Peço licença ao amigo Ruy Gessinger, que publicou em seu blog o texto abaixo, de autoria do médico Franklin Cunha, para aqui postá-lo e comentá-lo. O texto do médico me pareceu otimista em demasia, utópico, fantasioso inclusive, não levando em conta inúmeras variáveis. . Lembrou-me a crença das pessoas em geral ao final do século XIX.
Devido ao progresso e aos inquestionáveis avanços científicos da época, muitos
acreditavam que o século XX seria algo como a realização do paraíso na Terra.
Diziam que não haveria mais guerras, nem doenças, nem miséria, nem injustiças,
enfim. Bem, não preciso explicar o que foi o século XX. Vamos ao texto de Franklin Cunha (a postagem pode ser conferida na íntegra do blog do Ruy Gessinger: http://ruygessinger.blogspot.com.br/2013/12/viveremos-140-anos.html.
"A expectativa de vida sobe para 74,6 anos. ( Dos jornais)
No anuário L´Année Scientifique et Inustrielle de 1891, lê-se que a duração média da vida humana à época era de 33 anos. Hoje, segundo o IBGE, cento e pouco anos depois, nossa expectativa de vida mais do que dobrou. Outros fenômenos biológicos ocorreram nesse mesmo período de tempo. A idade da primeira menstruação caiu de 16 para 12 anos e a da menopausa cresceu de 45 para 50 anos. O número de filhos baixou de sete para menos de dois e de cada quatro cidadãos do primeiro mundo, um tem mais de 65 anos. E o casamento monogâmico e perene tornou-se quase um achado arqueológico.
A visão futurista é a de um mundo onde se poderá viver 140 anos. E tal fato, com a crescente velocidade dos avanços da biotecnologia e das condições sócio-ambientais, não levará um século.
As implicações sociais de um mundo habitado por macróbios pode nos preocupar, no entanto o progresso das ciências naturais nos faz imaginar um futuro homem de 140 anos com a vitalidade e as potencialidades físicas e intelectuais de um executivo atual de 50 anos.
A velhice, esta condição do passado humano – dirão os médicos do futuro – era acompanhada por uma desorganização da memória que podia diminuir ou desaparecer, o que anulava as vantagens de uma vida longa. Se a senectude equivale a uma baixa na entropia por degradação da energia celular, a informação, ao se acumular, torna-se uma entropia ao contrário. Por exemplo: a que se acumulou através do tempo no código genético,se renova constantemente no sentido de uma organização cada vez mais elaborada . E Chomsky provou este fato pela sua descoberta da existência da gramática generativa.
As histórias de ficção científica que traçam cenários habitados por seres humanos a salvo das degenerações física e metal, fazem uso de bancos de memória, transplantes de cérebros, clones e robôs bióticos.Os clones em cadeia tornariam os indivíduos cada vez mais ricos de informações, pois cada nova duplicação conservaria a memória dos clones anteriores. Estes e os robôs bióticos poderão, em nome da eficiência no trabalho, ser programados tanto para executar tarefas específicas como também ser impossibilitados, de rir, chorar, amar e reivindicar alterações em sua tarefas. A idéia é antiga, Huxley,Orwell, Zamiatin, Karol Capek, já imaginaram e se preocuparam com tais panoramas possíveis no futuro."
Franklin Cunha (médico)
Agora, minhas breves considerações:
A princípio, lembro que os mesmos autores citados por Franklin Cunha, como Huxley e Orwell, também imaginaram outros cenários muito menos otimistas, pelo contrário, bastante sombrios e descrentes na humanidade, aos quais o autor do texto não faz referência
A questão do aumento da expectativa de vida, que sem dúvida é um fato,
esbarra em alguns pontos. Primeiro, quando se diz que em 1891 a média de vida
humana era de 33 anos, algo precisa ser explicado. A diferença daquele tempo
para o de hoje é tão ampla porque havia muita mortalidade infantil. As pessoas
tinham muitos filhos e vários deles morriam nos primeiros dias ou primeiros
meses de vida. Essas crianças que morriam entravam nas estimativas de vida
geral, o que puxava a expectativa para baixo. Mas se considerarmos aquelas
crianças que passavam dessa idade, dos primeiros meses, a média de vida aumenta
bastante. Então, 33 anos era a média de vida porque nasciam muitas crianças e
muitas morriam. Não era a média esperada de quem atingia a idade adulta. Se
analisarmos sob esse ângulo, claro que a média de vida aumentou, mas não foi
tanto assim quanto parece.
Um outro ponto é que o autor do texto não menciona que há inúmeros
locais do planeta onde vivem bilhões de pessoas em que a expectativa de vida
continua baixíssima (em algumas regiões ela até diminuiu, como é caso de alguns
países da África subsaariana), em que a miséria impera, onde doenças como a aids
continuam dizimando a população, onde os progressos da ciência não chegam, e
pouco estão preocupados em fazer com que a situação se modifique.
Mas o que achei mais absurdo no texto foi a total desconsideração por
parte do autor quanto à pergunta: viveremos mais, mas onde? Ele afirma que as situações ambientais facilitarão o aumento da expectativa de vida... Em que planeta vive o senhor Franklin? Parece-me que os
entusiastas da ciência desconsideram que o ser humano é um animal que necessita
de um planeta para sobreviver, que a nossa existência demanda o consumo dos
recursos naturais, e que tais recursos não são infinitos, muito pelo contrário,
já dão sinais claros de seu esgotamento, e que necessitamos da saúde e do equilíbrio dos ecossistemas para nossa qualidade de vida. Qual é o custo, qual
o preço, de nossas existências? De mais de 7 bilhões de habitantes? Estimativas
indicam que a população atual da Terra supera em mais de um terço a capacidade
do planeta em sustentá-la, sem falar que cada um de nós consome muito mais para
viver do que o planeta pode oferecer a cada habitante.
Obtivemos um progresso na expectativa de vida, porém, no meu entender,
este progresso encontra-se hoje ameaçado por um motivo bastante simples: nossa
casa pode desabar sobre nossas cabeças. Enquanto o homem vive mais, em um nível
de consumo absurdo e predatório, sem apresentar sinais reais de redução, o
planeta torna-se cada vez mais doente, e sua vida é progressivamente
aniquilada. Acreditamos realmente que conseguiremos viver mais em um planeta sem
vida, sem que soframos nenhuma consequência? Seria uma imperdoável ingenuidade.
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