26 setembro 2009

O Livro que Explica Deus


(Uma humilde homenagem a Jorge Luís Borges)



Ao falecer aquele sábio, um de meus melhores amigos, fez-me uma assombrosa revelação. Disse-me que existia, em algum canto do mundo, um livro jamais lido que explicaria Deus em toda sua verdade e completude. Segundo meu amigo, eu era o homem destinado a encontrá-lo e lê-lo pela primeira vez. E não deveria tentar fugir à minha missão.

Após encontrar e ler o fantástico livro, eu deveria divulgá-lo à humanidade. E para cumprir esse supremo desígnio, eu teria que dedicar a integridade de minha existência, realizar tudo o que fosse necessário para encontrar o livro onde quer que ele estivesse. Para tamanho empreendimento, eu possuía apenas uma informação: o livro estaria em um local onde jamais pessoa alguma colocou os olhos ou as mãos, porém, tal local se encontraria em um lugar frequentado regularmente pelas mais diversas pessoas. Perguntei em que país do mundo se encontraria tal lugar, mas o sábio não soube me dizer. Descobri-lo seria uma parte, a mais difícil, de minha missão. Acrescentou apenas meu amigo que o livro apresentaria uma capa preta sem absolutamente nenhuma inscrição. Eu deveria verificar a primeira página, pois ali estaria o título dele: “O Livro que Explica Deus”.

Como último questionamento, quis saber o que aconteceria comigo se não procurasse o absurdo livro. O sábio advertiu-me que não aconteceria nada, mas que o peso de minha consciência seria tão intenso que iria esmagar a totalidade de minha vida. Em seguida, meu amigo faleceu.

Eu tinha 22 anos quando fui abalado pela revelação. Minha reação inicial, apesar de já estar familiarizado com as inaceitáveis verdades do Ocultismo, foi de absoluto ceticismo. Porém, esse ceticismo se transformou em estupefação. E esta, em um terrível peso na consciência que me impossibilitava de dormir, de comer, de trabalhar, de me divertir, enfim, de viver. Não havia saída para mim. Fosse real ou não minha missão, eu deveria fazer tudo para cumpri-la.

Encontrar o fantástico livro parecia algo impossível. A princípio, era-me quase inviável imaginar um local intocado e jamais visto situado nos limites de um lugar frequentado por muitas pessoas. Apenas concluí que deveria ser um local público onde houvesse muitos livros. Seria uma biblioteca? Uma livraria? Uma universidade? Talvez algum museu? Uma igreja? Um templo? Enfim, imaginando quantos lugares assim deveriam existir pelo mundo, procurar o livro era um trabalho para Hércules. Eu não poderia realizá-lo. No entanto, uma força maior e implacável em meu interior como que me obrigava a sair alucinado à procura do livro que explicaria Deus.

E eu o fiz. Porém, não sem antes planejar muito bem como poderia realizar minha inaceitável missão. Primeiramente, julguei mais sensato procurar o livro nos locais públicos de minha cidade e de cidades próximas, sempre investigando à exaustão aqueles locais mais escondidos e, teoricamente, raramente observados pelo público em geral. O livro poderia estar camuflado de alguma forma. Então, toda atenção seria pouca.

Trabalhava pela manhã, e durante as tardes e parte da noite, dedicava meu tempo para a procura febril do livro. Minha vida resumia-se a isso. Alimentava-me mal, dormia ainda pior. Minhas horas de lazer não existiam, não havia feriados ou fins de semana. Sempre que conseguia férias de meu emprego, ou em feriadões, eu viajava para as mais distantes cidades do país e de países vizinhos, com o óbvio intuito de encontrar o livro. E sempre foram nulos os meus resultados. Creio que em cinco anos vasculhei quase toda a América. Claro que não visitei todos os lugares possíveis. Porém o mundo era muito vasto. Havia ainda quatro continentes para vasculhar.

Felizmente, sendo o proprietário de uma lucrativa empresa, durante esses cinco anos reuni uma considerável soma de dinheiro que me permitiria viajar mundo afora. E eu o fiz. Fui para a Europa, em seguida para a África, Ásia e Oceania. Creio que visitei todos os seus principais museus, bibliotecas, universidades, livrarias e igrejas; eu não suportava mais ver livros na minha frente, estava me transformando em um verdadeiro louco. Minha vida era de uma total insanidade. Não possuía amigos, renunciei ao amor, não tinha olhos para as mulheres. Não me divertia, não aproveitava os lugares maravilhosos que visitava, unicamente preocupado em encontrar o livro. Enfim, minha vida não existia.

Havia deixado minha empresa sob a direção de meu irmão, e ele frequentemente me enviava, como eu solicitara, boas quantias de dinheiro para prosseguir em minha demente missão. Passaram-se oito anos desde que parti do Brasil para a Europa. O último país que visitei foi a Nova Zelândia, na Oceania. E não encontrara absolutamente nada do fabuloso livro, nenhum sinal, nem a mínima referência, ninguém nunca ouvira falar nele, não estava em lugar algum entre os que procurei. Estava exaurido, verdadeiramente acabado. Emagrecera mais de 20 quilos, minha saúde estava precária, e eu sentia que logo enlouqueceria total e definitivamente. Procurei o livro divino por 13 anos. E nada. Decidi pôr um fim à minha missão suicida. E retornei para casa.

Retornei e tomei a resolução de viver a vida que não havia vivido. Optei por não reassumir a direção da empresa, e pedi a meu irmão que me destinasse uma renda mínima que me permitisse viver com dignidade, porém sem luxo ou excessivo conforto. Passei a dedicar-me à pintura, arte para a qual sempre tive talento, mas que as tarefas da vida cotidiana jamais me permitiram. Curiosamente, mesmo não encontrando o livro e não cumprindo minha missão, minha consciência encontrava-se estranhamente aliviada.

Ao mesmo tempo em que me aprofundava mais e mais na pintura e divulgava meus quadros com muito esforço e dificuldade, intensifiquei minhas relações sociais e criei um bom e confiável círculo de amigos. Junto com alguns deles, principiei intensos estudos no Ocultismo durante as nossas longas e agitadas noites regadas à vinho e à arte. Em nenhum de meus estudos, no entanto, encontrei qualquer livro que explicasse Deus em sua totalidade.

Relacionei-me com algumas mulheres, mas nenhum dos relacionamentos foi duradouro e definitivo. Seguia procurando um amor para minha vida. Empreendi algumas viagens, agora não para procurar o livro, mas para aproveitá-las como lazer e como crescimento humano e espiritual. Creio que aos poucos fui tornando-me um homem sábio. Não um sábio que renunciou à vida, mas que procurava vivenciar de forma diversa e intensamente as experiências existenciais, não rechaçando suas inúmeras oportunidades, mas aprendendo com elas.

Até que finalmente amei. Amei total e profundamente uma mulher que também me amou da mesma forma. Porém, eu não era feliz. No fundo, eu era um eterno insatisfeito. Sempre me faltava algo, e eu não sabia exatamente o que era...

Quando estava com meus 47 anos realizei uma viagem a uma pequena cidade do interior gaúcho. Lá, dirigi-me a uma biblioteca, uma das raras que não havia ainda visitado em minha terra. Apesar de a cidade ser pequena, sua biblioteca possuía um número razoável de livros.

Quando eu folheava um livro de literatura estrangeira, mais precisamente um antigo exemplar em alemão do “Faust” de Goethe, que parecia nunca ter sido retirado da estante, tamanha era a quantidade de pó e bolor em suas páginas, encontrei um outro livro em seu interior, de reduzidas proporções. Sua capa era inteiramente negra. Abri-o, e, na primeira página, li: “O Livro que Explica Deus”. Possuía apenas 7 páginas. Rapidamente li todo o livro.

O que dizia nele? Dizia exatamente esta história que você, leitor, está lendo. Você está pensando que escrevi este relato? Não, não escrevi uma linha, nem uma palavra. Tudo o que fiz foi transcrever com o mais absoluto rigor aquilo que estava impresso no livro. Não havia autor. Tampouco, havia ano, editora ou local de publicação, somente havia o que você leu e está lendo. Não acrescentei uma letra sequer ao livro. Esta história, rigorosamente DO COMEÇO AO FIM, é o que estava no “Livro que Explica Deus”. E esta história acaba aqui.

24 setembro 2009

Não

nos atuais dias
de que serve
um coração?
enfeite?
de-coração?

não!
um coração
não serve pra nada:
coração não deve servir
deve ser Rei
de cetro
e Espada

23 setembro 2009

Marco Peixoto: Um Bom Moço?

Alguns acham que o jornalista Lasier Martins pegou pesado com o deputado Marco Peixoto. Eu não acho. Acho que ele fez os questionamentos que deveria fazer, foi insistente como qualquer gaúcho que queira saber a verdade. Eu sim teria pegado pesado se fosse o entrevistador. Teria dito, entre outras coisas, que não é a primeira vez que o deputado é acusado ou suspeito de alguns envolvimentos excusos. Teria perguntado por que ele não assinou a CPI. Se não há o que temer, deixa investigar.
Teria dito também que naquela gravação onde o deputado dialoga com um senhor do qual esqueci o nome, ele não parece tão bom moço quanto na entrevista do Lasier Martins... Na entrevista, para a qual ele foi preparado, soube se defender muito bem, bons argumentos, o que faz dele um ótimo conquistador de votos: sabe argumentar bem (e tem dinheiro...). Mas é como eu já disse aqui: o Diabo também sabe argumentar maravilhosamente. Já na conversa da gravação, vemos o deputado Marco Peixoto um tanto quanto... malandro. Não acharam? Claro que a gravação não prova nada. Mas que deixa suspeitas, ah isso deixa... Contra o Sarney também não provaram nada que o tirasse do governo. Mas todo mundo sabe que ele é culpado, até o presidente, que frequentemente gosta de afirmar "eu não sei di nada"...
Primeiro que o deputado Marco foi falar com a governadora na companhia do Otávio Germano, logo por quem há mais suspeitas e, segundo as investigações, seria o mais comprometido com a fraude do Detran. Depois, o deputado Marco fala na gravação com um tom tão de sem-vergonha... Cá entre nós, não acharam o deputado Marco com jeito de culpado naquela gravação? Eu achei. Isso não quer dizer que ele seja (embora eu ache que é), mas está aí a CPI para provar se ele é ou não, bem como os outros envolvidos. Mas provavelmente a CPI não vai dar em nada. A bancada aliada já infestou a CPI com o propósito de acabar tudo em pizza. É até uma falta de hombridade não comparecer para ouvir as gravações. Uma falta de coragem. Gaúcho que se preze nunca foi de fugir da briga (falando nisso, deixo um poema meu abaixo, em homenagem atrasada à semana do gaúcho). Pena que a governadora não é gaúcha. Inclusive fez fiasco na Semana Farroupilha. Mas isso já é outros quinhentos... Ah, e falando na Yeda, tem uma gravação lá onde um cara diz que 11% era para a governadora e para seu ex-marido. Hehe, só 11%, governadora? E para dividir com o marido ainda? Se eu fosse governador exigiria uns 30%, no mínimo. Mas a Yeda sim é uma boa moça, nada gananciosa. Já eu, eu não presto.
Mas, por enquanto, eu só queria saber que negócio tão bom foi aquele que os deputados Marco e Germano fizeram com a governadora... Diz aí deputado, só pra Santiago, ninguém vai espalhar na capital. Não esqueces que tu és só um representante, é empregado dos santiaguenses. E empregado deve satisfação ao patrão. A gente também quer a nossa parte da negociata...
Encarnado

no espírito do gaúcho
há o lenço encarnado...

mas se não há força
mas se não há luta
se não há combate
se não há coragem

não há espírito algum
encarnado no lenço

21 setembro 2009

Ignorantes Eruditos

criaram governos de intelectuais
e exércitos de materialistas
com a intenção irrevogável
de aprisionar o universo
dentro do próprio crânio
de limitar o infinito
a seus próprios olhos
de contar a eternidade
com seus próprios minutos

intentaram
pôr barreiras
nas estradas cósmicas
censurar
a voz dos sonhos
amordaçar
a música das esferas
exilar
corações
e por fim
torturar e executar
almas

intentaram...
mas triunfa sempre
a Lib(V)erdade

19 setembro 2009

Pulsação

o tempo
é a expulsão
de todas as certezas
o tempo
é a impulsão
de tudo o que é absurdo
em in-pulsos
pulsos ao Fim
o tempo pulsa
o tempo passa
o tempo pensa
o tempo puma
o tempo tuba
o tempo troa
o tempo trompa
o tempo Tarde
o tempo parte
o tempo Marte
tempo martelo...

o tempo Morte
o tempo porta
o tempo pó
o tempo pulso
o tempo passa
e o homem só
de passa tempo

Mundo à Beira de Colapso Ambiental


Texto do jornal Correio do Povo de 25 de outubro de 2006:

Mundo à beira de colapso ambiental

Excesso de consumo gera devastação em ritmo superior à capacidade de regeneração do planeta


A população mundial usará duas vezes mais recursos do que o planeta é capaz de produzir dentro de 50 anos a menos que haja uma mudança imediata no estilo de vida da humanidade, alertou o grupo ambientalista Fundo Mundial para a Natureza (WWF) no relatório Planeta Vivo, publicado ontem. Os países com mais graves índices per capita de devastação ambiental provocada por seres humanos são Emirados Árabes Unidos, Estados Unidos, Finlândia, Canadá, Kuwait, Austrália, Estônia, Suécia, Nova Zelândia e Noruega. A China aparece em 69º lugar no ranking, mas o tamanho do país e seu rápido crescimento econômico fazem dela um importante ator no uso de recursos naturais sustentáveis, avaliam os especialistas do WWF Internacional.


O relatório bienal do grupo sobre a situação da natureza conclui que, se for mantido o atual ritmo de consumo dos recursos naturais seriam necessários dois planetas Terra para atender à demanda mundial até 2050. 'Estamos gravemente além do limite suportado pela natureza, consumindo os recursos disponíveis muito mais rápido do que a Terra é capaz de repô-los', disse o diretor-geral do WWF Internacional, James Leape. 'As conseqüências disso são previsíveis e terríveis', acrescentou. Se forem confirmadas as previsões, bens ecológicos como florestas e locais de pesca estarão devastados de tal forma que poderão desaparecer plenamente. Um dos indicadores das marcas deixadas pelos seres humanos nos ecossistemas é o declínio de cerca de um terço na população de mais de 1,3 mil espécies de animais vertebrados em todo o mundo entre 1970 e 2003, segundo o grupo.

18 setembro 2009

Meu Dever

13º Arcano...

vinho fatal
de sentidos múltiplos
de um cálice de Fim
se derrama último
sobre os copos imundos
em que ri a humanidade
ria humanidade
em rio de vinho
venho...

alma
que é antena dos tempos
tempo de em fim
e tempo de pois
e depois?

voo em asas de corvo
ao alto te quero que sintas
que tu sintas é tudo que quero
que tu sintas em mais altos voos
que tu voes em mais vastas almas
tuas almas levar em mais asas
elevar em minha alma tuas asas
e com alma levar os teus olhos
e teu olho elevado na alma
acima do Fim te deixo que sintas
e sentindo acima de tudo
e voando em cósmico mar
além do Fim
verá teu olhar...

16 setembro 2009

à Arte


a Arte
vale a pena
que tudo mais
é menos

a Arte é o nada
que tudo pode
que o todo diz
e nunca fala
silêncio e fúria
de sol dois olhos
ao longe raio
jamais se cala
do eterno filha
do tempo mãe
de fogo asas
visão de anjos
sem deus nem guia
não ouve humanos
deusa de si
além limite
sem fim nem morte
de onde pulsa
espada ao alto
tormenta e lago
de noite e alma
verdade e Marte

com ela sou
eu sou eu só
só...
à Arte

14 setembro 2009

A História de Chapeuzinho Colorido e o Não-Lobo-Mau

A bela Chapeuzinho Colorido, contrariada e com muita má-vontade, levava em uma pequena sacola os remédios para sua avó, conforme ordenara sua mãe. Eram medicamentos contra a hipertensão e a diabete. Chapeuzinho detestava ir à casa de sua avó, porque ela deveria seguir uma trilha por entre a mata, e a menina não apreciava nem um pouco a natureza. Reclamava dos mosquitos, tinha medo das odiosas cobras, repugnava-lhe ter que atravessar a pontezinha sobre o riacho, pois receava que ela pudesse cair, já que era muito velha.

O canto dos pássaros não a comovia, e a beleza das árvores era indiferente para Chapeuzinho. Era uma menina urbana e moderna, preferia passear nos shoppings e contemplar as vitrines das lojas, como toda boa consumidora. De modo que somente visitava sua avó quando era obrigada por sua mãe. Nesses momentos maldizia aquela velha rabugenta que fedia a fumaça de fogão. E maldizia sua mãe também, aquela mulher antiquada e autoritária.

Porém, logo ao tomar a trilha que levava à casa de sua avó, Chapeuzinho foi surpreendida ao perceber que grande parte da mata havia sido cortada e queimada. A ausência da vegetação, no entanto, não a incomodava em absoluto, era até melhor, porque assim ela poderia pegar mais sol, bronzear-se mais. Só o que lhe perturbava era o cheiro de fumaça do mato queimado, que a deixava ainda mais irritada. Caminhando pela trilha, Chapeuzinho chutou o casco seco de um tatu que fora tostado. Logo adiante, viu o corpo de uma capivara que havia sido abatida a tiros. Chapeuzinho sorriu ironicamente. Sempre achara a capivara um animal feio e sem graça. Não faria falta aquela que estava ali morta.

Chapeuzinho estranhou não ouvir tantos cantos de aves como das outras vezes. Melhor assim, pensou. Já estava muito irritada mesmo, e o silêncio seria melhor, ou até cantarolar algum funk ou pagode. Caminhando um pouco mais, a menina avistou o cadáver de um cachorro-do-mato. Estava queimado. Nesse instante, Chapeuzinho lembrou das histórias de sua avó, quando contava sobre o lobo-guará, belo e antigo animal que nunca mais fora visto nas imediações. Apesar de sua avó insistir que o lobo-guará era um animal predominantemente dócil e inofensivo, Chapeuzinho não acreditava. A velha devia estar caduca, ou na sua insistente mania de defender a natureza, exagerou nas qualidades do lobo. Para Chapeuzinho, lobo era lobo. E lobo era sempre mau. Não merecia viver. Deu graças pelo animal não existir mais por aquelas bandas. Imaginem se ela cruzasse com um lobo-guará pelo caminho! O animal estúpido poderia agredi-la e até matá-la.

Finalmente, atravessando a floresta em grande parte queimada e devastada, Chapeuzinho chegou à casa de sua avó, que vivia sozinha. Como batera várias vezes à porta, e sua avó não atendia, resolveu entrar. Encontrou-a deitada inerte sobre a cama. Chapeuzinho tentou reanimá-la, mas foi inútil. Sua avó estava gelada, não respirava, devia estar morta. Chapeuzinho entrou em pânico. Não gostava muito de sua avó, não ficou realmente sensibilizada ao verificar sua provável morte, porém, não sabia o que fazer estando sozinha diante de uma pessoa sem vida. Não havia ninguém nas redondezas, porém, a menina correu para fora gritando por socorro. Um caçador que passava pelas imediações ouviu os gritos e dirigiu-se até a casa.

Chapeuzinho sentiu-se aliviada com a chegada do caçador, e pediu que ele fizesse algo para ajudá-la com a avó. O caçador disse que nada faria, e que era ótimo que a velha estivesse morta. Afinal, a avó de Chapeuzinho não passava de uma velha chata, rabugenta e impertinente, que com suas manias ecológicas vivia tentando impedir que os caçadores entrassem em suas matas. Felizmente, aquela velha retrógrada estava agora morta, e ele e seus amigos poderiam caçar à vontade e extrair a madeira de suas terras, coisa que já estavam fazendo há algum tempo de forma clandestina. Aquelas terras deveriam ser úteis para alguma coisa além de servir de abrigo para sapos e macacos barulhentos.

Chapeuzinho então, vendo que seria inútil pedir auxílio ao caçador, decidiu voltar para sua casa e comunicar à mãe sobre o ocorrido. No entanto, o caçador a impediu, puxando-a pelo braço e falando em seu ouvido:
- Que é isso, mocinha, fica mais um pouco. Sabe que você é muito bonitinha... Vamos, me dá um beijinho!

Chapeuzinho tentou resistir, empurrando o caçador, mas ele era muito mais forte e conseguiu subjugá-la, derrubando-a no chão. Mesmo com os gritos e com toda a resistência de Chapeuzinho, o caçador foi arrancando com fúria suas roupas e esbofeteando seu rosto delicado para que ela parasse de gritar. Baixou as calças e, segurando o pênis, exclamou com sua sórdida voz:
- Olha como é grande! Isso é pra te dar prazer melhor, hahaha!

E à força, penetrou brutalmente a indefesa Chapeuzinho. O estupro consumava-se com muita violência, a menina sangrava e, não suportando a dor, esperneava incessantemente, até que em um momento logrou acertar com força seu joelho nos testículos do caçador. Então, este se enfureceu ainda mais, agarrou a cabeça de Chapeuzinho e a bateu violentamente contra o chão por várias vezes, até que ouviu o barulho de seu crânio rachando e sentiu alguns respingos de sangue em seu rosto deformado pelo ódio e pelo monstruoso desejo sexual.

E, no corpo já sem vida de Chapeuzinho, o caçador prosseguiu com seu abominável estupro, prosseguiu até dilacerar repulsivamente o órgão sexual da menina, até deixá-lo em carne viva e expor as suas entranhas. Em seguida, apanhou sua espingarda que largara em um canto, e fugiu pelo que restava da mata, abandonando o cadáver ensanguentado de Chapeuzinho.

Quando saía da floresta e aproximava-se do riacho, o caçador assustou-se com a revoada de um enorme e agourento urubu inteiramente negro que estava pousado sobre uma rocha à beira d’água. Com o susto, o caçador escorregou nas pedras lisas e úmidas, bateu brutalmente a cabeça na rocha e estirou-se fulminado sobre as pedras. Seu crânio abriu-se com a violência do choque, e pedaços sanguinolentos de sua massa encefálica podiam ser vistos à beira do riacho, em uma poça de sangue.

Dias depois, seu corpo foi encontrado pela polícia. Os policiais tiveram trabalho para afugentar o bando de urubus que fazia um banquete arrancando os intestinos do caçador. Um dos policiais poderia jurar que os murmúrios lúgubres dos urubus quando afugentados assemelhavam-se muito a sombrias risadas...

Moral da história: o urubu tem razões que a própria razão desconhece.

12 setembro 2009

Advogado do Diabo

Acompanhando o blog do Júlio Prates, li sobre o senhor Políbio Braga, defensor do governo Yeda. O fato de seu governo precisar de um defensor tão ferrenho e capacitado, deixa ainda mais claro a fragilidade e incompetência do seu "novo jeito de governar". Yeda precisa de um bom jornalista para defender aquilo que é indefensável. É como o bandido óbvio que só se livra da cadeia porque contratou um excelente advogado. Argumentar contra ou a favor de alguma coisa, sempre é possível. Até mesmo a favor do Diabo é possível se argumentar. Para que melhor argumento para justificar sua queda que o de Satã, no "Paraíso Perdido" de Milton? Argumentou Satã: "Melhor ser rei no inferno que escravo no céu!". É como os que argumentam que não há aquecimento global. Os argumentos são ótimos, mas os fatos falam por si. Basta olhar para o planeta... Eu preciso falar algo sobre isso? Contra os fatos, não adiantam argumentos. E o fato é que o governo Yeda é um desastre em quase todas as áreas. É só olhar. E se ainda fosse bem sucedido em outras áreas, o descalabro, o caos vergonhoso e revoltante que seu governo implantou na educação já seria mais que suficiente para merecer o meu mais completo desprezo. Governo que não valoriza a educação é sempre um desastre. Sempre! Por mais que o senhor Políbio bem argumente, não apagará os fatos. O que o governo Yeda merece, com todo seu secretariado, é a lata de lixo. Basta de poluição no planeta.

Pedaços de Versos

e hipertensão artística
de um coração febrilunar
enfartado de esper
ânsias

e dois beijos viróticos
à sonata se terminando
em tua saliva holo
cáustica

e duas preces mezzo-fúnebres
de demônios incandescentes
sobre altares de re
legiões


e três letras pouco-elípticas
caindo em sono eternal
nos tristes braços de um será
fim

11 setembro 2009

Duas Considerações sobre a "Desatenção" Humana


Primeira Consideração:


Comentarei dois casos curiosos da desatenção humana. Quando classifico como "desatenção", na verdade estou sendo um tanto eufemista. Poderia ser mais duro. Mas deixarei assim mesmo.

Ontem, assistindo a um telejornal durante a madrugada, vi o caso de um homem em São Paulo que estava recolhendo com as mãos desprotegidos os papéis e plásticos acumulados nos bueiros transbordantes devido às fortes chuvas. Sua casa havia sido atingida pela enchente. Nas cidades grandes, e até nas pequenas, e Santiago já um exemplo, a poluição das ruas agrava profundamente o problema da drenagem das águas da chuva. Com bueiros entupidos, e com o crescente caos climático, as enchentes estão cada vez mais desastrosas.


E onde entra a "desatenção"? Entra no momento em que quase todos nós, e quase todos mesmo, jogamos lixo no chão aqui no Brasil. E aposto que o senhor que estava recolhendo o lixo com as mãos, muitas vezes já fez o mesmo. Será que agora aprendeu a lição? Acho que não. "Os seres humanos não aprendem as lições da vida nem a canhonaços". Eu mesmo estou cansado, exausto, de ver pessoas jogando nas ruas papéis de bala, de chocolate, garrafas de todos os tipos, lenços de papel, sacolas plásticas, propagandas distribuídas nas ruas. Quando estão no carro, jogam pela janela do carro. Se estão no ônibus, pela janela do ônibus. Ou seja, o planeta inteiro é visto como uma lata de lixo, não importa o local em que estejam. Não é assim? Esse é o homem. Bem, chega um dia que a volta vem. Ação e reação, Lei do Karma, chamem como quiserem. Mas sempre pagamos o preço de nossos atos, cedo ou tarde. A natureza não perdoa. E não perdoará.



Segunda Consideração:


Se eu dissesse que os cristãos atuais em sua maioria são satanistas, certamente me questionariam o porquê de eu fazer essa afirmação absurda. Mas eu digo que somente satanistas deveriam fazer o sinal da cruz de forma invertida. É o que fazem a maioria dos cristãos. É um ato inconsciente, é claro, é outro caso da "desatenção" humana. Qualquer observador atento perceberá isso claramente. A cruz invertida é um dos símbolos principais do satanismo. E é como a cruz é traçada quando os cristãos fazem o sinal da cruz: um toque na testa, um toque no meio do peito, na parte superior do peito, e dois toques nos ombros. Pronto. Se formos visualizar a cruz traçada, ela fica claramente invertida. Para a cruz ficar realmente correta, ao invés de o toque ser dado no peito, deveria ser na altura do umbigo, aproximadamente.


Não deixa de ser uma ironia que os ditos cristãos façam ritualisticamente e com frequência o sinal de seu maior inimigo, Satã. Por que será?

09 setembro 2009

Minha Opinião



os caninos expostos do Tigre
brancos como a morte
a gotejar saliva
inabalável para o bote
a um passo
de estraçalhar a presa

labaredas expostas do Fogo
rubras como a morte
a gotejar inferno
inextinguível para o incêndio
a um metro
de aniquilar mansões

tempestades expostas da Nuvem
negras como a morte
a gotejar catástrofe
interminável para o raio
a um minuto
de devastar cidades

assim
se deve escrever...

07 setembro 2009

Nada

nem uma estiagem sobre o peito
nem um canhonaço nas idéias
nem um furacão sobre a esperança
nem um genocídio dos valores
nem um tsunami na virtude
nem um terremoto na psique
nem a bomba atômica no espírito
nem uma catástrofe na alma
nada
nem o próprio Fim
acordará o homem
do seu nada
e do seu próprio Fim

06 setembro 2009

Poema Feio e Simples

disseram-me
que acreditasse
na humanidade
e que fosse
um homem são

que elevasse hinos
claros belos fortes
alvos vivos vastos
à altissonante
evolução

que eu me inflasse
de esperanças
que te amasse
com sorrisos
e nunca andasse
na contramão

que jamais saísse
da sensata linha
que fosse exemplo
bem comportado
bom cidadão

mas eu...
eu fui bem simples:
disse que não.

04 setembro 2009

Governo Yeda: Cambada de Sem-vergonhas


50 milhões de reais. Foi só isso que alguns políticos e seguidores de políticos roubaram do povo gaúcho através do Detran. 50 milhões não é nada. Em 3 meses de "trabalho" o idiota do Gugu ganha mais que isso. E um trabalhador que receba um sálário mínimo por mês, trabalhando 8h por dia, levará a bagatela de quase 10.000 anos para ganhar. Eu disse, 10 mil anos!!! Isso me lembra aquela música do Raul Seixas: "Eu nasci/há 10 mil anos atrás,/e ganhei trabalhando duro/ 50 milhões de reais..."

O governo Yeda é uma vergonha. Ora roubar só isso, quanta incompetência. E do povo ainda. O povo é burro, é fácil de roubar. Do povo que paga uma fortuna pra tirar uma carteira de motorista e se na hora da prova esquecer de ligar o pisca para estacionar, já rodou. Haha! Tudo isso deve ser uma piada. Não pode ser sério. Melhor se roubassem dos ricos. Eu respeito muito mais uma quadrilha de assaltantes de banco do que o governo Yeda. Pelo menos eles assaltam bancos, não o povo.

O governo Yeda é uma vergonha em todos os quesitos. Seus secretários são todos uns incompetentes, a começar pela secretária da educação (que acaba de sair, depois de não fazer nada que preste). A secretária deveria ser colocada numa sala de aula com 50 alunos mal-educados, violentos e desinteressados, recebendo o salário básico de uma professora estadual, levando trabalhos pra casa, sendo odiada pela sociedade e levando todas as culpas. Deveriam ter colocado a secretária nessa situação. Assim, ela estaria morta. Por suicídio. Até acho que essa sala de aula deveria ser a casinha da Yeda. Afinal, foi o povo que pagou. Dá pra fazer uma baita escola.

Desculpem, eu generalizei, disse que todos os secretários são incompetentes. Não devia ter generalizado. Mas que são todos incompetentes, ah isso são. Até que me provem o contrário, vou continuar pensando assim. Eu sou muito cabeça-dura. Aliás, eu sou do pensamento que todo homem é culpado até que se prove o contrário. Inocente nem as crianças são mais. Com 3 anos já estão rebolando funk sob os aplausos dos pais imbecis.

E os nossos deputados então? Fizeram uma CPI, mas parece que não querem que ela descubra nada. Sim, não há o que descobrir, todo mundo já sabe quem são os culpados. Por isso que sou fã do deputado Marco Peixoto do PP (Partido dos Playboys), ele, um homem inteligente, não assinou o requerimento da CPI. Não ia dar em nada mesmo. Ele é um orgulho pra Santiago. Como ele já sabe de tudo, pra que CPI? Só para o povo também ficar sabendo e ainda querer arrumar confusão querendo o impeachment da governadora? Cambada de Sem-vergonhas! O povo, não os deputados.

Cheguei à conclusão que sou muito burro. Não entendo de política. Aqui, o PT quer descobrir a corrupção e lá em Brasília defende o Sarney. Mas é melhor eu nem falar em Brasília, esse texto já está fedendo demais. Êeeta Brasil véio!

Mas nada disso me preocupa. Afinal, não tive que trabalhar 10.000 anos pra pagar a fraude do Detran. Felizmente, o povo é consciente e sabe que deve ser unir para pagar os roubos do governo. O que me preocupa é o seguinte: agora, Sem-vergonha é com hífen ou sem hífen? Ah, que se dane também. Nem quem fez as novas regras sabe direito mesmo. Na dúvida vai dos dois jeitos: Cambada de Sem-vergonhas! Cambada de Sem Vergonhas!

02 setembro 2009

Eu, Um Assassino (Parte Final)

Fui o primeiro a deixar a sala de reuniões. Com a companhia de dois de meus homens de maior confiança, fui até o banheiro, e meu primeiro ato foi lavar exaustivamente as mãos com água e sabão e logo após desinfetá-las com uma substância especial. Claro que não havia deixado o copo de água mineral na sala de reuniões. Trouxera-o em minha mão direita, tampado, e despejei seu conteúdo na privada, dando descarga em seguida. Após, coloquei o copo em uma grande sacola que estava com meus guarda-costas, tirei toda minha roupa de cima e também as depus na sacola. Nela, também foi colocada a pasta que estava comigo com tudo que havia dentro dela. Minutos depois, a sacola com todo seu conteúdo seria queimada por meus capangas. Antes de sair do banheiro, lavei minhas mãos mais uma vez, desinfetando-as novamente.

Sem dúvida, entre os quatro chefes, eu era o mais satisfeito. Acharam mesmo eles que eu iria pisotear em minha honra e esquecer suas afrontas e atrocidades contra minha gente? Que eu iria aceitar a paz com suas odiosas Famílias? Imbecis! Deixei-os pensar que poderiam estabelecer suas decisões, que eu as aceitaria. Porém, eu queria a MINHA paz, e a minha paz era vê-los mortos. E dentro de 24h, eles estariam mortos e eu estaria em paz. E a Família Veracini assumiria o controle total dos negócios.

É ostensível que não os envenenei. Há várias formas de se matar uma pessoa. No meu ofício, há que se conhecê-las todas e ter a consciência de saber utilizá-las da forma mais adequada e no momento mais correto. Jamais me equivoquei em um assassinato. E também jamais me arrependi de algum. Se achamos que podemos nos arrepender de algum ato nosso no futuro, é melhor nem cometê-lo. Todos os que matei, mereciam morrer. Eram assassinos como eu. E se ainda não eram, viriam a ser.

Eram pessoas que estavam em um negócio de risco e sabiam que a morte era uma companhia próxima e constante. Talvez eu também mereça morrer. Basta que alguém consiga me assassinar. É justamente esse o problema. Se alguém obtiver esse êxito, deixo meus aplausos antecipados. Às vezes, penso que ajo como se fosse um braço divino. Elimino pessoas que merecem ser eliminadas. Varro o mundo de uma torpe sujeira. De modo que quando chegar o meu momento de ser varrido, estarei preparado.

E também não me arrependo de trabalhar com negócios ilegais. Ganho dinheiro de forma desonesta? Talvez, mas o que é ser desonesto? O médico que cobra uma quantia absurda por uma reles consulta de 5 minutos para mal examinar um pobre coitado, e dizer que ele não tem nada, também não é desonesto? Um empresário que ganha lucros exorbitantes com seus produtos não é desonesto? O pastor de uma igreja que cobra para transmitir um conhecimento supostamente divino enganando a boa-fé dos cidadãos não é desonesto? O governo não é desonesto nos altíssimos e cruéis impostos que nos empurra goela abaixo? Sim, tudo isso é desonesto, porém é legal. É roubo permitido por lei. Quem disse que a lei é correta? Por isso não a sigo.

Com meus negócios, apenas disponibilizo às pessoas aquilo que elas desejam, porém é ilegal, a lei não permite. E elas me pagam pelo que disponibilizo e pelo risco que corro para tanto. Nada mais justo. Creio que até sou mais honesto que aquele médico que enriquece à custa da doença e da ignorância dos outros. Então, aquele que vier me acusar de desonestidade, que primeiro olhe para seu umbigo.

Sempre pensei que eu deveria criar e seguir as minhas próprias leis. Por que eu deveria seguir as leis estabelecidas por outros, que defendem os interesses de outros? Qual ser humano pode ou deve ter o direito de ditar regras, leis e condutas para outros humanos seguirem sem questionar?

Em todo caso, seja qual for a culpa que eu carregue nas costas, não serão os homens que me farão pagá-la. Jamais submeterei a eles a minha força de vontade. Deus talvez me fará pagar? É possível. Porém, nesse caso, também terei algo a receber. Mesmo com Deus, ainda assim, saberei negociar.

Mas creio que devo esclarecer como matei aqueles senhores, chefes das demais Famílias mafiosas. Obviamente eles ainda não morreram, mas já posso contá-los como mortos. Como deve parecer lógico, as trufas não estavam envenenadas, caso contrário eu jamais teria comido a trufa que foi indicada por Maschetto. Porém, somente agora revelo que retirei a trufa com minha mão ESQUERDA. E tive toda a atenção do mundo para em momento algum da reunião colocar qualquer dedo da mão direita em minha boca, nariz, olhos ou ouvidos. Lembrem-se que minha mão direita estava úmida com a água mineral do copo, e eu fiz questão de apertar as mãos dos demais chefes com bastante ênfase, para que suas mãos também ficassem umedecidas. Em seguida, sentamo-nos para o início das negociações. Imediatamente, ofereci as trufas aos três senhores. Cada um pegou uma trufa com a mão direita, a mão umedecida, e a comeu. Logicamente, eu já investigara se algum deles era canhoto. Felizmente, eram todos destros. As trufas não possuíam embalagens próprias, encontravam-se numa caixinha de plástico sem nenhum envoltório individual. De forma que os chefes encostaram seus dedos úmidos diretamente nas trufas. E as ingeriram. Pronto, consumado! Nesse instante, eles fizeram soar o martelo da sentença de suas próprias mortes.

Como disse, há várias formas de se matar uma pessoa. O problema é saber a forma mais adequada para cada ocasião. Existem, por exemplo, vírus mortais, absolutamente devastadores. A ciência descobriu vários. E aperfeiçoou alguns. Para guerras. O homem é mesmo perverso. É para coisas como essa que a ciência evoluiu.

Semanas atrás, incumbi meus homens de descobrirem qual dessas armas de guerra desenvolvidas pelas forças armadas americanas seria a mais mortífera, qual vírus mataria de forma mais rápida e mais cruel e possuiria um meio de contágio adequado para o caso em questão. Em poucos dias obtive a informação. Um vírus que destruía o organismo em aproximadamente 24h. Não foi difícil “comprar” um cientista que me fornecesse algumas cepas do vírus. Os cientistas de hoje amam mais o dinheiro do que a ciência. Eu até mesmo pensei que ele fosse sair mais caro. Claro que estou certo de que ele jamais quebrará o código de silêncio. Afinal, foi muito bem informado da fama e dos procedimentos da Família Veracini. Nossas propostas sempre são irrecusáveis. E jamais fazemos ameaças. O homem inteligente sabe se fazer entender sem nunca ameaçar. Quem ameaça já admitiu metade de sua culpa. E, obviamente, o cientista entendeu, afinal não é um homem estúpido, que será ótimo para ele viver sob nossa proteção e, em troca, fornecer algumas informações confidenciais quando necessário. Claro que também lucrando financeiramente. Ele pesou na balança, ponderou sobre os dois lados e percebeu que isso era bem melhor que acabar seus dias com uma bala metida na sua testa. Foi a conclusão a que ele chegou.

Bem, não será preciso dizer que na água mineral havia uma concentração de vírus fatais. Um vírus que não se espalha pelo ar, só contamina pelo sangue ou em contato direto com as mucosas humanas. Como as da boca. E mata em 24h. Fora do corpo humano, em temperatura ambiente, os vírus permanecem vivos por cerca de 12h.

De modo que agora, acabo de ler nos jornais: “Três dos maiores gângsteres da Filadélfia morrem de doença desconhecida. David Bracci, Antonio Machetto e James Bruniere faleceram poucas horas depois de serem levados ao hospital já em estado grave. Cerca de 9h depois de sua internação, seus corpos encontravam-se aniquilados em horríveis hemorragias. Ignora-se como contraíram a fatal enfermidade.” Sim, isso mesmo, hemorragias! Morreram derramando seu sangue miserável, esvaídos em sangue. Há que ter sangue! Sangue só se lava com sangue! Esse é o procedimento da Família Veracini.

Assina: Edgar Veracini

01 setembro 2009

Eu, Um Assassino

A reunião fora marcada para as 18h. Ficou rigorosamente estabelecido que no interior da sala de reuniões somente nós quatro entraríamos. Éramos os chefes das Famílias e discutiríamos os negócios de forma direta, sem nenhum tipo de intermediário. Para a segurança e maior tranquilidade de todos, combinamos que os seguranças, guarda-costas e capangas de toda espécie, inclusive caporegimes e consiglioris, deveriam permanecer pelo lado de fora, sem a mínima interferência no interior da sala. Pelo acordo, deveríamos, naturalmente, entrar na sala absolutamente desarmados.

Há muito eu esperava por esse dia. Minha preparação fora completa. Cheguei cinco minutos antes ao local combinado, acompanhado por três homens de absoluta confiança. Fui o segundo a chegar. Passados dois minutos, chegaram os demais chefes, praticamente ao mesmo tempo. Optei por ser o primeiro a entrar na sala de reuniões, não sem antes passar por uma exaustiva revista por parte dos guarda-costas das Famílias rivais, os quais conferiram também, como não poderia deixar de ser, uma pequena pasta que trazia comigo. Havia nela, conforme foi constatado, alguns documentos não confidenciais, canetas, cigarros, um pequeno copo lacrado com água mineral e uma caixinha com quatro trufas de chocolate. Questionaram-me o porquê das trufas. Respondi que eram para mim. Levar trufas envenenadas numa reunião seria um golpe tão primário que jamais algum chefe cairia. Fui liberado e penetrei no ambiente antecipadamente tenso da sala de reuniões.

Meu primeiro ato dentro da sala foi abrir a pasta, retirar o copo de água mineral e deslacrá-lo com o máximo cuidado. Umedeci minha mão direita com a água. Em seguida, entraram na sala dois dos chefes das Famílias, Bracci e Maschetto. Logo após, foi a vez de Bruniere. Cumprimentei Bracci e Maschetto com um forte e demorado aperto de mão. Da mesma forma o fiz com Bruniere, que, surpreso, comentou:

- Sua mão está úmida, Veracini, estaria um pouco nervoso?
- De forma alguma, Bruniere, você conhece bem a minha frieza. Eu estava bebendo um pouco de água mineral e acabei derramando o líquido em minhas mãos. Como podem ver, o copo está ali sobre a mesa. Os senhores queiram desculpar-me por cumprimentá-los com as mãos úmidas.
- Sem problemas, exclamou Bracci. Vamos sentar-nos e darmos logo início a nossa reunião. Gostaria que não nos prolongássemos em demasia.
- Sou da mesma opinião, completei.

Principiamos a discutir sobre nossos negócios. Nossos diálogos como de costume, eram calmos e pausados, cordiais, diplomáticos, delicados e sinuosos. Intentávamos dissimular ao máximo a tensão e a desconfiança que fervilhava no interior de cada um de nós. Tratando de negócios, nossos diálogos eram direcionados com o intuito aparente de ajeitar as coisas de uma forma que todos nós lucrássemos e deixássemos a reunião total ou parcialmente satisfeitos. Porém, a intenção verdadeira, aquilo que fervia em nossos âmagos era algo integralmente diverso. Desejávamos a morte um do outro.

Eu desejava com ânsia infinita a morte de cada um daqueles mafiosos, daqueles homens desonestos, cínicos, calculistas, dissimulados, mentirosos e assassinos. Exatamente iguais a mim. Aliás, nós não diferimos muito do restante da humanidade. Talvez a nossa diferença esteja no fato de que quando desejamos matar alguém, se for conveniente para os negócios, afinal sangue custa caro, nós o fizemos. Os outros homens não possuem coragem suficiente. Não possuem, provavelmente, porque não têm meios para isso. Se cometerem um assassinato, é quase certo que serão presos. Já nós, devido às nossas relações e influências, estamos seguros de que não iremos para a cadeia. Ninguém conseguiria provas contra nós. Somos sagazes demais para que permitamos o surgimento de provas. Então, afirmo solenemente que eu estava decidido a assassinar aqueles três chefes das Famílias rivais, com quem eu dialogava de forma tão tranquila e educada, mantendo-me frio, não obstante a tensão natural daquele momento.

Era óbvio que eu não iria matar aqueles senhores apenas porque isso era conveniente, lucrativo para os negócios. Há sempre algo de pessoal em qualquer assassinato. Eu os odiava profundamente. Mas não com aquele ódio de ferver o sangue, desesperado, explosivo. Tal categoria de ódio leva tudo a perder, sempre. Somente os tolos deixam seu ódio transparecer. Meu ódio era um ódio sereno, frio e perfeitamente controlado. Um ódio paciente, como a agressividade da cobra que se enrodilha e aguarda o momento certo de dar o bote.

Mas o certo era que os odiava. Eles já haviam assassinado pessoas intimamente ligadas a mim, amigos de confiança, parentes pelos quais eu nutria um sincero afeto, mulheres que eu amara. De modo que eu desejava a vingança. E poucas coisas na vida nos transmitem uma sensação tão deleitosa e reconfortante quanto o ato de vingar-se. Aquece o coração. Um homem com o sangue latino sabe muito bem disso. Sangue se lava com sangue. Quem tem sede de sangue não pode se satisfazer simplesmente com um mero copo d’água. De modo que eu queria sangue. Os outros não matam porque não podem. Porque não possuem a segurança interior e exterior e/ou a inteligência para tanto. Como eu possuo as duas as coisas, eu o faço.

Estou certo de que os outros chefes das Famílias também pretendiam acabar comigo. Porém, também estou certo de que não possuíam um plano infalível como o meu. E todas as minhas ações foram perfeitamente calculadas para que meu plano fosse concluído com êxito. De forma que logo no início de nossas negociações retirei de minha pasta a caixinha com as quatro trufas e as ofereci aos outros chefes, argumentando que isso simbolizaria uma confraternização de paz entre nós. Naturalmente, todos ficaram desconfiados, de modo que Bracci questionou-me com uma sombria ironia:

- É claro que as trufas não estão envenenadas, não é mesmo, Veracini?
Sorri e retruquei:
- E eu seria assim tão óbvio? Mas se desejarem, para tranquilizá-los, comerei por primeiro uma das trufas.
Maschetto, fumando seu charuto, concordou e acrescentou:
- É claro, mas nós escolheremos uma delas para você.
- De acordo! exclamei.

Maschetto mesmo indicou a trufa que eu deveria retirar e comer. E eu o fiz. Em seguida, tranquilizados, os demais chefes retiraram as suas e logo as saborearam. Em um momento tenso como aquele, em que o ar parecia denso e carregado de vibrações psíquicas um tanto negativas, saborear uma fina e deliciosa trufa de chocolate era algo que transmitia um agradável prazer tranquilizador.

E a conversa sobre nossos negócios foi se desenrolando de maneira cordial, cínica e hipócrita, como sempre acontece, sem deixar de ser séria e regada de tensas desconfianças mútuas. Vários assuntos foram teoricamente resolvidos durante a reunião, porém a mim isso já não despertava o menor interesse, eu apenas fingia concordar com tudo. Afinal, aqueles homens eram homens mortos.

Cerca de 2h depois, a reunião finalizou-se, e todos saímos satisfeitos com as resoluções tomadas e com os acordos pactuados. Os outros chefes das Famílias pareciam estar muito contentes com a minha boa vontade em aceitar todos os termos do acordo, tanto que até desconfiaram da relativa facilidade de minha aceitação. De forma que em alguns momentos tive que agir de maneira dissimuladamente mais dura, para que fossem amenizadas as desconfianças.

(Amanhã, a parte final)

30 agosto 2009

Fúria

cada sonho que se procria
é vergado por furacões
cada olho pelo horizonte
é um raio que me condena

o tempo passa e pulsa
a boca beija e brame
a morte mata e move

cada vida demais amada
é morte ao extremo temida
cada sino que bate aos olhos
é minuto chorando à porta

a terra treme e troa
a fera fere e finda
martelam Morte e Marte

cada bafo em crise do ocaso
é gelo que me explode as veias
cada ânsia enforcada à noite
é sopro que me queima as asas

grito-gangrena e guerra
sonho-sangue sangrado
trompa-trombeta ao tempo

28 agosto 2009

Johann Wolfgang Von Goethe


Hoje, 28 de agosto, completa-se 260 anos do nascimento de Johann Von Goethe, um dos maiores gênios da literatura universal, responsável pelo estabelecimento do Romantismo na literatura e fundamental para o seu surgimento nas outras artes.

Goethe nasceu em Frankfurt, na Alemanha, em 1749, e como Beethoven na música e Goya na pintura, ele representa a passagem da Classicismo para o Romantismo na literatura. Goethe é clássico e romântico. Para expressar a grandeza de Goethe, nada melhor que as palavras de seu grande amigo Schiller, outro grande nome do romantismo alemão: "Não há meios de capturar Goethe. Por isso, ao mesmo tempo, ele me é repugnante, e amo fervorosamente seu espírito e tenho por ele uma profunda admiração. Fez despertar em mim uma estranha mescla de amor e ódio. Seria capaz de matar sua alma, e, não obstante, seguir amando-o de todo coração..."

Muitos sentem o mesmo que Schiller com relação a Goethe. Uma atração e uma repulsa, como se fosse um estranha divindade pagã. Goethe é múltiplo, a tudo se adapta, de todos escapa e em tudo se tranforma. Além de ser um magnífico criador em todos os campos literários, também se interessou por todos os tipos de arte, pelo Ocultismo, pelas ciências naturais, pelas línguas, história, política. Tudo o atraía, e nada o prendia definitivamente.

A história de Goethe se adapta perfeitamente a sua vida, às necessidades de seu espírito. Nas palavras de Schiller: "seu destino fez tudo o que seu gênio necessitava, enquanto eu tenho que lutar até esse minuto!" E nas palavras de Paul Valéry: "Ele representa para nós, seres humanos, um dos nossos melhores intentos de assemelhar-se aos deuses".

Não há como não admirar Goethe, assim como é difícil simpatizar com ele de imediato. Ele não possuia pontos fracos para as feridas mortais, não dava passo em falso, jamais confundiu-se no mistério e sempre conservava uma secreta cautela, que lhe permitia chegar à beira do abismo e salvar-se no último minuto. Tanta segurança incomoda os homens. Queriam ver nele um ponto fraco, algo que o deixasse a mercê das críticas, mas jamais encontraram. Ele sempre se sobrepôs a tudo. E na sua obra máxima, "Fausto", formulou, abrangeu e elevou todas as questões fundamentais da humanidade, com uma maestria e consciência jamais igualadas.

"Cuidado, amigo,
Com este inimigo
mundo fatal...
Parece maciço,
Mas é quebradiço
como cristal".

Goethe