12 dezembro 2012

O Maldito Baudelaire sabia como tratar a Humanidade

O gênio iniciador da literatura moderna, o (em seu tempo) odiado e execrado Charles Baudelaire legou-nos uma série de delirantes e impiedosos poemas em prosa. Hoje, como uma mensagem de Natal levemente antecipada, deixo um desses poemas. Querido leitor, abaixo, aprenda como tratar o público:

O Cão e o Frasco


— Meu belo cão, meu cãozinho, meu querido totó, vem cá, vem respirar um excelente perfume comprado no melhor perfumista da cidade.

E o cão, agitando a cauda, o que é, suponho, entre esses pobres seres, o sinal correspondente ao riso e ao sorriso, aproxima-se e, curioso, põe o nariz úmido no frasco destampado; mas subitamente, recuando de susto, late contra mim, à maneira de reprimenda.

— Ah, miserável cão! se eu te houvesse oferecido um embrulho de excrementos, decerto o cheirarias com delícia e talvez o tivesses devorado. Assim, ó indigno companheiro de minha triste vida, tu te assemelhas ao público, a quem nunca se devem apresentar perfumes delicados, que o exasperam, mas imundícies cuidadosamente escolhidas.

Charles Baudelaire

11 dezembro 2012

da Simplicidade


o dia de ontem
era insuportável
péssimo
horrível

o clima de ontem
era insuportável
o tempo péssimo
o calor horrível

e o era tanto
que não havia
quem se sentisse bem
e tanto o era
que como estava
nem se podia
se ir além

então à noite
veio uma tormenta
que mudou tudo
derrubando céu
e arrancando toco:
era o medo, o caos, o soco

mas depois
como foi melhor
o dia seguinte
(ainda
que em meio à ruína)

o fim
(o Fim)
é isso

simples
assim

09 dezembro 2012

In-poema


poema-não
não do tempo
em que arte era alta

de meu resto de alma
deixo um naco de nada
de um fim de festa
de um sim de falta

faz parte...
que a arte
agora é ínfima
ínfera
inferna
de um vazio de peito
de um afundar de perna
inferior
desinterna

ah deusa arte
adeus
morreste
de inf-arte

07 dezembro 2012

da Marginalidade


no meu vale
o que vale
é à margem
límpida e líbera
miragem
libertária

visionária
argila à beira
de correnteza
intocada pela humana pata
apática
e rasteira

barro de margem de lago
de onde se molda o novo
o alto
e o mago

do centro
sempre distante
avante
como se lança o bandido
despido
e deixa
à sociedade canalha
um banho de metralha

tudo vale a pena
se se cria
no que se extrema

ninguém ao meu lado
verso sem rabo

poeta mau
e marginal

06 dezembro 2012

da Queda


quando morreste
(não que tiveste morrido)
nem soubeste
o que houveste vivo
ou que não és o que foste
e talvez nem foste
o que em ti te morreste:
tiveste sede
e sedeste

acabou-te o olhar
no antes do acima
(per)deste-lo abaixo
aos cachos em palmo
a palmo
do sonho enterrado
errado

agora
(con)tentaste
em varrer o teu pó
(es)correm-te astros
pelo (v)entre das coxas
e vomitaste nas mesas
em podrentas certezas
as entranhas já roxas

e sorrias
como quem ainda ama
deixando à mostra
pelo céu da boca
uma pérola de ostra
e um (re)pasto de lama

e nem há arte
a falar-te

04 dezembro 2012

aos Sábios


são sábios
e co-acham
sobre tudo

sobretudo
coaxam
sem sotaque

embaixo
do sovaque
carregam eterna mente
suas descobertas de eureca
e filosofias de araque

coçando o saco
e o cavanhaque
mantém a (im)potência
da sua dita dura
e o próprio umbigo
empinado em destaque
de com
e im
postura
de ataque

lá vão eles
de matraque
badulaque
e fraque

sabem tudo da vida
de almanaque

02 dezembro 2012

da Arte de não se importar


olho aquele olhar
que nos olha
sem que dirija algum olhar
a nenhum lugar:
vejo-o lá
quando ele que não ele
nem está

não se houve palavra
no seu dessilêncio
breve instante do denso
que se pensa dito:
é o tudo
só mais uma gota na taça
e o imenso
do nada quanto se faça

o que é feito em verdade
é feito não se importando
deixando que se fale ou cale
ou nem mesmo em deixar
um sopro no alto
ou um passo no vale

ele que passa sempre a um passo
enquanto se pensa
no que pode (seu) ser
mas quem julga pensar
há muito
deixou de entender
pois pensar
é ter em mente um algo
e só serei o que sou
quando do mim mesmo
me estiver falto...

aliás
o de Olhar
não se diz
de nenhum jeito
eu mesmo
não falo de coisa alguma
e este poema
(como bem podem ver)
nem sequer
chegou a ser feito

01 dezembro 2012

Mensalão: Esperança ou Só Vingança

Alguns otimistas de direita estão afirmando que a condenação dos corruptos do PT no caso do "mensalão" inicia uma nova era no país, onde a impunidade da corrupção será efetivamente combatida. Ou o dizem por ingenuidade ou por maldade. 

Ora, o mensalão foi uma exceção. Cada vez mais me convenço de que as condenações contra os membros do PT, ainda que merecidas, apenas ocorreram exatamente por se tratar do PT. O ódio da direita contra o PT, e aí se inclui quase toda a grande mídia brasileira, é algo homérico. Jamais haverá tanta dureza e rigor no julgamento de outros casos de corrupção. 

Querem um prova? Deixo uma noticiazinha publicada em um canto de página do jornal Correio do Povo do dia 29 de novembro. Confira:

"CPI do Cachoeira pode acabar em pizza - A CPI do Cachoeira corre o risco de terminar em pizza, sem a aprovação final com as conclusões das investigações. Mesmo após o recuo do relator Odair Cunha (PT-MG), que desistiu de pedir o indiciamento de cinco jornalistas e a investigação do procurador-geral da República, Roberto Gurgel, parte da base, capitaneada pelo PMDB, uniu-se ao PSDB e ameaça derrubar e sequer votar o texto."

Vejam só, o PSDB, que tanto alardeou durante o julgamento do mensalão que a corrupção deve ser duramente combatida, exigindo justiça e rigor nas condenações, agora quer fazer com que a CPI de um dos maiores corruptos da atualidade vire pizza. Por quê? Porque agora o julgamento não se refere mais ao PT, mas a setores ligados com a direita em que se inclui o próprio PSDB e jornalistas de uma certa revista amiga dos tucanos... Sim, exatamente, a Veja. Quanta hipocrisia, hein!

E onde está o "nosso herói", ministro Joaquim Barbosa? Acho que no Brasil, nem  o Chapolin adianta.

29 novembro 2012

Que o Progresso Não Cessa...


homem pós pós-moderno
e a máquina
que não pode parar
mais combustível para o carro
mais energia para a casa
que o carro não para
e a casa
há de sempre ser clara
lâmpada acesa
geladeira repleta
e comida na mesa
indústria a todo vapor
que o progresso não cessa
nem se confessa
jamais o atraso
(retrocesso é pecado)
deixe que vá o navio
para o lado que for
e o avião
para o lado que ar
mais energia
hidrelétrica termelétrica
e nuclear
mais força e mais poder
que o progresso
ninguém pode deter
o shopping a fábrica a loja
a lavoura o fogo a forja
a mina o carvão
mais alta e vasta energia
para o micro o celular a razão
na água na terra no céu
a máquina e o mundo
acelerador até o fundo
até que o canto se exploda

e o que de alma e de vida
se foda

28 novembro 2012

do Futuro


I

que geração se gerará
desta geração gerada
no nada?

qual questionamento gerarão
que gere um algo
sobre  viver?
que nada!
já será muito
sobreviver

II

foi-ce
um algo melhor
do que não sei de saber
mas sinto
com um resto descido
de ser-me
o homem deixando seu Ser
abaixo
des-sendo

26 novembro 2012

Um Governo Sempre Mente


um governo sempre mente
mesmo quando diz a verdade:
quando mente
tem a verdade como plano de fundo
quando diz a verdade
tem a mentira como base do mundo

não seria governo se não mentisse
mentir
é adiar para o nunca a verdade
governar é a arte de adiar
não seria governo se não omitisse
omitir
é dizer a verdade de que existe o tapete
mas sem erguê-lo para ver-se o debaixo
governar é decidir
sendo capacho

as verdades que um governo esconde
são aquelas que não podem ser verdades
mesmo o sendo
pois não é que um governo minta
ele decide
(a partir do que decidem por ele)
o que pode ser verdade ou não
transforma fato em ilusão
e ilusão em fato
para mais ou para menos
de acordo com o comprimento
da sua cola de rato

governar
é ter bocas de canalhas por trás
sussurrando que o que é
jamais deve ser
e garantindo o tudo
desde que impossibilitado
por milhares de mas...

na organização da mentira
o executivo a extrai de um suposto correto
o legislativo torna lei o que se mente
o judiciário garante que a mentira é o correto
as polícias exigem o respeito à mentira
e o poeta é inútil com sua lira

não
na verdade quem mente sou eu
pois um governo sempre diz a verdade
mesmo quando diz a mentira:
se fosse mentira o que se diz verdade
teríamos que destruir degrau por degrau
tudo o que se diz humanidade

24 novembro 2012

Aos Otimistas


I

os otimistas
dizem que a vida
assim como é vista
e tida
nem é tão pouca
e que a humanidade
apesar do que há-de
não é tão louca
para sair dos seus trilhos

e é exatamente isso
a que me refiro:
o triste
(e o digo sozinho)
é que acham o que se vive tanto
que encho-me de espanto
e que a humanidade
tem seus trilhos no caminho...

II

há alguns
que me acusam de pessimismo
e que desejo o Fim...
como são injustos
quanto a mim:
o que eu desejo é o novo
algo semelhante-análogo
ao que o planeta viu
lá nos tempos áureos
após o fim dos dinossauros

22 novembro 2012

A um Trecho de um Som


Mistério
é o que não se pode
nem porre
de podê-lo
nem sabê-lo
como sendo
há príncípio
precipício
é o que nem é
e ninguém sabe sê-lo
a novecentos e noventa e nove
re-voltas no nove-lo

é o que nem sabe a selo
que não carta
não se mensagem
no que cabe a vê-lo
mas vem como desalgo
um agora estar vago
um ninguém viver ser
o que vê sem ter sido
um ninguém se saber
sem vencer o não visto

um elevado alto de um halo
ditado de não-dizer
que é mister
misteriá-lo

21 novembro 2012

Cruz e Sousa e a Consciência Negra

20 de novembro é o Dia da Consciência Negra. Infelizmente, meu dia de ontem foi bastante corrido e não tive tempo de postar nada no blog. Faço-o hoje. Mas sem realizar homenagenzinhas sem graça, atulhadas de lugares comuns e de hipocrisias. 

Aproveito para falar de Cruz e Sousa (que nasceu em 24 de novembro de 1861), o grande poeta negro, filho de escravos, o Cisne Negro, como ficou conhecido, um dos maiores poetas brasileiros e um dos maiores simbolistas mundiais. Se o catarinense Cruz e Sousa não foi um grande revolucionário da linguagem poética, como o foram Baudelaire e Rimbaud, talvez os dois maiores nomes do Simbolismo universal, o nosso simbolista foi sem dúvida mais sublime que o primeiro e mais humano que o segundo. Acrescentaria ainda que foi mais sincero que Verlaine, mais profundo que Mallarmé e mais autêntico que Valéry. Dito isso, não é necessário que eu diga mais nada sobre. 

Talvez apenas seria interessante acrescentar que Cruz e Sousa não faz parte da Academia Brasileira de Letras. Não o faz porque era negro? Ou porque era simbolista? O Simbolismo foi um movimento muito combatido pela crítica brasileira da época, que preferia os artificialismos do Parnasianismo. Os franceses e alemães, países atrasados, é que apreciavam o Simbolismo. Seja como for, ainda bem que o Sousa não fez parte dessa Merda  toda (em maiúscula mesmo, em um recurso simbolista) que se tornou a nossa academia de letras.

Deixo trechos do poema "Piedosa", comovente obra que Cruz e Sousa escreveu para sua mulher, também negra, Gavita Gonçalves, que lhe deu quatro filhos, todos mortos pela tuberculose, e que, por isso, enlouqueceu. Poucas obras em nossa literatura são tão tocantes como o poema abaixo. Comprovem:

Piedosa (Trechos)


Porque não é por sentimento vago,
Nem por simples e vã literatura,
Nem por caprichos de um estilo mago
Que sinto tanto a tua essência pura.

Não é por transitória veleidade
E para que o mundo reconheça,
Que sinto a tua cândida Piedade,
As auréolas de Luz dessa cabeça.


Mas sinto porque te amo e te acompanho
Pelas montanhas de onde sóis saudosos
Clarões e sombras de um mistério estranho
Espalham, como adeuses carinhosos.

Sinto que te acompanho, que te sigo
Tranqüilo, calmo desses vãos rumores
E que tu vais embalada comigo,
Na mesma rede de carinho e dores.

Sinto os segredos do teu corpo amado,
Toda a graça floral, a graça breve,
Todo o composto lânguido, alquebrado
Do teu perfil de áureo crescente leve.

Sinto-te as linhas imortais do flanco,
E as ondas vaporosas dos teus passos
E todo o sonho castamente branco
Da volúpia celeste desses braços.

Sinto a muda expressão da tua boca
Feita num doce e doloroso corte
De beijo dado na veemência louca
Dos céus do gozo entre o estertor da morte.

Sinto-te as nobres mãos afagadoras,
Riquezas raras de um valor secreto
E mãos cujas carícias redentoras
São as carícias do supremo Afeto.

Sinto os teus olhos fluidos, de onde emerge
Uma graça, uma paz, tamanho encanto,
Tão brando e triste, que a minha alma asperge
Em suavíssimos bálsamos de pranto.

Uns olhos tão etéreos, tão profundos,
De tanta e tão sutil delicadeza
Que parecem viver lá n’outros mundos,
Longe da contingente Natureza.

Olhos que sempre no tremendo choque
Dos sofrimentos íntimos, latentes,
Tem esse toque amigo, o velho toque
Original das lágrimas ardentes.

Ah! sé eu vejo e sinto esse desvelo
Que transfigura e faz o teu martírio,
O sentimento amargurado e belo
Que e já, talvez, quase mortal delírio...

Sinto que a mesma chama nos abraça,
Que um perfume eternal, casto, esquisito,
Circula e vive com divina graça
Dentro do nosso trêmulo Infinito.

E tudo quanto me sensibiliza,
Fere, magoa, dilacera, punge,
Tudo no teu olhar se cristaliza,
No teu olhar, no teu olhar que unge.

Cruz e Sousa




20 novembro 2012

Um Bilhão de Litros de Agrotóxicos Despejados na Última Safra Brasileira

Já comentei no blog que o problema dos agrotóxicos é uma questão gravíssima para a qual raras vezes é dispensada a devida atenção. Os governos e a mídia pouco estão interessados no assunto. É que o país precisa produzir mais e mais alimentos. Se saudáveis ou não, pouco importa. Deve-se é abastecer-se as pessoas com farta comida. O "desenvolvimento" não pode parar. Proibir ou limitar o uso de agrotóxicos, para muitos, é um atraso, uma maneira inaceitável de "frear" o desenvolvimento do país, o progresso da nação. E de se deixar de lucrar. Um bom empresário não pode aceitar a redução dos seus lucros. Seria um imbecil, se o fizesse, um retrógrado. Como voltar atrás? E o meio-ambiente, e o planeta? Ah, está tudo bem com ele, como sempre esteve, a destruição ambiental é um mito. No mínimo, um exagero dos alarmistas.

Deixando de lado a ironia, finalmente leio no jornal  Correio do Povo algo sobre o tema, sem ser uma nota de rodapé. Abaixo,  transcrevo trechos do que está no Correio do Povo de 18/11, página 13:

"O Brasil  consumiu 1 bilhão de litros de agrotóxicos somente na última safra. Diluído na água, este volume de material nocivo ao ambiente e à saúde pública chega à conta de 100 bilhões de litros dispensados pela natureza e absorvidos pelas pessoas em alimentos, água, ar e contato com o solo. Entre os vetores da contaminação estão frutas, hortaliças e até o arroz e o feijão que ocupam o prato dos brasileiros todos os dias."

No congresso da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), foram apresentadas algumas pesquisas a respeito da tragédia dos agrotóxicos. Em uma delas, realizada pelo médico Wanderlei Pignati, conforme o jornal, "feita com mães lactantes em um município do Mato Grosso (...) o resultado de exames mostrou a presença de traços de mais de um tipo de agrotóxico no leite materno em 100% das mulheres examinadas".

Mais adiante, na mesma matéria: "Estes químicos são tóxicos e ficam no corpo humano e na natureza. O consumo ocorre em microgramas num tomate, alface, pimentão, derivado de soja ou milho, e diversos outros itens comuns da mesa brasileira. O problema é que o efeito cumulativo pode causar graves doenças. Cânceres, males hepáticos, danos cerebrais estão entre as potenciais manifestações consequentes do consumo de alimentos impregnados de agrotóxicos".

Mas de que adianta alertar sobre? No Brasil, parece ter-se eleito o cigarro como o bode expiatório, único culpado por todos os males da saúde da população. O resto deixa-se como está. Tanto é que a bancada ruralista quer AUMENTAR o uso de agrotóxicos. Está em outro jornal, no Sul 21. Deixo este trecho: 

"Em uma realidade onde os brasileiros consomem por ano uma média de 5,2 litros de agrotóxico e o país é líder mundial em insumos químicos na agricultura, a bancada ruralista tenta agora modificar a legislação do único estado que proíbe a comercialização de agrotóxicos banidos nos países de origem. Desde 1982, a Lei dos Agrotóxicos restringe a venda e distribuição das substâncias que não são liberadas nos países em que são produzidos. Porém, o deputado estadual Ronaldo Santini (PTB), apresentou o Projeto de Lei 78/2012 para retirar esta prerrogativa do estado gaúcho a fim de 'aumentar a competitividade do agronegócio'."  Parece piada. Quem dera fosse. Confiram aqui.

Bem, creio que não preciso dizer mais nada.


18 novembro 2012

Verdade Tóxica


quem dera
deixar um algo
última verdade tóxica
como se fosse um resto de trago
no sujo fundo de um vaso
ou a brasa de um cigarro
inflamado
sendo sangue cuspe catarro
quem dera tirar um sarro
amargo
deixando um algo
manejado à foice
avançando à bala
um tapa um soco ou um coice
um vasto travo de droga
espuma do que se afoga
antigo cheiro de ópio
ao largo
mijo e baba de sapo
peçonha e saliva de cobra
um frasco negro de coca
e uma alta dose no sangue
de sal...

quem dera deixar um algo
verdade última e tóxica
que te acordasse
e te fizesse mal

17 novembro 2012

A Polícia Militar e a sua Culpa nos Crimes em São Paulo - E a Violência da Brigada em Santiago

Abaixo, apenas transcrevo a 1ª parte do texto "Só o PCC ameaça Sâo Paulo?" publicado no jornal eletrônico Sul 21. O texto é de autoria de Antonio Martins. Os trechos em destaque (em vermelho) são de minha responsabilidade. 


"Ao descrever, num ensaio recente (breve em português, em Outras Palavras), a situação tormentosa vivida pela Grécia, o jornalista Paul Mason, da BBC, recorre à história da Alemanha, às portas do nazismo. Só uma sucessão de erros crassos, mostra ele, pôde permitir que Hitler chegasse ao poder. Mas havia algo sórdido por trás destes enganos. Embora não fosse conscientemente partidária do terror, a maior parte das elites alemãsdesejava o autoritarismo, pois já não conseguia tolerar o ambiente democrático da república de Weimar.

As circunstâncias são distintas: não há risco de fascismo no cenário brasileiro atual. Mas é inevitável lembrar de Mason, e de sua observação sobre a aristocracia alemã, quando se analisa a espiral de violência que atormenta São Paulo há cinco meses. Em guerra com a facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC), parte da Polícia Militar está envolvida numa onda de assassinatos que já fez dezenas de vítimas, elevou em quase 100% o índice de homicídios no Estado e aterroriza as periferias.

Pior: a escalada foi iniciada (e é mantida e aprofundada) por integrantes da própria PM, a força que deveria garantir a segurança e o cumprimento da lei no Estado. Mas apesar de inúmeras evidências, o governo do Estado não age para refrear tal atitude. E a mídia omite, ao tratar da onda de mortes, a participação e responsabilidade evidentes da polícia. É como se tivessem interesse em manter, em São Paulo, um corpo armado, imune à lei e ao olhar da opinião pública, capaz de se impor à sociedade e diretamente subordinado a um governador cujos laços com a direita conservadora são nítidos.

Para ocultar o papel de parte da PM na avalanche de brutalidade, a mídia criou um padrão de cobertura. As mortes de autoria do PCC são noticiadas, corretamente, como assassinatos de PMs. Informa-se que o número de crimes deste tipo cresce de modo acelerado — já são 90 vítimas, este ano. Mas se associa a insegurança que passou a dominar o Estado apenas a estes atos. Também informa-se sobre parte das mortes praticadas pela PM — seria impossível escondê-las por completo. No entanto, aceita-se, sempre sem investigação jornalística alguma, a versão da polícia: morreram “em confronto”, depois de terem reagido.

Este estratagema permite silenciar sobre três fatos essenciais e gravíssimos: a) parte da PM abandonou seu compromisso com a lei e a ordem pública e passou a agir à moda de um grupo criminoso, colocando em risco a população e a grande maioria dos próprios policiais, honestos e interessados em cumprir seu papel; b) diante desta subversão do papel da PM, o comando da corporação e o governo do Estado estão, ao menos, omissos; c) procura-se preservar este estado, evitando, recorrentemente, caracterizar a atitude do setor criminoso da polícia e, muito menos, puni-lo.

Antonio Martins - Confira todo o texto aqui.

Aproveitando a temática da postagem, a qual se relaciona com os crimes cometidos por PMs, deixo, a pedido do amigo Vanderlei Almeida, um texto de sua autoria sobre as recentes suspeitas de agressões e de abuso de poder por parte de policiais militares em nossa cidade. Alguns policiais teriam agredido covardemente alguns meninos indefesos e, até onde se sabe, inocentes.  O caso está sob investigação.

"Hoje pela manhã, fiquei perplexo em ver os pais daqueles meninos que foram agredidos por policiais militares em nossa cidade, protestando contra a violência e o abuso de poder. Senti-me em outra cidade, onde a sociedade questiona atos de violência contra menores, contra a fome, enfim protestando contra a polícia do ESTADO. Historicamente falando, a polícia, os "guardas" foram criados para defender o Estado e não o cidadão. Mas também fiquei revoltado, em saber que só há manifestação quando filhos de uma classe social sofrem qualquer tipo de represália por parte daqueles que estão aí para nos proteger? E os filhos daqueles que não conhecem os seus direitos? Onde está a sociedade para se manifestar a favor também dos filhos de pessoas das classes mais baixas? No passado, na época da ditadura militar, onde vivíamos sem expressão alguma, sem direito algum, o Brasil acordou do golpe da censura do abuso do Estado, quando filhos de empresários começaram a sofrer represálias e serem torturados nos porões da ditadura. Precisamos ter a capacidade de entender que a lei e a justiça valem para todos e não apenas para uma minoria que se diz ter expressão. Precisamos urgentemente de pessoas que defendam nossos direitos, o direito de todos, enfim os DIREITOS HUMANOS."

Vanderlei Almeida

16 novembro 2012

Teu Toque em Silêncio


teu olhar mudo
como se nem estivesse
toque surdo
de trompa
que quando tocas
tocas a todos
da hipocrisia
e da pompa

impassível
contemplador de horizontes
sobre montes de nuncas
e de impossíveis
sob toque de sinos
o tique-taque
invisível
dos destinos

as misérias humanas
não te tocam:
sutil
como um toque de mãos
ao final da tarde
tocas
sem fazer alarde...

Tu
intocável
Urubu

14 novembro 2012

da Frieza*


meu coração
se eu disser que tu estás mal
irão dizer
que sou melodramático
um ressentido
um egoísta
que só se importa
com seu próprio lado
e sua própria crista

meu coração
se eu disser que tu estás bem
irão dizer
que sou um água-com-açúcar
um enjoado
de poesia fraca sem graça
que não vale um tostão
daquelas
declamada em sorrisos
no meio da praça

e meu coração
se eu disser que tu sentes
o sofrimento do mundo
serei acusado
de ser falsamente profundo

então
meu coração
não sintas nada
mantém-te frio
entre a neve lerda
ou
melhor ainda
vai  à merda

* Poema republicado com outro título e algumas alterações.