25 julho 2012

Agora sou frio

fazia frio
fora
e dentro de mim...
isso foi há séculos
agora sou frio.

mas há séculos
passei pela floresta
e na floresta
havia um rio
e no rio uma cachoeira
e ao lado da cachoeira
uma grande pedra
e sobre a pedra
caía eternamente
um fio de água
do lado esquerdo do rio...
isso foi há séculos
agora sou frio.

há dias
fui ver a grande pedra
não passava
de um pequeno cascalho
o fio de água
de cair sobre o seu acima
por séculos e séculos seguidos
a consumiu...
isso foi há dias
agora sou frio.

mas quem ali passou
durante os séculos seguidos
não percebeu
que a pedra morria
sob o fio de água de um pequeno rio...

(lá vai,
um abutre,
a minha esperança alada...)

e assim é com tudo que acaba...

mas isso foi há séculos
agora sou frio.

23 julho 2012

Então, eu pergunto...

o que não está aqui
está em que onde?
qual dos lados dos vários lados
é o lado em que estou?

quando alguém observa
que de fato algo é algo
o que há de fato
no que de algo se observa?

a fragrância do perfume que sinto
é fragrância por que e para quem?

por que que o que é
é tido como sendo
se um outro outro
pode ser em seu lugar?

onde é que
quando que
e como que
ficou claro
que está claro alguma coisa?

onde é que está
de onde que é
o que é
e o é para quem
o sentido que há
naquilo que dizem
que há sentido?

e se eu disser
Vida
o que foi isso que eu disse?

21 julho 2012

da Nobreza da Indiferença

dizer o que se deve dizer
sem deixar que o que é dito
perturbe ao o quem disse

basta-me que eu seja
lago profundo de água fecunda
coberto com espessa
capa de gelo
e que eu me mire
no meu próprio gélido espelho

qual pedra qualquer
causará ondas quaisquer
no inabalável da minha superfície?
o que é que me importa
o ser-não-meu dos outros
ou sua alheia crendice?

porque ao-final
aquilo que eu seja aqui
o que importa àquela estrela?
e o que importa a mim
o fato de eu não sê-la?

20 julho 2012

Apenas uma Sugestão

fosse eu o princípio de um
no alto de outro
ao daquilo que nunca
estivesse comigo o nada que te
uma geada que caia por entre
um sopro que venha do que
um longe distante do tanto
um vasto de gelo que tente
...

o aquilo que sinto
(não sendo o meu ser
o ser que é do outro)
sinto apenas comigo

o melhor do que verso
é o que se busca sozinho
no intervalo
entre o meu eu e o quem me lê...
eu não afirmo
sugiro
a que se busque o caminho...

18 julho 2012

Doutores de Eureka (ou de Arake)

A recente demissão, pela URI de Santiago, da amiga e excelente professora do Curso de Letras Terezinha Bombassaro, tendo-se como argumentos o enxugamento de pessoal e a titulação, reflete dois pontos: um deles muito bem abordou o colega blogueiro Froilam Oliveira, que diz respeito à perseguição e à decadência dos cursos de formação de professores. É assim que o Brasil pretende ingressar no 1º mundo. É como eu sempre digo, e muitos não gostam, mas não me canso em repetir: o Brasil foi e continua sendo uma piada.

O outro ponto relaciona-se com a estúpida e hipócrita valorização demasiada dada à titulação de um professor (e entre outros profissionais), como se isso fosse sinônimo de conhecimento, de se saber ministrar devidamente uma aula, de se possuir a verdadeira sabedoria de que um professor necessita para se tornar um bom mestre. No caso da professora Terezinha Bombassaro, que possuía apenas especialização, sem mestrado ou doutorado, o que se percebia é que ela definitivamente não precisava de um. Até poderia fazer, mas apenas por questão de titulação e para acumular mais algumas informações, porque sabedoria como profissional ela possuía, e muito. Estou certo de que essa é a opinião da maioria absoluta dos alunos de Letras que passaram pela professora. Tinha ela (e tem) não só o conhecimento, mas também sabia (e sabe) transmiti-lo e ensejar no estudante o gosto pela Literatura Brasileira, a sua disciplina. E, acima de tudo, a professora Terezinha é um profissional humano, sabendo equilibrar-se no terreno difícil entre a exigência e a compreensão. Resultado: foi demitida.

Por outro lado, conheci os famosos doutores “bitolados”, presos dentro de uma redoma de cristal opaco, que só percebiam um caminho estreito à sua frente e nada mais. Cegos e surdos para os demais aspectos das coisas que não estivessem de acordo com sua visão pré-fabricada da realidade ou da imaginação. Aliás, muitos desses doutores nem imaginação tinham, uma vez que já a haviam esmagado com o seu estúpido “rigor acadêmico”, que os deixou incapazes de ver e de criar o novo. Mentes-bolo perfeitamente assadas dentro da bela forma do academicismo.

Certa vez, tive uma palestra com uma senhora que era doutora em Literatura Romântica Alemã, com doutorado na Alemanha. Era brasileira. Mas mal sabia falar o Português. E não, ela não tinha vivido a maior parte da vida na Alemanha. Vivera apenas uns cinco anos lá. Não sabia porque simplesmente não conseguia dar uma palestra. Não sabia expressar e desenvolver argumentos. Lia o que deveria ser dito naturalmente em uma exposição. Questionei-lhe sobre um aspecto da obra de Goethe, e a doutora enrolou, enrolou e não disse absolutamente nada sobre a minha pergunta. E como ela, há muitos outros “doutores”. É claro que há os doutores altamente respeitáveis, que não se deixaram enquadrar, que não foram tolidos em sua criatividade e pensamento. Mas são poucos, bem poucos.

Disse certo escritor de que agora não recordo o nome que “Um especialista é alguém que sabe tudo sobre nada”.  Nada mais correto. Tanto se preocuparam em saber sobre algo tão mínimo que, ao invés de se aprofundar, afundaram-se em conceitos mortos e teorias estéreis, em rigorezinhos científicos mecânicos, tornando-se os robozinhos do conhecimento. São aqueles que se alguém lhes disser que fez uma nova descoberta, responderão que a descoberta só será válida se alguém a tiver descoberto antes. “Como assim, uma descoberta nova? Isso não existe, meu filho. Quem és tu pra descobrir algo novo? Uma obra de arte original? Ora, pensas que és um gênio, é?”

Os doutores dessa categoria perderam todo o senso holístico, não possuem a capacidade de perceber e compreender o todo, e prendem-se a seus titulozinhos como se fossem atestados de inteligência, sabedoria e autoridade. E ai de quem os contradizer. O curioso é que uma das diretrizes da educação brasileira é justamente a construção do conhecimento em conjunto com o aluno, sabendo-se ver os conhecimentos que os estudantes possuem como também importantes. O professor não pode se julgar o dono da verdade. Porém, quando estamos em um curso superior, o que se vivencia, em muitos casos, é justamente o inverso: professores doutores autoritários e arrogantes, cuja palavra (limitada, curta, “palavra de forma”) é a lei. E, muitas vezes, sabem menos que o aluno. Mesmo. O que não era o caso da professora Terezinha, muito pelo contrário. Até porque, graças a Deus, ela não tinha doutorado.

Que tipo de gente sairá das universidades com doutores dessa espécie? Pensantes por si próprios, críticos, sensíveis e criativos? Acho que não, hein...

17 julho 2012

Concerto com S

de que adiantam
teus coros a quatro vozes
(ou teus choros de quatro modess)
emudecidos pelo vento
(ou endurecidos de cimento)
já tantas vezes
(já tantas fezes)
ou os teus acordes
com cordas
pelos cortes
do pescoço?
concordas?

as notas do teu piano
(de que caem teclas ano a ano)
o Tempo
nem mais nota

à tua partitura
já não cabe nenhum inserto...

Humanidade
(uma flauta na tempestade):
tu não tens concerto

15 julho 2012

Miséria

sendo música que é sem ter que ser
assim me espero no que nada sou
vejo os campos tão amplos dos profundos
lagos meus que nunca foram benditos
porque ao âmago sempre inútil seco
aqueles verdes vagos passam e levam-me
raio de dita tornado tornado
a olho amigo para o céu que oceana
todos os sorrisos são como pássaros
fêmina passagem em culpa precisa:
tudo é triste abaixo dO que não é
e em quatorze versos não disse nada
não disse porque estou rouco e tampouco...

e tudo é tão feio tão vão tão pouco

(Revisão do poema publicado em 1º de fevereiro de 2011.)

12 julho 2012

Não Sirvo

vós me perguntastes
em algum (de nenhum) tom
entre o fútil e o vago
(como se perguntar
respondesse a algo)
o para quê?
serviria um poeta

respondi
(como se nem estivesse aqui)
que poeta
(se poeta)
não serve pra nada
e não serve a ninguém

poeta
(seja nada ou seja triste)
é o que ainda resiste
em ser-se

a função do poeta
é ser o ser em si
num mundo
onde todos são como todos
e ninguém é ninguém

sou-me
(ainda que um além)...

mas jamais
ser-vos

11 julho 2012

Al Pacino, o Maldito de Hollywood: "Ler salvou-me a vida"

Os amigos que acompanham o blog devem saber que o Al Pacino é meu ator favorito. Já vi todos os seus filmes, vários deles dezenas de vezes. É um ator diferente dos demais em diversos sentidos. Suas atuações são sempre carregadas de uma dose dramática altamente pessoal, intransferível, incomparável. Sua assinatura artística é intensa, forte, como sua personalidade. A sua capacidade única para os discursos e improvisações (proveniente do seu amor pelo teatro e por Shakespeare) é algo capaz de emocionar até mesmo aqueles que não são fãs do ator.

Pacino, nascido em um bairro pobre de Nova Iorque, descendente de italianos, criou-se nas ruas, trabalhando para se sustentar, sendo sempre avesso ao luxo e à ostentação. Manteve e mantém até hoje uma posição contrária aos padrões de Hollywood, o que não permitiu que ganhasse vários Oscars, muito embora merecesse diversos outros além do único que conquistou pela sensacional atuação em Perfume de Mulher. Uma das maiores injustiças de Hollywood de todos os tempos foi não se ter concedido o Oscar de melhor ator para Al Pacino por sua atuação impecável em O  Poderoso Chefão II. "Pacino oferece-nos talvez o maior retrato cinematográfico da história do endurecer de um coração”, conforme o jornalista Larry Grobel. Abaixo, deixo trechos de uma das raras entrevistas concedidas por Al Pacino  (concedida a Larry Grobel) , além de outras considerações não minhas sobre um dos maiores atores de todos os tempos.


(Os textos abaixo foram retirados do site Wand'rin' Stars, de David Furtado. O link pode ser conferido ao final da postagem.)

 “Eu era realmente um ator das ruas, um cigano, sem casa e sem dinheiro. Vivi em espeluncas, albergues e hotéis de segunda. Para mim, qualquer coisa que tivesse água corrente era um paraíso”.   Al Pacino


Garry Marshall sobre Al Pacino:  “É estranho falar de vulnerabilidade e inocência em relação a alguém que interpretou alguns dos maiores assassinos da tela, mas ele é tão puro, honesto e artístico que lembra um pequeno Dom Quixote a caminhar por Hollywood.”

Larry Grobel sobre Al Pacino: “Pareceu-me um homem tímido e cauteloso, enfadado por ser uma estrela. O seu apartamento consistia numa pequena cozinha com aspeto gasto, a cama por fazer, uma casa de banho com a água do autoclismo a verter, e uma sala que parecia o palco de uma produção teatral sem dinheiro para os adereços. Eu conhecia pessoas pobres que viviam mais luxuosamente, por isso, simpatizei logo com aquele homem, cujas necessidades materiais eram obviamente escassas. Por toda a sala, viam-se cópias usadas de peças de Shakespeare e argumentos amontoados. Um homem sincero e dedicado à sua arte. Sempre foi avesso aos jogos de Hollywood e pagou o preço: Só em 1992 ganhou o Oscar que já era seu há mais de 20 anos."


Trechos da entrevista concedida a Larry Grobel: 
Achas que merecias o Oscar por O Poderoso Chefão II?
Acho que deves pôr as ideias em ordem acerca disso de “merecer oscars”. Estás algo equivocado…


Não é o fato de não o receberes que te irrita. Mas sim, o fato de outro o ganhar, é isso?
Quem o ganha, merece-o. Merece-o por quê? Temos de dizer, “se estes atores fossem médicos e eu tivesse de fazer uma operação ao coração, qual escolheria?” Assim, já conversamos.
Estas coisas te preocupam?
Deixa que te diga, honestamente: Não me interessa. Não estou nem aí.
Conheceste figuras verdadeiras da Máfia?
Sim, em privado. Deram-me umas referências.
Para os observares?
Sim, exato.
E eles deixaram?
Sim.
E o que aconteceu?
Nada.
Ainda estão vivos?
Não posso responder.
Tens uma cena favorita, n’O Poderoso Chefão I e II?… um momento de que te orgulhes especialmente?
Tenho um momento no Chefão II. Passa despercebido. Michael e o seu irmão Fredo estão em Cuba, a ver o espetáculo do Superman no clube noturno. Michael percebe que o irmão o traiu. É o meu momento favorito. Mas é sutil. Depois dessa cena fui levado para o hospital.
Por exaustão?
Sim. Filmávamos na República Dominicana. Fiquei fisicamente doente. Trabalhei simplesmente demasiado nesse papel.
O que procuras numa mulher?
Gosto de mulheres que saibam cozinhar (sorriso malicioso). Isso está primeiro. O amor é muito importante, mas é preciso ter uma amiga, antes de tudo. Queremos chegar a um ponto em que possamos dizer, “a mulher que está comigo é também minha amiga”. Isto relaciona-se com confiança. E leva tempo. O amor passa por diferentes fases. Mas perdura. O amor perdura. No entanto, o amor romântico pode ser um grande engano, digo-te. Pode te magoar.
Tiveste problemas com a bebida?
Não gosto de falar sobre isso, é uma coisa que não compreendo muito bem. Demorei um ano a perceber o que estava a fazer a mim mesmo e outro ano a deixar de beber.
Achas que terias conseguido sem a ajuda do Charlie?
Não.
Achas que estarias vivo?
Não sei.
Refletes sobre isso?
Só sei que, se estamos vivos, tudo é enriquecedor.
Nem sempre. Há muitas pessoas deprimidas.
Eu incluído.
O que te deprime?
Não sei. Será que a depressão é a perceção de que temos um bilhete de ida? Estou no carro, olho e vejo todas estas pessoas e penso, elas não querem estar aqui. Por isso, usam drogas ou álcool para fugirem. Tudo para não estarem aqui. E é muito compreensível.
Ainda te vês como uma personagem de Dostoiévski?
Já não. Há uns anos, sim. Agora sou mais uma personagem de Chekov. Cresci com muitos autores diferentes, de Balzac a Shakespeare. Sei que venho das ruas e não tive educação formal, mas li essas coisas e foi com os russos que mais me identifiquei. Ler salvou-me a vida.
Curiosidades sobre Al Pacino:
Chris O’Donnell, com quem Pacino contracenou em Perfume de Mulher, ouvia-o, no camarim ao lado, “dia após dia, horas a fio… a experimentar a mesma frase de 30 maneiras diferentes… era inacreditável. Nunca vi tal coisa”. O ar intimidado da personagem de O’Donnell perante o ‘Coronel Slade’ inspirou-se na intimidação que o jovem ator sentiu ao contracenar com Pacino.
A certa altura, Pacino comprou um luxuoso BMW. “Não me senti nada bem”, confessa. “Estacionei-o em frente a minha casa e pensei, ‘isto não tem nada a ver comigo! Vou devolvê-lo’.” No entanto, quando saiu, tinham-lhe roubado. “Aí está menos um problema…”
Al Pacino aprecia o trabalho de Sean Penn, Johnny Depp e Russell Crowe: “Acho que estes três deviam fazer Os Irmãos Karamazov. “E Tom Cruise?”, pergunta-lhe o entrevistador. “Tom Cruise é uma estrela de cinema, categoria totalmente diferente. Tem um tremendo carisma e também é bom ator.” Curiosamente, Pacino foi escolhido por Oliver Stone para protagonizar Nascido em 4 de Julho, papel posteriormente atribuído a Cruise. Al não aceitou fazer Kramer versus Kramer, que deu o Oscar ao seu arqui-inimigo Dustin Hoffman. “Não achei que pudesse dar muito ao papel. Dustin fez um excelente trabalho e mereceu o prémio.”


Tony Montana, em Scarface (1983) é um dos papéis de que Pacino mais se orgulha. Parece fácil… mas “é obrigação do ator que as coisas pareçam fáceis”. A realização de Brian De Palma, o argumento de Oliver Stone e a interpretação fantástica de Pacino tornaram o filme um clássico, embora tenha sido mal recebido na época. Al Pacino é assustador, no papel de gângster. Na sua opinião, “não nos podemos censurar enquanto atores, porque cortamos o instinto. Parte do modus operandi do ator é trabalhar com o inconsciente. Estamos sujeitos a cometer erros tremendos. Há que observar as crianças, as melhores professoras de arte dramática do mundo”.


Toda a entrevista está aqui.

Insisto: Taxa de Mortalidade da Gripe A é Maior do que a da Gripe Comum

Em 2009, quando ocorreu o surgimento no mundo da gripe A, ou gripe suína,  afirmei aqui no blog que, segundo os dados até então obtidos sobre a doença, a taxa de mortalidade da gripe A era um pouco maior que o da gripe comum. Na ocasião, questionei o jornal Expresso Ilustrado por ter informado em suas páginas que a mortalidade da gripe comum era maior que a da gripe A. Naturalmente, o jornal não aceitou meu questionamento.  

Bem, passaram-se três anos e a gripe A volta a assolar os gaúchos. Agora, com mais tempo para se analisar as ocorrências da doença, parece mesmo que a gripe A possui sim uma taxa de mortalidade maior. Segundo estudos que vêm sendo realizados (clique aqui) a gripe causou e vem causando muito mais mortes do que se pensava. O total de mortos pela gripe A foi elevado em 15 vezes com relação ao que havia se calculado anteriormente. 

Peguemos o exemplo atual do RS. Até o momento, estamos com 145 casos confirmados e 23 mortes. Taxa de mortalidade de altíssimos 15,86%. A taxa de mortalidade da gripe comum é de 1 a 2%. E esse alto índice de mortalidade não é só aqui no RS. Vejamos nos EUA: "Os Estados Unidos, com 300 milhões de habitantes, confirmaram mais de 300 mortes de crianças por causa do vírus H1N1, e dizem que provavelmente o número real foi muito maior. Isso equivale a mais do que o dobro dos números registrados durante a epidemia sazonal de gripe de todos os anos." Isso está aqui.

Os fatos falam por si. O que o Expresso Ilustrado fala agora sobre a taxa de mortalidade da gripe A aqui no RS? Eu não sei, porque não acompanho o jornal.

10 julho 2012

Poema Humilde e Provocativo Cujo Final é de Baudelaire

transformaste-te
então
no ser-humano-exemplo
a quem todos devem seguir
uma vez que encontraste a verdade
e conheces a verdade
e praticas a verdade
e vives a verdade
a cada instante de tua existência
portanto
todos devem fazer como tu fazes...

de quanto esforço e trabalho
e sacrifício e abnegação
necessitaste
para encontrares a verdade!
e com que força de vontade
chegaste à conclusão das conclusões
(a que não permite margem de erro)
de que a verdade que tens
é a verdade verdadeira!

admirável!

conseguiste
então
através da verdade que encontraste
ser uma nova pessoa
senhora do que pensas e sentes
agora podes erguer a voz
e dizeres que é um ser exemplar
orgulho da humanidade
sem mal algum dentro de ti
e que conheces-te ao fundo
do mais íntimo do que és
conheces-te tanto
que estás certo que o que é bom pra ti
é bom pra todos
e que tua missão
é convencer a todos
que o teu bom é o bom universal

certamente
o mundo seria outro
se todos fossem como tu és
a humanidade estaria nas alturas da evolução
e nossos problemas já não mais o seriam
então eu
humildemente
agradeço por existires
a ti, que achaste o caminho
e que pensas
tudo o que deve ser pensado
e dou-te toda a razão
ó tu
“Hipócrita  leitor, meu igual, meu irmão.” 

08 julho 2012

Ao Fim da Rosa

rosa que paira pelo não-vindo
quem foi que sagrou-te à tormenta
quem foi que matou-te em meu sangue
rosa que sonha pelo meu grave?

quem foi que falou-nos de amar-te
daquilo que voa mas sempre te parte
o alguém que arrancou-te da noite
rosa que doente pelo meu sempre?

quem te avassala pelas espadas
em vasto martelo firme na morte
e larga teu lago vazando-me o rastro
rosa que morre pela minha veia?

onde é que deixaram o teu passo na lama
rosa que afoga em tudo que chove
no medo que corta do que te consomes
rosa que vai-te em tudo que corre?

quem é que te lança na faca que mata
rosa que vaga em tudo que é podre
rosa que finda em todo meu nada...?
rosa esmagada

(Revisão do poema publicado em fevereiro de 2010.).

07 julho 2012

O Coração de Porco

Um relâmpago soado como se não estivesse (ele quase nem era) no longínquo do canto de um quadro. Um longe que nem foi notado. Os dois surdos sentados em um banco branco entre o verde desbotado da praça. Olham entusiasmados o carro que passa, mas que não emite som. Para os surdos, ao menos, não emite. Mas o carro os entusiasma pelo fato de se movimentar sem necessidade que algum animal o puxasse. Não obstante, o relâmpago continua no canto de um dia de sol. Já nem tão dia, já se enrugando de sensações de ocaso. Nuvens pardacentas para cinzas que surgem vagarosamente, como lesmas arrastando-se pelas calçadas castanhas em um derradeiro dia de verão. Já nem tão verão, alguns diriam que agourantemente outono.

Entre a praça, os dois surdos, ainda sentados no banco branco debaixo de um limoeiro florido exalando o perfume de suas flores (que, todavia, não cheiram), veem que há alguns pássaros à sua volta. Alguns pássaros, apenas, não muitos. Veem, porém, obviamente, não ouvem. Continuam fixando suas atenções estupefatas nos veículos que passam. Nenhuma pessoa passa pela rua. Não que não passe nenhuma. Logicamente que passam muitas. Em demasia até. Porém os surdos não se interessam por elas. E nem elas pelos surdos. E nenhum de nenhum percebe que alguém está ali ou passa por ali. E ninguém se interessa por ninguém. Então, é como se não passasse absolutamente ninguém.

Eu também passo não passando por ali. Porém, observo os dois surdos atentamente. Um homem e uma mulher, um casal de surdos. Belos, devo dizer, formam um perfeito conjunto. A moça, definitivamente bela, está com os seios quase à vista. Faço que não vejo. Poderia, contudo, olhá-los sem problema, pois os surdos não me veem. Não porque não podem, mas porque não querem, pois estou a um passo deles. Cumprimento-os com uma profunda saudação. Claro que não ouviriam minhas palavras. Mas também não veem meu gesto. Com seus belos olhos vidrados nos carros que passam, a mulher parece que olha através de mim. É como se eu não estivesse aqui, ou nem sequer existisse. O homem olha para baixo, como se verificando se sua roupa está bem ajustada ao corpo. Prossigo a minha caminhada.

Uma névoa de frio surge de súbito. Deve ter surgido do campo que já a essa altura desaparecera. Um pouco mais adiante de onde eu deveria pisar, noto uma pequena poça d’água. Percebo que uma moça chora agachada sob uma pequena tenda colorida como um arco-íris. Imagino, imediatamente, como quem não pensa, que a poça seria a acumulação de suas lágrimas. Uma menina, na verdade. Obviamente, não devem ser suas lágrimas ali. Ainda mais que todos pisam na poça, pois é quase invisível entre a névoa do frio do campo que já não era. Acrescento, como na indiferença, que é quase noite. Um ocaso lento, arrastado. Mesmo entre o nevoeiro, aquele relâmpago, que se aparenta com um detalhe de um fundo de uma pintura antiga e esquecida, não cessa de cintilar. Tenho uma leve impressão, não confirmada, de que se aproximou, embora nada que impressione. Não nesse momento de indiferença.

As pessoas que pisam na poça d’água que eu, ingenuamente, ainda imagino ser das lágrimas da menina de olhos castanhos, como não veem a poça diante de seus pés, no que não as posso culpar, pois é praticamente invisível, molham seus pés até os calcanhares e então resmungam algo que não consigo entender, até porque é tudo muito rápido. A menina permanece chorando debaixo da tenda colorida. Aceno para ela. Então percebo que é cega. Porque me olha, mas não vê. Mas ainda agora tenho a impressão de que ela sorriu, um sorriso malicioso, talvez até maligno. Mas é apenas a minha impressão, que, como não deve deixar de ser, não tem valor algum. Impressões são impressões. Por exemplo: tenho a impressão, fortíssima, de que aquele cachorro que transa com uma cadela sarnenta na esquina diagonal à minha é o cachorro do meu colega de trabalho. E aí está a prova de que impressões não passam de impressões, porque meu colega de trabalho não tem cachorros.

Adiante, um mau cheiro invade minhas narinas como se fosse de amoníaco. Porém, é um fedor mais pungente, insuportável. Acredito ter ouvido um trovão estendido entre os montes. Uma senhora pendura sua blusa na sacada do apartamento. Parece não sentir o fedor. Aliás, parece que ninguém o sente, tão somente eu. Percebo uma aglomeração em uma esquina. Curioso, aproximo-me. Um coração apodrece na calçada. É dele que vem o mau-cheiro. As pessoas, porém, afirmam, categoricamente, como quem estuda, que não há mau-cheiro algum. Protesto, mas é inútil. Estão certos de que é um coração de porco em estado de decomposição, não pode ser humano. Há alguns que discordam; “É um coração humano que algum cachorro trouxe do necrotério, ou do cemitério talvez!”. Outros acham que o coração, carcomido por larvas, foi derrubado por algum médico que o estava levando para a incineração. Ou para doação, enfim. Outros estão certos de que é de brinquedo. Mas a opinião geral, e já aceita, é que é mesmo o coração de um porco, animal que possui seu órgão cardíaco bastante semelhante ao nosso, como sabem os estudiosos. Muitas moscas verdes em volta. A névoa é intensa.

Volto-me para a praça. Lá está o casal de surdos a observar, atônitos, os carros que passam sem cessar. Começa a chover. Aquele relâmpago de canto de pintura continua. Até já se torna um pouco irritante. Quase noite. E o coração ali, coração de porco, dizem. Meu Deus, como fede. Todos dizem que não, tanto que consideram desnecessário retirá-lo, mas eu sinto. Maldito coração!

(Na imagem, detalhe da asa direita do tríptico "O Jardim das Delícias", de Hieronymus Bosch.)



05 julho 2012

Três Críticas Rápidas aos Prostitutos da Escrita

I

há os que a pulso
e lâmina
julgam abrir estrada...
mas nem podem
com o próprio punho
da pena
ou da espada

II

creem que criaram coragem
com a palavra
dada...
mas lá vão eles
pro...fundos
do nada

III

os que se unem a inimigos
(ou a amigos de rabo...)
até obtêm
a futilidade da (in)glória

mas a quem luta sozinho
a própria derrota
é a mesma vitória

04 julho 2012

Então, não somos mais racistas? A Eurocopa que o diga. Racismo, Hipocrisia e Burrice se espalham pela Europa.

A Eurocopa 2012 acabou domingo. A Espanha conquistou seu tricampeonato. E com justiça. O que não foi justo foram os inúmeros casos de racismo contra jogadores de algumas equipes, como holandeses, tchecos e italianos, os quais foram insultados, simplesmente por serem negros, por croatas, poloneses, russos e ucranianos. Quem quiser saber mais, clique aqui , aqui e aqui.

O mais interessante, ou vergonhoso, nesses casos de racismo é que eles partiram de povos que sofreram o inferno exatamente devido ao racismo dos nazistas durante a Segunda Guerra Mundial. Quem conhece um pouquinho de história sabe que os nazistas consideravam os poloneses e  demais eslavos (ucranianos, russos, croatas etc.) como “raças impuras”. Não eram apenas os judeus e negros que o nazismo julgava como “seres inferiores”. Os horrores vividos pelos poloneses, por exemplo, durante a Guerra, deveriam ser mais do que suficientes para extirpar de seu povo qualquer atitude e sentimento racistas. No entanto, ridícula e tragicamente, o que vemos ocorrer é justamente o contrário. Cada vez mais a Europa se afunda no racismo e no ódio aos estrangeiros, principalmente contra africanos e árabes. Mas, e todos sabem, outros povos também não são bem-vindos lá, entre eles, nós, brasileiros. É claro que não vou generalizar, sei que há europeus realmente não-racistas. Mas parece que não representam o sentimento da maioria. A Segunda Guerra foi justamente o desembocar catastrófico de tanto racismo e ódio disseminados, acumulados e entranhados entre os povos europeus...

O que eu sempre questiono são essas pessoas utópicas e/ou otimistas que tentam de todas as formas enxergar um mundo melhor e afirmam, entre outras coisas, que não somos mais racistas como no passado e que não há mais preconceitos em geral como antes havia. É incrível como a luz do otimismo cega! É verdade que avançamos na legislação contra o racismo e contra outros preconceitos; também é verdade que há uma maior conscientização da população em geral de que não devemos ser racistas. Porém, dentro de cada ser humano, o que foi que realmente mudou? Muitas pessoas que se dizem não-racistas verdadeiramente não o são ou apenas seguem uma “moda” de não ser racista? Será que, em muitos casos, não estão apenas acobertando ou disfarçando o seu racismo para não serem “mal-vistas” ou para evitar sofrerem um processo? É claro que somente o fato de se julgar “feio” ser racista já é um avanço. Porém, lá dentro, no interior sombrio e oculto da psique humana, o racismo permanece vivo, e bem vivo, esperando uma oportunidade para se manifestar. E em um momento pode se manifestar com uma explosão.

E oportunidades ocorrem, por exemplo, na internet, onde a sensação de anonimato e impunidade tornou o campo fértil para a proliferação do crime do racismo e muitos outros, como a pedofilia. Outra oportunidade ao racismo são os jogos de futebol, em que as torcidas, considerando-se protegidas pela multidão que torce enlouquecida, sentem-se livres para soltar de dentro de si o seu monstro racista, até então acorrentado pelas convenções sociais. E isso não só na Europa, mas também aqui na América do Sul, aqui no Brasil inclusive, país tido geralmente como não-racista. Aqui no RS, o racismo no futebol é deveras comum. E o que há de mais ridículo, vergonhoso e incoerente nisso tudo é que muitos torcedores insultam jogadores e torcedores negros de outros times enquanto nos próprios times para os quais torcem há jogadores e torcedores negros. E quando um jogador negro do seu time faz um gol, o jogador é um herói. A humanidade é mesmo uma piada. De mau gosto.

Mas ninguém quer admitir o seu racismo, muitas vezes nem para si mesmo. Nem o seu racismo nem a sua hipocrisia. Quem é que gosta de se observar no espelho, se não for apenas para se achar lindo? O melhor é fugir de si próprio e ir alardear que o mundo está melhor...

(Na foto acima, alguns imbecis croatas fazendo propaganda nazista. Talvez, devem gostar de o povo croata ter sido considerado impuro, sendo subjugado e oprimido pelos nazistas na 2ª Guerra Mundial.  Além de racistas e hipócritas, são burros. Com o ser humano, só rindo.)

02 julho 2012

Há?

há lago o princípio do verso
com o que há-de há na minha sina
há salto em que havia em teu verbo
que há vôo
há queda
e há lado
busquei no que passa o que há sombra
mas o que havia era o que não é
ou o que não há

aah...
há sempre menos no que há de mais
o que há funda (me)
é o que há no céu
e há as sentenças
que vós há sinais
por onde há rasto
o meu há lento
por onde (há) olhar
e por fim há sopro
há claro
há solo
alago
mas...
não há mar