é brasa inflamada
jogada num poço
chama de incêndio
acesa na chuva
lava vulcânica
jogada na antártida
e o poço e a chuva e a antártida
é o teu coração
23 novembro 2009
21 novembro 2009
O que Fica...
que o tudo que sinto
seja mais forte mais vasto mais alto
que o nada
que me impele pra baixo
se alvejarem meu tigre
não apagarão a força
com que ele sangrou suas presas...
se flecharem minha águia
não apagarão o espaço
que percorreram suas asas...
se serrarem meu cedro
não apagarão a altura
que atingiram seus galhos...
seja mais forte mais vasto mais alto
que o nada
que me impele pra baixo
se alvejarem meu tigre
não apagarão a força
com que ele sangrou suas presas...
se flecharem minha águia
não apagarão o espaço
que percorreram suas asas...
se serrarem meu cedro
não apagarão a altura
que atingiram seus galhos...
20 novembro 2009
Schubert e a Canção mais Trágica do Mundo
Qual a canção mais trágica para você, leitor?
Na música clássica, a canção é universalmente denominada Lied (literalmente, canção, em alemão). Lieder é o plural. Trata-se de uma composição breve, de caráter lírico e melódico, geralmente para soprano ou tenor, com acompanhamento de piano, piano e algum outro instrumento, ou orquestra. O Lied também constitui uma união perfeita entre a música e a literatura, pois quase sempre a canção clássica possui como letra um poema composto por algum grande poeta. Goethe foi o poeta que mais teve poemas musicados.
O compositor austríaco Franz Schubert é considerado o responsável pelo desenvolvimento e ápice do Lied, seguido por Schumann, Brahms e Mahler. Pois Schubert compôs uma infinidade de canções trágicas. Muito difícil escolher qual a mais trágica. Qual a mais triste. E mais difícil ainda se compararmos com os lieder de outros compositores, principalmente Brahms.
No entanto, cheguei a uma conclusão quanto ao lied mais trágico. Fiquei entre vários de Schubert e alguns de Brahms, e decidi pelo lied "Der Atlas", que está no ciclo de lieder "Schwanengesang", D957, de Schubert. Esse não é o lied mais triste, nem o melhor. O melhor talvez seja o 1º lied das "Quatro Canções Graves" , "Denn es gehet dem Menschen", de Brahms. E o melhor de Schubert talvez seja "Gretchen am Spinnrade", com texto do "Fausto" de Goethe. Mas o lied "Der Atlas", com pouco mais de 2 minutos de duração, é, para mim, o lied mais trágico do mundo. Esse é o meu julgamento, obviamente subjetivo, como qualquer julgamento artístico.
"Der Atlas", ou "O Atlas" é um pequeno poema do poeta alemão Heinrich Heine, grande nome do romantismo. Atlas, é um personagem da mitologia grega que, devido ao seu desmedido orgulho, recebeu o castigo de carregar nas costas o mundo. É desse personagem mitológico que se originou a denominação dos atlas geográficos. Abaixo, está o poema de Heine, no original em alemão e com a tradução. Quanto à música de Schubert, eu espero ter despertado no leitor que ainda não a conhece, o desejo de buscá-la e conhecê-la.
DER ATLAS
Heinrich Heine
Ich unglücksel'ger Atlas! Eine Welt,
Die ganze Welt der Schmerzen muß ich tragen,
Die ganze Welt der Schmerzen muß ich tragen,
Ich trage Unerträgliches, und brechen
Will mir das Herz im Leibe.
Du stolzes Herz, du hast es ja gewollt!
Du wolltest glücklich sein, unendlich glücklich,
Oder unendlich elend, stolzes Herz,
Und jetzo bist du elend.
O ATLAS
Eu, desafortunado Atlas! Um mundo,
Todo um mundo de sofrimento devo carregar,
Carregar o incarregável, e no peito
Carrego um coração que quer se quebrar.
Ó, coração orgulhoso, bem tu o quisera!
Quisera felicidade, infinita felicidade!
Ou infinita miséria, orgulhoso coração,
Quisera tu! Agora és miserável.
(Na imagem, Schubert, aos 15 anos de idade)
19 novembro 2009
I FÓRUM LATINO-AMERICANO DE LITERATURA / II ENCONTRO DE ESCRITORES DO MERCOSUL.
A Casa do Poeta de Santiago, "Casa Caio Fernando Abreu", convida toda a comunidade regional para o lançamento da campanha de marketing do I FÓRUM LATINO-AMERICANO DE LITERATURA / II ENCONTRO DE ESCRITORES DO MERCOSUL.A campanha será lançada no dia 27 de novembro de 2009, sexta-feira, às 20h00min, na Câmara dos Vereadores de Santiago e o traje é esporte.
O evento internacional ocorrerá naquele mesmo local, nos dias 22, 23 e 24 de janeiro de 2010.Maiores informações podem ser obtidas no site da casa: http://www.casadopoetadesantiago.com.br/ .
O evento internacional ocorrerá naquele mesmo local, nos dias 22, 23 e 24 de janeiro de 2010.Maiores informações podem ser obtidas no site da casa: http://www.casadopoetadesantiago.com.br/ .
18 novembro 2009
Na Praça Pública
O poema a seguir, cujo título está acima, é de José Régio, um dos maiores nomes do modernismo português. Melhor que comentar um poema, é deixar que o leitor o leia e tire suas próprias conclusões. Assim deve ser a arte. Não é para ser analisada. É para ser vivida e sentida. Não existe uma interpretação única e "correta" de um poema. Existe o que ela suscita em sentimentos e pensamentos no leitor. Nem mesmo o autor é dono de sua poesia. Ele é seu instrumento. Bem, vamos ao poema, que é o que realmente importa...
....
Subi ao púlpito negro
Por minhas mãos levantado;
Levantado
Por minhas mãos esgarçadas...
E, da tribuna mais alta,
Arrepelando os cabelos,
Gritei à malta:
“Eh, Camaradas!... Ouvi,
Que vou dizer-vos quem sou.”
Depois
Tudo o que penso de mim,
A minha boca gritou.
Gritou assim:
“Desde Jó
Que sofro as minhas feridas
E as minhas resignações.
Bastou: preciso falar!
Jó, deixa uivar os leões!
(Tens uma jaula no seio...)
Que este é o meu ar.
Estas vagas mãos caídas,
Estes vagos olhos fitos,
Este vago riso alheio,
- Não sei quem foi que mos deu!
Eu?!...
Eu sou um doido aos gritos,
Um que torce as mãos e berra,
Com olhos cegos de pó,
Com boca cheia de terra,
Com sangue roxo nas unhas,
Com micróbios nos pulmões...
Jó,
Abre a grade dos leões!
Camaradas!... Camaradas!...
Eu sou um velho realejo
Velhas valsas descoradas
Que farto já de esmoer,
Desandou,
E desatou a gemer
Coisas que ninguém no mundo
Lhe ensinara,
E que ele sempre guardara
No fundo
Lá tão no fundo!...
Eu?! camaradas!
Eu sou o esboço de Alguém
Que esteve quase a nascer
Mas não nasceu.
...Quem não me deixa ser eu?!
Viver
É, para mim, duvidar,
Desvairar,
Interrogar,
Procurar-me
Torturar-me
Agarrar fumo nas mãos
E acenar a uns meus irmãos
Que sinto perto, e não vejo
Por causa da multidão...
Sou um desejo
Que não tem satisfação!...
Embrião
Que nunca pode ser flor,
(É esta minha tragédia
E é esta a minha comédia)
Sou a linha do Equador,
Que fica entre Cá e Lá...
Senhor!
Meu Autor,
Criador nosso,
Culpado disso que sou!:
Ah, Camaradas!...”
E eu ia enfim, revelar-me...
Não sei que vento
Me levantava os cabelos
E me arrastava
Num turbilhão...
Todo eu era um alarme
Que vibrava
Abria-se-me a prisão!
Abriam-se
As minhas fontes fechadas!
Meus olhos doídos, fundiam-se
Em lágrimas que nasciam
Do coração...
Então,
Parei, sentindo risadas
Entre aqueles que me ouviam.
E as suas caras diziam:
- Que charlatão!
Levantado
Por minhas mãos esgarçadas...
E, da tribuna mais alta,
Arrepelando os cabelos,
Gritei à malta:
“Eh, Camaradas!... Ouvi,
Que vou dizer-vos quem sou.”
Depois
Tudo o que penso de mim,
A minha boca gritou.
Gritou assim:
“Desde Jó
Que sofro as minhas feridas
E as minhas resignações.
Bastou: preciso falar!
Jó, deixa uivar os leões!
(Tens uma jaula no seio...)
Que este é o meu ar.
Estas vagas mãos caídas,
Estes vagos olhos fitos,
Este vago riso alheio,
- Não sei quem foi que mos deu!
Eu?!...
Eu sou um doido aos gritos,
Um que torce as mãos e berra,
Com olhos cegos de pó,
Com boca cheia de terra,
Com sangue roxo nas unhas,
Com micróbios nos pulmões...
Jó,
Abre a grade dos leões!
Camaradas!... Camaradas!...
Eu sou um velho realejo
Velhas valsas descoradas
Que farto já de esmoer,
Desandou,
E desatou a gemer
Coisas que ninguém no mundo
Lhe ensinara,
E que ele sempre guardara
No fundo
Lá tão no fundo!...
Eu?! camaradas!
Eu sou o esboço de Alguém
Que esteve quase a nascer
Mas não nasceu.
...Quem não me deixa ser eu?!
Viver
É, para mim, duvidar,
Desvairar,
Interrogar,
Procurar-me
Torturar-me
Agarrar fumo nas mãos
E acenar a uns meus irmãos
Que sinto perto, e não vejo
Por causa da multidão...
Sou um desejo
Que não tem satisfação!...
Embrião
Que nunca pode ser flor,
(É esta minha tragédia
E é esta a minha comédia)
Sou a linha do Equador,
Que fica entre Cá e Lá...
Senhor!
Meu Autor,
Criador nosso,
Culpado disso que sou!:
Ah, Camaradas!...”
E eu ia enfim, revelar-me...
Não sei que vento
Me levantava os cabelos
E me arrastava
Num turbilhão...
Todo eu era um alarme
Que vibrava
Abria-se-me a prisão!
Abriam-se
As minhas fontes fechadas!
Meus olhos doídos, fundiam-se
Em lágrimas que nasciam
Do coração...
Então,
Parei, sentindo risadas
Entre aqueles que me ouviam.
E as suas caras diziam:
- Que charlatão!
José Régio
17 novembro 2009
Sobre um Tema de Fernando Pessoa
“Aos que a felicidade é sol, virá a noite...”
Fernando Pessoa
é belo o sol
imperador classicista dos céus...
mas a peste romântica da tempestade
amargura do caos
violência de tigre que ataca
vem e não se detém:
finda-se a paz do sol
no desespero das nuvens
carregadas...
é belo o azul
dos céus inatacavelmente felizes...
mas a pata em silêncio do lobo da noite
decadência do olhar
peso do sonho que esmaga
vem e não se detém:
finda-se a paz do azul
no desespero das trevas
carregadas...
é belo o rio
sereno e límpido sob azul e sol...
mas violento e túrgido sob noite e chuva
vem e não se detém:
finda-se a paz do rio
no desespero das águas
carregadas...
é vão lutar
contra o que deve vir:
o Fim sempre vence...
então deita nas águas do rio
e deixa por elas ser
carregado...
Fernando Pessoa
é belo o sol
imperador classicista dos céus...
mas a peste romântica da tempestade
amargura do caos
violência de tigre que ataca
vem e não se detém:
finda-se a paz do sol
no desespero das nuvens
carregadas...
é belo o azul
dos céus inatacavelmente felizes...
mas a pata em silêncio do lobo da noite
decadência do olhar
peso do sonho que esmaga
vem e não se detém:
finda-se a paz do azul
no desespero das trevas
carregadas...
é belo o rio
sereno e límpido sob azul e sol...
mas violento e túrgido sob noite e chuva
vem e não se detém:
finda-se a paz do rio
no desespero das águas
carregadas...
é vão lutar
contra o que deve vir:
o Fim sempre vence...
então deita nas águas do rio
e deixa por elas ser
carregado...
(Na imagem, o quadro "A Tempestade" de Giorgione)
15 novembro 2009
E uma Ave que Voa...
aqui
como se não estivesse
como se tirassem o mundo
debaixo do meu sou
coruja que clama pela noite
e a noite amanheceu
como se fugisse o ar
ao meu erguer de asas
promessa branca
cumprida ao contrário
pacto de sangue
em sangue sem hemácias
descompactado
divino sorriso
só aberto em ironias
horizonte em mar
salgado
quando se tem sede
e uma ave que voa
na aurora da chuva
como se dissesse a deus...
como se não estivesse
como se tirassem o mundo
debaixo do meu sou
coruja que clama pela noite
e a noite amanheceu
como se fugisse o ar
ao meu erguer de asas
promessa branca
cumprida ao contrário
pacto de sangue
em sangue sem hemácias
descompactado
divino sorriso
só aberto em ironias
horizonte em mar
salgado
quando se tem sede
e uma ave que voa
na aurora da chuva
como se dissesse a deus...
14 novembro 2009
Limites
a formiga
no jardim
pensa que o mundo
é o jardim
o tubarão
no mar
penso que o mundo
é o mar
o periquito
no mato
pensa que o mundo
é o mato
o morcego
no escuro
pensa que o mundo
é o escuro
e o homem
no mundo
pensa que o mundo
é o mundo
no jardim
pensa que o mundo
é o jardim
o tubarão
no mar
penso que o mundo
é o mar
o periquito
no mato
pensa que o mundo
é o mato
o morcego
no escuro
pensa que o mundo
é o escuro
e o homem
no mundo
pensa que o mundo
é o mundo
12 novembro 2009
A Grandiosa Farsa de Yeda
Tu, amigo leitor, engoliste o pacote de reajuste dos servidores de Yeda e caíste na sua enganação, que tão pomposamente, prenhe de mentiras e hipocrisias, vem apresentando à sociedade? Eu não. E acredito que tu também não. No entanto, como a mídia vive manipulando o povo, e até mesmo os blogs estão estranhamente calados sobre o assunto, vamos à verdade, na forma de um divertido VOCÊ SABIA.
VOCÊ SABIA que o governo Yeda prometeu dobrar o salário da Brigada Militar, mas agora contempla os brigadianos com um reles aumento de 20%, e que continuam sendo os mais mal pagos do Brasil na área de segurança?
VOCÊ SABIA que o “reajuste” de Yeda só contempla 14% dos professores, pois 86% deles estão nos níveis 5 e 6, que não ganharão 1 centavo de aumento?
VOCÊ SABIA que os professores aposentados foram excluídos do “pacote”?
VOCÊ SABIA que esse “reajuste” na verdade não é um reajuste? É somente um completivo para os que ganham menos de R$ 750,00. E é um completivo que não se incorpora ao salário, pois será descontado quando houver qualquer tipo de reajuste real. Não há nenhum índice de reajuste proposto aos professores, tudo foi enfiado goela abaixo sem nenhuma discussão. Isso foi tudo que o governo Yeda fez depois de 3 anos sem dar ao menos a reposição da inflação ao magistério.
VOCÊ SABIA que o novo plano de carreira incluído no “pacote” acaba com direitos adquiridos pelos professores, como promoções, triênios, avanços entre níveis e licença-prêmio? E que aqueles que não aderirem ao novo plano IMPOSTO e não discutido entre as categorias terão seus salários congelados?
VOCÊ SABIA que dizer que o piso do magistério vai passar para R$ 1500,00 é uma imensa mentira? Piso salarial é o vencimento básico de início da carreira, e sobre ele recairão os avanços e gratificações obtidos. Já para Yeda, piso é tudo isso somado. Ou seja, para ela, piso é o mesmo que teto. Significa que um professor que ganhe R$ 1500,00 devido a todo seus avanços, gratificações e conquistas não receberá 1 centavo de aumento, pois já está dentro do piso, que é o teto. Por que será que ninguém fala sobre isso?
VOCÊ SABIA que o tão propalado 14º salário é outro engodo? Primeiramente, afirma que somente irão receber o tal salário aqueles professores que merecerem. Mais quais os critérios desse merecimento? Provavelmente será puxar o saco do governo e não questionar suas decisões. Será um abono para os puxa-sacos. E ainda assim, segundo o próprio secretário da fazenda, “Se o Estado não estiver equilibrado, não tem prêmio.” Haha! Digam-me quando que o Estado está equilibrado?
Esse é o novo jeito de governar, através da mentira descarada, e com um poderoso mecanismo de marketing por trás. Mas há algo de novo nisso? Outra prova da grande farsa que é este governo incompetente e corrupto de Yeda é o trecho da rodovia entre Santa Maria e Paraíso do Sul. Passei por lá semana passada. Há um enorme cartaz que ostenta: Recuperação do trecho... blá, blá, blá. Mas a realidade que salta aos olhos, e ao carro, é uma buraqueira e desníveis vergonhosos.
VOCÊ SABIA que o governo Yeda prometeu dobrar o salário da Brigada Militar, mas agora contempla os brigadianos com um reles aumento de 20%, e que continuam sendo os mais mal pagos do Brasil na área de segurança?
VOCÊ SABIA que o “reajuste” de Yeda só contempla 14% dos professores, pois 86% deles estão nos níveis 5 e 6, que não ganharão 1 centavo de aumento?
VOCÊ SABIA que os professores aposentados foram excluídos do “pacote”?
VOCÊ SABIA que esse “reajuste” na verdade não é um reajuste? É somente um completivo para os que ganham menos de R$ 750,00. E é um completivo que não se incorpora ao salário, pois será descontado quando houver qualquer tipo de reajuste real. Não há nenhum índice de reajuste proposto aos professores, tudo foi enfiado goela abaixo sem nenhuma discussão. Isso foi tudo que o governo Yeda fez depois de 3 anos sem dar ao menos a reposição da inflação ao magistério.
VOCÊ SABIA que o novo plano de carreira incluído no “pacote” acaba com direitos adquiridos pelos professores, como promoções, triênios, avanços entre níveis e licença-prêmio? E que aqueles que não aderirem ao novo plano IMPOSTO e não discutido entre as categorias terão seus salários congelados?
VOCÊ SABIA que dizer que o piso do magistério vai passar para R$ 1500,00 é uma imensa mentira? Piso salarial é o vencimento básico de início da carreira, e sobre ele recairão os avanços e gratificações obtidos. Já para Yeda, piso é tudo isso somado. Ou seja, para ela, piso é o mesmo que teto. Significa que um professor que ganhe R$ 1500,00 devido a todo seus avanços, gratificações e conquistas não receberá 1 centavo de aumento, pois já está dentro do piso, que é o teto. Por que será que ninguém fala sobre isso?
VOCÊ SABIA que o tão propalado 14º salário é outro engodo? Primeiramente, afirma que somente irão receber o tal salário aqueles professores que merecerem. Mais quais os critérios desse merecimento? Provavelmente será puxar o saco do governo e não questionar suas decisões. Será um abono para os puxa-sacos. E ainda assim, segundo o próprio secretário da fazenda, “Se o Estado não estiver equilibrado, não tem prêmio.” Haha! Digam-me quando que o Estado está equilibrado?
Esse é o novo jeito de governar, através da mentira descarada, e com um poderoso mecanismo de marketing por trás. Mas há algo de novo nisso? Outra prova da grande farsa que é este governo incompetente e corrupto de Yeda é o trecho da rodovia entre Santa Maria e Paraíso do Sul. Passei por lá semana passada. Há um enorme cartaz que ostenta: Recuperação do trecho... blá, blá, blá. Mas a realidade que salta aos olhos, e ao carro, é uma buraqueira e desníveis vergonhosos.
Alguém vai me rebater?
11 novembro 2009
Eu sempre me espanto...
porque falam
no milagre da vida
e nas maravilhas do cosmos
aqueles que julgam
que o milagre da vida
e as maravilhas do cosmos
não passam
do fruto sem sentido do acaso
de um amontoado estúpido de átomos?
se a Lei existe ou não
por que deveria ela
desocultar-se de seus longínquos
atender mansa a nossos gritos
responder clara às nossas mentes?
crer no acaso
ou crer na Lei
não é certeza,
é crença:
não faz diferença
então
prefiro crer
que a beleza e o canto do pássaro
não são imagem e ruído ordenados
por absurdas coincidências
para mim
a beleza e o canto do pássaro
são beleza e canto!
e em tudo que vejo e ouço
eu sempre me espanto...
no milagre da vida
e nas maravilhas do cosmos
aqueles que julgam
que o milagre da vida
e as maravilhas do cosmos
não passam
do fruto sem sentido do acaso
de um amontoado estúpido de átomos?
se a Lei existe ou não
por que deveria ela
desocultar-se de seus longínquos
atender mansa a nossos gritos
responder clara às nossas mentes?
crer no acaso
ou crer na Lei
não é certeza,
é crença:
não faz diferença
então
prefiro crer
que a beleza e o canto do pássaro
não são imagem e ruído ordenados
por absurdas coincidências
para mim
a beleza e o canto do pássaro
são beleza e canto!
e em tudo que vejo e ouço
eu sempre me espanto...
09 novembro 2009
A Dança Cósmica (Parte Final)
(Na imagem, o quadro "O Ancião dos Dias" de William Blake)
E eu tinha minha alma antes junto com Ele. Tinha-a antes do Bigbang. E após o Bigbang que tinha outro nome passei a existir. Mas eu já era. Desprendeu-se a minha alma do ventre do Todo que é Uno: a minha Mônada. O universo passou a existir, a se expandir. Iniciou o Grande Dia Cósmico. A que os ocultos antigos chamavam Mahavantara. O Grande Dia Cósmico que é a concretização do que estava latente no Cosmos, a germinação da semente, a expansão iniciada com o Bigbang, é o agora, somos nós. Está claro que esse dia chegará ao fim, e advirá a Grande Noite Cósmica. Que é o contrário. A retração, o encolhimento, o envelhecimento, a morte. Todas as coisas passarão a deixar de existir e mergulharão novamente no seio do Todo que é Uno. O universo irá se densificar, pois chegará a um ponto máximo em que não poderá mais se expandir: é a Noite. Então tudo voltará ao ponto inicial.
Eu estava lá com Ele. E nós vimos. O grande cíclico movimento, densificação extrema, todas as almas, as mônadas, as partículas elementares voltando ao ventre até formar o estado pré-bigbang. E assim justifiquei para mim mesmo o amor. O amor é perfeitamente lógico. Devemos amar-nos uns aos outros porque somos os outros. No fundo, somos a mesma coisa: fagulhas nascidas de e pertencentes a um Todo que é Uno. Éramos uma coisa só, um átomo titânico, antes do Bigbang. Continuamos essa mesma coisa só, ainda que transformados. E voltaremos a ser esse átomo titânico. Por isso o amor. Não amar é como um braço de um corpo detestar e prejudicar o outro braço do mesmo corpo.
Ao iniciar o Mahavantara, eu iniciei a aventura da existência. Como se fosse tudo simultâneo e em perfeito equilíbrio e dinâmica transcendente. Deixei o repouso sereno da Noite Cósmica, do estado pré-bigbang e mergulhei na dramaticidade do teatro da formação espiritual-física. Desci, criado, e ingressei na evolução. E fui um elemental mineral, um elemental vegetal, um elemental animal, e fui um Elemental humano e... Viria mais. Algo além da evolução mecânica. Mas se não se vai além da evolução, vem o outro lado da roda, a outra face da moeda, pela lei do Eterno Retorno, vem a involução. Dia e Noite. E assim sucessivamente, infinitamente, em intermináveis ciclos. Noite e Dia.
Bigbangs explosões expansões auges retrações densificações auges Bigbangs explosões expansões... E o Todo deixando de ser Todo e sempre sendo Todo e sempre sendo Uno. E todas as coisas passando a existir sendo criadas e se expandindo ao máximo e se retraindo e sendo descriadas deixando de existir mas sempre sendo até a retração-regressão máxima e todas as coisas...
Universos e mais universos nascendo e morrendo e tornando a nascer e tornando a morrer. Assim é conosco. Assim é o Cosmos. E quantos bilhões de anos ou trilhões ou quatrilhões compõem um Dia Cósmico? E quantos Dias e Noites Cósmicas já vieram e morreram e retornaram? Quantos Bigbangs? E quantos ainda virão? E eu vi tudo isso. Eu estava lá com Ele. Nós estávamos lá com Ele. Nós éramos Ele. E Ele é Deus.
Eu estava lá com Ele. E nós vimos. O grande cíclico movimento, densificação extrema, todas as almas, as mônadas, as partículas elementares voltando ao ventre até formar o estado pré-bigbang. E assim justifiquei para mim mesmo o amor. O amor é perfeitamente lógico. Devemos amar-nos uns aos outros porque somos os outros. No fundo, somos a mesma coisa: fagulhas nascidas de e pertencentes a um Todo que é Uno. Éramos uma coisa só, um átomo titânico, antes do Bigbang. Continuamos essa mesma coisa só, ainda que transformados. E voltaremos a ser esse átomo titânico. Por isso o amor. Não amar é como um braço de um corpo detestar e prejudicar o outro braço do mesmo corpo.
Ao iniciar o Mahavantara, eu iniciei a aventura da existência. Como se fosse tudo simultâneo e em perfeito equilíbrio e dinâmica transcendente. Deixei o repouso sereno da Noite Cósmica, do estado pré-bigbang e mergulhei na dramaticidade do teatro da formação espiritual-física. Desci, criado, e ingressei na evolução. E fui um elemental mineral, um elemental vegetal, um elemental animal, e fui um Elemental humano e... Viria mais. Algo além da evolução mecânica. Mas se não se vai além da evolução, vem o outro lado da roda, a outra face da moeda, pela lei do Eterno Retorno, vem a involução. Dia e Noite. E assim sucessivamente, infinitamente, em intermináveis ciclos. Noite e Dia.
Bigbangs explosões expansões auges retrações densificações auges Bigbangs explosões expansões... E o Todo deixando de ser Todo e sempre sendo Todo e sempre sendo Uno. E todas as coisas passando a existir sendo criadas e se expandindo ao máximo e se retraindo e sendo descriadas deixando de existir mas sempre sendo até a retração-regressão máxima e todas as coisas...
Universos e mais universos nascendo e morrendo e tornando a nascer e tornando a morrer. Assim é conosco. Assim é o Cosmos. E quantos bilhões de anos ou trilhões ou quatrilhões compõem um Dia Cósmico? E quantos Dias e Noites Cósmicas já vieram e morreram e retornaram? Quantos Bigbangs? E quantos ainda virão? E eu vi tudo isso. Eu estava lá com Ele. Nós estávamos lá com Ele. Nós éramos Ele. E Ele é Deus.
08 novembro 2009
A Dança Cósmica
(Este conto foi escrito em 2003 e publicado em 2004 no jornal Letras Santiaguenses. Republico-o aqui com algumas poucas alterações e adequações ao meu estilo atual de escrita.)
Eu vi. Eu estava lá. E vi que no Princípio era o Verbo. Mas não vi o que era o verbo. Mas sei que era Ele, porque eu era Ele. Ali estávamos eu-Ele, e o Bigbang explodia. Principiava o universo mais uma vez. Ali, eu-Ele éramos todas as coisas não-feitas, não-formadas, nós e tudo mais éramos sem existir, no seio do Todo, sem formação, sem criação, mas sendo. Ali, antes do Bigbang, ou do Princípio do Mahavantara, como era seu nome para os antigos, estávamos extremamente densificados, numa vida não-vida, cujas sensações sem-sensações não se pode definir. Foi então que tudo principiou, e o Verbo fez-se. O universo explodiu no Bigbang novamente, e todas as coisas foram criadas, foram desdensificando, sendo feitas, passando a existir e não apenas ser.
Quando passei a existir, não era mais Ele, mas ainda permanecia com Ele. Numa época relativamente recente, que hoje diríamos que foi há milênios, descobri ocultamente que o Bigbang não é moderno. Do Bigbang já me disseram há milênios. É antigo, muito antigo. O que há de novo? O novo é o muito velho. Tudo retorna. Tudo é cíclico. A existência de todas as existências é regida pela lei do Eterno Retorno. Dinâmica infinita. O dia, ao chegar ao auge, regride em favor da noite. A noite, ao chegar ao auge, regride em favor do dia. O verão e o inverno se amam da mesma forma. O progresso da economia de um país regride ao chegar ao auge, em favor da recessão... A felicidade psicológica de um ser humano, ao chegar ao auge, regride em favor da dor... Por que com o universo todo seria diferente? “Assim como é acima, é abaixo”. Hermes Trimegisto.
Eu estava lá. Eu vi. Vi quando o universo, ao atingir o auge de sua densificação, não pôde mais continuar, e necessitou se expandir. Como é impossível à noite se intensificar a partir de certo ponto. Eu estava lá com Ele. E vi o universo explodir e principiar sua expansão. Vimos quando todas as coisas foram feitas. Era belo, sublimemente belo, ver todos aqueles sóis, planetas, cometas, luas, animais, plantas, homens, anjos, deuses... O Todo sob a vontade do Um. O Um sendo o Todo. Na verdade, seria mais preciso dizer que as coisas passaram e passam por profundas transformações, e não por criações. Pois antes já eram, apenas não existiam. Ou existiam em estados latentes. “Nada se perde, nada se cria, tudo se transforma.” Lavoisier.
Mas foi ali que eu-Ele contemplamos que a matéria é uma transformação da energia. E que ambas são a mesma coisa. Vimos com olhos de alma que lá no átomo, ou aqui no átomo, as partículas ínfimas que formam seus prótons e elétrons comportam-se como energia. E estão em terrível movimento. Têm vida. A vida que palpita em todo Cosmos, o espírito vibrante do Todo que é Uno. O Mistério da Dança Cósmica. Vimos que as partículas têm sua irmã gêmea. Que quando mexemos nessa partícula, a sua irmã, instantaneamente, muito mais rápida que a luz, também é mexida, ainda que esteja a anos-luz de distância...
(Amanhã, a parte final)
Eu vi. Eu estava lá. E vi que no Princípio era o Verbo. Mas não vi o que era o verbo. Mas sei que era Ele, porque eu era Ele. Ali estávamos eu-Ele, e o Bigbang explodia. Principiava o universo mais uma vez. Ali, eu-Ele éramos todas as coisas não-feitas, não-formadas, nós e tudo mais éramos sem existir, no seio do Todo, sem formação, sem criação, mas sendo. Ali, antes do Bigbang, ou do Princípio do Mahavantara, como era seu nome para os antigos, estávamos extremamente densificados, numa vida não-vida, cujas sensações sem-sensações não se pode definir. Foi então que tudo principiou, e o Verbo fez-se. O universo explodiu no Bigbang novamente, e todas as coisas foram criadas, foram desdensificando, sendo feitas, passando a existir e não apenas ser.
Quando passei a existir, não era mais Ele, mas ainda permanecia com Ele. Numa época relativamente recente, que hoje diríamos que foi há milênios, descobri ocultamente que o Bigbang não é moderno. Do Bigbang já me disseram há milênios. É antigo, muito antigo. O que há de novo? O novo é o muito velho. Tudo retorna. Tudo é cíclico. A existência de todas as existências é regida pela lei do Eterno Retorno. Dinâmica infinita. O dia, ao chegar ao auge, regride em favor da noite. A noite, ao chegar ao auge, regride em favor do dia. O verão e o inverno se amam da mesma forma. O progresso da economia de um país regride ao chegar ao auge, em favor da recessão... A felicidade psicológica de um ser humano, ao chegar ao auge, regride em favor da dor... Por que com o universo todo seria diferente? “Assim como é acima, é abaixo”. Hermes Trimegisto.
Eu estava lá. Eu vi. Vi quando o universo, ao atingir o auge de sua densificação, não pôde mais continuar, e necessitou se expandir. Como é impossível à noite se intensificar a partir de certo ponto. Eu estava lá com Ele. E vi o universo explodir e principiar sua expansão. Vimos quando todas as coisas foram feitas. Era belo, sublimemente belo, ver todos aqueles sóis, planetas, cometas, luas, animais, plantas, homens, anjos, deuses... O Todo sob a vontade do Um. O Um sendo o Todo. Na verdade, seria mais preciso dizer que as coisas passaram e passam por profundas transformações, e não por criações. Pois antes já eram, apenas não existiam. Ou existiam em estados latentes. “Nada se perde, nada se cria, tudo se transforma.” Lavoisier.
Mas foi ali que eu-Ele contemplamos que a matéria é uma transformação da energia. E que ambas são a mesma coisa. Vimos com olhos de alma que lá no átomo, ou aqui no átomo, as partículas ínfimas que formam seus prótons e elétrons comportam-se como energia. E estão em terrível movimento. Têm vida. A vida que palpita em todo Cosmos, o espírito vibrante do Todo que é Uno. O Mistério da Dança Cósmica. Vimos que as partículas têm sua irmã gêmea. Que quando mexemos nessa partícula, a sua irmã, instantaneamente, muito mais rápida que a luz, também é mexida, ainda que esteja a anos-luz de distância...
(Amanhã, a parte final)
07 novembro 2009
Sede e Sede
quem tem sede
(a sede do corpo)
não tem sede de copo
tem sede de água:
então
quem tem sede
(a sede da alma)
que é a sede mais alta
não tem sede de corpo
(que é o copo)
tem sede de alma
(que é a água)
(a sede do corpo)
não tem sede de copo
tem sede de água:
então
quem tem sede
(a sede da alma)
que é a sede mais alta
não tem sede de corpo
(que é o copo)
tem sede de alma
(que é a água)
06 novembro 2009
Última Chance
preciso de mais uma chance
ao meu último adejo de asas
pra voar à Torre de Vênus
que quase cheguei há algum dia
ah! que eu quase fui alto na noite
ah eu quase passei do meu fim
eu quase beijei nos teus olhos
quase olhei nos teus lábios
mas caiu-me a lua em pedaços
mas quedou-me quieto teu canto
mas um raio incendiou-me de asas
mas um fogo encheu-me de sangue
que eu... e agora que tudo se oculta?
eu.. e agora que estrelas se inflamam?
e agora que matam-se os loucos?
agora no último lance?
preciso
da Última Chance...
ao meu último adejo de asas
pra voar à Torre de Vênus
que quase cheguei há algum dia
ah! que eu quase fui alto na noite
ah eu quase passei do meu fim
eu quase beijei nos teus olhos
quase olhei nos teus lábios
mas caiu-me a lua em pedaços
mas quedou-me quieto teu canto
mas um raio incendiou-me de asas
mas um fogo encheu-me de sangue
que eu... e agora que tudo se oculta?
eu.. e agora que estrelas se inflamam?
e agora que matam-se os loucos?
agora no último lance?
preciso
da Última Chance...
05 novembro 2009
Estrela...
para Liziane Serafini
os fogos-fátuos da terra inflamada
nos vagas-lumes de uma estrela ao longe
os incêndios da tempestade em febre
nas fluídas chamas de uma estrela ao longe
velas elétricas de raios cósmicos
nos altos raios de uma estrela ao longe
lavas vulcânicas de bomba atômica
nos sóis em fúria de uma estrela ao longe:
meus lábios
nos teus
os fogos-fátuos da terra inflamada
nos vagas-lumes de uma estrela ao longe
os incêndios da tempestade em febre
nas fluídas chamas de uma estrela ao longe
velas elétricas de raios cósmicos
nos altos raios de uma estrela ao longe
lavas vulcânicas de bomba atômica
nos sóis em fúria de uma estrela ao longe:
meus lábios
nos teus
03 novembro 2009
Em Chamas
Sozinho, eu seguia pela estrada que parecia não ter fim. A cada passo que com absurdo pesar eu executava, uma nuvem negra de sangue surgia nos horizontes carregados de horror. A poeira da estrada desolada ardia-me nos olhos, como os resquícios de um sol que se filtrava pelo peso das nuvens. Quanto menos o sol brilhava, mais fatais eram seus raios. E a cada passo que eu dava, eu morria cada vez mais... Ao meu redor, para onde quer que eu olhasse, não havia nada. Nada! Absolutamente nada, devastadoramente ninguém. O mundo não estava ali. Mas isto era o mundo. Horizontes infindos de um nada que crescia como fungos na lama apodrecida. E sempre olhando à frente como o condenado contempla sua forca, eu contemplava o cosmos cada vez mais carregado.
O céu não estava no alto. Ou estava, e eu não o via. Ou ao alto estava, eu o via, mas ele não aparecia para mim. A cada passo que em delírio meu corpo sonhava que dava, surgia um rosto feliz com um sorriso esponjoso, rançoso e hipócrita em névoas claras pela imensidão do nada. Eles sorriam e queriam mostrar-me o caminho, dizer-me por onde ir, eles sempre sabiam de tudo, embora eternamente soubessem de nada. Em seu nada, aqueles rostos eram indescritivelmente horrendos. Eles surgiam como reação aos meus passos. E eu mal conseguia caminhar desde que os Outros vieram e cortaram-me as asas. Eu olhava para o alto e invejava os corvos que eternamente pairavam sobre minha existência.
Desde que podaram minhas asas, eu não consigo mais andar pelo mundo. Eu joguei pedras com o meu sangue derramado naqueles sorrisos imbecis. Eu soprei o furacão que devasta os meus pulmões nos olhos dos sensatos em suas vidas atoladas no nada. Eu beijei a boca quente da minha sublime tuberculose. Eu olhei para trás, para tudo o que havia percorrido, e contemplei extasiado os rastros roxos do meu sangue golfejado pela minha boca que nunca cessa de sentir.
Os rastros de sangue da sublimidade incomparável da minha tuberculose é que iriam salvar-me. Eu poderia voltar, jamais me perderia. As nuvens se intensificavam, caía chuva torrencial sobre meus sonhos. E eu os erguia cada vez mais alto, mais ao alto! Enquanto eles eram metralhados pelos sensatos que sorriam em seus rostos suspensos na nulidade do nada. Um banho de sangue e de lágrimas jorradas das almas de meus sonhos matou minha sede de tudo. Que a chuva era ácida. E eu jamais me contentaria com o teu muito que é miserável.
Ergui minha mão ao raio com um poema escrito com brasas nas minhas veias, e o raio o queimou. E sua fumaça ascendeu no fogo e impregnou as narinas de Deus. E os sorrisos dos sensatos, dos certos, dos felizes aplaudiram meu poema hipocritamente sem nunca o terem lido, pois Deus o queimou e respirou com suas narinas doentes. E eu era asfixiado pelo fumo de minha obra.
O aspecto repulsivo dos felizes com a coluna vertebral chafurdada na lama revoltou-me o estômago. Enquanto eu seguia sedento e avançava indômito em sofreguidão pela estrada por entre o nada, podia ouvir os berros desesperados dos gatos torturados pelos sensatos que sempiternamente assassinavam liberdades. O horror pairou mais denso e grave pelas atmosferas trovejantes. Na monumental infelicidade de sua felicidade, os rostos suínos (porque era nisso que agora se metamorfosearam) alimentavam-se das fezes que eles mesmos produziam em meio de seu nada que eu pisava indiferente e indignado.
Por entre a tempestade, caía a mais suprema das noites. Uma lua de absurdos donde partiam terríficos arcanjos imperou sobre minha desgraça. Extirpei de meu peito uma rosa de sangue febricitante para deixar nas mãos brancas do vulto gracioso que surgiu do nada. Acompanhava-me. Eu não estava morto.
Arranquei minha alma da tristeza e da revolta, fúria e melancolia, que fervilhavam no oceano de meus sentimentos. E com minha alma na ponta afiada da espada, fitei o que havia no lado escuro da lua. De um trovão mitológico, partiu uma flecha incendiada de olhares que causou fatal terremoto pela imensidade do nada de lodo. Um ciclone de desejos levou minha angústia poética ao auge enquanto ela gritava ao se debater em meus ventos. Um mar vermelho, de repente, cobriu todo o céu e a lua.
Meu olho imenso se abriu e dardejou aos céus como uma lança de liberdade insana. Alucinado, respirei fundo o veneno do ar que me oprimia e senti-me mais forte. Eu também era nada, mas alimentando-se do sangrar incessante de tudo o que eu sinto, minha Alma não morreu. Eu não deixei que a sepultassem no sem-sentido da vida dos certos. Minha alma, Em Chamas, vive, enquanto eu caminho com olhos sangrentos, desvairado, rumo à próxima Aurora...
O céu não estava no alto. Ou estava, e eu não o via. Ou ao alto estava, eu o via, mas ele não aparecia para mim. A cada passo que em delírio meu corpo sonhava que dava, surgia um rosto feliz com um sorriso esponjoso, rançoso e hipócrita em névoas claras pela imensidão do nada. Eles sorriam e queriam mostrar-me o caminho, dizer-me por onde ir, eles sempre sabiam de tudo, embora eternamente soubessem de nada. Em seu nada, aqueles rostos eram indescritivelmente horrendos. Eles surgiam como reação aos meus passos. E eu mal conseguia caminhar desde que os Outros vieram e cortaram-me as asas. Eu olhava para o alto e invejava os corvos que eternamente pairavam sobre minha existência.
Desde que podaram minhas asas, eu não consigo mais andar pelo mundo. Eu joguei pedras com o meu sangue derramado naqueles sorrisos imbecis. Eu soprei o furacão que devasta os meus pulmões nos olhos dos sensatos em suas vidas atoladas no nada. Eu beijei a boca quente da minha sublime tuberculose. Eu olhei para trás, para tudo o que havia percorrido, e contemplei extasiado os rastros roxos do meu sangue golfejado pela minha boca que nunca cessa de sentir.
Os rastros de sangue da sublimidade incomparável da minha tuberculose é que iriam salvar-me. Eu poderia voltar, jamais me perderia. As nuvens se intensificavam, caía chuva torrencial sobre meus sonhos. E eu os erguia cada vez mais alto, mais ao alto! Enquanto eles eram metralhados pelos sensatos que sorriam em seus rostos suspensos na nulidade do nada. Um banho de sangue e de lágrimas jorradas das almas de meus sonhos matou minha sede de tudo. Que a chuva era ácida. E eu jamais me contentaria com o teu muito que é miserável.
Ergui minha mão ao raio com um poema escrito com brasas nas minhas veias, e o raio o queimou. E sua fumaça ascendeu no fogo e impregnou as narinas de Deus. E os sorrisos dos sensatos, dos certos, dos felizes aplaudiram meu poema hipocritamente sem nunca o terem lido, pois Deus o queimou e respirou com suas narinas doentes. E eu era asfixiado pelo fumo de minha obra.
O aspecto repulsivo dos felizes com a coluna vertebral chafurdada na lama revoltou-me o estômago. Enquanto eu seguia sedento e avançava indômito em sofreguidão pela estrada por entre o nada, podia ouvir os berros desesperados dos gatos torturados pelos sensatos que sempiternamente assassinavam liberdades. O horror pairou mais denso e grave pelas atmosferas trovejantes. Na monumental infelicidade de sua felicidade, os rostos suínos (porque era nisso que agora se metamorfosearam) alimentavam-se das fezes que eles mesmos produziam em meio de seu nada que eu pisava indiferente e indignado.
Por entre a tempestade, caía a mais suprema das noites. Uma lua de absurdos donde partiam terríficos arcanjos imperou sobre minha desgraça. Extirpei de meu peito uma rosa de sangue febricitante para deixar nas mãos brancas do vulto gracioso que surgiu do nada. Acompanhava-me. Eu não estava morto.
Arranquei minha alma da tristeza e da revolta, fúria e melancolia, que fervilhavam no oceano de meus sentimentos. E com minha alma na ponta afiada da espada, fitei o que havia no lado escuro da lua. De um trovão mitológico, partiu uma flecha incendiada de olhares que causou fatal terremoto pela imensidade do nada de lodo. Um ciclone de desejos levou minha angústia poética ao auge enquanto ela gritava ao se debater em meus ventos. Um mar vermelho, de repente, cobriu todo o céu e a lua.
Meu olho imenso se abriu e dardejou aos céus como uma lança de liberdade insana. Alucinado, respirei fundo o veneno do ar que me oprimia e senti-me mais forte. Eu também era nada, mas alimentando-se do sangrar incessante de tudo o que eu sinto, minha Alma não morreu. Eu não deixei que a sepultassem no sem-sentido da vida dos certos. Minha alma, Em Chamas, vive, enquanto eu caminho com olhos sangrentos, desvairado, rumo à próxima Aurora...
02 novembro 2009
O Desastre da Legislação Ambiental Brasileira e o Otimismo de Maffesoli
Agora querem alterar a Legislação Ambiental. Para pior. Para poderem desmatar mais, inclusive a mata das margens dos rios. Para devastarem as parcas florestas que restaram nas propriedades rurais. Não querem ter limite nenhum. Querem acabar com tudo. E querem ser perdoados das multas que pagaram no passado ou que ainda têm que pagar. Por quê? Ora, porque os proprietários de terra têm o direito de fazer o que querem com ela, afinal são donos. O que tem a humanidade a ver com isso? Mas não querem desmatar para o lucro, longe disso. Querem fazê-lo para o desenvolvimento... Como soa pomposa essa palavra: DESENVOLVIMENTO. DE-SEN-VOL-VI-MEN-TO!!! Não é linda? Acho que é a palavra mais bela e poética da língua portuguesa. Parece que estou vendo os políticos encherem a boca, estufarem as bochechas para pronunciar o mais profundo lema da humanidade: “tudo pelo DESENVOLVIMENTO!
É como diria o pensador francês Michel Maffesoli, o mundo está melhor, está menos individualista. Haha! Quer dizer que ele pensou, pensou, e chegou a essa conclusão? Agora recebi a prova de como sou imbecil. É incrível, mas eu não consigo enxergar o óbvio: o mundo está menos individualista. Certamente devo ter sonhado quando li nos jornais que o número de famintos e desnutridos no mundo passou de 800 milhões para mais de 1 bilhão nos últimos anos. Ah, PENSANDO bem, só aumentou em 200 milhões! 200 milhões é só a população do Brasil. Isso não é nada! É só um acidente de percurso em nosso pomposo desenvolvimento...
Se eu pudesse dialogar com o senhor Maffesoli e outros pensadores pós-modernos do 1º mundo eu sugeriria: por que vossos países ricos, que não são individualistas, não ajudam de verdade aqueles países pobres que vocês tanto exploraram no passado? De vez em quando eles mandam umas esmolas, que rapidamente são repostas em quádruplo pelo lucro de suas multinacionais. Que não são individualistas.
Maffesoli é francês. A França não é individualista. Claro, enriqueceu tanto com suas colônias do passado (e ainda enriquece com suas multinacionais) que agora tem riqueza para todo mundo. Foram séculos de pirataria, pilhagem e roubalheira dos recursos naturais de países que hoje agonizam com 1 bilhão de famintos e desnutridos. 1 BILHÃO! Isso também é pomposo!
França, Inglaterra, Portugal, Espanha... Países que não são individualistas. Foram séculos devastando matas, poluindo rios, extirpando as riquezas das terras férteis e transbordantes de ouro e diamante do 3º mundo, à custa das lágrimas dos seus povos, da escravidão e do sangue derramado, à custa de seu suor inútil, de suas esperanças asfixiadas, de seus direitos renegados. Claro, agora não é mais preciso ser individualista. Agora todos são tolerantes e amiguinhos. Inclusive eu, inclusive você, amigo leitor. Não somos mais individualistas, desde que os problemas dos outros não atinjam o nosso próprio umbigo. 1 bilhão de famintos? E daí? Eu não tenho nada a ver com isso.
O intelectual Maffesoli disse que o homem deve sonhar. Concordo plenamente. Aliás, sonhar é o que mais faço na vida. Como escrevi em certo poema, não passo de um labirinto de sonhos. Eu só tenho uma dúvida: acho que em alguns anos vamos ter que sonhar no mundo da lua, porque não haverá mais planeta Terra para sonharmos...
É como diria o pensador francês Michel Maffesoli, o mundo está melhor, está menos individualista. Haha! Quer dizer que ele pensou, pensou, e chegou a essa conclusão? Agora recebi a prova de como sou imbecil. É incrível, mas eu não consigo enxergar o óbvio: o mundo está menos individualista. Certamente devo ter sonhado quando li nos jornais que o número de famintos e desnutridos no mundo passou de 800 milhões para mais de 1 bilhão nos últimos anos. Ah, PENSANDO bem, só aumentou em 200 milhões! 200 milhões é só a população do Brasil. Isso não é nada! É só um acidente de percurso em nosso pomposo desenvolvimento...
Se eu pudesse dialogar com o senhor Maffesoli e outros pensadores pós-modernos do 1º mundo eu sugeriria: por que vossos países ricos, que não são individualistas, não ajudam de verdade aqueles países pobres que vocês tanto exploraram no passado? De vez em quando eles mandam umas esmolas, que rapidamente são repostas em quádruplo pelo lucro de suas multinacionais. Que não são individualistas.
Maffesoli é francês. A França não é individualista. Claro, enriqueceu tanto com suas colônias do passado (e ainda enriquece com suas multinacionais) que agora tem riqueza para todo mundo. Foram séculos de pirataria, pilhagem e roubalheira dos recursos naturais de países que hoje agonizam com 1 bilhão de famintos e desnutridos. 1 BILHÃO! Isso também é pomposo!
França, Inglaterra, Portugal, Espanha... Países que não são individualistas. Foram séculos devastando matas, poluindo rios, extirpando as riquezas das terras férteis e transbordantes de ouro e diamante do 3º mundo, à custa das lágrimas dos seus povos, da escravidão e do sangue derramado, à custa de seu suor inútil, de suas esperanças asfixiadas, de seus direitos renegados. Claro, agora não é mais preciso ser individualista. Agora todos são tolerantes e amiguinhos. Inclusive eu, inclusive você, amigo leitor. Não somos mais individualistas, desde que os problemas dos outros não atinjam o nosso próprio umbigo. 1 bilhão de famintos? E daí? Eu não tenho nada a ver com isso.
O intelectual Maffesoli disse que o homem deve sonhar. Concordo plenamente. Aliás, sonhar é o que mais faço na vida. Como escrevi em certo poema, não passo de um labirinto de sonhos. Eu só tenho uma dúvida: acho que em alguns anos vamos ter que sonhar no mundo da lua, porque não haverá mais planeta Terra para sonharmos...
31 outubro 2009
Sem Termos...
façamos um pacto
nos seguintes termos:
amemos sem termos
morrido
morramos sem termos
amado
e só por termos amado morramos
ao amor não há
adequados termos:
alto cardíaco pacto
de infinito amor:
impossível matemática
sem
termos...
nos seguintes termos:
amemos sem termos
morrido
morramos sem termos
amado
e só por termos amado morramos
ao amor não há
adequados termos:
alto cardíaco pacto
de infinito amor:
impossível matemática
sem
termos...
30 outubro 2009
Otacílio e Madalena ou A Morte do Pampa (As Almas do Fantástico na História do RS - História 3ª) - Parte Final
Mas o que mais me impressionou foi quando entrei no quarto do casal. Ali estava a cama embolorada e úmida, carcomida por ratos, traças e outros animais que ali fizeram seus ninhos em meio a cobertores, lençóis, pelegos e travesseiros esquecidos. Fiquei imaginando os anos felizes em que ali Otacílio e Madalena viveram. Curiosamente, naquele ambiente ancestral, denso, insalubre, carregado, acabei perdendo todo o medo e receio que inicialmente sentira. Sentei-me ali no quarto, em uma cadeira que parecia ainda inteira o suficiente para suportar meu peso e refleti durante horas sobre aqueles seres fantasmais, sobre suas existências antes e depois da morte.
Em um momento, não sei por que motivo, talvez hipnotizado por minhas divagações absurdas e pelo clima sobrenatural que sombriamente me seduzia, tive a coragem de desligar a lanterna e mergulhar na mais tenebrosa escuridão. Nesse instante, meus pensamentos calaram-se, e o silêncio tumular invadiu minha alma de forma arrebatadora. Uma profunda tensão naquelas atmosferas tristes e envelhecidas pesou-me nos ombros...
Foi então que julguei ter escutado passos, e um sussurro feminino soou nos meus ouvidos cava e profundamente chamando meu nome. Julguei sentir o sopro de uma respiração nos meus cabelos. Alarmado, rapidamente liguei a lanterna. Mais uma vez, não vi nada. Talvez tenha imaginado o que ouvi... Contudo, decidi então manter a lanterna acesa até o amanhecer, aquele clima de tensão não era suportável sem algum tipo de luminosidade. E eu ali permaneci sentado no fúnebre quarto, divagando sobre assuntos que dificilmente ocorrem às pessoas comuns.
Refleti, por exemplo, em por que os fantasmas do casal deixaram de ser vistos há quase 30 anos, e por qual motivo aqueles que afirmavam tê-los presenciados eram, quase sempre, pessoas simples, camponeses sem nenhuma formação intelectual, formados apenas pela vida natural em seu ambiente destituído das convenções sociais. Pensei nisso, porque na década de 60, atraídos pelos muitos relatos, alguns estudiosos de assuntos paranormais dirigiram-se ao local para tentar avistar os espíritos, não obtendo, no entanto, permissão do antigo fazendeiro para entrar na casa. E tais estudiosos não viram ou pressentiram absolutamente nada no campo.
Cheguei à conclusão, dessa forma, que a capacidade de contemplar tais fenômenos é algo exclusivo do coração, da intuição, nada tem a ver com o acúmulo de teorias e de conhecimentos mecânicos na mente. Pelo contrário, quanto mais intelectualizado for o indivíduo, mais ele terá a tendência de raciocinar e tentar conceituar esses fatos, criando barreiras psicológicas que impedem que possa naturalmente presenciá-los.
Porém, lamentavelmente, a tendência dos dias atuais é justamente essa intelectualização estéril de todos os fenômenos que a ciência não explica, como se todas as coisas do universo pudessem ser analisadas, medidas, quantificadas, esquecendo-se, desprezando-se os acontecimentos espirituais, além do raciocínio lógico. Por isso, hoje os sabichões do intelecto preferem ridicularizar tais histórias, afirmar desdenhosamente que são “contos de nossos avós”, como se pelo fato de essas pessoas não serem intelectuais, não podem então saber de nada, não merecem crédito.
E assim, esses senhores intelectuais foram aos poucos assassinando as almas da natureza, alastrando o vírus do ceticismo cego e estéril. Quando falo em almas, não me refiro somente a assombrações, mas às almas dos campos, das matas, dos rios, dos ares, das plantas, dos animais. Para esses senhores, nada possui alma, tudo é mecânico e material tão somente, tudo pode ser conceituado dentro do limitados padrões mentais, não há mistério algum por trás das coisas.
Por tais motivos, pensei, hoje só raras vezes se presenciam os fenômenos de aparições de almas, não só de pessoas falecidas, mas também dos elementais da natureza. Os homens bloquearam seus sentidos superiores devido ao acúmulo excessivo de teorias mecanicistas e agora duvidam e riem-se de tudo que não for “cientificamente” comprovado, como se ciência fosse sinônimo de mental.
Os homens afogaram seus corações no veneno das teorias intelectuais, e o resultado é que as manifestações da Alma do Mundo abandonam agora os homens. E assim é com o pampa gaúcho. O pampa morre, porque o homem mata sua alma. Toda a destruição ambiental que flagela o planeta é fruto desse desprezo que a humanidade dispensa às almas da natureza. É como se para a humanidade nada possuísse alma, nem mesmo ela. Então, se nada possui alma, o planeta também não possui. E o planeta morre, e com ele o pampa... Viciamo-nos a pensar em todo e qualquer ser vivo como se fosse uma máquina, inclusive o homem. Se nós, seres vivos, fôssemos máquinas, depois de mortos, bastaria “reparar o defeito” do organismo e religar à fonte de energia, que voltaríamos a viver. Assim podemos fazer com um carro ou com um computador, mas não com um ser vivo. Não podemos pôr de volta a vida.
Afirmo que todas essas assombrações e aparições misteriosas que tanto povoavam nossos campos também fazem parte da alma do pampa. E o desaparecimento desses fantasmas é outro sintoma de sua morte...
E nesses assuntos que ninguém mais pensa, ou pensa apenas para desprezá-los, eu pensava quando fui despertado pelo cantar dos pássaros. Já principiava a alvorada, embora o sol ainda não houvesse saído. Levantei-me da cadeira, despedi-me do quarto espectral e dirigi-me à porta. Como já iniciava a clarear o dia, desliguei a lanterna. E ao abrir a porta, assustei-me com o disparar de um cavalo mouro que partia rapidamente ao capão de mata. Havia um casal sobre ele...
Em um momento, não sei por que motivo, talvez hipnotizado por minhas divagações absurdas e pelo clima sobrenatural que sombriamente me seduzia, tive a coragem de desligar a lanterna e mergulhar na mais tenebrosa escuridão. Nesse instante, meus pensamentos calaram-se, e o silêncio tumular invadiu minha alma de forma arrebatadora. Uma profunda tensão naquelas atmosferas tristes e envelhecidas pesou-me nos ombros...
Foi então que julguei ter escutado passos, e um sussurro feminino soou nos meus ouvidos cava e profundamente chamando meu nome. Julguei sentir o sopro de uma respiração nos meus cabelos. Alarmado, rapidamente liguei a lanterna. Mais uma vez, não vi nada. Talvez tenha imaginado o que ouvi... Contudo, decidi então manter a lanterna acesa até o amanhecer, aquele clima de tensão não era suportável sem algum tipo de luminosidade. E eu ali permaneci sentado no fúnebre quarto, divagando sobre assuntos que dificilmente ocorrem às pessoas comuns.
Refleti, por exemplo, em por que os fantasmas do casal deixaram de ser vistos há quase 30 anos, e por qual motivo aqueles que afirmavam tê-los presenciados eram, quase sempre, pessoas simples, camponeses sem nenhuma formação intelectual, formados apenas pela vida natural em seu ambiente destituído das convenções sociais. Pensei nisso, porque na década de 60, atraídos pelos muitos relatos, alguns estudiosos de assuntos paranormais dirigiram-se ao local para tentar avistar os espíritos, não obtendo, no entanto, permissão do antigo fazendeiro para entrar na casa. E tais estudiosos não viram ou pressentiram absolutamente nada no campo.
Cheguei à conclusão, dessa forma, que a capacidade de contemplar tais fenômenos é algo exclusivo do coração, da intuição, nada tem a ver com o acúmulo de teorias e de conhecimentos mecânicos na mente. Pelo contrário, quanto mais intelectualizado for o indivíduo, mais ele terá a tendência de raciocinar e tentar conceituar esses fatos, criando barreiras psicológicas que impedem que possa naturalmente presenciá-los.
Porém, lamentavelmente, a tendência dos dias atuais é justamente essa intelectualização estéril de todos os fenômenos que a ciência não explica, como se todas as coisas do universo pudessem ser analisadas, medidas, quantificadas, esquecendo-se, desprezando-se os acontecimentos espirituais, além do raciocínio lógico. Por isso, hoje os sabichões do intelecto preferem ridicularizar tais histórias, afirmar desdenhosamente que são “contos de nossos avós”, como se pelo fato de essas pessoas não serem intelectuais, não podem então saber de nada, não merecem crédito.
E assim, esses senhores intelectuais foram aos poucos assassinando as almas da natureza, alastrando o vírus do ceticismo cego e estéril. Quando falo em almas, não me refiro somente a assombrações, mas às almas dos campos, das matas, dos rios, dos ares, das plantas, dos animais. Para esses senhores, nada possui alma, tudo é mecânico e material tão somente, tudo pode ser conceituado dentro do limitados padrões mentais, não há mistério algum por trás das coisas.
Por tais motivos, pensei, hoje só raras vezes se presenciam os fenômenos de aparições de almas, não só de pessoas falecidas, mas também dos elementais da natureza. Os homens bloquearam seus sentidos superiores devido ao acúmulo excessivo de teorias mecanicistas e agora duvidam e riem-se de tudo que não for “cientificamente” comprovado, como se ciência fosse sinônimo de mental.
Os homens afogaram seus corações no veneno das teorias intelectuais, e o resultado é que as manifestações da Alma do Mundo abandonam agora os homens. E assim é com o pampa gaúcho. O pampa morre, porque o homem mata sua alma. Toda a destruição ambiental que flagela o planeta é fruto desse desprezo que a humanidade dispensa às almas da natureza. É como se para a humanidade nada possuísse alma, nem mesmo ela. Então, se nada possui alma, o planeta também não possui. E o planeta morre, e com ele o pampa... Viciamo-nos a pensar em todo e qualquer ser vivo como se fosse uma máquina, inclusive o homem. Se nós, seres vivos, fôssemos máquinas, depois de mortos, bastaria “reparar o defeito” do organismo e religar à fonte de energia, que voltaríamos a viver. Assim podemos fazer com um carro ou com um computador, mas não com um ser vivo. Não podemos pôr de volta a vida.
Afirmo que todas essas assombrações e aparições misteriosas que tanto povoavam nossos campos também fazem parte da alma do pampa. E o desaparecimento desses fantasmas é outro sintoma de sua morte...
E nesses assuntos que ninguém mais pensa, ou pensa apenas para desprezá-los, eu pensava quando fui despertado pelo cantar dos pássaros. Já principiava a alvorada, embora o sol ainda não houvesse saído. Levantei-me da cadeira, despedi-me do quarto espectral e dirigi-me à porta. Como já iniciava a clarear o dia, desliguei a lanterna. E ao abrir a porta, assustei-me com o disparar de um cavalo mouro que partia rapidamente ao capão de mata. Havia um casal sobre ele...
29 outubro 2009
Otacílio e Madalena ou A Morte do Pampa (As Almas do Fantástico na História do RS - História 3ª)
Em uma das muitas estradas que cortam os vastos campos do interior de Santiago, durante o período de 1950 a 1981, os viajantes e moradores da região do vale do rio Itacurubi relatavam com alguma frequência a visão de um fantasma que surgia à beira de um capão de mata que circundava uma coxilha. Tratava-se de um gaúcho vestindo um pala cinzento, lenço vermelho, chapéu e botas pretas, aparentando ter em torno de 50 anos de idade. Geralmente, o fantasma era visto à beira da estrada, em pé, observando algum ponto indefinido à sua frente. Mas em algumas poucas vezes, via-se ele atravessando a estrada carregando uma mulher aparentemente adormecida ou morta em seus braços, usando um vestido branco. Alguns ainda afirmavam já ter avistado o fantasma em um belo cavalo mouro, com a mulher em sua garupa. O gaúcho era visto quase sempre às primeiras horas da noite, ou logo antes da saída do sol, ou seja, sempre durante os crepúsculos.
Segundo os moradores da região, as aparições tratavam-se do fantasma de Otacílio Vicente Marques, e a mulher que eventualmente o acompanhava seria sua esposa Madalena Marques. O casal viveu em uma pequena e rústica casa de alvenaria, cuja tapera ainda existe no local, durante a década de 40. Otacílio vivia do trabalho nas lavouras de sua pequena propriedade e criava algumas poucas cabeças de gado. De acordo com os moradores mais antigos do vale do Itacurubi, o casal levava uma vida tranqüila e modesta. Não possuíam filhos nem parentes próximos. Raramente recebiam a visita de alguns tios e primos relativamente distantes. Aparentavam viver felizes tendo apenas um ao outro, e a solidão da vida no campo não os molestava.
No entanto, o ano de 1949 surgiu com uma terrível tragédia para o casal. No mês de janeiro, Madalena nadava em um açude da propriedade, enquanto Otacílio buscava gravetos na mata. Foi quando este ouviu os gritos de Madalena que, com cãibras em uma das pernas, afogava-se nas águas profundas do açude.
Otacílio mal teve tempo de pular na água, já era tarde, sua esposa estava morta. Carregou-a nos braços de volta para casa e durante toda a noite chorou em desespero ao lado de seu corpo. No dia seguinte, nas primeiras horas da manhã, enterrou-a a cerca de 1 km da residência, ao pé de uma coxilha, sob a sombra de um imenso angico. Otacílio não suportou a dor da perda da esposa. Nas semanas subseqüentes viveu em uma profunda depressão, deixando de trabalhar e até mesmo de se alimentar. Foi encontrado morto em sua cama cerca de cinco meses depois da morte de Madalena. Foi enterrado ao lado de sua amada, sob a sombra serena do angico. Ela morrera com 39 anos, ele com 52.
Um tio idoso de Otacílio ficou como responsável pela propriedade e decidiu vendê-la a um fazendeiro das vizinhanças. Este optou por preservar a pequena residência com toda sua mobília, em lembrança e respeito à memória do casal.
Foi no ano seguinte, 1950, que o fantasma de Otacílio foi visto pela primeira vez no local anteriormente descrito. As aparições tornaram-se cada vez mais freqüentes durante a década de 50, a ponto de os moradores da região reunirem-se para a realização de orações às almas dos mortos. Durante os anos 60, as visões permaneceram constantes, contudo, a partir de 1970 principiaram a reduzir-se gradativamente, até que em 1981 ocorreu o último relato de alguém ter vislumbrado os fantasmas de Otacílio e Madalena.
Porém, devo dizer que fervilhava em mim o intenso desejo de contemplar aquelas almas... Tanto que em determinado fim-de-semana, decidi passar toda uma noite na tapera de Otacílio, na esperança de presenciar as aparições do casal... Facilmente obtive permissão do agora dono das terras, filho do antigo fazendeiro para quem o tio de Otacílio vendera a propriedade, para pernoitar na pequena casa já em semi-ruínas.
Cheguei àquelas terras misteriosas ainda durante a tarde. Permaneci próximo ao capão de mata à beira da estrada que ficava a algumas dezenas de metros da propriedade. No entanto, as horas passavam-se, a noite sombria de outono esfriava, e eu já não suportava permanecer imóvel em meu posto de observação: não surgira absolutamente nada.
Decidi caminhar até o sepulcro do casal, situado a pouco mais de 1 km de onde me encontrava. Conforme me aproximava, percebi que o clima psíquico tornava-se mais denso, concentrado, eu poderia jurar que alguma presença ignota influenciava nas sensações estranhas que me invadiam, porém não pude avistar os fantasmas. Entretanto, diferentemente do que se poderia pensar, não senti medo, não era algo assustador. Pelo contrário, sentia-me bem estando perto da sepultura do casal, apenas duas cruzes de ferro já enferrujado cravadas no chão. A brisa fria que soprava na coxilha era-me salutar, e uma profunda serenidade advinha daquele vetusto e venerável angico que ali se erguia como um solene guardião àqueles dois amantes.
Permaneci ali por algumas horas, passava já da meia-noite, e embora fosse uma noite fria e sem lua, a madrugada principiava bastante agradável, ao menos para mim. Porém, como não via nada de sobrenatural, conquanto minha intuição captasse algo de estranho, resolvi voltar para a residência e, pela primeira vez, entrar naquela casa sombria e inquietante.
Trazia comigo, é claro, uma potente lanterna, e detive-me quando dirigi seu facho à porta de madeira já semi-apodrecida que se encontrava entreaberta. Receei por um momento antes de entrar. Nunca soube de alguém que tivesse entrado na casa após a morte de Otacílio, com exceção de seu tio e dos vizinhos que foram velar o corpo. Nem mesmo o fazendeiro agora proprietário da residência o fizera. Confessou-me que nunca vira a assombração e que não acreditava muito em visões de espíritos, embora soubesse de vários relatos a respeito, inclusive o de seu falecido pai. Disse-me que seu pai nunca quisera entrar na casa, com receio de ser amaldiçoado pelo fantasma de Otacílio, e por isso também jamais pensara em destruí-la. Mas ele, o filho, afirmou que mal lembrava da casa e dos espíritos, que abandonara o local à ação do tempo, mais preocupado com seus outros campos. Pretendia, inclusive, ordenar a destruição da tapera e ali construir um galpão para armazenar parte da produção de suas lavouras.
Pensei exatamente nesse estado de abandono quando entrei na casa. Os móveis ainda ali permaneciam, aparentemente nunca foram alterados de lugar. Porém, apresentavam sinais de apodrecimento, o ambiente aparentava ser bastante úmido, e vários buracos no teto permitiam entreverem-se as estrelas. O cheiro de mofo e bolor era quase insuportável, bem como a poeira que se acumulava em todos os cantos, em todos os móveis. Alguns morcegos revoaram quando entrei, aranhas e suas teias estavam em todos os lugares, e alguns animais pequenos rapidamente moveram-se por baixo das mesas e cadeiras.
Direcionei o facho da lanterna para uma janela ao assustar-me com o som do adejo de asas de alguma grande ave. Era uma coruja-de-orelhas que voava pela janela parcialmente aberta.
O clima daquela casa era verdadeiramente tétrico e nada acolhedor. Suas paredes sujas e manchadas, algumas panelas e chaleiras muito antigas sobre o fogão à lenha, pelegos imundos jogados aos cantos, cadeiras de palha que apodreciam, armários caindo aos pedaços, cuias, copos e canecas embolorados, enfim, tudo o que ali eu via parecia ter surgido de dentro do próprio túmulo do casal, tamanha era a sensação de esquecimento funerário que me transmitia. Sentia ter penetrado em um local onde o tempo parou e que somente a morte e o mistério habitavam agora.
Segundo os moradores da região, as aparições tratavam-se do fantasma de Otacílio Vicente Marques, e a mulher que eventualmente o acompanhava seria sua esposa Madalena Marques. O casal viveu em uma pequena e rústica casa de alvenaria, cuja tapera ainda existe no local, durante a década de 40. Otacílio vivia do trabalho nas lavouras de sua pequena propriedade e criava algumas poucas cabeças de gado. De acordo com os moradores mais antigos do vale do Itacurubi, o casal levava uma vida tranqüila e modesta. Não possuíam filhos nem parentes próximos. Raramente recebiam a visita de alguns tios e primos relativamente distantes. Aparentavam viver felizes tendo apenas um ao outro, e a solidão da vida no campo não os molestava.
No entanto, o ano de 1949 surgiu com uma terrível tragédia para o casal. No mês de janeiro, Madalena nadava em um açude da propriedade, enquanto Otacílio buscava gravetos na mata. Foi quando este ouviu os gritos de Madalena que, com cãibras em uma das pernas, afogava-se nas águas profundas do açude.
Otacílio mal teve tempo de pular na água, já era tarde, sua esposa estava morta. Carregou-a nos braços de volta para casa e durante toda a noite chorou em desespero ao lado de seu corpo. No dia seguinte, nas primeiras horas da manhã, enterrou-a a cerca de 1 km da residência, ao pé de uma coxilha, sob a sombra de um imenso angico. Otacílio não suportou a dor da perda da esposa. Nas semanas subseqüentes viveu em uma profunda depressão, deixando de trabalhar e até mesmo de se alimentar. Foi encontrado morto em sua cama cerca de cinco meses depois da morte de Madalena. Foi enterrado ao lado de sua amada, sob a sombra serena do angico. Ela morrera com 39 anos, ele com 52.
Um tio idoso de Otacílio ficou como responsável pela propriedade e decidiu vendê-la a um fazendeiro das vizinhanças. Este optou por preservar a pequena residência com toda sua mobília, em lembrança e respeito à memória do casal.
Foi no ano seguinte, 1950, que o fantasma de Otacílio foi visto pela primeira vez no local anteriormente descrito. As aparições tornaram-se cada vez mais freqüentes durante a década de 50, a ponto de os moradores da região reunirem-se para a realização de orações às almas dos mortos. Durante os anos 60, as visões permaneceram constantes, contudo, a partir de 1970 principiaram a reduzir-se gradativamente, até que em 1981 ocorreu o último relato de alguém ter vislumbrado os fantasmas de Otacílio e Madalena.
Porém, devo dizer que fervilhava em mim o intenso desejo de contemplar aquelas almas... Tanto que em determinado fim-de-semana, decidi passar toda uma noite na tapera de Otacílio, na esperança de presenciar as aparições do casal... Facilmente obtive permissão do agora dono das terras, filho do antigo fazendeiro para quem o tio de Otacílio vendera a propriedade, para pernoitar na pequena casa já em semi-ruínas.
Cheguei àquelas terras misteriosas ainda durante a tarde. Permaneci próximo ao capão de mata à beira da estrada que ficava a algumas dezenas de metros da propriedade. No entanto, as horas passavam-se, a noite sombria de outono esfriava, e eu já não suportava permanecer imóvel em meu posto de observação: não surgira absolutamente nada.
Decidi caminhar até o sepulcro do casal, situado a pouco mais de 1 km de onde me encontrava. Conforme me aproximava, percebi que o clima psíquico tornava-se mais denso, concentrado, eu poderia jurar que alguma presença ignota influenciava nas sensações estranhas que me invadiam, porém não pude avistar os fantasmas. Entretanto, diferentemente do que se poderia pensar, não senti medo, não era algo assustador. Pelo contrário, sentia-me bem estando perto da sepultura do casal, apenas duas cruzes de ferro já enferrujado cravadas no chão. A brisa fria que soprava na coxilha era-me salutar, e uma profunda serenidade advinha daquele vetusto e venerável angico que ali se erguia como um solene guardião àqueles dois amantes.
Permaneci ali por algumas horas, passava já da meia-noite, e embora fosse uma noite fria e sem lua, a madrugada principiava bastante agradável, ao menos para mim. Porém, como não via nada de sobrenatural, conquanto minha intuição captasse algo de estranho, resolvi voltar para a residência e, pela primeira vez, entrar naquela casa sombria e inquietante.
Trazia comigo, é claro, uma potente lanterna, e detive-me quando dirigi seu facho à porta de madeira já semi-apodrecida que se encontrava entreaberta. Receei por um momento antes de entrar. Nunca soube de alguém que tivesse entrado na casa após a morte de Otacílio, com exceção de seu tio e dos vizinhos que foram velar o corpo. Nem mesmo o fazendeiro agora proprietário da residência o fizera. Confessou-me que nunca vira a assombração e que não acreditava muito em visões de espíritos, embora soubesse de vários relatos a respeito, inclusive o de seu falecido pai. Disse-me que seu pai nunca quisera entrar na casa, com receio de ser amaldiçoado pelo fantasma de Otacílio, e por isso também jamais pensara em destruí-la. Mas ele, o filho, afirmou que mal lembrava da casa e dos espíritos, que abandonara o local à ação do tempo, mais preocupado com seus outros campos. Pretendia, inclusive, ordenar a destruição da tapera e ali construir um galpão para armazenar parte da produção de suas lavouras.
Pensei exatamente nesse estado de abandono quando entrei na casa. Os móveis ainda ali permaneciam, aparentemente nunca foram alterados de lugar. Porém, apresentavam sinais de apodrecimento, o ambiente aparentava ser bastante úmido, e vários buracos no teto permitiam entreverem-se as estrelas. O cheiro de mofo e bolor era quase insuportável, bem como a poeira que se acumulava em todos os cantos, em todos os móveis. Alguns morcegos revoaram quando entrei, aranhas e suas teias estavam em todos os lugares, e alguns animais pequenos rapidamente moveram-se por baixo das mesas e cadeiras.
Direcionei o facho da lanterna para uma janela ao assustar-me com o som do adejo de asas de alguma grande ave. Era uma coruja-de-orelhas que voava pela janela parcialmente aberta.
O clima daquela casa era verdadeiramente tétrico e nada acolhedor. Suas paredes sujas e manchadas, algumas panelas e chaleiras muito antigas sobre o fogão à lenha, pelegos imundos jogados aos cantos, cadeiras de palha que apodreciam, armários caindo aos pedaços, cuias, copos e canecas embolorados, enfim, tudo o que ali eu via parecia ter surgido de dentro do próprio túmulo do casal, tamanha era a sensação de esquecimento funerário que me transmitia. Sentia ter penetrado em um local onde o tempo parou e que somente a morte e o mistério habitavam agora.
(Amanhã, a parte final)
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