13 outubro 2010

Quem Pisou o meu Chão?

antes de eu pisar aqui onde piso
quem pisou antes de mim?
quem foi que foi onde agora sou eu?
quem pisou o chão da minha casa
antes da minha casa se erguer?
aquele que trabalhava na construção civil
que eu nunca vi e que nunca me viu?
e antes dele
quando era só campo ou mato ou banhado?
passou por aqui um guerreiro
que tenha morrido ou tenha matado?
pisou onde estou algum bicho?
carneiro cavalo jaguar ou guará?
será que algum dia de novo esse bicho
a sua pata-pegada aqui deixará?
um homem pré-histórico
pisou a minha casa futura?
ou minha casa um dia serviu
de uma milenar sepultura?
e antes ainda nos tempos estranhos
de monstros e de dinossauros...?
que pata acompanhou o  meu passo
sem nunca saber que estaria
no meu mesmo invisível compasso?
e que mistério existido sem conhecimento
fora da ciência e da consciência
e de qualquer momento
pode ter um dia pisado o meu piso?
queimou o meu chão um dragão?
não sei, só sei que tudo passa:
estes passados versos que escrevo
também um dia serão pisados
por uma traça...

11 outubro 2010

"A cidade ali está com seus enganos..." - A Cidade, de Fagundes Varela

A meu ver, Fagundes Varela (1841 - 1875), é um de nossos poetas injustiçados. Está certo que não foi dos mais originais de nossos românticos, não foi o iniciador de nenhum dos três períodos do romantismo, e acabou sendo ofuscado pela originalidade e radicalismo de Álvares de Azevedo e pela força grandiosa da inspiração de Castro Alves. No entanto, a imensa variedade de sua temática, que parte do pessimismo e da desilusão do 2ª geração romântica (na qual é incluído) até atingir as alturas do "condoreirismo" da 3ª geração , a espontaneidade da escrita, a beleza plástica de seus versos, a sua intensidade emocional fazem de Fagundes Varela um dos grandes poetas brasileiros. 

É oportuno lembrar que mesmo não tendo sido o poeta carioca o iniciador da geração "condoreira" no Brasil, ele de certa forma se antecipou, prevendo Castro Alves, pois foi o primeiro ultrarromântico a deixar as sombras do "mal-do-século". Isso deveria ser levado mais em consideração ao se avaliar a  importância de sua obra. A presença da natureza é constante e muito forte na obra de Fagundes Varela. E estou certo de que se ele vivesse hoje teria uma imensa consciência ecológica. 

Prova disso é o poema "A Cidade", que está abaixo. Um poema que se nos apresenta com terrível atualidade. Que o leitor tire suas conclusões. Para não deixá-lo muito cansativo à leitura no blog, tomei a liberdade de excluir algumas poucas estrofes. Na imagem, o quadro, "O Crescente das Casas" de Egon Schiele.

A Cidade
A cidade ali está com seus enganos,
seu cortejo de vícios e traições,
seus vastos templos, seus bazares amplos,
seus ricos paços, seus bordéis salões.

A cidade ali está: sobre seus tetos
paira dos arsenais o fumo espesso,
rolam nas ruas da vaidade os coches
e ri-se o crime à sombra do progresso.

A cidade ali está: sob os alpendres
dorme o mendigo ao sol do meio-dia,
chora a viúva em úmido tugúrio,
canta na catedral a hipocrisia.

A cidade ali está: com ela o erro,
a perfídia, a mentira, a desventura...
Como é suave o aroma das florestas!
Como é doce das serras a frescura!

A cidade ali está: cada passante
que se envolve das turbas no bulício
tem a maldade sobre a fronte escrita,
tem na língua o veneno e nalma o vício.



Quanta atroz injustiça e quantos prantos!
Quanto drama fatal! Quantos pesares!
Quanta fronte celeste profanada!
Quanta virgem vendida aos lupanares!

Quanto talento desbotado e morto!
Quanto gênio atirado a quem mais der!
Quanta afeição cortada! Quanta dúvida!
Num carinho de mãe ou de mulher!



E abalroam-se as múmias coroadas,
corpos de lepra e de infecção cobertos,
em cujos membros mordem-se raivosos
os vermes pelas sedas encobertos!



Aqui verdes campinas, altos montes,
regatos de cristal, matas viçosas,
borboletas azuis, loiras abelhas,
hinos de amor, canções melodiosas.



Ali a honra e o mérito esquecidos,
mortas as crenças, mortos os afetos,
os lares sem legenda, a musa exposta
aos dentes vis de perros objetos!



Salve, florestas virgens! Rudes serras!
Templos da imorredoura liberdade!
Salve! Três vezes salve! Em teus asilos
Sinto-me grande, vejo a divindade!



Fagundes Varela

09 outubro 2010

Soneto aos Últimos Momentos (para Franz Schubert)

saíste dos solares das auroras
direto aos teus ocasos iminentes
anoiteceu em tudo o que tu sentes
tragédias sussurraram em tuas horas...

o sonho de mais vida te devora
quanto mais ao sublime vais em frente
há morte nos avisos que pressentes
e arcanjos em segredo vão embora...

deixaste um véu no teu gênio profético
alheios à fama os sopros fatais
mas há oculto no teu cântico hermético

e em fúnebres marchas de altos sinais
o hino em dó de um catastrófico épico:
és um homem para os Grandes Finais.

08 outubro 2010

Poema Catastrófico nº1 – Uma Valsa

A partir de hoje, criarei poemas para as catástrofes ambientais e sociais que assolam nosso planeta. Não que tais acontecimentos já não fossem temas de minhas obras, sempre foram, obviamente, porém agora alguns poemas farão referência direta a fatos catastróficos específicos. Começo com um poema para o vazamento tóxico de “lama vermelha” de uma fábrica de alumínio na Hungria, considerado o pior desastre químico da história do país. O desastre causou a morte de várias pessoas, feriu e contaminou muitas outras, contaminou o solo e pequenos rios, e há o temor que o vazamento atinja o famoso rio Danúbio, que corta inúmeros países europeus e consagrou-se na famosíssima valsa de Johann Strauss "Danúbio Azul".

Poema Catastrófico nº1 – Uma Valsa

eu dormia e sonhava
com as valsas de Liszt e de Strauss
e bailavam na minha esperança
os cânticos das ninfas azuis...
mas acordei-me com um berro
e as pernas afogadas no rubro do ferro...

quedou na leveza do meu sono
o pesar do chumbo
e o ritmo frenético de um bumbo
que fez valsar as minhas pernas em lavas
na febre ardente do mercúrio
as arrancou como se fossem asas...

serpenteavam sarcásticas pelos meus costados
nas hemácias ácidas de um sangue artificial
as correntes dos metais pesados
sonhava com valsas
e acordei com metal...

voei de um leito para um leito
de hospital
valsando às chibatadas
de um líquido relho...
saio do céu do Danúbio Azul
para o inferno de um Danúbio Vermelho...

07 outubro 2010

...dos meus Limites

...aquele que sonhou o sonho do meu ver
porque eu não passo de um sonho
sem sequer esquecer...

deu-me a poesia
(oh dia!)
para que eu chegasse ao fim
e que sonhasse ser o Ser
que está além do acima de mim...
a poesia é o sonho que é o degrau
que talvez eu nunca subi
é ela que lembrando o que não foi
sempre me recorda a corda
que nunca me tirou daqui
talvez eu fosse aquela espada
de não e de nada
que sangrou o tudo
pela minha vida
e fronteirou-me além dos meus Limites
para que eu versasse ao alto
e acima caísse
ao cimo da minha arte
perdida
e à parte...

...àquele que sonhou o sonho do meu ser
porque sou um passo de um sonho
que se quer esquecer...

05 outubro 2010

Por que Escrever?

Quanto ao ofício de escrever, não admito cartilhas, manuais, teorias, enfim, todas essas baboseiras que pretendem nos ensinar artificialmente a escrever. Se alguém disse com real propriedade, na minha opinião, o que é escrever, foram o poeta alemão Rainer Maria Rilke (1875 - 1926) e o poeta e escritor alemão/americano Charles Bukowsky (1920 - 1994), literatos que muito aprecio, principalmente o Rilke. Abaixo, o que disseram Rilke e Bukowsky a respeito (na imagem, Rainer Maria Rilke):


"Procure entrar em si mesmo. Investigue o motivo que o manda escrever; examine se estende suas raízes pelos recantos mais profundos de sua alma; confesse a si mesmo: morreria, se lhe fosse vedado escrever? Isto acima de tudo: pergunte a si mesmo na hora mais tranquila de sua noite: "Sou mesmo forçado a escrever?" Escave dentro de si uma resposta profunda. Se for afirmativa, se puder contestar àquela pergunta severa por um forte e simples "sou", então construa a sua vida de acordo com esta necessidade. Sua vida, até em sua hora mais indiferente e anódina, deverá tornar-se o sinal e o testemunho de tal pressão. Aproxime-se então da natureza. Depois procure, como se fosse o primeiro homem, a dizer o que vê, vive, ama e perde. (...)"
Rainer Maria Rilke



Então queres ser escritor? 

se não sai de ti a explodir
apesar de tudo,
não o faças.
a menos que saia sem perguntar do teu
coração da tua cabeça da tua boca
das tuas entranhas,
não o faças.
se tens que estar horas sentado
a olhar para um ecrã de computador
ou curvado sobre a tua
máquina de escrever
procurando as palavras,
não o faças.
se o fazes por dinheiro ou fama,
não o faças.
se o fazes para teres
mulheres na tua cama,
não o faças.
se tens que te sentar e
reescrever uma e outra vez,
não o faças.
se dá trabalho só pensar em fazê-lo,
não o faças.
se tentas escrever como outros escreveram,
não o faças.

se tens que esperar para que saia de ti a gritar,
então espera pacientemente.
se nunca sair de ti a gritar,
faz outra coisa.

se tens que o ler primeiro à tua mulher
ou namorada ou namorado
ou pais ou a quem quer que seja,
não estás preparado.

não sejas como muitos escritores,
não sejas como milhares de pessoas que se consideram escritores,
não sejas chato nem aborrecido e pedante, 
não te consumas com auto-devoção.
as bibliotecas de todo o mundo têm bocejado até adormecer
com os da tua espécie.
não sejas mais um.
não o faças.
a menos que saia da tua alma como um míssil,
a menos que o estar parado
te leve à loucura ou ao suicídio ou homicídio,
não o faças.
a menos que o sol dentro de ti
te queime as tripas,
não o faças.

quando chegar mesmo a altura,
e se foste escolhido,
vai acontecer
por si só e continuará a acontecer
até que tu morras ou morra em ti.

não há outra alternativa.

e nunca houve.

Charles Bukowski

04 outubro 2010

Faço Slogans para Candidatos

Já que não ganho nenhum dinheiro como escritor, estou oferecendo meus serviços 
para os políticos. Inspirado no sucesso do maior político brasileiro, o filósofo Tiririca, com seu famoso slogan "Pior que tá não fica", estou criando slogans para candidatos. Vou deixar alguns exemplos para provar a qualidade de meu trabalho. Abaixo, alguns slogans que fiz para políticos consagrados:

para a recém eleita senadora Ana Amélia:

"RBSTV: a Ana Amélia, a gente faz pra você." 

para Fogaça:

"Não passe em cima do muro como o meu partido passa, vote Fogaça."

para Yeda:

"Conto com o seu apoio para comprar outra casinha e pôr nas escolas cortinas de seda. Governadora é Yeda."

para Serra:

"Cuidado com a Dilma que a Dilma te pega, te mata daqui e lá ela te enterra.Vote no Serra"

O senhores políticos que apreciaram o meu trabalho e quiserem contratar meus serviços, por favor, deixam aqui seus e-mails que entrarei em contato. Se forem eleitos, cobro 20% dos futuros desvios de verbas.

03 outubro 2010

O Líquido Mais Puro

quem disse que não podeis descer?
qual vazia ditadura oculta mentiu
que esgotou a imensidão dos vossos mares?

quem disse que não podeis brotar?
acaso aterraram o fundo de vossos lagos
ou aprisionaram as nuvens das vossas névoas?

quem disse que não podeis correr?
que mão fútil frívola supérflua
quis pôr um dique nas correntezas dos vossos rios?

quem disse que não podeis sulcar?
sulcar a terra da Terra inteira
com os vinhos dos vossos sangues
com os sangues das vossas águas?

quem disse que não podeis chorar?
minhas glândulas lacrimais
que o após do pós-modernismo
não conseguiu extirpar?

Lágrima imperatriz do profundo!
vós sereis o líquido mais puro
que restará sobre a finitude do mundo...

01 outubro 2010

Palavras de Sangue

antes de ser sagrado
sagre-se
antes de ser sacado
saque
antes de ser sangrado
sangre
atire no ponto
antes que te atirem da ponte
e puxe a faca
antes da maca...

o tigre é tigre porque tem dente
e ameaça à frente
a águia é águia porque tem garra
e mata na marra...

no cavalo se coloca o encilho
e no homem o gatilho...
como ter confiança na esperança?
e alegria no hoje em dia?
ou verdade na humanidade?

há que ser mais forte que a morte
pois não há como se livrar dessa roda:
o sangue está sempre na moda.

Por que NÃO voto em Chicão? Por que NÃO voto no PP?

Primeiramente, como este blog possui muitos leitores de fora de Santiago, esclareço que o senhor Francisco Gorski, mais conhecido como Chicão, é candidato a deputado estadual pelo PP (Partido Progressita).

Os motivos de meu voto não ir para Chicão nada têm a ver com sua pessoa, contra a qual não tenho absolutamente nada. Meus motivos referem-se ao seu partido, PP, para o qual nunca votei e nunca irei votar, seja quem for o candidato e digam-me o que quiserem dele.

Sou do tempo em que antes de se votar num candidato, votava-se na ideologia do partido, em sua história, em seu significado político dentro de nossa nação, estado e cidade. Votava-se antes de qualquer coisa no que este partido iria representar dentro de determinado governo. É nisso que penso. E por pensar é que não voto no PP.

O Partido Progressista deve ter esse nome porque veio progredindo desde lá a ditadura, para a qual deu uma sólida base através da ARENA, (o PP era a ARENA, todos sabem), veio progredindo SEMPRE REPRESENTANDO OS INTERESSES DAS ELITES. Dito isso, vou apresentar meus motivos:

1) Sendo eu um escritor (se bom ou mau, isso já é outra história) que sempre lutou pela liberdade de expressão, como votar em alguém de um partido que foi a base da ditadura militar?

2)Como votar em um partido que tem como um dos seus maiores líderes históricos o cidadão Paulo Maluf, um dos maiores ladrões do Brasil?

3)Como votar em um partido que sempre representou o coronelismo em nossa cidade, a elite financeira, os interesses dos ricos, dos grandes latifundiários?

4)Como votar em partido que sempre representou a direita conservadora, rançosa, arcaica, vazia, que junto com o DEM e o PSDB sempre estiveram ao lado do poder financeiro e do capitalismo selvagem em nosso país?

5) Como votar em um partido que apoiou e apoia o pior governo do RS na história, na minha opinião, esse da Yeda que aí está?

6) Por fim, toda essa campanha que pretende pregar uma unanimidade em Chicão, como se por eu ser santiaguense devo votar em um santiaguense, é simplesmente uma ofensa à minha inteligência e aos meus princípios. Toda unanimidade é burra.

Não voto no PP. Nunca. Jamais.

E, para finalizar, venho informar que estou mudando meu voto para presidente. Votarei agora no vencedor do debate de ontem, no senhor PLÍNIO DE ARRUDA SAMPAIO, do PSOL. Sinto não mais votar na Marina, mas como ela não tem chances de ir para o segundo turno, vou dar meu apoio a esse velho senhor que demonstrou ser o mais inteligente e consciente dos candidatos.

Como sempre, este blog está TOTALMENTE ABERTO para manifestações contrárias à minha. Quem discordar, sinta-se livre para aqui deixar a sua opinião.

30 setembro 2010

O Meu Verdadeiro Fim

os versos que não fiz
é o que há de melhor em mim
o que não fiz é meu verdadeiro fim...

sou o fumo espiritual que beija meus não-versos
os meus in-versos é o que mais pulsa no meu peito
e quanto mais o peito vivo pulsa
mais a vida escorre
e não há outro jeito...

o melhor de mim é o meu porre
do vinho que preparei nos vasos da melancolia
do meu sistema sanguíneo...
preparei com os sonhos que fermentaram
nas bactérias sedentas do meu coração
pois sou aquilo que não tiveste noção...

e nem mesmo eu tive
não sei de mim mais que o poema sabe de si
sou um mau poema que não foi feito
ou foi feito com palavra que era só música
e que nem eu mesmo nunca ouvi:
o melhor que faço é o que escuto
e que digo que não estou aqui
em absoluto.

29 setembro 2010

Por que Voto em Marina e em Tarso?

Os motivos são extremamente simples. A minha maior preocupação com o Brasil, de forma geral (a maior, não a única, é claro), é com a questão ambiental. É algo absolutamente óbvio, mas o que espanta, assombra, deixa-me atônito, é que as pessoas, até mesmo intelectuais, parecem não se dar conta disto: prosseguindo os atuais níveis de consumo e degradação ambiental em breve não haverá mais recursos naturais. E assim, não haverá desenvolvimento de nenhum tipo. Nem vida.

E dos candidatos para presidente que aí estão a Marina é a que ME PARECE mais preocupada e comprometida com a questão ambiental. A Dilma possui um perfil tecnicista e desenvolvimentista demais para mim. E o Serra, bom, o Serra é o imbecil candidato dos ricos. Em um eventual segundo turno entre Dilma e Serra, irei de Dilma. O governo Lula foi um bom governo, de modo geral, é verdade. Porém, todo esse desenvolvimento que aí está, em grande parte é uma ilusão. Em grande parte, não é um desenvolvimento sustentável, foi e está sendo efetuado às custas de mais degradação, de mais exploração indevida de nossa natureza, sem uma verdadeira preocupação ambiental.


E voto em Tarso porque no RS minha maior preocupação é com a educação, e o Tarso ME PARECE o mais preocupado e comprometido com a questão educacional. A YEDA FOI O MAIOR DESASTRE NA EDUCAÇÃO GAÚCHA DA HISTÓRIA, e o Fogaça, bem, o Fogaça é só papo, só conversa fiada. Foi senador por 16 anos!!! e não fez nada.

Se alguém discorda de mim, o blog está aqui aberto para toda e qualquer manifestação, sem nenhum tipo de censura ou de seleção de opiniões.

Poemas do Término e Contos do Fim 40

A edição 40 do zine literário Poemas do Término e Contos do Fim já foi lançada e encontra-se disponível. Inclui a parte final do conto "As Duas Mulheres" e os poemas "O Melhor é o que Não se Espera", "Destino" e "Concordas?".

O zine 40 está também disponível digitalmente, gratuito, como a versão impressa. Para recebê-lo, basta que o leitor deixe seu e-mail aqui ou mande para reiffer@gmail.com, que então ele será enviado.

Em Santiago, os pontos de distribuição da versão impressa são os seguintes: locadoras Fox, Classic e Stop, biblioteca pública, biblioteca da Uri, Ponto Cópias e Livraria Santiago. Pode ser enviado para qualquer cidade do Brasil ou exterior, mediante o pagamento das despesas de correio.

Além de Santiago, o zine Poemas do Término e Contos do Fim possui distribuição fixa nas seguintes cidades: Santa Cruz do Sul/RS, Santa Maria/RS, Porto Alegre/RS, Santo Ângelo/RS, São Gonçalo/RJ e Goiana/PE.
O trabalho de design da publicação é realizado por Guilhermes Damian.

28 setembro 2010

Eu passo do ponto. E pronto.

Em 2009, eu e meu amigo músico Marcus Vinícius Manzoni realizamos um trabalho em parceria, cujo resultado foi a letra "O Ponto". Serve como letra e como poema. Agora, o Marcus musicou a letra, e o fez com grande qualidade, um trabalho realmente digno de admiração. Tanto a parte instrumental quanto a vocal estão muito bem compostas e executadas. Quem quiser conferir a música, aqui está:

http://palcomp3.com/marcusmanzoni/

O poema/letra está abaixo:

O Ponto

até certo ponto
me atiro da ponte
até certa ponte
eu passo do ponto
uma ponte no passo
a um passo da ponte
me atiro com um tiro
se passo do tiro
me volto ao meu ponto
passo ponto e ponte
mas e eu estou onde
que nunca me encontro
e nunca estou pronto?

na ponta da noite
me aponto no escuro
ponteando socorro
batendo no muro
no ponto do erro
na margem da ponte
eterno horizonte
eu bato no peito
eu penso se corro
e nunca me encontro
e nunca estou pronto?
eu passo do ponto
e pronto.

26 setembro 2010

Palavras de Paz

não se pode ludibriar um poeta
com os símbolos das palavras
porque só ele conhece a todos:
poeta é o que sabe os significados perdidos...
quem tem olho que vê o fundo do escuro
não se engana com o brilho fácil das luzes
quem tem íris que capta o negro da noite
não se engana com o sonho fácil das cores...

acima das plumas brancas da esperança
paira a sábia asa-sangue do abutre
e a firme garra impiedosa do gavião...

os melhores vinhos trazem as trevas da morte
e os piores raios brilham como as luzes do dia...

e há tanta paz no olho do furacão...

25 setembro 2010

Romantismo Pós-Moderno

quem disse
que o romantismo saiu de moda?
eu mesmo estou aqui
beijando uma mulher que morre...

acariciando seus cabelos dourados
como as areias dos desertos novos...

perdendo-me em seus olhos claros
como luzes de duas bombas atômicas...

aspirando o seu alento morno
como o ar enfumaçado lá dos trópicos...

sorvendo sua saliva macia
como os mares flutuantes de petróleo...

sentindo o sangue pulsar em suas veias
como o golfejo do guará esmagado no asfalto...

dei a ela
esta flor, a mais triste
a flor-esta
devastada...

beijo uma mulher que morre
cujo nome é Humanidade...

24 setembro 2010

Venda o Seu Voto!

Sabem, estive pensando... Os eleitores deveriam vender seu voto. Sim, é uma forma de valorizá-lo. A melhor forma. Afinal, por que não vender o voto? Se o voto é meu, se é um direito que tenho, deveria fazer dele o que eu quisesse. Estive pensando e acho que sou um burro em não vendê-lo. Por que devo dar de graça meu voto? Para depois o cara que for eleito ir lá  enriquecer às minhas custas? 

Além do mais, há muitos que vendem suas casas para colocar propagandas de candidatos, alugam automóveis para saírem nas ruas enchendo o saco com suas musiquinhas ridículas. Vendem seus serviços para fazer campanha. Vendem espaços em seus jornais, vendem seus blogs, vendem suas opiniões, enfim, vendem tudo. Por que não vender o voto?

E para ser sincero, raros são os homens que não têm um preço. A maioria é comprada por dinheiro. E aí vai depender de cada um. Uns são caros, outros baratos. Alguns se vendem por uma simples caixa de cerveja. Outros por um carro último tipo. Outros por uma fortuna. Mas se vendem. 

Há ainda os que se vendem por fama, por status social, para aparecer mesmo! Há os que se vendem por puro puxa-saquismo,  por simples elogios. Há os que se vendem por favores, por promessas. Há até os que se vendem  para se sentirem mais confortáveis. Enfim, todos tem seu preço. Ou não? Tu tens o teu, leitor?

Então, por que não vender o voto? Agora, não pensem que estou dizendo para vender com sinceridade. Claro que não. Bom, primeiro de tudo, temos que procurar vender somente para aqueles que é sabido que têm muito dinheiro. E nunca podemos aceitar a primeira  oferta. Não, temos que sempre pedir o dobro do ofertado. Quanto mais arrancarmos desses cafajestes, melhor. Ainda que eles não queiram pagar o dobro, vão pagar com certeza um pouco mais do que inicialmente ofereceram. E, por último, e mais importante: devemos ser como os políticos. Mentirosos e traiçoeiros. Vendam o voto, mas nunca, jamais! votem em quem comprou seu voto. É óbvio que esses imbecis não merecem ser eleitos. 

21 setembro 2010

Mais Um Trecho de Um Instante de Sono (Sono Sanguíneo)

como o líquido negro do café
que escorre dos vales da minha urgência
sonho que um vinho vive em meu passo à beira...
sou daqueles que passam às margens do tenso
no passar em seus três sentidos
e sempre um símbolo de humanidade morta
despenca-me tumularmente furiando
a cada lágrima que em teus cílios convulsiona-me
um sei que se apaga no morrer-do-sol
durmo como dorme a lua febre
envelhecida pelo fumo de um cigarro
só não dorme o que vulcanicamente pulsa
na pele sonâmbula do sentimento
em finais derramamentos de violinos ocasos
ao Fim da História...
durmo após o mundo
no pânico do ansiamente em charme
para acordar nos roxos abraços
dos sangues do que deve abraçar-me...

20 setembro 2010

(arco) Íris

gavião azul
em limoeiro escuro:
flor lilás.
os meus versos brancos
vêm de castanhos olhos
para o sol voltados:
revoltadas flechas...

astro-rei
de violeta ultra
vindo em fachos roxos...
o meu inverno verde
doura os lábios rosas
do começo ao fim
no vermelho ocaso.

um gavião azul
no vermelho ocaso.

17 setembro 2010

“A política e o crime são a mesma coisa.” (FINAL)

O político fala:

Como não posso desabafar com ninguém, nem mesmo com minha família, que não sabe de nada, nem com meus correligionários, para quem eu pareceria ser um fraco, vou aliviar essa pressão que está me consumindo escrevendo algumas linhas. Dizem que escrever é uma ótima forma de descarregar tensões.

Nem sei por onde começar, o que sei é que devo dar um jeito naqueles miseráveis, filhos-da-puta, que não param mais de sugar o meu dinheiro, que é meu por direito, afinal, eu fui eleito, fui eu que o povo escolheu para cuidar de seus problemas, de seus anseios, e não eles, aqueles ladrões, desgraçados! Ah, como fui tão burro, logo eu, que sempre me julguei tão esperto, o mais esperto de todos, fui aquele dia cair na conversa daquela miserável. Mas como ela era bonita... e gostosa, meu Deus! Como eu iria resistir? Também sou humano, não sou um deus, não tinha como não cair naquela conversa doce e macia, naquele olhar ao mesmo tempo sedutor e desamparado, parecia ser tão puro... o qual percebi que há vários dias procurava os meus em nossas reuniões do partido.

Então ela veio, dizendo que estava apaixonada por mim, que queria ao menos ser minha amante, pois sabia que seria impossível ser minha esposa, afinal, amo minha esposa. Como, meu Deus! Como não me apaixonar também? Como não acreditar em suas palavras que pareciam ser tão sinceras, tão profundas, tão intensas... Não, eu não tive culpa, fui uma vítima. Apaixonei-me, e no afã cego da paixão, e para mostrar a ela como eu era um homem esperto, poderoso, muito rico, contei tudo, tudo! Eu contei tudo a ela! Que idiota! Como não desconfiei que poderia ser uma armadilha daqueles desgraçados, ladrões, porcos chantagistas! Agora eles sabem de tudo, têm provas, tudo gravado por aquela prostituta, aquela cadela vadia, que ainda roubou meus documentos. Eu devia ter lembrado daquela frase que li certa vez, não lembro onde: “O sexo é a pedra de tropeço.” Sim, é isso mesmo, tropecei nele, e caí. Maldito amor! O amor é mesmo uma piada. Mas agora não adianta ficar me lamentando, terei que fazer algo, mas o quê? Eles não param de me sugar, sabem o quanto sou rico e o quanto estou comprometido. À polícia não posso ir... Mas posso ir até eles e matá-los! Não, eu até poderia pagar alguém para matar alguns, mas jamais todos, e as provas continuariam com eles. Tenho que jogar como eles jogam, conseguir alguém que se infiltre naquela maldita organização e resgate as provas para mim... Sim, sim, acho que essa é a saída, farei isso! Ah, mas ela, aquela puta! Ela eu tenho que matar!

Meu Deus, como é difícil ser político neste país! Dei meu sangue por esse povo ingrato e agora sou vergonhosamente roubado, de um dinheiro que é meu, MEU! Sim, tudo bem que ele não faz parte de meu salário de deputado, mas o salário é muito baixo, ridículo, para todos os problemas e preocupações que tenho que passar. Nada mais justo do que pegar uma partezinha desse montão de verbas que aí esta, e de que todos pegam um pouco para si. Sim, sim, todos pegam, todos sabem disso, e qualquer um que for eleito e vir para cá, vai fazer o mesmo, vai pegar uma parte para si, por muito honesto que se ache. E eu acho isso perfeitamente justo, porque a verdade é que somos muito mal pagos, deveríamos receber muito mais, temos obrigação de ser ricos perante a sociedade, somos um espelho no qual o povo se reflete. Só o que fiz foi corrigir pelas minhas próprias mãos algo visivelmente errado. Mereço esse dinheiro que peguei do povo, porque trabalho pelo povo. Eu que tenho que decidir quanto devo ganhar, não os outros, o poder é meu, eu o mereci, fui escolhido.

Isso não é desonestidade, é uma questão de justiça, ainda que não esteja na lei. A lei também erra. Eu sou um homem honesto, honrado, digno da confiança que o povo depositou em mim. Cumpro minhas obrigações, apresentei e apresento inúmeros projetos para o bem de meu país, sou um pai de família respeitado. Só eu sei o que sofro na pele por ser político, todas as acusações falsas, as piadinhas que tenho que aguentar, todo o trabalho de ir até o povo, aos pobres, às favelas, e ter que estar sempre sorrindo e de bom-humor, apertando a mão, correndo o risco de pegar doenças, porque essa é a realidade. E essa gente é uma gente traiçoeira. Diz que vai votar em nós, mas depois não vota. Agora eu, eu tenho que falar sempre a verdade e ser sempre simpático! Ah, vão à merda! Então, se eu pego um dinheiro pra mais, é para fazer justiça a mim mesmo, para recompensar todos esses males por que tenho que passar como homem público. E quem não faria? Quem não pegaria uma justa recompensa para si?

Mas agora, agora surgiram esses vagabundos, que não querem trabalhar, e ficam roubando o dinheiro de quem trabalha, miseráveis! E ainda se utilizam de vagabundas sedutoras, fazendo com que eu, além de trair minha amada esposa, conte, como um patinho, meus segredos para aquela vaca, aproveitando-se do meu coração apaixonado e bondoso. Às vezes fico pensando que talvez eu devesse ouvir meu pai, quando dizia: “filho, seja um grande político, mas um político honesto, nunca vá roubar o dinheiro do povo.” Bem, o pai era um ingênuo, um romântico, eu sou um homem prático. O pai não entendia nada de política, não sabia que pegar algumas verbinhas não é roubar, mas ser justo consigo mesmo. Mas se eu tivesse ouvido o pai, agora não teria que dar a metade do meu dinheiro para aqueles ladrões. Talvez ser “honesto” fosse mais lucrativo...