19 agosto 2016

Duas Injustiças nos jogos Olímpicos

Quando se trata de Olimpíadas, e acompanhei todas desde 1988, algo sempre me pareceu, de algum modo, injusto: as formas de premiação e a contabilização das medalhas. 

No caso das premiações, o que julgo como injusto é que as modalidades individuais têm o mesmo peso das de duplas e das coletivas. Isso parece significar que o esforço de um só ser humano tem o mesmo valor do de vários. Por outro lado, quem disputa modalidades individuais tem a possibilidade de ganhar medalhas em diversas variações de um mesmo esporte, o que não ocorre nos esportes coletivos. Um exemplo: o norte-americano Michael Phelps é um fenômeno da natação. Arrebatou dezenas de medalhas nas últimas olimpíadas, tantas, que SÓ ele possui mais medalhas que muitos países em TODA a história das Olimpíadas. Um deles é o próprio Brasil. Chega a ser vergonhoso. 

Mas no fato está embutida, na minha opinião, uma injustiça. Ele é um nadador excepcional. E a natação tem muitas modalidades. Phelps, naturalmente, é fora de série em quase todas elas. Acaba ganhando medalhas em várias modalidades de um mesmo esporte. Mas e no vôlei, por exemplo? Por melhores que sejam os jogadores de um time, eles nunca vão contabilizar mais que uma medalha no seu esporte. Seria o caso de contabilizar as medalhas de todos os jogadores da seleção vencedora. Não sei, talvez seja exagero, mas também é exagero que um só nadador tenha a possibilidade de contabilizar 3 medalhas, por exemplo, nos 50, nos 100 e nos 200m de um só esporte com várias modalidades de poucas diferenças, como é a natação. 

Outro fato que me parece injusto é  a forma como se contabilizam as medalhas. Por exemplo: nas Olimpíadas de Sydney, na Austrália, em 2000, o Brasil não conquistou nenhuma medalha de ouro, mas 6 de prata e 6 de bronze. No quadro de medalhas acabou atrás de Moçambique e Colômbia, que conquistaram apenas uma de ouro cada. Isso porque não importa quantas medalhas de prata ou bronze um país conquiste, uma só de ouro valerá mais que todas as outras. É ostensível que algo aí não é totalmente justo. 

Mas dificilmente haverá um reavaliação dessas questões, pelo menos não enquanto os EUA estiverem sempre na ponta do quadro de medalhas.  

17 agosto 2016

Ave Caesar Invintus

és mortto o silêncio in darmores
e os olhoos ocasam as tormares
nem céu mais lhe ditas alfontes
e os sonhos são finis e sânguines:
aos nuncas te iguais me encontrares...

mas

se destem os rithus del montes
se álcoois os teus lábios altares
no quando eu ser não-existires
improvo que sou-me no dantes:
meu rei torno é questão de acabes

15 agosto 2016

Peste Negra Mecânica

I – da Lógica Mecanicista

as pessoas
com mais nada se chocam.
não por estarem conscientes
mas porque já foram chocadas
pelas galinhas
da produção em série

II – da Peste dos Nossos Dias

o rodar derradeiro
do radar da Morte
a render seres humanos
e a rondar a humanidade

III – Só um Risco

as formas de vida
em risco
no risco ascendente dos lucros:
e em breve na vida
um risco



13 agosto 2016

Prepare-se

o homem não vive:
só se prepara.
nasce
e se prepara para crescer
depois é estudar para se preparar
e se preparar para o que vem depois

o depois
é se preparar para trabalhar
que o trabalho é uma preparação
para outras coisas mais
que ou são nada
ou quando vêm não bastam
e então se prepara para o que falta
que nunca deixa de faltar

e por fim se prepara para
quando se ficar velho
e...

a Morte

pois ao fim de tudo
nunca estamos preparados





11 agosto 2016

de melhor em mim?

o que não fiz
é que é meu autêntico fim

sou-me
um inaudito
nendito

não sei de mim
mais que o poema sabe de si
o melhor que faço
é o que escuto
e quando digo que não estou-me
é nada
em absoluto

só escrevo
porque escorre:
o melhor que (des)faço
é o meu porre


08 agosto 2016

Indecência

ser feliz...
como alguém pode ser feliz?
ou julgar-se ser feliz
(que, em tudo, é mais fácil julgar-se
do que ser)
enquanto crianças e suas inocências
agonizam de miséria e nada?
enquanto animais e suas inocências
se extinguem em crueldade e dor?

somente quem não sente
(que sentir é perceber)
não vê também sua culpa
ao passar satisfeito
pela família que no lixo
disputa os nojos e os podres
com as moscas e as baratas

somente quem não sente
(que raros sabem sentir)
não capta o horror
que é sorrir pelas estradas
enquanto passamos rápidos absortos
pelos animais atropelados
estrebuchados (des)encarneados
com a sagrada intimidade de suas vísceras
de sua carne de seu sangue
exposta
à indecência da alegria humana





06 agosto 2016

As Olimpíadas e Vinicius de Moraes


Estamos em época de Olimpíadas. E no Brasil. Independente se éramos contra ou favor da sua realização em nosso país, o evento está acontecendo, e, como brasileiros, é momento de torcer para que as Olimpíadas do Brasil sejam grandes, e que nossos atletas tenham o melhor desempenho da história. Não assisti à abertura, mas segundo a imprensa, inclusive a estrangeira, ela foi belíssima, unindo simplicidade, bom gosto e criatividade. No entanto, li no "Blog do Barão", de Zatonio Lahud, que, no momento da música "Garota de Ipanema", apenas o autor da música, Tom Jobim, foi homenageado. Mas e o autor da letra? Vinicius de Moraes, um de nossos maiores poetas modernistas, também merecia sua homenagem. Por que nossos escritores são esquecidos?


Pensando nisso, selecionei trechos do poema "Pátria Minha" do Vinicius. Acredito que seja bastante adequado ao momento:

Pátria Minha (Trechos) Vinicius de Moraes

A minha pátria é como se não fosse, é íntima
Doçura e vontade de chorar; uma criança dormindo
É minha pátria. Por isso, no exílio
Assistindo dormir meu filho
Choro de saudades de minha pátria.

Se me perguntarem o que é a minha pátria direi:
Não sei. De fato, não sei
Como, por que e quando a minha pátria
Mas sei que a minha pátria é a luz, o sal e a água
Que elaboram e liquefazem a minha mágoa
Em longas lágrimas amargas.

Vontade de beijar os olhos de minha pátria
De niná-la, de passar-lhe a mão pelos cabelos…
Vontade de mudar as cores do vestido (auriverde!) tão feias
De minha pátria, de minha pátria sem sapatos
E sem meias pátria minha
Tão pobrinha!

Porque te amo tanto, pátria minha, eu que não tenho
Pátria, eu semente que nasci do vento
Eu que não vou e não venho, eu que permaneço
Em contato com a dor do tempo, eu elemento
De ligação entre a ação e o pensamento
Eu fio invisível no espaço de todo adeus
Eu, o sem Deus!

Pátria minha… A minha pátria não é florão, nem ostenta
Lábaro não; a minha pátria é desolação
De caminhos, a minha pátria é terra sedenta
E praia branca; a minha pátria é o grande rio secular
Que bebe nuvem, come terra
E urina mar.

Não te direi o nome, pátria minha
Teu nome é pátria amada, é patriazinha
Não rima com mãe gentil
Vives em mim como uma filha, que és
Uma ilha de ternura: a Ilha
Brasil, talvez.

04 agosto 2016

Ninguém melhora Ninguém*

I - não escrevo
para que os outros me leiam
me entendam
me decifrem

escrevo
para eu fazê-lo
com os outros

II - não escrevo
para melhorar ninguém

(só o si
melhora a si
quando cai em si)

escrevo a meu ser
que saindo da miséria que sou
se vá além do que sei

III - ser poeta
é perceber
que não se percebe
é dar-se conta
de que não se dão conta

*Poema reelaborado e republicado.


02 agosto 2016

Robótico e Espacial

no mundo atual
(robótico e espacial)
não há espaço
para o desespaço
do mundo interior

por isso
não mais falo
do que sinto:
a qual alguém pode interessar
o que um outro sente
se o alguém nem sente
por si mesmo
nem quer saber
se o outro sente
e nem que outro é o outro?

só há sentido no ser
do sentimento expresso
quando o outro
o reflete e o encontra
expresso no seu ser
e então se conhece
do que de si mal sabia

mas ninguém
nem se encontra no seu ser
nem reflete por si mesmo
nem se expressa o que não sente
e por Fim
nem mal sabe de si
nem sentido há algum
em se saber o que nem há


31 julho 2016

Bebida Forte*

I - a poesia
(pelos olhos)
é pouco lida
porque exige
(pela alma) 
muita lida

II
- em termos de poesia
as pessoas
preferem os eventos
já eu               
ao termo da poesia
prefiro os ao ventos

III - a poesia é vida
e onde há vida
há morte

poesia
também pode ser festa
mas com bebida forte

*Poema reelaborado e republicado

29 julho 2016

O Junho mais Quente da História

Não, não foi o junho gaúcho. O nosso junho, na verdade, foi uma ilha de frio em um mundo onde o mês bateu todos os recordes de temperaturas ACIMA da média. A notícia, inclusive, saiu no jornal Correio do Povo na semana passada.

Segundo a NOAA (National Oceanic and Atmospheric Administration), dos EUA, o mês de junho deste ano foi o mais quente desde que se iniciaram as medições de temperatura, com quase 1ºC acima do normal, e foi o 14º mês SEGUIDO com temperatura acima da média.  Confira aqui.

Para os que insistem que não há alterações climáticas, que tudo não passa de invenção dos ecochatos, e que o homem, como sempre, é inocente, o pobrezinho, foi um balde de água fria, ops!, de água quente.

Pois é, lembrando que os cientistas alertam que 2015 foi o mês MAIS QUENTE já registrado, mas que ainda pode ser superado por 2016, se se confirmar a previsão de um final tórrido de primavera e início de verão no hemisfério sul. Aliás, a tendência é que 2016 e 2017 sejam os anos mais quentes da história, conforme a agência meteorológica do Reino Unido. (Aqui).

Mas ninguém tem culpa de nada. 

27 julho 2016

Rico só dá pra rico

Poema escrito em 2015, para o qual o momento em que vivemos tem dado ainda mais razão. Então, republico-o.

dinheiro chama dinheiro:
que quem o tem quanto mais
no quanto mais quer retê-lo
(e esse é seu único anelo)

e te percebas que os ricos
sempre se unem a outros ricos
que se protegem em mútuos
pois o que importa é seus lucros

então conclui-se que os ricos
por em tudo estarem juntos
(sendo a menor minoria)
mantêm sua merda em dia

mas o pobre que é mais número?
foi convencido que é nada
que não pode apoiar pobre...
é a regra: pobre se fode


25 julho 2016

O Grandioso Cu dos "Sábios"

I - lá vão os “sábios”
do nosso tempo
com sua baba aba(o)stada
de sabão:
falam e fazem espuma
julgam quem sangra ou noite oufuma
mas mantêm firmes
enquadrados no sofá
os limites do seu bundão

II – lá vão os “sábios”
vivendo de alfafa e alfarrábios
para tudo eles têm solução:
“é só fazer o que eu faço:
enfiar no cu pelo umbigo
tudo que for além do que digo
e deus-o-livre um palavrão!”

III
– lá vão os "sábios"
posudos podados peidados
de tanto manuais cartilhas e bulas
solenes sensatos e pulhas
com algemas correntes cadeados
para prender a vida
nas suas mentes “desta bitola”
e ensinar à vida, como esmola
como se deve viver
e por fim lhe dizer:
“eu não tenho razão?”

IV
– e lá vão os “sábios”
(que mal conhecem
o perfume dos lábios...)
para colocar o ser
o cosmos
a consciência infinita
num saquinho de ração



22 julho 2016

O homem é um rato ou um raro?

falta-nos humanidade
ou humanidade é o que é:
o isso que nos falta?

o homem é isto
ou homem é o que não se foi?
ou o que já se foi?

homem é a árvore que não cresceu
ou é a semente apodrecida?

ou o homem
é uma única árvore
que cresceu entre o adubo
de sementes podres?

o homem
são os ratos sub-humanos
os raros sobre-humanos?


20 julho 2016

Lições dos Bichos

há algo no voo do pássaro
que nos lembra que não vivemos

há algo na pata do puma
que nos lembra que nos perdemos

há algo no olho do corvo
que nos lembra que nem sabemos

há algo no canto do sapo
que nos lembra que nos fodemos


17 julho 2016

Aos Vícios ("Todos somos ruins, todos perversos.")

Trechos deste "insultante" poema de Gregório de Matos, o sempre atual Boca do Inferno:
Eu sou aquele que os passados anos
Cantei na minha lira maldizente
Torpezas do Brasil, vícios e enganos.

De que pode servir calar quem cala?
Nunca se há de falar o que se sente
Sempre se há de sentir o que se fala.

Isto faz a discreta fantasia:
Discorre em um e outro desconcerto
Condena o roubo, increpa a hipocrisia.

O néscio, o ignorante, o inexperto
Que não elege o bom, nem mau reprova
Por tudo passa deslumbrado e incerto.

E quando vê talvez na doce trova
Louvado o bem e o mal vituperado
A tudo faz focinho, e nada aprova.

Diz logo prudentaço e repousado:
-Fulano é um satírico, é um louco,
De língua má, de coração danado.

Se souberas falar, também falaras
Também satirizaras, se souberas
E se foras poeta, poetizaras.

A ignorância dos homens destas eras
Sisudos faz ser uns, outros prudentes,
Que a mudez canoniza bestas feras.

Há bons, por não poder ser insolentes,
Outros há comedidos de medrosos,
Não mordem outros não? -por não ter dentes.

Quantos há que os telhados têm vidrosos,
E deixam de atirar sua pedrada,
De sua mesma telha receosos?

Todos somos ruins, todos perversos,
Só nos distingue o vício e a virtude,
De que uns são comensais, outros adversos.

Quem maior a tiver do que eu ter pude,
Esse só me censure, esse me note,
Calem-se os mais, chitom, e haja saúde.


15 julho 2016

“Já bem me basta o horror de tudo quanto hei visto.” (Alphonsus de Guimaraens)

eu acredito em fantasmas
acredito em assombrações
acredito em lobisomens e em bolas de fogo
acredito em extraterrestres

acredito em fadas, duendes e sereias
acredito em sacis, mães d´água e curupiras
acredito em silfos, gnomos e ondinas
acredito

acredito em anjos, arcanjos, potestades
acredito em Lúcifer e em seus demônios
acredito até em Deus!

só não acredito no ser humano.

13 julho 2016

Despromessa

que minha poesia
(se é foda
ou se é vadia)
seja qualquer vão de hospício
faz de conta
sem um conto
lá pros quintos
dos abismos

que minha poesia
(seja funda
seja vazia)
não tenha nenhum compromisso
nem com compras
nem promessas
nem comícios

que minha poesia
não seja
nem cela
(daquelas que seguem regras)
nem sela
(daquelas que alguém encilha...)

a minha poesia
que só seja ela
e quem me dera
(ah, falta da minha estrela)
eu fosse sê-la

11 julho 2016

Divina Ironia

I - pensei,
ondeando os olhos
de Marya:
será que na  Luz
também há ironya?

II
- ouro de tolos
presentes aos não-presentes
dádivas aos não-pedidos
e carne para os cervos

a Verdade
dá nos nervos

III - o mais de vida na vida
é a vida devida
ou a devida vida?

IV - nada de sina mágica:
só ilusório ótico.
não entendeste?
ótimo

09 julho 2016

Noite pra Sempre

quem dera minha vida
fosse sempre noite
como um Stabat ou um Salve
de  Giovanni Battista
Pergolesi Reiffer

sempre noite
em segredo e medo
(num eterno ainda é cedo)
e eu não tivesse
que dizer mais nada
só um poema sem forma nem ritmo
como esta minha vida
sem fôrma nem trilho
sem norma nem brilho
noturnizada

fosse sempre noite
lagoas de música e álcool
vapores de vinho e de fumo
asas de precipício e céu
que viver não passa de morte
entre o sem nada e o sem rumo

que fosse sempre noite
aquela beira do fatal e do adiante
nunca a manhã que nunca é minha
que a esperança só existe
quando se está bêbado
e à merda todos os sênsatos
cágados autômatos

quem dera minha vida
fosse sempre noite
ou seja
fosse sempre vida