Junqueira Freire é um dos poetas brasileiros incluídos em nosso Ultra-romantismo. É bem pouco conhecido, até mesmo pelos fãs da literatura sombria. No entanto, sua pequena produção poética, justificada em parte pela sua morte precoce (23 anos), se não é das mais originais e maduras, revela uma intensidade de vivência emocional e um profundo conhecimento dos conflitos que massacram a alma humana. O poema abaixo reflete de forma radical e definitiva uma visão inconsolável da desesperança do homem perdido dentro de um mundo aniquilador dos altos sentimentos.
DESEJO
(Hora do Delírio)
Se além dos mundos esse inferno existe,
Essa pátria de horrores,
Onde habitam os tétricos tormentos,
As inefáveis dores;
Se ali se sente o que jamais na vida
O desespero inspira:
Se o suplício maior, que a mente finge,
A mente ali respira;
Se é de compacta, de infinita brasa
O solo que se pisa:
Se é fogo, e fumo, e súlfur, e terrores
Tudo que ali se visa;
Se ali se goza um gênero inaudito
De sensações terríveis;
Se ali se encontra esse real de dores
Na vida não possíveis;
Se é verdade esse quadro que imaginam
As seitas dos cristãos;
Se esses demônios, anjos maus, ou fúrias,
Não são uns erros vãos
Eu - que tenho provado neste mundo
As sensações possíveis;
Que tenho ido da afeição mais terna
Às penas mais incríveis;
Eu - que tenho pisado o colo altivo
De vária e muita dor;
Que tenho sempre das batalhas dela
Surgido vencedor;
Eu - que tenho arrostado imensas mortes,
E que pareço eterno;
Eu quero de uma vez morrer para sempre,
Entrar por fim no inferno!
Eu quero ver se encontro ali no abismo
Um tormento incrível:
- Desses que achá-los nas existência toda
Jamais será possível!
Eu quero ver se encontro alguns suplícios,
Que o coração me domem;
Quero lhe ouvir esta palavra incógnita:
- "Chora por fim, - que és homem!"
Que, de arrostar as dores desta vida,
Quase pareço eterno!
Estou cansado de vencer o mundo,
Quero vencer o inferno!
Junqueira Freire
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