28 janeiro 2010

Sobre a Casa do Poeta de Santiago: eu não formo panelinhas.

Não sou homem de cobrar nada dos outros. E detesto que cobrem de mim. Os únicos que devem ser cobrados sem tréguas são os políticos, pois em sua maioria são parasitas que vivem e enriquecem à custa do dinheiro, do sofrimento e da ignorância do povo.
Dito isso, não concordo com cobranças para com aqueles que não foram ao Fórum de Literatura promovido pela Casa do Poeta de Santiago, entre outras instituições. Quem não quer ir, não vai, ninguém é obrigado. Eu mesmo não fui em vários eventos ditos literários. Se eu não quero, não vou.
Mas também não concordo com o julgamento do amigo Júlio Prates de que era necessáro convite particular para ir ao evento. O evento era aberto para todo mundo, nunca foi fechado ou eletista como ele afirma. Os convites particulares podem ou não ser enviados nesse caso. Não é algo imprescindível, muito pelo contrário, a maioria das pessoas que foram não receberam convites particulares. Eu, sendo parte da diretoria, não enviei convite para ninguém. Não sei se o presidente, o Pasini, enviou. Se enviou, ele tinha o direito, e eu não tenho nada a ver com isso. O Pasini tem o pensamento dele, e eu, o meu. Eu não o fiz porque julgo que seria uma forma de pressão para com a pessoa, e detesto pressões. Qualquer um era livre para ir ou não. O evento foi divulgado a todos, eu mesmo divulguei em meu blog várias vezes. Não era um lançamento particular de livro, que aí sim necessitaria de convite.
Quem quisesse participar, bastaria chegar ao local, fazer a inscrição, que seria muito bem recebido. E se quisesse vender seus livros ali, era só falar comigo mesmo, eu era o responsável para isso, junto com o Luiz Paulo Milani, outro membro da diretoria. Mas não enviei convites para tanto. A ninguém. Isso era aberto a todos os participantes do evento. Para que convites particulares para um evento que era aberto a toda a sociedade? Isso sim seria eletista.
E não sei por que essa história de que a Casa do Poeta é uma panelinha, se todos podem participar dos cafezinhos literários, e de qualquer outro evento, sem precisar fazer parte da Casa, sem precisar se associar, sem precisar de nada. Basta ir e expor sua opinião, o seu pensamento, o seu sentimento, a sua obra. E se quiser continuar a ir sem se associar, pode fazê-lo. E se quiser se associar, na hora mesmo isso será feito. Liberdade total e absoluta. Falta divulgação dos dias e horários dos cafezinhos? Talvez poderia haver uma divulgação maior por parte da imprensa, pois a divulgação é feita pela internet. Por que a imprensa não divulga? Panelinha é o que ocorre, por exemplo, no jornal Expresso Ilustrado, que possui a coluna Rotação Literária da qual fui proibido de participar pelo chefe do jornal. No entanto, o chefe desse jornal pode, tranquilamente, participar da Casa do Poeta.
Será que não gostam da diretoria da Casa do Poeta? Tudo bem, ninguém é obrigado a gostar dela. Se alguém quiser mudar a diretoria, basta se associar à Casa e compor uma chapa. Qualquer santiaguense pode fazer isso, basta se associar. A associação é muito barata, apenas três reais por mês. Não cobre nem as despesas da Casa. Qualquer um pode se associar, seja escritor ou não. Depois haverá a eleição. E todos os sócios votam. Quem não vai é porque não quer, não por falta de conhecimento, ou por qualquer outro impedimento. E se ainda não tinha conhecimento, agora está tendo. E se não quer ir, não serei eu que irei pressionar a fazê-lo. Nunca o farei.
Não posso admitir que afirmem que faço parte de uma panelinha. Detesto panelinhas, e sempre lutei contra elas. Lutei, sozinho diga-se de passagem, contra a panelinha formada pelo Oracy Dornelles e seus sequazes em torno da literatura em Santiago. Não será agora que formarei uma panelinha, ou que contribuirei para que ela se forme. Apenas não sou uma pessoa de andar atrás dos outros para que façam isso ou aquilo. Se alguém quiser participar da Casa do Poeta, de minha parte, será absolutamente muito bem recebido. Quem quer que seja. Inclusive o Oracy. Eu mesmo farei a associação. O convite está feito. Mas se não quiser, eu não irei correr atrás. E ponto final.

27 janeiro 2010

Poema Leve

minha obra que é nada leve
deixo que o furacão a leve
leve com tudo que a mim é nada
leve de nada que no fundo é tudo
que do todo não vivo me livro
como a mais trágica página
arrancada do mais trágico livro

que se apague essa funesta vela
o olhar sentença que meu sonho vela
arraste o meu peito em lava
às correntezas onde a água o lava
a água livre de lavado pranto

deixo que leve leve em descanso
a minha alma a nadar em vale
a minha a alma que nada vale...

25 janeiro 2010

Imortal

imortal
amor
amor tal
amoral
mal

amortal
imorre douro
que morre
sem ouro

imoral
não d’ouros
não duras
aah amor tal
amor tão...
em vão...
aah!
ah mortal!

23 janeiro 2010

A Lenta Morte da Mulher Bela - Final


Os gritos da bela mulher não eram reações desesperadas somente às suas dores excruciantes, mas ela reagia também às terríveis chagas que surgiam em todo o seu corpo e sangravam de forma inclemente, espargindo um sangue pútrido e mau-cheiroso, que se derramava por toda a cama, maculando os brancos lençóis e carregando o ar impuro de pestilentas emanações. As chagas desapareciam com o passar dos arrastados dias, mas sempre retornavam, cada vez piores, em cores mórbidas que iam do vermelho, ao roxo e finalmente ao negro.

E as pessoas ali respiravam aquela atmosfera mefítica, com uma imbecil tranquilidade sorridente. A mulher ardia em febre, e sua febre irradiava-se pelo ar, elevando a temperatura gradativamente. Ondas de enfermidade visivelmente partiam de seus entristecidos olhares de negras olheiras. Suas lágrimas não cessavam de escorrer como orvalhos de desgraça por seus miríficos cabelos negros. Sua face pálida e cadavérica implorava por misericórdia. No entanto, aqueles que viviam em seu quarto apresentavam um comportamento tão estúpido, tão indiferente, tão agressivo e miserável, que faziam, ainda que inconscientemente, com que a moléstia da mulher se agravasse ainda mais.

Em um instante soou um luto deprimente. E nas atmosferas ensombrecidas, mornas de enfermidade, densas de pesadelos, assomou pelo ambiente degradado a tensão desesperada de uma trágica marcha fúnebre. E suas notas noturnas vibravam como sinos agourentos de palpáveis maldições. Simultaneamente, adejaram pela janela as asas de um corvo que surgiu da noite distante, do espaço longínquo, e fitou seus olhos fundos de sentenças nas pessoas que ali no quarto estavam. O corvo assemelhava-se a um anjo. Trazia uma carta no bico.

Às vezes, os dias transcorriam em aparente serenidade. A serenidade funesta que antecede as mais devastadoras tormentas. E nos dias lentos, rastejantes, de tensão insuportável, relâmpagos e trovões, por vezes distantes, por vezes próximos, espargiam horrores e deixavam um odor ominoso pelo ambiente do quarto. E o clima obscurecia-se paulatinamente.

Ataques golfejantes de tosse assediavam os pulmões da bela mulher. Golfadas espessas de sangue espalhavam-se por todo o aposento. Um catarro amarelecido descia canhestramente de seu nariz. Ela debatia-se e revirava-se na cama inundada de um suor ardente, pegajoso e febril.

Pela janela semiaberta do quarto, uma estranha luminosidade avermelhada penetrou no ambiente de dúvidas e desesperos adejantes. A bela mulher desvairava, inebriada das mais absurdas catástrofes. Contorcendo-se de dor em todos os seus órgãos, ela levava as mãos amareladas e ressequidas, de veias proeminentes, à cabeça que latejava freneticamente.

Um sopro anômalo e rubro de sangue entrou com diabólica violência pela janela entreaberta. Tal sopro deve ter afetado a sanidade da bela mulher. Agonizante, como um furacão ela redobrou suas forças para erguer-se da cama sanguinolenta. Insana, descontrolada, enlouquecida, ela agarrou com suas mãos crispadas, de unhas crescidas e ensanguentadas, um por um o pescoço daqueles que viviam em seu quarto e os estrangulou com fúria alucinante. Nove dos dez moradores do quarto foram mortos dessa forma. Apenas aquela mulher que sinceramente tentava ajudar a bela enferma foi poupada. E, nesse instante, uma tênue fagulha de vida refulgiu em seus enormes olhos verdes. E o nome da bela mulher era Terra.
(na imagem, o quadro "O Pesadelo", de Füssli.)

22 janeiro 2010

A Morte Lenta da Bela Mulher


A magnífica beleza daquela mulher deslumbrava a todos. Mesmo agora, gravemente doente, sua beleza ainda encantava. Mas um intenso sofrimento era plenamente visível em seu rosto de olhos fundos e encovados. Sua doença era verdadeiramente terrível, impiedosa, e, aos poucos, bem aos poucos, em uma extrema e quase imperceptível lentidão de brutal angústia, seu organismo ia sendo consumido pela absurda enfermidade. Era como a mais desolada e arrastada das marchas fúnebres.

Enfermidade que a definhava de uma forma digna da mais elevada comiseração. Seus sintomas algumas vezes surgiam, noutras, desapareciam por completo. Porém, quando retornavam, eram ainda mais violentos. Dores insuportáveis em todas as partes do corpo. Ela chorava copiosamente nestes momentos. Mas o que assombrava ainda mais era a inexplicável indiferença com que quase todos observavam a sua agonia.

Das dez pessoas que viviam em seu quarto, apenas uma delas sentia verdadeira piedade ao vê-la morrer de maneira tão lenta e sofrível. As outras aparentavam não se dar conta da devastadora desolação que acometia a bela e pobre mulher. No entanto, todos afirmavam que conheciam sua doença, que sabiam de suas causas a fundo e que possuíam a cura para a pavorosa e fatal enfermidade. Consideravam-se médicos de extrema perspicácia e inteligência. Havia até alguns que diziam que a doença não era grave, que seria facilmente curada e que exageravam no julgamento da intensidade de seus sintomas. Mas ainda não a haviam curado, apesar de todas as tentativas de fazê-lo, tentativas em realidade estúpidas, vergonhosamente insuficientes, enfim, absolutamente inúteis.

Todos os dez indivíduos também afirmavam com total segurança que conheciam o fato de que eles, todos eles, eram os responsáveis, os culpados pela bela mulher agora se encontrar enferma. Sim, a moléstia que a afetava foi causada pelas dez pessoas que viviam em seu quarto. Viviam em seu quarto e dependiam da bela mulher para tudo, para absolutamente tudo, inclusive para viver. Não viveriam sem ela. Daí então a urgente necessidade de curá-la. Se ela morresse, todos os dez morreriam com ela.

De modo que assombrava, era quase inacreditável a indiferença com que seus companheiros de quarto contemplavam a sobrenatural agonia que a passos de anômala marcha fúnebre levava aquela linda mulher a uma morte dolorosa e implacável. Algo realmente incompreensível. O que passaria pela mente dos cinco homens e das cinco mulheres que ali naquele quarto de doença viviam? O que passaria por seus sentimentos?

Talvez os moradores do quarto já estivessem tão habituados com a doença que causaram à mulher que já nem eram capazes de se emocionar com o vagaroso, lento, gradual sofrimento que ela irradiava. Havia ali somente uma pessoa que ainda agia intentando acender os sentimentos dos outros para que realmente tomassem consciência da iminente situação em que se encontravam. Porém, sempre inútil.

Mais e mais o clima reinante naquele quarto tornava-se pesado e nervoso. Sombras pesarosas iam surgindo dos cantos do ambiente carregado de densos espectros de ocaso. Lentamente, numa lentidão que parecia eterna. Em alguns momentos, luzes cintilavam em algumas pequenas reentrâncias quase ocultas que traziam consigo determinada esperança. Porém, em pouco tempo eram rapidamente subjugadas por nuvens escuras de uma fumaça de ignota origem.

Sistematicamente, a bela mulher em sua suprema agonia emitia gritos horripilantes, gemidos dilaceradores, que ensurdeciam e inflamavam os ouvidos dos seus companheiros de quarto, a ponto de sangrá-los. Mesmo assim, raramente se emocionavam, bem raramente...
Amanhã, o final.
(na imagem, o quadro "Mulher Morta" de Reinhardt Sobye)

21 janeiro 2010

I Fórum de Literatura e Meu Primeiro Livro de Poesias


Amanhã, dia 22/01/10, às 19h, ocorrerá, na câmara de vereadores de Santiago, a abertura do I Fórum de Literatura e II Encontro de Escritores do Mercosul. Ainda é possível realizar inscrições. É uma ótima oportunidade para os amantes da cultura. E até para os que não a amam tanto. Para maiores informações: http://www.casadopoetadesantiago.com.br/ . Confira no quadro acima o cronograma do evento.

Meu primeiro livro de poesias, intitulado Poemas do Fim e do Princípio, seria lançado durante o evento, mas infelizmente, por motivos de forças maiores, isso não será possível. O livro não ficou pronto a tempo. Ele está, no momento, sendo preparado pela editora Livros Ilimitados e deverá ser lançado no final de fevereiro ou, no máximo, no início de março. Contará com 246 poemas escolhidos dentro de minha produção dos últimos cinco anos, de acordo com critérios de qualidade e de temática por mim estabelecidos. A publicação do livro será uma inovação em Santiago dentro do campo literário. Tal inovação será conhecida no dia de seu lançamento.

20 janeiro 2010

Fernando Pessoa e Seus Passos da Cruz (IV)


Continuo postando os sonetos de Passo da Cruz de Fernando Pessoa, conforme explicado na seguinte postagem: http://artedofim.blogspot.com/2009/12/fernando-pessoa-o-predestinado-passos.html. Na próxima semana, o 5º passo. Na imagem que acompanha o poema, o quadro "Mignon" de Von Schadow.

Passos da Cruz - Soneto IV

Ó tocadora de harpa, se eu beijasse
Teu gesto, sem beijar as tuas mãos!,
E, beijando-o, descesse p'los desvãos
Do sonho, até que enfim eu o encontrasse.

Tornado Puro Gesto, gesto-face
Da medalha sinistra - reis cristãos
Ajoelhando, inimigos e irmãos,
Quando processional o andor passasse!...

Teu gesto que arrepanha e se extasia...
O teu gesto completo, lua fria
Subindo, e em baixo, negros, os juncais...

Caverna em estalactites o teu gesto...
Não poder eu prendê-lo, fazer mais
Que vê-lo e perdê-lo!... E o sonho é o resto...

18 janeiro 2010

Poema Inebriado

e que no além seja tudo aquilo
que caí de ser além de tudo:
me deixando em tudo que não fui
seja minha arte o além mais alto...

o além de mais belo
do vasto que andei
chama que te li
tragos do que busco
ave que clarei
sempre que te bebo
mais do que te vejo
sonho que não li
beijo do que vou
verso mais que flor
olho que me noite
nada do que sou...

lá me alto e passo
lá sou só o que sinto:

céu e vinho tinto

17 janeiro 2010

do Destino

o coelho sai tranquilo
da toca e...
de repente o lobo o abocanha

o lobo vai tranquilo
com o coelho e...
de repente o pega a armadilha

o caçador vai tranquilo
com o lobo e...
de repente o pica a serpente

(...)

e era um dia nublado
chuvoso e...
de repente saiu sol

ninguém esperava...

15 janeiro 2010

Uma Pergunta:

mas o que foi que fizeste da tua alma?
quer dizer que a sabes
mas não a ouves?
quer dizes que a tens
mas não a lês?
quer dizer que a vês
mas não a pensas?
quer dizer que a amas
mas não a sentes?

de que adianta
noivar através das flores
se o perfume evapora
pela indiferença do nada?

de que adianta
luzir por entre olhares
se os sonhos escapam
pelo deixar cair das asas?

se achas que vives ter alma
é melhor que a esqueças:
pois só vive a alma
quem por ela morre...

14 janeiro 2010

Letras Aos Corvos (Antologia)


A Editora Literata está realizando uma antologia de poemas góticos e grotescos, com a organização dos escritores Ana Carolina Giorgion e M. D. Amado, e a participação é aberta a qualquer poeta.

Terei a honra de ser o prefaciador do livro, e também serei um dos participantes. Para informações mais detalhadas, tais como o regulamento para participação, comunidade no orkut, acesse o site http://www.letrasaoscorvos.blogspot.com/.


13 janeiro 2010

Fernando Pessoa e Seus Passos da Cruz (III)


Continuo postando os sonetos de Passo da Cruz de Fernando Pessoa, conforme explicado na seguinte postagem: http://artedofim.blogspot.com/2009/12/fernando-pessoa-o-predestinado-passos.html. Na próxima semana, o 4º passo. Na imagem que acompanha o poema, o quadro "Vênus" de Velázquez.


Passos da Cruz - Soneto III
Adagas cujas jóias velhas galas...
Opalesci amar-me entre mãos raras,
E fluido a febres entre um lembrar de aras,
O convés sem ninguém cheio de malas...

O íntimo silêncio das opalas
Conduz orientes até jóias caras,
E o meu anseio vai nas rotas claras
De um grande sonho cheio de ócio e salas...

Passa o cortejo imperial, e ao longe
O povo só pelo cessar das lanças
Sabe que passa o seu tirano, e estruge

Sua ovação, e erguem as crianças
Mas o teclado as tuas mãos pararam
E indefinidamente repousaram...

12 janeiro 2010

Eu Não Sirvo a Ninguém

como exemplo
não me siga
que eu a ninguém sou exemplo:
irias arrancar os cabelos
se visses o que trago por dentro

quanto mais belo é o que escrevo
mais de horrores me inundo...
eu não passo
de um vagabundo
e em todos meus passos
nos mais altos
abismos me afundo

o que eu faço da vida
não sei
sei
que meu peito estraçalhei
que quanto melhor é a Arte
mais grave é o enfarte

sou tão nada
que escrevo como escreveram
todos os poetas:
não passo de um triste
a minha própria alma
de tão funda
nem existe

construí catedrais inúteis
do que sinto
ergui minha alma
nos alicerces do que nunca vem
e tudo que digo
minto

do meu trono de miséria
olho-te cheio de orgulho e desdém
por isso não me siga
não me admire
que eu não sirvo pra nada
e não sirvo a ninguém.

10 janeiro 2010

Fatal

na minha boca
sangue de estrelas
sobre meus ombros
todo sol cai
tudo se esvai
lutando à luz do ocaso
trompas de arcanjos
cortam-me a testa
sobre meus olhos
vem todo céu
rasga-se o véu
olhando o fim pra sempre
rabos de raios
dando-me coices
na minha voz
pesa-me a lua
e a noite nua
amando a marcha e a morte
mundos não-críveis
trevas de luzes
cósmicos trezes
na minha alma
voou toda calma
se indo pelo Mistério

08 janeiro 2010

Não Melodio por Mim...

a final melodia que mais criei
é mais triste que tudo que crio
que é a melodia que não criei
que melodias não rio
mas melodias finais
é tudo que faço
e traço

fracasso
que não crio tudo que faço
só o que é cada vez mais trágico
e escuro
só traço o final mais puro
o estrago
a melodia que for mais triste
que é claro
não existe
e o final que for mais duro
e trago

o vinho que for mais largo
de cansaço
amarguro
e de sangue
na desgraça do braço
em pulso

foi com ele que (al)cansei o laço
errado
onde ando arrastando
o rastro
ondeando em vão
para lassar teu astro
na minha passada de vasto
em passados abraços
de finais e últimos
(com)passos...

07 janeiro 2010

"Eis o mal dos senhores, os políticos. Nem mesmo chegam a pensar em coisas importantes."


Acompanhando o intenso blog do Ruy Gessinger, li: "A Conta Está Chegando". Refere-se aos desastres ambientais que vêm assolando o RS, sendo o último a queda da ponte de Agudo pela devastadora enchente. Diz Gessinger:


"Mas a conta dos anos 70, do milagre soja-trigo, do desmatamento; a fatura do crescimento demográfico incontrolado ; a destruição de matas nativas e florestas ciliares não podia ficar impune. A Natureza se sente ameaçada, ela é um ser vivo, ela raciocina em termos de milênios, mas decidiu não ter mais paciência com esse serzinho ignóbil, com” suicidal tendences”. "

Faço minhas as suas trágicas palavras. A conta está chegando. E será alta, muito alta, altíssima! Mas não adianta avisar. Adianta? A destruição impiedosa e imbecil da natureza prosseguirá a passos de gigante. E virá a conta, em parcelas cada vez mais caras. E tanto não adianta avisar, que em 1928, eu disse em 1928!, quando ainda não havia preocupações ambientais reais por parte da humanidade, em seu livro "Contraponto", o genial escritor inglês Aldous Huxley advertiu sobre a desgraça que o "progresso" traria ao planeta. A seguir, um trecho da obra:

"Com essa agricultura intensiva, os senhores estão roubando ao solo o seu fósforo. Ele vai desaparecendo completamente de circulação. Depois, basta ver como os senhores deitam fora centenas de milhares de toneladas de anidrido fosfórico nesses esgotos! Derramando-o dentro do mar. E a isso os senhores chamam progresso. (...)

Eis o mal dos senhores, os políticos. Nem mesmo chegam a pensar em coisas importantes. Vivem a falar do progresso e deixam que todos os anos milhões de toneladas de anidrido fosfórico corram para o mar. É idiota, é criminoso, é... é o mesmo que tanger a lira enquanto Roma arde. Mais duzentos anos apenas e os depósitos se extinguirão. Os senhores julgam que estamos em progresso porque vivemos do nosso capital. Fosfato, carvão, petróleo, salitre, esbanje-se tudo! Eis a política dos senhores. (...)

O único resultado desse progresso dos senhores será que dentro de algumas gerações há de vir uma revolução verdadeira - uma revolução natural, cósmica. Os senhores estão transtornando o equilíbrio. Ao cabo, a natureza o há de restabelecer. E o processo será muito desagradável para os senhores. A queda será tão rápida como o foi a ascensão."

E essas palavras proféticas de Huxley já estão se cumprindo.

Para finalizar, republico um de meus poemas, escrito em outubro de 2009:

Enxurrada

olho para a humanidade
e rio
rio que me leva
leve
em suas correntezas
sem correntes

por que devo combater
o que não deve ser combatido?
o que não deve ser combatido
não deve ser combatido
por que já está vencido
o simplesmente é deixar assim
que tudo nasce
e corre ao Fim

não digo
que não irei com a enxurrada
digo que choveu forte vasto e além
e que a enxurrada vem...

06 janeiro 2010

da Sabedoria

uma nota sinfônica
sabe
por toda altura
acima
de cada letra filosófica

uma pintura mágica
filtra
sol e lua
avante
de quaisquer gases científicos

uma poesia trágica
rufla
suas negras asas
além
de toda poeira teórica

05 janeiro 2010

Fernando Pessoa e seus Passos da Cruz (II)


Publico, conforme anunciei na postagem do dia 28/12/09, o segundo da série de 14 sonetos de Passos da Cruz, de Fernando Pessoa. Semana que vem, o 3º soneto.


Passos da Cruz - Soneto II


Há um poeta em mim que Deus me disse...
A Primavera esquece nos barrancos
As grinaldas que trouxe dos arrancos
Da sua efémera e espectral ledice...

Pelo prado orvalhado a meninice
Faz soar a alegria os seus tamancos...
Pobre de anseios teu ficar nos bancos
Olhando a hora como quem sorrisse...

Florir do dia a capitéis de Luz...
Violinos do silêncio enternecidos...
Tédio onde o só ter tédio nos seduz...

Minha alma beija o quadro que pintou...
Sento-me ao pé dos séculos perdidos
E cismo o seu perfil de inércia e voo...
(na imagem, o quadro "João Batista" de Leonardo Da Vinci)

03 janeiro 2010

Frases para 2010

A seguir, deixo 13 trechos literários para reflexão neste ano que está principiando...



1)“Não é ilógico supor que, numa existência futura, possamos considerar esta vida terrestre como um sonho.”

Edgar Allan Poe

2)“A lembrança da felicidade passada é a angústia de hoje, as amarguras que existem agora têm sua origem nas alegrias que podiam ter existido.”

Edgar Allan Poe

3)“O corpo é a sombra das vestes
que encobrem teu ser profundo.”

Fernando Pessoa

4)“A morte é a curva da estrada,
morrer é só não ser visto.”

Fernando Pessoa

5)“Deus costuma usar o fogo, para nos ensinar sobre água.”

Fernando Pessoa

6)“Querer não é poder. Quem pôde, quis antes de poder só depois de poder. Quem quer nunca há-de poder, porque se perde em querer.”

Fernando Pessoa

7)“Como a arte é longa, e como a vida é breve!”

Johann Wolfgang Von Goethe

8)“Um prazer demasiadamente repetido produz a insensibilidade; não o sentimos mais como prazer.”

Aldous Huxley

9)“Por trás de toda grande fortuna há um crime.”

Honoré de Balzac

10)“Para não serdes os martirizados escravos do Tempo, embriagai-vos;embriagai-vos sem tréguas! De vinho, de poesia ou de virtude, à vossa escolha.”

Charles Baudelaire

11)“Que minha guerra contra o homem se eternize, já que cada um de nós reconhece no outro sua própria degradação.”

Conde de Lautréamont


12)"O homem não é o único a falar, o universo fala, tudo fala, linguagens infinitas.”

Novalis

13)“Tu és O Poeta, o grande assinalado
Que povoas o mundo despovoado,
De belezas eternas, pouco a pouco.”

Cruz e Sousa

02 janeiro 2010

Soneto Ainda Mais ao Fim

Mas da minha alma, Deus, que faço agora,
se mais e mais sou um louco isolado,
se toda esperança é sonho acabado,
se nenhum olho pelo Cosmos chora?

Pois de ocultar-me vejo chegar a hora:
tão somente um coração massacrado
é o que trago caminhando ao meu lado,
é o que te deixo... Sim, devo ir embora.

Exauri as cordas do meu violino
na tentativa de elevar-te além,
na luta insana contra o Gran Destino.

Voto agora ao homem total desdém
e uma carta a um corvo em febre eu assino
na Noite quieta que matar-nos vem...