fazer de escravos, mas não conseguiram, nós resistimos até o último homem, e o último homem sou eu. Queriam nos pacificar, nos domesticar, nos impedir de correr livres e soberanos pelos campos. Pelos campos que eram nossos. Mas nós, nós não permitimos. Nós preferimos a morte a ser domados pela covardia e pela desonra do teu povo. Queriam nos impor os seus costumes, seus hábitos, suas crenças, mas não conseguiram. Vocês são fracos. Tão fracos que fomos nós que empurramos a vocês o que nós somos, ou éramos.

- Sinceramente, eu não estou te entendendo...

- O teu povo não conseguiu fazer com que nós vivêssemos como vocês queriam. Nós resistimos, lutamos até a morte, como os guerreiros terríveis que somos, matamos muitos dos de vocês, vendemos muito caro o nosso fim, mas jamais fomos domados. Somos da guerra, da luta, somos livres como o vento, fortes como o sangue. Mas vocês, vocês agora querem ser como nós... Até os nossos costumes vocês pegaram pra vocês, querem nos imitar. O churrasco que vocês comem, fomos nós que inventamos, a carne assada com fogo de chão em espeto de pau. O mate, o mate é nosso! A erva-mate faz parte do nosso sangue. E essas boleadeiras que vocês usam? E o xiripá? E o pala? Tudo nosso, tudo foi imitado do meu povo. Vocês quiseram nos impor os costumes de vocês... Haha! Mas, no final, foram vocês que se dobraram aos nossos. Porque nós nunca nos dobramos, nunca nos curvamos!

- Sim, devo confessar que tu tens razão... Muitos dos costumes dos gaúchos foram herança de alguns grupos indígenas do pampa. Mas... me diga quem és tu? De onde vens, qual tua tribo? Jamais soube que tivesse índios por aqui...

- E olha agora para estes campos, estas matas, estes rios estes animais... Eles estão todos morrendo, vocês, povo de covardes, estão os matando. O meu povo amava tudo isso. Eu falava com os animais, sim, eu os compreendia, e eles me compreendiam. E foi por conversar com os animais que nos tornamos grandes cavaleiros, os melhores destes campos. Eu conversava com as plantas, com as árvores, tratava-as com amor, como se fossem gente, e elas me curavam das minhas doenças. Eu falava com as águas, com os ares, com a terra, eu sabia que eles também tinham alma, eu falava com a alma deles. E assim eles nos ajudavam, e assim meu povo vivia, em paz com a natureza e com seus filhos.

Mas o teu povo de covardes, o teu povo sem respeito, sem honra, sem alma, não vê alma na natureza, só vê nela coisas a serem usadas, a serem destruídas. O teu povo está espalhando a morte por estes campos, matas e rios. E quem espalha morte vai colher morte. E é o que virá pra vocês. Vocês pensam que a natureza e seus filhos ficarão quietos pra sempre, que eles não irão se erguer para impor a sua força de justiça... Mas eles virão, eles se erguerão com fúria e colocarão tudo novamente em seu devido lugar. Então eu terei pena de vocês... Não, não terei pena nenhuma, o teu povo terá o que merece. Eu sinto no ar, sinto o cheiro da guerra que a natureza prepara aos poucos...

- Sim, mas...

- Ah, tu queres saber quem eu sou... Eu sou o último. O último dos Minuanos, os índios mais bravos, os mais guerreiros, os mais indomáveis que já pisaram estes campos. Aqueles que foram covardemente massacrados por vocês com suas armas de fogo e com muitos mais homens do que nós. Mas o meu sangue, o nosso sangue está vivo, e vivo ele volta a esta terra de que faz parte e fará parte da guerra que virá, fará parte da nossa vingança...

E após alguns opressivos segundos, o índio faleceu, esvaído em sangue. Tentei, então, aproximar-me de seu cadáver para examinar alguns sinais estranhos desenhados em seus braços, mas nesse instante... me acordei. Sim, estive desacordado por todo esse tempo, completamente inconsciente, que creio que não foi muito longo, pois ainda raiava o sol.

Acredito que por efeito de alguma substância tóxica do espinho perdi a consciência por alguns minutos. Então, o índio e toda a sua conversa não passaram de alucinação? Sonhei? Tive uma visão? Seja como for, tudo me pareceu pungentemente real. Tão real quanto o meu sangue que ainda estava sobre as pedras da margem do rio, o meu sangue, em que há o sangue dos índios do pampa...

(Obs.: as 7 histórias que compõem esta série estão relacionadas entre si, mas são independentes, ou seja, uma não é a sequência da outra. Todas as histórias são baseadas em fatos reais e misteriosos da história do RS, mas seu desenvolvimento é fictício. A 7ª história ainda não foi finalizada.)

27 março 2010

As Almas do Fantástico na História do RS – História 6ª: O Último


O crepúsculo caía lento. Mas parecia mais denso, mais dramático, mais carregado que o normal. Atravessando aquele imenso campo ancestral que parecia infinito, inexplicavelmente fui invadido por uma estranha tensão. Deveria chegar à fazenda antes que anoitecesse completamente. Apressei o passo.

Uma gigantesca mata surgiu diante de meus olhos cansados, quando atingi o alto da coxilha. Um lindo espetáculo se descortinou, um bosque de um verde puro e intenso, com imensas árvores frondosas, algumas delas paradisiacamente floridas. Porém, a tensão, o insondável nervosismo que me afligiu sem que eu encontrasse uma explicação plausível para ele não se arrefeceu, pelo contrário, ele se intensificava mais e mais.

Deveria atravessar a mata e, mas adiante, o riacho que nela se ocultava, para atingir o outro lado e, finalmente, chegar ao campo que me levaria à fazenda. O sol ainda brilhava, mas não poderia perder tempo. Caminhei rápido em direção à mata e penetrei em sua beleza deslumbrante e misteriosa, sentindo que o pulsar de meu coração tornava-se mais célere. Minha inquietação era sobremaneira anômala. Anômala porque não era a inquietação natural, compreensível, de quem entra em uma mata fechada sem saber exatamente o que ali poderá encontrar, correndo o risco de entrar em contato com serpentes e outros animais perigosos. Minha inquietação relacionava-se com algo que me parecia bem mais ameaçador e enigmático, que eu não saberia dizer a mim mesmo o que poderia ser. Sentia apenas uma sombria intuição, um pressentimento angustiante, como se alguma coisa de anormal, de sobre-humano, estivesse para acontecer.

Todavia, eu não tinha outra saída, a não ser entrar e atravessar toda a mata. Obviamente, ao fazê-lo, minha cautela era enorme. A rapidez com que caminhava pelo campo deu lugar a um avanço muito lento por entre a vegetação fechada do bosque. Conforme penetrava na mata de árvores imensas e regada de arbustos, trepadeiras e plantas rasteiras, meus receios e angústias inflamavam-se.

Cada local em que pisava era por mim observado com extrema atenção. Dirigia meus olhares para todos os lados, para o alto das árvores, para seus galhos, na terrível expectativa de avistar algum perigo em potencial. Porém, atingi o riacho sem nada divisar de ameaçador, vi tão somente alguns animais inofensivos.

Atravessei o belo e pequeno rio em um trecho onde ele era bastante raso. Poderia ter aproveitado melhor aquelas agradáveis e límpidas águas, no entanto, minha tensão não me permitiu. Nervoso, já na outra margem do rio, ainda com muita cuidado, ia entrando novamente na mata, quando senti dolorosamente que algo espetou meu antebraço esquerdo. Havia cravado um enorme espinho que se aprofundou em minha pele. O espinho era de um alto arbusto de uma espécie para mim desconhecida. Retirei-o de meu braço, e o sangue escorreu abundantemente. Senti então uma febre no local e uma leve tontura, e imediatamente imaginei que poderia haver no espinho alguma substância tóxica. Como a tontura não passava, sentei-me na margem do rio, sobre algumas pedras, não poderia prosseguir naquele estado.

Creio que alguns minutos após sentar-me, ainda levemente tonto, principiei a ouvir um som estranho advindo da outra margem. Voltei-me para ela e lá e contemplei um homem sentado nas pedras que apresentava um grave ferimento no peito, o qual sangrava abundantemente. O homem era, sem dúvida, um indígena, um típico índio, aliás, que eu nem sequer suspeitava que pudesse existir por aqueles campos, não obstante eles terem sido habitados por povos indígenas pampianos há séculos.

O índio era jovem, não devia ter mais que 25 anos de idade.Vestia somente uma calça de estilo bastante antigo. Da cintura para cima, o índio estava nu, e os seus pés, descalços. Possuía uma aparência aguerrida e robusta, um rosto de traços fortes e duros e um corpo aparentemente bastante possante. Porém, demonstrava uma profunda extenuação, quase uma agonia. O lado direito do seu peito trazia um considerável buraco, o qual, tudo indicava, fora feito a bala.

O seu sangue jorrava incessante, derramava-se por todo seu corpo e misturava-se às pedras, à areia e à água do rio. Sua respiração começava a ser estertorante. Levantei de onde eu estava e tentei, ainda que com muito receio, aproximar-me para ajudá-lo:

- Não, não te aproximas. Se vieres perto de mim, te mato! Pra isso ainda tenho forças.

A voz do índio, apesar de fraca e quase soluçante, era expelida com uma intensa determinação, a qual assustava, pois se combinava com um olhar firme, fulminante, enfebrecido. Seu sotaque soava bastante estranho, porém compreensível. Detive-me e retorqui:

- Mas assim como estás, vais morrer. Precisas de ajuda.


(Amanhã, o final - Na imagem, o quadro "Moema", de Victor Meirelles)

26 março 2010

Lembrança

luz que adeja sobre meu sonho
não pensas que eu te esqueci:
sei do teu canto vasto pelos finais
sei que te acimas, sei que te imensas
ouço teus dedos, cheiro teus olhos
não pensas que te descri
dos mares em que te oceanas
do sempre em que tu te eternas
do todo em que te infinitas...

por ti
eu caí das verdades
mergulhei no que erra
abismei-me no Fim

se cada vez mais
me aprofundo na sombra
é pra fincar tua bandeira
nos abismos em que hás de brilhar
inclusive
dentro de mim

25 março 2010

Petição para a Nestlé

Amigo leitor, peça à Nestlé para que pare de comprar óleo de palma de florestas devastadas. Assine a petição:

http://www.greenpeace.org.br/kitkat

E assista ao vídeo no mesmo link.

Obrigado.

Nestlé Devastando Florestas Tropicais


Que a Nestlé é uma das maiores empresas alimentícias do mundo todos sabem. Porém, poucos são os que sabem que ela está envolvida na destruição de florestas tropicais na Ásia, particularmente nas da Indonésia. Por que será que a grande mídia não divulga tal fato no Brasil? Grandes são as manifestações na Europa para que a Nestlé pare de comprar óleo de palma de plantações que se proliferam conforme as florestas tropicias do Sudeste Asiático são devastadas.

Sim, é exatamente isso que acontece. As florestas da Indonésia e do outros países estão sendo varridas do mapa para a plantação de palmas que produzem óleo para chocolates, do qual a Nestlé é a maior compradora. Ou seja, estamos comendo chocolate à custa do massacre de uma das maiores, mais ricas e mais importantes florestas tropicais do mundo.

Até o ano passado, este mesmo óleo era comprado pela Unilever para a fabricação do sabonete Dove. A pressão foi tão grande sobre a empresa na Europa que ela anunciou no final do ano passado que rompeu com os plantadores de palma da Indonésia. Mas a Nestlé continua.

A Nestlé, que tem como seu símbolo um ninho com pássaros... Que ironia... Quantos milhões de ninhos e pássaros será que a Nestlé já ajudou a destruir pelas florestas do mundo afora? Seria cômico, se não fosse trágico.

Todos falam na preservação da Amazônia. Mas só a Amazônia? E as outras florestas? As outras podem ser destruídas? Ainda temos 80% da Amazônia. Deveríamos ter quase 100%. Mas das florestas tropicais da Indonésia, de uma exuberância tão imensa quanto a amazônica, restam apenas 50%. É uma das florestas de maior biodiversidade do planeta, sua biodiversidade animal é ainda maior que a da Amazônia. É o onde vive, por exemplo, o orangotango, cada vez mais ameaçado de extinção, para que os seres humanos tomem banho com sabonetes de luxo e comam chocolates mais cremosos.

De minha parte, não comprarei mas produtos Nestlé, não até que tenha certeza que a multinacional não esteja mais comprando óleo de áreas de florestas devastadas. Se é que é possível ter tal certeza... E seria demais pedir aos leitores que também não consumam mais produtos Nestlé? É, talvez seja...

Até quando o homem se empenhará ao máximo para tornar a Terra um inferno? Até o dia em que a natureza dizer basta. E ela já pronuncia o "b"... A salvação do planeta é o fim da humanidade...

(Na imagem, o contraste nítido entre a floresta intocada e a área destruída devido à plantação de palmeiras para a produção de óleo na Indonésia.)

24 março 2010

Algumas Fotos do Lançamento de Meu Livro Poemas do Fim e do Princípio





Deixo algumas fotos do lançamento de meu 2º livro, Poemas do Fim e do Princípio, ocorrido dia 20/03/2010, no centro cultural de Santiago. Mais uma vez agradeço a presença de todos.

23 março 2010

Fernando Pessoa e Seus Passos da Cruz XI


Continuo postando os sonetos de Passos da Cruz de Fernando Pessoa, conforme explicado na seguinte postagem: http://artedofim.blogspot.com/2009/12/fernando-pessoa-o-predestinado-passos.html . Na próxima semana, o 12º passo. Na imagem que acompanha o poema, o quadro "Anjos Rolando a Pedra do Sepulcro" de William Blake.

Passos da Cruz - Soneto XI

Não sou eu quem descrevo. Eu sou a tela
E oculta mão colora alguém em mim.
Pus a alma no nexo de perdê-la
E o meu princípio floresceu em Fim.

Que importa o tédio que dentro de mim gela,
E o leve Outono, e as galas, e o marfim,
E a congruência da alma que se vela
Com os sonhados pálios de cetim?

Disperso… E a hora como um leque fecha-se…
Minha alma é um arco tendo ao fundo o mar…
O tédio? A mágoa? A vida? O sonho? Deixa-se…

E, abrindo as asas sobre Renovar,
A erma sombra do voo começado
Pestaneja no campo abandonado…

22 março 2010

a Ele

ó Tu
Rio sem fim
que percorre o universo...
quatro letras de arcanos
tem o Teu nome no eterno...
os Teus coros de anjos
elevam-nos em luz e sombra
às alturas do céu da alma...
Tu nos consolas na dor
e na calma...
Tua mão de Pai
engendrou a música das esferas
criou mundo e sonhos
astros e quimeras...
Teu espírito paira
pelo espaço pela noite pelo mar
Teu coração
nos ensinou a amar...

Dirão que Tu és DEUS...
Mas Tu és BACH.

(Poema em homenagem aos 325 anos de Johann Sebastian Bach, comemorado ontem, dia 21/03/2010. Lembro aos leitores que Bach significa "rio" em alemão.)

21 março 2010

Agradecimento

Esta postagem é extremamente simples: venho deixar meus sinceros agradecimentos a todos os amigos que estiveram presentes no lançamento de meu livro Poemas do Fim e do Princípio. Espero ter correspondido às suas expectativas. E espero que a obra não decepcione aos que a adquiriram.

Agradeço em especial ao Giovani Pasini, por seu imprescindível auxílio na organização do evento; à profª Rosane Vontobel, por sua perfeita análise da obra; à Janice Trombini, por sua competente assistência no protocolo; ao Luiz Paulo Milani, pela ajuda na distribuição do material; à Liziane Serafini, pela excelente atuação como fotógrafa.

Todos os que estiveram presentes, e os que não puderam comparecer por motivo de forças maiores, merecem meus mais profundos agradecimentos. No ano que vem, pretendo lançar meu 3º livro, e conto com todos vocês novamente.

19 março 2010

Poemas do Término e Contos do Fim nº 38 em Versão Digital e Gratuita


A edição 38 do zine literário Poemas do Término e Contos do Fim será lançada amanhã, dia 20/03, juntamente com meu livro Poemas do Fim e do Princípio. Incluirá o conto "A Lenta Morte da Bela Mulher" e mais 3 poemas que não estarão no livro.

O zine 38 virá com uma importante inovação: será distribuído também digitalmente, gratuito como a versão impressa. Para recebê-lo, basta que o leitor me passe seu e-mail, que então ele será enviado.

Em Santiago, os pontos de distribuição da versão impressa são os seguintes: locadoras Fox, Classic e Stop, biblioteca pública, biblioteca da Uri, Ponto Cópias e Livraria Santiago. Pode ser enviado para qualquer cidade do Brasil ou exterior, mediante o pagamento das despesas de correio.

Agradeço a colaboração dos seguintes amigos na distribuição do zine em outras cidades: Liziane Serafini (Santa Cruz do Sul/RS), Luana Serafini (Santa Maria/RS), Alberto Ritter (Porto Alegre/RS), Gracieli Persich (Santo Ângelo/RS), Louise Wagner (São Leopoldo/RS), Marcus Vinícius Manzoni (Frederico Westphalen/RS), Lilene Leverdi (São Gonçalo/RJ), Héder Duarte (São Gonçalo/RJ), Agnes Mirra (Goiana/PE) e Paulo Soriano (Salvador/BA). Agradeço também ao amigo Guilhermes Damian pelo excelente trabalho de design do zine.

18 março 2010

ARCAHDIA

O site Arcahdia, dedicado aos novos escritores brasileiros de literatura fantástica, criou uma página para divulgação de minhas obras. Para acessá-la:
http://arcahdia.webnode.com.br/alessandro-reiffer

Poemas do Fim e do Princípio


Venho informar (e convidar) aos amigos leitores do blog que neste sábado, dia 20 de março de 2010, às 20h, no Centro Cultural de Santiago, será lançado meu 2º livro, Poemas do Fim e do Princípio.

Como já mencionei aqui no blog, meu livro conta com 245 poemas em quase 250 páginas e já está disponível nas versões impressa e digital no site da editora Livros Ilimitados, que publicou o livro. Acima desta postagem, logo abaixo do cabeçalho do blog, está o link do site da editora, onde o leitor pode acessar os livros.

Poemas do Fim e do Princípio foi composto ao longo de 5 anos. Durante este período, compus mais de 500 poemas. Porém, nem todos considero publicáveis em livro. Outros seriam publicáveis, mas fugiriam um pouco da temática e objetivo da obra. E ainda, vários dos poemas incluídos no livro foram revisados e sofreram alterações. Então, os 245 poemas que publiquei vieram de uma seleção que realizei considerando qualidade e temática. Meu objetivo foi construir um livro onde estivesse o melhor de mim durante estes últimos 5 anos (lembrando que os 5 anos a que me refiro vão até final de 2009) sem perder a coerência de temática. Espero ter alcançado tal objetivo.

16 março 2010

Que as Leve...

dentro em mim
há levas de palavras em lavas
larvas de palavras não-livres
livros não lavrados mal lidos
lendas em velórios levadas

dentro em mim há tanto
que não é nada...
as minhas palavras
largarei letra a letra
deixarei que escorram bem lentas
como os pingos derretidos da vela
como o grão a grão da areia
que desmorona da catedral condenada
como as folhas mortas que caem
da floresta ensopada em napalm
como o gota a gota ainda quente
da garganta do carneiro carneado...

quem quer saber da luz que digo?
o que em mim de belo canta
eu levarei comigo...

e as minhas palavras de sombra
deixo que o Ocaso as entregue
e o Fim as carregue...

15 março 2010

Fernando Pessoa e Seus Passos da Cruz X


Continuo postando os sonetos de Passos da Cruz de Fernando Pessoa, conforme explicado na seguinte postagem: http://artedofim.blogspot.com/2009/12/fernando-pessoa-o-predestinado-passos.html . Na próxima semana, o 11º passo. Na imagem que acompanha o poema, o quadro "Campo de Trigo Sob o Céu Nublado" de Van Gogh.


Passos da Cruz - Soneto X

Aconteceu-me do alto do infinito
Esta vida. Através de nevoeiros,
Do meu próprio ermo ser fumos primeiros,
Vim ganhando, e através estranhos ritos

De sombra e luz ocasional, e gritos
Vagos ao longe, e assomos passageiros
De saudade incógnita, luzeiros
De divino, este ser fosco e proscrito…

Caiu chuva em passados que fui eu.
Houve planícies de céu baixo e neve
Nalguma coisa de alma do que é meu.

Narrei-me à sombra e não me achei sentido.
Hoje sei-me o deserto onde Deus teve
Outrora a sua capital de olvido…

13 março 2010

Confissão

confesso-me que não-ser:
não fui-me.
admito que bebi demais
bebi a própria sede de beber
e assim explodiu-me o vinho
e quando a sede me confessava imensa
me foi negada a água
e quando a água se admitia a mim
me foi secada a boca

confesso-me que me fim:
não fiz-te.
pedir o vinho é vir vinagre
que Deus dá água
a quem não tem sede
e vida a quem não tem sangue
que o sangue é a alma
e admito que me sangrei
porque minha alma era demais
e quanto mais sangrava meu ser
mais sangue se sede em mim

confesso-me que não sou-te:
não... nada.
admito a sede
admito o vinho
admito o sangue.
foi-me o sonho sa(n)grado...

Eu me declaro culpado.

12 março 2010

Quando?

quando à manhã de céu azul
cruzará aquela ave sombria,
se eu trago uma vela no escuro?
eu escrevo com o que procuro...

se eu pudesse sonhar, dormiria.

quando incensarão pela tarde
as tulipas que eu te colhia,
se eu trago uma espada no braço?
eu escrevo com o que não abraço...

se eu te pudesse mirar, pintaria.

quando aos fluidos deste ocaso
encherei esta taça vazia,
se eu trago uma brasa na testa?
eu escrevo com o que me resta...

se eu te pudesse falar, cantaria.

quando virão na minha noite
sonatas da morte do dia,
se um beijo nos lábios sustenho?
eu escrevo com o que não tenho...

se eu te pudesse viver, morreria.

E-mail enviado ao amigo Júlio Prates, sobre o anonimato na blogosfera

Prezado Júlio:

Obviamente, não tenho, nem de longe, o conhecimento e a experiência que tu deves ter nas áreas do Direito e do Jornalismo. Não tenho e não pretendo ter, visto que não é o meu chão. Busco me aprofundar nas áreas de meu ofício, de minha vocação. Portanto, não possuo o embasamento necessário para debater contigo tais assuntos. E nem pretendo debater, eu apenas deixei a minha visão sobre a função de um blog. Creio que uma de suas funções é permitir esse debate de ideias, essa interatividade, e a permissão aos comentários acredito ser algo fundamental nesse sentido. Quando disse que julgo o ato de impedir os comentários como algo antidemocrático, não quis dizer que tu estás sendo deliberadamente antidemocrático, não foi uma acusação, essa é apenas a impressão que um blog onde não é possível comentar me transmite. Mas entre impressão e realidade, pode haver uma grande diferença. Certamente, tu tens teus motivos para torná-lo assim, não compete a mim julgar.

Os blogs que conheço todos eles permitem os comentários. Alguns permitem comentários anônimos, outros não, mas permitem comentários. O teu blog é o único que conheço onde eles não são permitidos, certamente deve haver outros, mas desconheço. Não te condeno por isso, quem sou eu para fazê-lo? Cada um sabe de seus motivos, e creio que os teus são perfeitamente justos e compreensíveis. Sem dúvida, entre o meu e o teu blog há uma grande diferença de temáticas, e os assuntos que abordas, o objetivo de teu blog, são bem mais suscetíveis a ataques e a reações pessoais do que meu. Por isso, talvez, no teu caso, impedir os comentários tenha sido a decisão mais acertada, mas, sinceramente, não sei até que ponto. Já o meu blog não tem intenções jornalísticas ou políticas. É um blog direcionado à arte, mas, como a arte é muito ampla, permito-me discorrer, vez que outra, de forma crítica sobre os assuntos que a amplitude da arte me proporciona, como os ligados a questões culturais, que, por sua vez, estão relacionados com assuntos políticos. E a interatividade do leitor através dos comentários faz parte de tudo isso, parece-me algo da própria essência do blog, algo natural, não vejo por que impedi-la, no meu caso.

Até porque, impedir o anonimato na internet, ou na sociedade em geral, é impossível. Se a lei diz que o anonimato é vedado, ela está sendo contraditória. Aliás, a lei é muito contraditória e nem sempre está correta. O anonimato sempre existiu e sempre vai existir, é uma forma de expressão do ser humano. Pode-se enviar um e-mail anônimo. Uma carta anônima. Existe a denúncia anônima amparada por lei. Uma pessoa honesta pode muito bem vir a ser investigada por uma denúncia anônima caluniosa. O voto é anônimo.Se não fosse, seria correto? É correto o voto anônimo dos deputados? Eu não acho, mas a lei permite. Por quê? Quantos poetas e escritores escreveram sob pseudônimos que durante muito tempo mantiveram-se secretos? Isso é crime? O crime é o que diz a lei ou o crime é o que diz nosso bom senso? Nem sempre a lei é sensata. Muito pelo contrário, a lei protege, muitas vezes, certos interesses de poucos. É claro que tu deves saber disso melhor do que eu. Eu, particularmente, não gosto do anonimato. Mas entre não gostar e julgá-lo como um crime, são outros quinhentos. O anonimato pode ser usado para o crime, mas em si, ele não é um crime. Assim como a internet não é um crime, o orkut não é um crime, mas podem ser usados para o crime. Não importa o que diga a lei. A minha consciência diz a mim que o anonimato não é um crime. Assim como ela me diz que não é crime um pobre roubar um pão por fome. Mas a lei diz que é. O voto, para mim, não precisaria ser anônimo. Eu faria questão de dizer a todos em quem votei. Mas por que o voto anônimo não é crime? Não é para proteger o indivíduo? Pois é isso, o anonimato é uma forma de proteção. E pode ser também uma forma de crime. Assim como a lei, também, pode ser criminosa. Contra o anonimato ofensivo ou calunioso, é perfeitamente justo que a lei haja. Mas não se pode julgar todo anonimato como um crime porque alguns o utilizam para isso. Essa é a minha visão, contra a qual qualquer um pode se manifestar e argumentar.

Estou ciente que devo me responsabilizar pelos comentários que estão em meu blog. Assim como me responsabilizo pelo que escrevo. Eu, como artista, sou a favor da expressão absolutamente livre do ser humano. Mas claro que aquele que se expressa deve estar ciente das consequências dessa expressão. Disse certo escritor que agora não me recordo: "Ninguém escreve impunemente". O escritor deve aceitar aqueles que se posicionam contra ele, seja aberta ou anonimamente. Isso faz parte. Obrigado, Júlio, pela oportunidade deste diálogo.

11 março 2010

Hieronymus Bosch - O Profeta


A capa de meu livro “Poemas do Fim e do Princípio”, a ser lançado no próximo dia 20, apresentará uma pintura de Hieronymus Bosch, “A Tentação de Santo Antônio”. Bosch é um dos mais geniais pintores de todos os tempos. É justo que eu fale um pouco desse mestre de quem sou um grande admirador.

Não se sabe bem ao certo a data de nascimento de Bosch, porém acredita-se que foi por volta de 1450, em Hertogenbosch, na Holanda. Seu sobrenome, Bosch, vem do nome de sua cidade. Mas não falarei de sua vida, a qual é envolta em indecifráveis mistérios, assim como suas obras. Mas falarei um pouco destas últimas.

Os quadros de Bosch apresentam três temáticas básicas: crítica social grotesca, inspiração ocultista/mística e devaneios fantásticos. Tais temáticas podem estar todas englobadas em uma mesma obra, ou serem tratadas separadamente. E foi na exploração desses temas que Bosch atingiu um alcance de visão artística raras vezes presenciado. Podemos ver em seus quadros uma visão pessimista, caótica e absurda da humanidade, demonstrando um profundo conhecimento da alma humana, de suas sombras, de seus medos, de suas fraquezas, de seus defeitos e desejos, de suas obsessões, de suas insanidades, do seu destino, dos enigmas de seu inconsciente coletivo.

Suas visões povoadas de monstros aberradores, de demônios semi-humanos, de homens e mulheres perversos e/ou enlouquecidos, submergidos em um universo de sombras e caos são intensamente simbólicas. Podemos perceber alusões altamente enigmáticas ao ocultismo (do qual era profundo conhecedor), críticas ao catolicismo, na forma de padres sendo retratados como diabos, tarados sexuais, seres humanos corruptos e decadentes, transformados em animais, ou animais transformados em seres humanos, toda uma multidão de seres depravados, medíocres, imbecilizados, totalmente bestializados, jogados em infernos de tormentos que causaram a si mesmos. Bosch pintou a miséria humana, o homem mergulhado em sua mediocridade, enquanto o mistério do cosmo o cercava, dominava-o, influenciando-o secretamente e rindo de sua ignorância. Tal análise impiedosa da humanidade ergue-se como algo universal, válido para todas as épocas e todos os lugares. E muito mais agora, em que vemos uma humanidade cada vez mais idiotizada e mecânica, desprovida de sensibilidade e alheia às questões de maior transcendência. Os homens tornam-se os monstros de Bosch, e o mundo agonizante dos homens torna-se os infernos tão horripilantemente expressos em suas pinturas.

E essa arte apocalíptica e visionária serviu de inspiração para, 400 anos depois, alguns artistas criarem o surrealismo e o expressionismo. Tais artistas consideravam Bosch como o seu mestre e precursor. Ou seja, Bosch antecipou-se na arte em 400 anos. Vejam bem, meus amigos, antecipou-se em 400 anos! De onde foi que obteve tanta imaginação? O misterioso e introspectivo Hieronymus Bosch, que teve inúmeros de seus quadros de transcendência e transfiguração queimados pelos católicos por julgarem que eram pinturas demoníacas, conseguiu adentrar no mais oculto da alma humana e expressar, lá na Idade Média, o que hoje vivenciamos no século XXI.

(na imagem, o quadro “Inferno”, o qual é o lado esquerdo do tríptico “O Jardim das Delícias”, de Hieronymus Bosch - clique sobre a imagem, para vê-la ampliada)

09 março 2010

O Poema Mais Puro

eu queria fazer o poema mais puro
como as sublimes águas
que celestam musicais
como os perfumes lagos
que profundam nos florais
e soprar verso luz
a tudo de claro que existe...

mas pensei em desistir
ao perceber que o verso meu
seria sempre triste...

mas também há pureza na melancolia
como os sublimes olhos
que lacrimam pelos rios
como os concertos anjos
que sentençam por sombrios
e soprar verso alma
ao que se voa pelo amor...

mas pensei em desistir
ao perceber que o verso meu
teria sempre dor...

mas também há pureza pelo sofrimento
como o sublime mártir
que se noite na verdade
como o transcendo gênio
que na arte sempre há-de
e soprar verso cruz
ao que se eleva em sacrifício...

mas pensei e... e desisti
ao perceber que o verso meu
teria sempre eu.

08 março 2010

Homenagem à Mulher


Hoje, Dia Internacional da Mulher, devo deixar a elas minha humilde homenagem. Deixo, então, o soneto de minha autoria abaixo, que está em meu livro "Poemas do Fim e do Princípio". Que cada um tire sua própria conclusão.

Soneto a Ela

E paira alta grandeza sobre as nuvens
e pesa mau destino sobre os homens.
Em negro mundo os anos se consomem
e mais clara em tua alma tu nos surges...

Caem raios das horas que refulges,
como sonhos de morte que em mim somem
como fins teus ocultos que há em Beethoven
como sombra em ti fêmea viva em luzes...

Tua voz nas tormentas que há nos céus,
teu olhar cataclísmico nos vela
nos sinais do Infinito dos teus véus...

E por ser Una, arcanamente bela,
alguém dirá talvez que vós sois Deus,
mas canto que vós sois no Eterno Ela...

(na imagem, o quadro "Flor ao vento" de Waterhouse)

Os Bugios Resistem


Passei este fim de semana na fazenda de meu tio, na região do rio Itacurubi. Estive lá harmonizando-me na imensidão dos campos, na profundidade das matas, na magia das águas, na pureza dos ares. De modo que retornei revitalizado.

Fora isso, o que também me deixou muito feliz foi constatar que os bugios estão lá, ainda, apesar da febre amarela que assolou o RS ano passado. Talvez agora não haja tantos bugios como havia até o verão de 2009. Mas ainda há várias famílias por lá. Apesar de não poder fotografá-los desta vez, como o fiz ano passado, fiquei satisfeito em ouvir os seus roncos magníficos, que já é um símbolo de nossas terras

Agora pergunto: os gaúchos que "amam sua terra" vão acabar com mais esse símbolo? Sim, por que os bugios no RS não morreram só de febre amarela. Muitos deles foram mortos envenenados por agrotóxicos (e ainda o são) e outros foram assasinados por perversos ignorantes que não sabem que o bugio não transmite a febre amarela ao homem, é o mosquito que transmite. Os bugios também são vítimas dos mosquitos. E ainda servem como um espécie de "termômetro" para sabermos se os mosquitos de determinda região estão contaminados ou não com o vírus da febre amarela. Quando um bugio morre pela doença, está dado o alrme. Se não há bugios, o alarme só será dado quando humanos adoecerem.

E mais uma coisa: o haemagogus, mosquito selvagem transmissor da febre amarela, não gosta de picar próximo ao solo, pois acha o ambiente muito úmido e escuro, o haemagogus prefere picar nas copas das árvores, onde é mais claro e seco. Por isso, os macacos são suas principais vítimas, lembrando que esse mosquito se alimenta predominantemente do sangue dos primitas. Porém, quando não há macacos, o haemagogus vê-se obrigado a descer ao chão para se alimentar. E então, pica o homem. Por isso, matar os bugios, ou qualquer outro macaco, além de ser uma maldade imperdoável, é de uma ignorância vergonhosa.

Na foto, uma família de bugios. O observador atento poderá constatar que ali há 5 bugios. Pai, mãe e 3 filhotes.

06 março 2010

Nem Tu És o que És

verás que o ser de tudo que é
não é aquilo que demonstra ser,
o ser das coisas
não é o que elas são...

vê mais fundo
no alto fundo que não se olha
e verás que por trás do todo
há um outro outro além de tudo...

o que se mostra
não é o que está ali,
ninguém vê o que olha:
o que está ali
não pode ser tido como estado...

o que sabes não é o que conheces,
o tudo que pensas saber
é aquilo que há em ti
mas não em teu ser,
o que há em teu ser
talvez agora esteja longe
e esse longe talvez seja o real...

há sempre outro verso
em tudo que é reverso:
verás que quanto mais com a luz
universares pelo escuro
mais começo e fim
verás em faces a existirem...

nem tu és o que és:
teu eu não é teu ser,
talvez teu eu agora seja noutro abismo,
como um sismo,
talvez teu ser então te chame mais acima,
noutra rima...

05 março 2010

Fernando Pessoa e seus Passos da Cruz IX


Continuo postando os sonetos de Passos da Cruz de Fernando Pessoa, conforme explicado na seguinte postagem: http://artedofim.blogspot.com/2009/12/fernando-pessoa-o-predestinado-passos.html . Na próxima semana, o 10º passo. Na imagem que acompanha o poema, o quadro "O Naufrágio" de William Turner.

Passos da Cruz - Soneto IX

Meu coração é um pórtico partido
Dando excessivamente sobre o mar.
Vejo em minha alma as velas vãs passar
E cada vela passa num sentido.

Um soslaio de sombras e ruído
Na transparente solidão do ar
Evoca estrelas sobre a noite estar
Em afastados céus o pórtico ido…

E em palmares de Antilhas entrevistas
Através de, com mãos eis apartados
Os sonhos, cortinados de ametistas,

Imperfeito o sabor de compensando
O grande espaço entre os troféus alçados
Ao centro do triunfo em ruído e bando…

04 março 2010

Poema Amargo



...nada
é o tudo que o Todo nos dá
quando a garganta é ao máximo erguida
e a esperança é ao extremo elevada

por mais que tua vida
esteja já arquitetada
verás como o sonho se torna caduco
e como a grave promessa da sorte
conta em deboche
sua sarcástica piada...

como a lua pela noite encarnada
a desilusão será sempre a amante
do sol frágil que te ilumina na estrada...

e terás, por fim, que fazeres uma sopa
com as letras já duras e secas
da felicidade
imagi...
nada...

03 março 2010

Giovani Pasini Lança "A Espiral e O Caracol"


Nesta sexta, o amigo e escritor Giovani Pasini lançará mais um livro, "A Espiral e o Caracol". Trata-se de uma obra onde são abordadas algumas das questões que sempre inquietaram a humanidade (e certamente continuarão a inquietar) como a existência ou não de Deus, o sentido da vida, as conclusões a que podemos chegar através de nossas próprias experiências existenciais, entre outras.

É um livro de questionamentos religiosos e filosóficos, onde o autor discorre sobre vários pensadores, em uma linguagem relativamente simples e acessível ao leitor leigo, sem, todavia, deixar de ser profunda. Vale a pena conhecê-lo.


01 março 2010

200 Anos de Chopin


Hoje o mundo comemora os 200 anos de nascimento de Frédéric Chopin, um dos maiores gênios do romantismo musical e um dos mais importantes compositores para piano da história da música.

Chopin nasceu em 1º de março de 1810, na pequena cidade de Zelazowa Wola, na Polônia, vivendo, no entanto, grande parte de sua vida em Paris, onde faleceu, segundo a história oficial, de tuberculose, embora estudos mais recentes sugiram que ele tenha morrido de fibrose cística. Chopin contava com apenas 39 anos de idade. Em Paris, é célebre o seu romance com a escritora Aurore Dudevant (que se utilizava do pseudônimo de George Sand), a qual muito inspirou o compositor polonês em suas apaixonadas e melancólicas melodias.

A música de Chopin é quase que exclusivamente para piano, solo ou com acompanhamento, característica que o torna único entre os grandes compositores. Trata-se de uma música bastante original e de grande expressividade técnica. Suas composições são geralmente densas e sombrias, de uma profunda expressão sentimental, carregadas de paixão e melancolia. Atingem os maiores extremos emocionais, partindo de uma celestial ternura e flutuante delicadeza até amargurados acordes de uma violência desesperada.

Pode-se dizer que o amor e a saudade da pátria são os temas mais constantes nas obras de Chopin. Antes dos 20 anos, Chopin já havia composto seus dois concertos para piano e orquestra, dois dos mais belos e expressivos concertos para esse instrumento já criados. Foram inspirados em seu amor por Constance Gladkowska, a quem teve que abandonar ao ver se obrigado a deixar a Polônia.

Logo após deixar seu país natal, sofreu uma profunda crise psicológica, conhecida como Crise de Stuttgart. Essa crise ficou registrada em uma série de escritos, o seu Diário de Stuttgart. Escreveu Chopin nesse diário:

“Por que vivemos essa vida miserável, que só nos devora e serve para nos converter em cadáveres? (...) É como se morrer fosse a melhor ação do homem... Qual será a pior? Nascer, desde o momento que é o contrário de sua melhor ação. Portanto, é perfeitamente plausível que eu esteja aborrecido por ter nascido neste mundo. Por que deveria querer permanecer em um mundo para o qual não estou preparado? O que minha existência poderia oferecer a alguém?”

Mas a sua existência ofereceu muito a toda a humanidade... Quantos milhares de casais já alimentarem sua paixão e seu amor ao som de suas mágicas notas, quantas vezes o seu gênio entristecido já nos ajudou a aprender a amar? E quantos homens desesperançados já se consolaram com os seus sobrenaturais noturnos e sonatas, com a tensa beleza e vivo mistério de suas mazurcas e polonesas e estudos e prelúdios...? E quem não conhece a sua marcha fúnebre? Sim todos a conhecem, ainda quem não saibam que a compôs. De modo, Chopin, que tua existência teve muito a nos oferecer...

(na imagem, Chopin pintado por Scheffer)

28 fevereiro 2010

Ao Fim do Pampa


quero-quero vasto que me olha denso,
o que é que alarma no teu sino antigo?

pampa que crepúsculas,
não te sones antes que eu me vide...

folha de angico que te nervas sopro,
o que é que julga na tua chama acesa?

pampa que te noites,
não te lues antes que eu me ocase...

sanga que adaga em todo um céu de chumbo,
o que é que marcha no teu grito frio?

pampa que te sangues,
não te doenças antes que eu me febre...

coxilha em cosmo que me fúria um sonho,
em quais sentenças é que te levantas?

pampa que te fins,
não te mortes antes que eu te ame...

26 fevereiro 2010

Falso Amor pela Terra, Tradicionalismo Vão e Mônica leal


O gaúcho, o brasileiro em geral, ama sua terra. Mentira! Ama coisa nenhuma! O que é amar a terra? O que é a terra? Como sou gaúcho, para não me estender em demasia, não vou falar aqui das terras amazônicas, das terras do cerrado, das terras do sertão, enfim, lugares esses onde a morte e a destruição sopram implacáveis há muito tempo, como demonstração sublime de todo amor que o brasileiro sente por sua terra. Vou falar da terra onde vivo, do pampa. Onde está o amor que os gaúchos tanto apregoam possuir por sua tão querida terra? Onde?!

Esses dias fui ao show do músico tradicionalista Leonel Gomes em uma fazenda no interior de Santiago. O show foi à noite, e durante o dia havia rodeio. Não vi o rodeio, apenas o show. Mas o que vi também foi um campo imundo, coberto de latas de cerveja, de garrafas plásticas, de papéis de picolé, de plásticos de todos os tipos, enfim, os senhores da tradição que dizem tanto amar a terra gaúcha, cobriram essa mesma terra de lixo. De lixo!

Isso é amar a terra? É transformar o pampa numa lixeira? Amar a terra é cobrir o campo de eucaliptos? É encharcar as lavouras de agrotóxicos? Amar a terra é entupir os rios de venenos, de esgotos, de detergentes? É assoreá-los devastando todas as matas que os protegem? Claro, rio não é terra, é água. Amar a terra é transformar campo em deserto de tanto explorar sem a mínima piedade? Amar a terra é massacrar os animais que nela vivem? É atropelar graxains, e tatus, e capivaras, e gambás e deixá-los estrebuchando pelas estradas? Amar a terra é varrer dela toda a vida?

E depois vêm com esses vãos tradicionalismos alardear que amam a terra gaúcha, que amam o pampa? Com raras e louváveis exceções, isso é uma mentira deslavada. Adoram andar ostentando suas pilchas, suas botas, seus lenços, suas bandeiras sobre o lombo de um pobre cavalo, mas por exibicionismo, não por amor. Adoram tomar seus tragos, fumar seu palheiros, dar seus gritos pelos campos, no mesmo campo que no outro dia irão pisar em cima, irão esmagá-lo, aniquilá-lo com toda a vacuidade e vergonha da ganância, da indiferença e da inconsciência.

Agora esses vãos tradicionalistas mataram cavalos em uma cavalgada imbecil para exibir o seu amor pela terra. Tudo isso é uma palhaçada. Uma cruel palhaçada que custou a vida de animais inocentes e indefesos, animais esses que deveriam ser amados pelo gaúcho, em sinal da infinita gratidão que deveríamos ter por eles. Os cavalos, que ajudaram a construir nossa história. E o verdadeiro gaúcho tem essa gratidão, sem dúvida, ama sua terra e os animais que nela vivem. E quem ama, cuida do que ama. O verdadeiro gaúcho não precisa andar pilchado para sê-lo. O autêntico gaúcho demonstra o seu "gauchismo" pela alma e pela consciência, não com exibicionismo barato. Ou melhor, caro, porque além de custar a vida de animais, custa o dinheiro do nosso bolso, que, como sempre, pagamos pelas palhaçadas deste governo vergonhoso que aí está.

Palhaçada sob os aplausos da Secretária de Cultura Mônica Leal. Uma incompetente, que só entrou para a secretaria porque era amiga da governadora. No embate entre Juremir Machado da Silva e Mônica Leal, fico com o primeiro. Ele tem toda razão. O que a Mônica fez pela real cultura em nosso estado? Eu até agora não vi nada. Só o que vejo nos reais campos culturais e artísticos são pesadas críticas ao trabalho (ou seria destrabalho?) da secretária.

A seguir transcrevo o trecho de um texto publicado no blog de Milton Ribeiro http://miltonribeiro.opsblog.org/2008/09/19/monica-leal-a-amiga-de-yeda-crusius/ :

“Mônica Leal foi colocada como Secretária de Cultura do Rio Grande do Sul por ser amiga de Yeda Crusius. Yeda afirmou que Mônica era alguém de sua confiança, uma amiga com quem tomava chá e chimarrão, enquanto Mônica replicava que estava encantada com o convite, apesar de não saber nada sobre política cultural, cultura, artistas, leis de incentivo, etc., mas que aprenderia, pois tinha boa vontade. Antes deste convite, Mônica Leal dizia “carregar a bandeira da Segurança Pública e a herança política de seu pai”. Nada mais próximo à cultura.


Em suas primeiras entrevistas, notei que Mônica tinha problemas maiores. Como dizê-los? Bem, parecia que a luz da inteligência não havia brilhado muito para ela, seus discursos eram vazios e, pior, sem o palavreado político habitual; ou seja, eram tolos. Uma vez, na abertura de um concerto da OSPA, o maestro Isaac Karabtchevsky, vendo que ela se perdia de forma constrangedora na frente de uma platéia que começava a rir, saiu em sua ajuda, aplicando os termos corretos: concerto, solistas, maestro, sinfonia, etc. A boa vontade de aprender cultura da secretária não estava à altura daqueles termos.

Mônica Leal é filha de um dos políticos mais truculentos e involuntariamente cômicos de nosso estado. Seu pai, Pedro Américo Leal, foi certamente o coronel mais entusiasmado com a ditadura militar. Era ele quem costumava ir aos jornais e TVs para, sempre aos gritos, afirmar que não havia tortura, que a ditadura realizava milagres em todos os campos e conclamava os comunistas a saírem de sob seus colchões. Ouvi-o muitíssimas vezes. Ele não aceitava apartes, era uma patrola.

Com a finalidade de defender a memória de papai, Mônica Leal já tentou retirar do Memorial do Rio Grande do Sul o Acervo da Luta Contra a Ditadura, desmembrando-o entre outras instituições. Ora, esta documentação — que ao que eu saiba nem está catalogada –, deve conter o nome de Pedro Américo Leal por todo lado.”

Essa é a nossa Secretária de Cultura... Vejam bem, meus amigos, de CULTURA! Sem mais.

25 fevereiro 2010

Inebriei-me de Ocaso...

flecha de Fim varou-me no peito
rasgando a carne como a água do mar
avança sobre a praia frágil:
insanamente lenta.

pé por pé
me lancei em lentidão da noite
e cada passo
era cada passo um século
cada século
era de sangue a gota
gota a gota
lacrimejava a vida
e passo a passo
me arrastava largo
vago arrastando
lento em adágio
formei-me vãos lagos
a cada compasso
lasso sangrado
e passo a gota
a marcha marcava
o rastro marcado
da morte alagada
lento inundado
do que desmorona
fúnebre marcha
em rastejo de cobra
sangue por sangue
sequei-me de alma
aos poucos do lento
em quase ao eterno
gole por gole
inebriei-me de ocaso
e ninguém viu que meu peito
que meu peito esvaziava

e devagar agonizo...
como a Terra nos morre...

23 fevereiro 2010

Fernando Pessoa e seus Passos da Cruz VIII


Continuo postando os sonetos de Passos da Cruz de Fernando Pessoa, conforme explicado na seguinte postagem: http://artedofim.blogspot.com/2009/12/fernando-pessoa-o-predestinado-passos.html . Na próxima semana, o 9º passo. Na imagem que acompanha o poema, o quadro "A Morte de Cleópatra" de Guido Cagnacci.

Passos da Cruz - Soneto VIII

Ignorado ficasse o meu destino
Entre pálios (e a ponte sempre à vista),
E anel concluso a chispas de ametista
A frase falha do meu póstumo hino...

Florescesse em meu glabro desatino
O himeneu das escadas da conquista
Cuja preguiça, arrecadada, dista
Almas do meu impulso cristalino...

Meus ócios ricos assim fossem, vilas
Pelo campo romano, e a toga traça
No meu soslaio anônimas (desgraça

A vida) curvas sob mãos intranqüilas...
E tudo sem Cleópatra teria
Findado perto de onde raia o dia...

21 fevereiro 2010

Sobre o Sangue

construí meu verso sobre o sangue
derramado duro na nua terra aberta
coagulado sangue seco pelo pó da enxada
que deserticamente escorre...

construí meu verso sobre o sangue
de água morta em rio derramado humano
sangue viscoso-negro entre a beira acabada
que poluidamente escorre...

construí meu verso sobre o sangue
de seiva-lágrima em derramada queda
esverdeado sangue de vastidão tombada
que devastadamente escorre...

construí meu verso sobre o sangue
do guará atropelado pelo horizonte
sangue vivo-lago derramado das estradas
que extintamente escorre...

meu verso é só uma expressão sangrada
de tudo aquilo que morre.

19 fevereiro 2010

Francesca da Rimini: Dante e Tchaikovsky unidos


Dante Alighieri e Piotr Tchaikovsky uniram-se para criar uma magnífica obra em conjunto. Claro que não pessoalmente. Dante morreu quase cinco séculos antes de Tchaikovsky nascer. Mas em 1876, Tchaikovsky compôs o poema sinfônico Francesca da Rimini, baseando-se no V canto do Inferno da Divina Comédia de Dante. Trata-se de uma das obras mais trágicas e violentas da história da música.

Porém, convém antes comentar brevemente sobre o que é um poema sinfônico. É uma composição para orquestra cuja intenção é descrever e expressar alguma obra literária. Ela pode ser baseada em toda obra ou em apenas em um trecho dela. Não confundir com a ópera, esta é cantada e teatralizada. O poema sinfônico é predominantemente instrumental e não teatralizado. Beethoven é considerado o precursor do poema sinfônico, mas foi Liszt quem o desenvolveu, criando inúmeras obras nesse gênero. Tchaikovsky, Richard Strauss, Cesar Franck, entre outros, foram também expoentes do poema sinfônico.

Francesca da Rimini está entre os maiores poemas sinfônicos já compostos. Mas quem é Francesca da Rimini? É um personagem do Inferno de Dante, cuja existência é verídica durante a Itália medieval. O genial poeta italiano encontra a sombra de Francesca a vagar no Inferno. Francesca fora condenada por trair seu marido, o qual era de desagradável aparência, com o próprio irmão deste. Os adúlteros foram condenados, no 2º círculo infernal, a serem carregados por uma brutal tempestade, um terrível vendaval, e estavam totalmente impedidos de voltar a se tocarem. No entanto, mantinham as recordações dos momentos felizes em que ainda podiam abraçar-se na entrega a seu amor proibido. E tais sensações eram fonte de indizível tortura.

Tortura essa que foi magistralmente expressa na obra de Tchaikovsky. O poema começa de forma absolutamente sombria, onde o clima infernal parece ser palpável no ar. Estamos entrando no Inferno dantesco. Em seguida surge o lúgubre soprar da tempestade, o qual vai crescendo assustadoramente, até se transformar em algo como um devastador e incessante furacão. A orquestra explode em impiedosos acordes de condenação.

Após, surge um momento de soturna calmaria, onde se apresenta o melancólico tema de amor do casal condenado. Trata-se de uma melodia escura e comovente, que vai tomando contornos cada vez mais intensos ao longo da obra, sob um fundo de sonho e pesadelo, de ternura e desgraça, de paixão e desolação. Porém, aos poucos, o clima do amor proibido dá lugar à devastação infrene da tempestade, que volta a soprar com toda fúria arrastando as almas dos condenados.

O obra encaminha-se então para o seu apocalíptico final, onde a força da orquestra torna-se absolutamente avassaladora, fazendo recair todo o peso da culpa sobre o casal de maneira insana e implacável. Ao finalizar-se, o poema sinfônico Francesca da Rimini deixa-nos a tremenda sensação de que acabamos de sair do mais profundo, mais sentencioso e mais invencível inferno. A obra é composta de um único movimento com mais de 25 minutos de duração. (na imagem, o quadro "A Barca de Dante", de Delacroix)

18 fevereiro 2010

Ninguém Pode Sabê-lo

o teu Mistério
ninguém pode sabê-lo nem vencê-lo
rosto de mar que se esvai pelas tênebras
e lá onde as verdes vozes ciclonam
o teu mistério ninguém pode sê-lo

que se espalha pelo azul dos mais vastos
em beijos de folhas que serenam perfumes
água da noite que se luz no não-dito
a um verso de ave inundando até sonhos...
o teu mistério ninguém pode vê-lo

ninguém pode ser o que vê sem ter sido
e nem pode saber se não vence o não-visto:
agora estou vago e do sol sinto um halo...
o teu Mistério ninguém pode sabê-lo...
só misteriá-lo.

16 fevereiro 2010

Fernando Pessoa e Seus Passos da Cruz VII


Continuo postando os sonetos de Passos da Cruz de Fernando Pessoa, conforme explicado na seguinte postagem: http://artedofim.blogspot.com/2009/12/fernando-pessoa-o-predestinado-passos.html . Na próxima semana, o 8º passo. Na imagem que acompanha o poema, o quadro "Incêndio nas Casas do Parlamento", de William Turner

Passos da Cruz - Soneto VII

Fosse eu apenas, não sei onde ou como,
Uma coisa existente sem viver,
Noite de Vida sem amanhecer
Entre as sirtes do meu doirado assomo…

Fada maliciosa ou incerto gnomo
Fadado houvesse de não pertencer
Meu intuito gloríola com Ter
A árvore do meu uso o único pomo…

Fosse eu uma metáfora somente
Escrita nalgum livro insubsistente
Dum poeta antigo, de alma em outras gamas,

Mas doente, e, num crepúsculo de espadas,
Morrendo entre bandeiras desfraldadas
Na última tarde de um império em chamas…

13 fevereiro 2010

Meu Livro Poemas do Fim e do Princípio – Uma Aposta no Livro Digital


Apresento aos leitores e amigos meu 2º livro, intitulado Poemas do Fim e do Princípio. O livro foi editado pela editora Livros Ilimitados e está em pré-venda em seu site, em duas versões: digital (e-book) e impressa. Poemas do Fim e do Princípio conta com 245 poemas em quase 250 páginas, o qual resulta de uma seleção realizada por mim mesmo entre a minha produção poética dos últimos cinco anos. A capa da obra é ilustrada com a pintura “A Tentação de Santo Antônio”, do gênio da pintura holandês Hieronymus Bosch. O quadro é considerado um dos mais apocalípticos da história.

Poemas do Fim e do Princípio ainda não foi lançado oficialmente, visto que os exemplares impressos que pedi somente ficarão prontos na semana seguinte ao carnaval. Seu lançamento ocorrerá em Santiago na 1ª quinzena de março, porém ainda não há data e local definidos.

Quanto à publicação do livro, resolvi fazer diferente desta vez. Ao invés de publicar um livro independente, encomendando determinado número de cópias a serem vendidas posteriormente, optei por publicá-lo por uma editora, realizando um livro totalmente profissional , com registro na Biblioteca Nacional e tudo mais. O livro será comercializado diretamente pela editora, o que não significa que não poderá ser adquirido por mim.

Sendo publicado por uma editora, a versão impressa sairá por um preço mais elevado do que se fosse editado de forma independente. Porém, a minha grande aposta está na versão digital do livro, a qual é bem mais barata que a impressa (inclusive se fosse uma edição independente), não necessita de frete (o que o barateia ainda mais), é prático, e, o que é muito importante, não agride o meio-ambiente. O livro digital, ou e-book, após efetuado o pagamento, será enviado para o e-mail do cliente informado durante a compra. Além disso, um livro digital publicado por uma editora possui um universo de divulgação muito mais amplo do que um livro independente. Para o autor mesmo é muito mais fácil, rápido e eficiente realizar a divulgação de um livro digital.

Hoje em dia, as pessoas leem bem mais poesia na tela do computador do que em livros impressos, principalmente os jovens, que passam horas e horas diárias ligados à internet. Tendência que só tende a crescer. E para aqueles que preferem ler o livro na forma tradicional, basta imprimi-lo. Portanto, eu recomendo a todos os leitores que adquiram o livro em sua versão digital.

Mesmo assim, o livro também poderá ser adquirido no formato impresso. Eu encomendei alguns poucos exemplares para o lançamento do livro em março. Durante o lançamento, os livros impressos estarão por um preço um pouco inferior ao preço de venda no site. No momento que estiverem determinados local e data para o lançamento, eu enviarei os convites.

Para quem já quiser adquirir o livro, esta é a minha página na editora Livros Ilimitados: http://www.livrosilimitados.com.br/loja/autores_descricao.asp?codigo_autor=7 .

Ali há um link que direciona para os livros em seus dois formatos. Então, convido todos a conhecerem o meu 1º livro de poemas. Qualquer dúvida, entre em contato pelo e-mail reiffer@gmail.com. Obrigado.

11 fevereiro 2010

Ao Fim da Rosa


rosa que paira pelo meu sonho
quem foi que sangrou-te à tormenta
quem foi que matou-te em meu sangue
rosa que sonha pelo meu grave?

quem foi que falou-te de amar-te
daquilo que voa e sempre te parte
quem foi que arrancou-te da noite
rosa que doente pelo meu sempre?

quem te atormenta pelas espadas
do vasto martelo firme na morte
quem te vaza do lago que canta
rosa que morre pela minha veia?

quem te disse que tu és passado
rosa que afoga em tudo que chove
em medo que corta tu te consomes
rosa que vai-te em tudo que corre?

quem é que te lança na faca que mata
rosa que vaga em tudo que é podre
rosa que finda em todo meu nada...?
rosa esmagada.


(na imagem, o quadro "A Rosa Meditativa" de Salvador Dalí)

09 fevereiro 2010

A Noite é o Seio

Noite...
negra flâmula do Fim...
és romântica, simbolista e pós-moderna:
a Noite é eterna.

quem pode impedir
o teu sempre ser?
quem além pode ver
entre o mistério que tens?
Tu sempre vens.

por mais sol
que brilhe nos olhos da bela
os olhos dela
hão de sempre fechar...
que de tudo há noite:
anoitece a vida
anoitece o sonho...
anoitece amar.

em tudo e no todo
cai a sombra divina:
as alegrias tombam
os sorrisos se fecham
e o romance termina.

o adeus aguarda no trono do tempo
e o seu aceno de réquiem
sempre nos alcança:
tudo descansa.

há a noite do dia
a noite do mundo
noite do Cosmos:
a Noite é a origem
Deusa de onde tudo veio...
e a Noite é o destino:
iremos todos repousar
no seu imortal seio...

(na imagem, o quadro “Noite Estrelada sobre o Rhone” de Van Gogh)