Certo músico escreveu que se Beethoven tivesse composto SOMENTE a Missa Solemnis, já seria considerado um gênio da música. Na partitura da Missa, o seu Opus 123 (ou seja, é da mesma época da 9ª Sinfonia, Opus 125, da sua última fase) Beethoven escreveu "De todo o coração". E de fato o é: música composta de todo o coração, de toda alma, da genialidade mais profunda. Trata-se de uma das maiores obras musicais de todos os tempos, tão alta, tão poderosa, tão imponente, tão revolucionária quanto a Nona Sinfonia, mas bem menos conhecida do grande público. Há obras bem menores de Beethoven, bem menos expressivas, como a bagatelle Für Elise, que são muito mais conhecidas e apreciadas.
Mas é bom que seja assim, que essa obra suprema, de extrema grandiosidade, se mantenha menos popularizada. Não é música fácil, de se compreender com facilidade, de agradar aos ouvidos na primeira audição. Também não é, como muitos devem imaginar, música de caráter meramente religioso, apesar do seu nome (uma missa) e de sua letra (é a letra da tradicional missa do cristianismo antigo, cantada em latim), pois a missa na música já havia se transformado em mais um gênero à serviço dos grandes gênios.
A Missa Solemnis vai muito, muito além. Beethoven não era um homem propriamente religioso. Também não era um ateu. Entendia Deus como uma força, uma potência universal que abrangeria a tudo e a todos. Beethoven era um panteísta. E assim é o caráter da Missa Solemnis. Um sobre-humano monumento à essa força universal, uma obra-prima absoluta de expressão do Cosmos, do amor entre todos os seres, da vitória do Ser, é a materialização musical da alma do universo.
A 2ª missa de Beethoven, ou seja, a Solemnis, finalizada em 1823, não é a única grande missa da história da música. Bach compôs a sua fenomenal Grande Missa em Si, Mozart tem a Grande Missa em Dó, Schubert, Bruckner, Haydn, entre outros, também criaram nesse gênero obras excepcionais. Mas a Solemnis de Beethoven possui algo que a torna única, inigualável, e não se sabe dizer exatamente o que é. Talvez a força descomunal, a inovadora potência instrumental, a inusitada violência sinfônica, talvez os coros alucinados, dilacerados entre o sofrimento e a vitória, entre a angústia e a grandeza, entre o tragédia e o amor. Talvez tudo isso junto e ainda mais.
A Missa Solemnis é Beethoven em seu auge. É o que há de mais elevado no gênio de Bonn. É o que há de mais elevado na Arte. É arte "de todo o coração" para o coração dos homens.
Acima, um trecho da Missa Solemnis, o Gloria, em uma das melhores interpretações dessa obra gigantesca: a da Concertgebouw Orchestra, com o grande Bernstein na regência.
Deixo este texto e esta música como minha mensagem de Natal. E o dedico a Patrícia Almeida, minha amada e companheira.
homem pós pós-moderno e a máquina (ou vice-versa que dá no mesmo) não podem parar: mais combustível para o carro mais energia para a casa que o carro não para e a casa há de sempre ser clara lâmpada acesa geladeira repleta comida na mesa indústria sem freio que o progresso não cessa nem se confessa não se perdoa o atraso (retrocesso é pecado) o navio deve ir o avião deve ar hidrelétrica termelétrica nuclear o shopping a fábrica a loja a lavoura o fogo a forja a mina a moeda o carvão mais alta e vasta energia ao micro ao celular à razão na água na terra no céu a máquina e o mundo acelerador até o fundo até que o tudo se exploda e a vida? ah, que se foda
Este poema foi escrito em 2013. Agora, com algumas leves revisões, republico-o, tendo em vista o clima consumista, digo, o clima natalino.
P. noel, eis minha carta: maior que tua barba bem perfumada de capital (de fazer trança) é a tua farsa bem estufada de banquetes e palacetes entre tua pança de bochechas coradas (de vergonha) e gordas tu só és papai, P. noel, a quem deixar algumas notas (e outras cotas) na (pro)fundidade do teu chapéu P.noel o bom velhinho velhaco: só ganha presente quem tiver dedos (no meio da moeda) pra te puxar o saco
Entre os contistas e cronistas brasileiros, o mineiro Fernando Sabino (1923 - 2004), é um dos meus preferidos. Foi um notável observador do homem, do estado da humanidade, do cotidiano das pessoas, daqueles pequenos detalhes a que geralmente não damos muita atenção, mas que uma vez revelados nos indicam a realidade caótica, absurda, em que nos encontramos. E algumas das viscerais observações de Sabino estão na crônica "O Ano Que Vem", do livro "A Cidade Vazia", de 1948, uma das primeiras obras do escritor. Vamos a alguns trechos da crônica, ainda incrivelmente atual, como toda boa literatura:
"Os ideais da humanidade se limitam à posse de um apartamento, uma geladeira, um rádio e um automóvel. Há qualquer coisa de trágico nesse cerceamento do espírito, nessa canalização de sentimentos que exige, na sua prática, uma disciplina de verdadeira filosofia iogue: a felicidade está em repetir, cada um para si mesmo, da manhã à noite, "sou livre!", "sou alegre!", "sou feliz!" até que a ilusão de uma realidade perfeita baixe sobre todos."
(...)
"Ele dirá fatalmente entrando num apartamento qualquer: "That Beautiful!". Beautiful por quê? Não é um apartamento exatamente igual aos outros? A milhares de outros, com o mesmo banheiro de paredes imitando azulejos. Com a mesma sala de estar sem janelas, estrangulada no meio dos quartos. Com as mesmas paredes de madeira e com as mesmas reclamações dos vizinhos. (...) "What a wonderful car!" ele dirá então, apontando para qualquer Chevrolet que lhe mostrem, enquanto lá nas fábricas um outro exatamente igual vai sendo lançado por minuto."
(...)
"Nada como exteriorizar um otimismo inexistente para fazer do conformismo uma ilusão de independência. Para fazer da vida algo que se gasta, com o dinheiro, na compra de imediatas e concretas fruições. Sou feliz, sou feliz - trancados no quarto, cercados de ruído, engaiolados em armações de aço, consumidos de uma insônia contra a qual as pílulas sedativas nada podem, o tédio e a solidão a espiar do canto, como dois demônios parados,, repetem até alta noite o refrão monótono de um dínamo esgotado que reacumula energia para as atividades do dia seguinte."
"O Ano Novo, onde está? O mundo continua o mesmo do ano passado, de todas as partes continuam chegando notícias de mortes, misérias, fome, guerra, sofrimento. Nenhum milagre aconteceu."
Alguém discorda do Sabino? Lá nos ideais da humanidade podemos substituir o rádio pelo computador. O resto continua igual.
Meu compositor favorito não é Beethoven. É Brahms. Questões de afinidades. Beethoven está em segundo lugar na minha preferência, seguido de Bach. Mas desde sempre considerei Beethoven, assim como muitos outros amantes da Música Erudita, como o maior gênio musical que já existiu, capaz de, quase sozinho, realizar uma das maiores revoluções artísticas da história. O gênio alemão, nascido em 16 de dezembro de 1770, não só criou uma nova forma de expressão, não só estabeleceu as bases e levou ao auge o Romantismo musical, como também criou música universal da mais absoluta profundidade e riqueza interpretativa, ainda hoje não superada. E nunca mais o será. Em 2012 escrevi um poema indigno do mestre, mas foi o que consegui fazer em sua homenagem. Agora, republico-o:
Nos últimos dias, Santiago não vem tendo seu nome associado à poesia, mas a algo bem diferente. Corrupção? Desvios de verbas? Fraudes? Talvez até fosse mais apropriado mudar o título de "Terra dos Poetas". É, eu sei, não soaria muito bonito associar a algo negativo como "Santiago, Terra dos Corruptos". Alguns, talvez, até protestassem: "Mas a corrupção, por exemplo, em Santiago não é maior que em outras cidades." Em termos absolutos, claro que não. Mas convenhamos que para o tamanho da cidade, que não é muito populosa, os índices estão até que bem altos. Além do mais, Santiago tem mais poetas que outras cidades? E acho que nem proporcionalmente falando.
A coisa começou com a intitulada "Operação Terra dos Poetas", deflagrada pela Polícia Federal, que associou nacionalmente o título de Santiago a uma das maiores fraudes recentes contra o INSS. Um dos maiores envolvidos é santiaguense. Depois veio a "Fraude Rural", que ocasionou a prisão de gente conhecida na cidade. Agora, surge a oposição de entidades federais contra a indicação do santiaguense Marco Peixoto para a presidência do Tribunal de Contas do Estado, com a justificativa de que o mesmo responde por crime de estelionato na justiça e emprega um assessor já condenado por desvio de recursos na Assembleia Legislativa. Sobre o fato, afirmou a presidente da Associação Nacional dos Auditores de Controle Externo dos Tribunais de Contas do Brasil (ANTC), Lucieni Pereira:"Um acusado de cometer crime não pode comandar uma corte que investiga fraudes e fiscaliza outros órgãos. Não é algo compatível com o cargo de alguém que dirige um órgão que tem a missão constitucional de fiscalizar a legalidade dos atos de pessoal”.Conferir aqui.
E o que dizer da nota vergonhosa no "Ranking da Transparência" que obteve Santiago, com seus míseros 3,10 - nota que colocou a cidade num dos últimos lugares do RS? E o que mais falta para ser descoberto na Terra dos Poetas?
hoje tudo é comprado (até virgindades) e tudo é vendido há até quem venda esperanças (até virgindades) aos olhos vendados do povo fodido II quem crava seus dentes nas veias cavas macias das nações indefesas? o lucro vampírico (dos chupacabras) das grandes em presas
Fagundes Varelaescreveu um dos mais belos e viscerais poemas dedicados à noite (e/ou ao sombrio) da literatura brasileira. Publico-o abaixo: Eu Amo a Noite Eu amo a noite quando deixa os montes, Bela, mas bela de um horror sublime, E sobre a face dos desertos quedos Seu régio selo de mistério imprime. Amo o sinistro ramalhar dos cedros Ao rijo sopro da tormenta infrene, Quando antevendo a inevitável queda Mandam aos ermos um adeus solene. Amo os lampejos verde-azuis, funéreos, Que às horas mortas erguem-se da terra E enchem de susto o viajante incauto No cemitério de sombria serra. Amo o silêncio, os areais extensos, Os vastos brejos e os sertões sem dia, Porque meu seio como a sombra é triste, Porque minh’alma é de ilusões vazia. Amo o furor do vendaval que ruge, Das asas densas sacudindo o estrago, Silvos de balas, turbilhões de fumo, Tribos de corvos em sangrento lago. Amo as torrentes que da chuva túmidas Lançam aos ares um rumor profundo, Depois raivosas, carcomendo as margens, Vão dos abismos pernoitar no fundo. Amo o pavor das soledades, quando Rolam as rochas da montanha erguida, E o fulvo raio que flameja e tomba Lascando a cruz da solitária ermida. Amo as perpétuas que os sepulcros ornam, As rosas brancas desbrochando à lua, Porque na vida não terei mais sonhos, Porque minh’alma é de esperanças nua. Tenho um desejo de descanso, infindo, Negam-me os homens; onde irei achá-lo? A única fibra que ao prazer ligava-me Senti partir-se ao derradeiro abalo!… Como a criança, do viver nas veigas, Gastei meus dias namorando as flores, Finos espinhos os meus pés rasgaram, Pisei-os ébrio de ilusões e amores. Cendal espesso me vendava os olhos, Doce veneno lhe molhava o nó… Ai! minha estrela de passadas eras, Por que tão cedo me deixaste só? Sem ti, procuro a solidão e as sombras De um céu toldado de feral caligem, E gasto as horas traduzindo as queixas Que à noite partem da floresta virgem. Amo a tristeza dos profundos mares, As águas torvas de ignotos rios, E as negras rochas que nos plainos zombam Da insana fúria dos tufões bravios. Tenho um deserto de amarguras nalma, Mas nunca a fronte curvarei por terra!… Ah! tremo às vezes ao tocar nas chagas, Nas vivas chagas que meu peito encerra!
Franz Schubert, um de meus compositores favoritos, faleceu a exatos 187 anos, em 19 de novembro de 1828, com apenas 31 anos. Aproveito a a ocasião para republicar o poema abaixo, inspirado na sua música, escrito ano passado. Após Schubert essa estrela que eu olho não é ela que está lá pois uma outra há que vá que me olha no que eu olho mas essa estrela que é que deseja o que eu vejo nunca é no meu desejo essa noite que eu vi nunca foi a que estava mas se vai com outra asa longe do que pedi alma do que não foi e outra noite me envia som-voo do que morria este sonho que eu tenho não é sonho que pode fiz-me por outro acorde nada em que me sustenho erro do meu não ser noite do que vou tê-la nem sonho e nem estrela
A catástrofe humana e ambiental ocorrida em MG, que causou a morte do Rio Doce, parece ainda não ter sido totalmente assimilada pela população brasileira. A ficha ainda não caiu. É algo de proporções monstruosas. O rio é o mais importante de MG. Ou era. As consequências , gravíssimas, perdurarão por décadas. E muito da vida da região perdeu-se para sempre. Mas para muitos, absurdos como esses são apenas acidentes de percurso, e, para eles, a humanidade vai muito bem em seu caminho rumo ao progresso, ao desenvolvimento, à evolução. Abaixo, trecho retirado do site Climatologia Geográfica:
"Segundo Luciano Magalhães, diretor do Serviço Autônomo de Água e Esgoto (SAAE) de Baixo Guando, órgão responsável pela análise, “parece que jogaram a tabela periódica inteira” dentro do rio. Segundo ele, a água não tem mais utilidade nenhuma, sendo imprópria para irrigação e consumo animal e humano.
Além desses metais pesados, a própria força da lama já devastou a biodiversidade do rio para sempre. Os ambientalistas não descartam a possibilidade de que espécies endêmicas inteiras tenham sido EXTINTAS pela lama. A quantidade de lama é tão grande que o rio teve o seu curso natural bloqueado, fazendo com que perdesse força e formasse pequenas lagoas que também não durarão muito, já que, além dos minérios, os esgotos, pesticidas e agrotóxicos também estão sendo carregados pelas águas." Clique aqui, para saber mais.
A empresa responsável, a Samarco, foi multada em 250 milhões de reais. De que adianta? Segundo fontes do governo federal, os prejuízos totais podem chegar a mais de 10 bilhões. Mas e a vida? Lógico que nem 1 trilhão pagará a vida perdida. Porém catástrofes como essas não pararão. Nem aqui nem em qualquer lugar do mundo. O dinheiro fala e continuará falando mais alto. As empresas querem lucro. Cada vez mais. O resto não importa. E todos acham isso ótimo, até quando ocorre uma tragédia. Então, se lamentam. E depois, esquecem. A Vale foi entregue nas mãos gananciosas da iniciativa privada durante o governo FHC, em suas famosas privatizações. Todo mundo, ou quase, achou uma maravilha.
Não há saída. Aos poucos, de facada em facada, o planeta morrerá. E a humanidade com ele. Por isso, deixo um de meus poemas. É só o que me resta:
A primeira parte do título acima, entre aspas, é o que foi noticiado no portal Sul21. A segunda parte eu acrescentei. Sim, porque é, no mínimo, vergonhoso e indignante que tal absurdo aconteça em qualquer nação. É uma afronta escancarada à população gaúcha. Nem em dar uma disfarçada se preocupam mais. E pior que o Estado pagar, é o fato de que os magistrados aceitam sem um pingo de vergonha. Como se precisassem de vale-refeição com seus salários acima dos 22 mil reais. E um vale refeição que é bem maior do que o pago a outras categorias. E ainda pior: é RETROATIVO. É, um juiz deve comer muito, muito mais do que outros seres humanos. É a única explicação plausível. Tudo isso seria ridículo, se não fosse catastrófico que esteja ocorrendo em um estado dito "politizado".
Depois, tanto o governo Sartori e sua base aliada (que acaba de aprovar a redução dos RPV's, ou seja, mais um golpe contra o funcionalismo), como muitos magistrados (logo eles, que deveriam ser exemplos do que é JUSTO), enchem a boca para falar de moralidade no estado, no país, de luta contra a corrupção, de cidadania, de igualdade, de justiça, enfim, o blá-blá-blá, o papo furado de sempre. Depois, exigem credibilidade da população. Depois, têm a cara de pau de falar em esperança.
Confira trechos do que foi noticiado no portal Sul21:
Enquanto o governo de José Ivo Sartori (PMDB) diz não ter condições de pagar o 13º salário dos servidores do Executivo, no dia 20 de dezembro, cerca de R$ 26 milhões saíram dos cofres do Estado na semana passada para arcar com o pagamento retroativo do vale-alimentação de cerca de 800 magistrados, referentes aos anos de 2011 a 2014. Sem saber se receberão o 13º, representantes dos servidores do Executivo questionam a discrepância de tratamento entre categorias do funcionalismo estadual e consideram “absurdo” o benefício concedido aos magistrados, que também deverão receber o 13º em dia, dado o fato de as folhas do Executivo, Legislativo e Judiciário serem separadas.
Na semana passada, cerca de 800 juízes receberam o pagamento do vale-alimentação mensal (no valor de R$ 799) referentes ao período de junho de 2011 até dezembro de 2014. Ao todo, saíram dos cofres do Estado R$ 26.241.528,83. Em junho, quando o benefício entrou em vigor para juízes, pretores e desembargadores, o governo já tinha repassado valores referentes ao ano de 2015 – os gastos anuais com o benefício giram na casa de R$ 7,7 milhões. O pagamento deste benefício segue uma determinação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Na avaliação dos representantes de servidores do Executivo, esta remuneração “é um absurdo”. “Não tem sentido algum receber isso, ainda mais nos valores que estão”, avalia Augustin, que diz que a Constituição já prevê que o subsídio mensal dos magistrados (no mínimo R$ 22 mil) deve ser suficiente para a alimentação. Augustin também diz que, mesmo que fosse aceitável que os magistrados recebessem o benefício, os valores estão muito acima dos praticados para outras categorias. “Esses valores são um atentado, ainda mais sabendo que, com esses recursos, fazem com que as pessoas que ganham abaixo de um salário mínimo tenham dificuldades para receber”.