de nada adiantam
os teus coros a quatro vozes
levados pelo vento
já tantas vezes...
ou os teus acordes
com cordas
no pescoço
ou as notas do teu piano
que o Tempo
nem mais nota...
o que surge errado não encontra acerto:
não adianta, Humanidade,
tu não tens concerto.
04 setembro 2010
03 setembro 2010
Gota a Gota ( um horrível poema pós-moderno)
gota a gota
derramarei um poema pós-moderno
legítimo:
começo
espremendo o líquido verde
das minhas esperanças
gota a gota
sobre o sangue de um graxaim
que gota a gota
escorreu pelo asfalto fervente
até ser absorvido pela terra seca
que gota a gota
espargiu seu pó
sobre os meus olhos pingando lágrimas
gota a gota
não de tristeza ou de sensibilidade
porque isso há muito morrera
mas porque sobre mim caía
uma chuva ácida
gota a gota
e caía também sobre o cedro morto
de que há muito
extirparam sua seiva
gota a gota
e as cinzas de suas antigas folhas
agora fumaça pelo ar
caiam como fuligem sobre meus olhos
gota a gota
mas ainda pude olhar para os meus pés
atolados num rio
que transbordava fezes
gota a gota
e ao lado havia um cadáver
de um homem com as mãos abertas
caindo moedas
gota a gota...
derramarei um poema pós-moderno
legítimo:
começo
espremendo o líquido verde
das minhas esperanças
gota a gota
sobre o sangue de um graxaim
que gota a gota
escorreu pelo asfalto fervente
até ser absorvido pela terra seca
que gota a gota
espargiu seu pó
sobre os meus olhos pingando lágrimas
gota a gota
não de tristeza ou de sensibilidade
porque isso há muito morrera
mas porque sobre mim caía
uma chuva ácida
gota a gota
e caía também sobre o cedro morto
de que há muito
extirparam sua seiva
gota a gota
e as cinzas de suas antigas folhas
agora fumaça pelo ar
caiam como fuligem sobre meus olhos
gota a gota
mas ainda pude olhar para os meus pés
atolados num rio
que transbordava fezes
gota a gota
e ao lado havia um cadáver
de um homem com as mãos abertas
caindo moedas
gota a gota...
02 setembro 2010
O Labirinto, de Jorge Luis Borges ( que merecia o Nobel...)
Borges é para mim o maior escritor da América Latina. Talvez não o maior poeta (embora esteja entre os maiores, certamente), mas na prosa é insuperável. Melhor, na minha opinião, que Gabriel García Márquez, e merecia mais que este um Nobel. Só que o Nobel, como a maior parte das premiações artístiscas, é uma piada. Sim, prêmios literários o que expressam? O gosto de alguns. Não venham me falar de imparcialidade, de conhecimento dos críticos, essas baboseiras todas. Arte é subjetividade. E ponto final. Ninguém tem a capacidade objetiva de determinar o que é melhor ou que é pior na arte, quando, é claro, trata-se de autores de níveis semelhantes. Poderia mencionar inúmeros exemplos aqui do que digo. Basta dizer, no entanto, que Fernando Pessoa perdeu um concurso com seu genial "Mensagem" para um padre literariamente medíocre que hoje ninguém sabe quem é.
Talvez seja até melhor que Borges não tenha ganhado o Nobel. Isso fala ainda mais alto em favor de sua genialidade, tanto como prosador como poeta. E como poeta, deixo aqui um de seus enigmáticos poemas, incluído no livro "Elogio da Sombra" de 1969. (Na imagem que acompanha o poema, "O Sonho do Pastor", de Füssli)
O Labirinto
Nem Zeus desataria essas redes
de pedra que me cercam. Olvidado
dos homens que antes fui, sigo o odiado
caminho de monótonas paredes
que é meu destino. Retas galerias
encurvando-se em círculos secretos
com o passar dos anos. Parapeitos
que se racharam na usura dos dias.
Já decifrei no pó esbranquiçado
rastros que temo. Tenho percebido
no ar das côncavas tardes um rugido
ou o eco de um rugido desolado.
Sei que na sombra há Outro, cuja sorte
é exaurir as solidões sem fim
que este Hades fiam e desfiam,
sugar meu sangue e devorar minha morte.
Nós dois nos procuramos. Quem me dera
fosse este o dia último da espera.
Jorge Luis Borges
01 setembro 2010
Quando a Água faz Falta...
Dizer que só se valoriza algo quando se perde, seria um lugar-comum. Mas é o que vivenciamos hoje no Brasil. A seca brutal, catastrófica, que vem dizimando florestas, cerrados, lavouras, criações, que vem transformando rios e lagos em desertos, que vem entupindo os céus de todo o Brasil com uma fumaça venenosa (o Brasil, um país tropical, equatorial em grande parte, conhecido pela sua água abundante!) faz agora com que pensemos que a água, a imprescindível água, pode acabar mais rápido do que imaginamos, e quem sem ela a humanidade, obviamente, está acabada. As pessoas pensam nisso. Mas depois, a seca passa, e voltam todos a maltratar a água como sempre fizeram, como estamos acostumados a fazer, como fomos condicionados, ensinados a agir.
Bem, tendo em vista esse momento dramático em nosso país, creio ser oportuno republicar aqui dois poemas meus que tratam do mau uso da água. O primeiro postado foi escrito em 2005. O outro, no ínicio deste ano. Na imagem, um lago quase totalmente seco no estado do Amazonas. No Amazonas, um dos mais úmidos lugares do mundo...
Águas do Fim
fúnebre
águas de marçoseco
águas alvas
brancas
águas claras
de espuma: de ter gente
águas belas?
águas plásticaschuvas ácidas
gotas trágicaságua da morte
dá medo
dá peste
e morre
a humanidade
e a água:
perdida
acabada.
e o que tu fazes?
fezes,
sem mágica...
e que água que resta?
a Lágrima.
a água do teu lábio
agora já é saliva
a saliva de uma lepra
a saliva do teu lábio
agora já é uma lágrima
e essa lágrima tu sorves
a lágrima do teu lábio
agora já é um sangue
o sangue que te nutre
o sangue do teu lábio
agora já é veneno
o veneno que te vives
o veneno do teu lábio
é a água que tu bebes
e estes versos que vomito
são à água do planeta...
30 agosto 2010
Aceito...
aceito o meu destino
com todas as pedras jogadas da Torre
no meio do meu caminho...
mais que a pedra de Drummond
é a pedra que soa como um sino
há um “Louco Alphonsus, Louco Alphonsus!”
no trilo do meu destino...
aceito mas não me inclino
deixo que o vidro se quebre
em seu cristal hialino
mas não junto os cacos do seu som...
mais que a pedra de Drummond
há um mantra-sino
no meio do meu des(a)tino.
com todas as pedras jogadas da Torre
no meio do meu caminho...
mais que a pedra de Drummond
é a pedra que soa como um sino
há um “Louco Alphonsus, Louco Alphonsus!”
no trilo do meu destino...
aceito mas não me inclino
deixo que o vidro se quebre
em seu cristal hialino
mas não junto os cacos do seu som...
mais que a pedra de Drummond
há um mantra-sino
no meio do meu des(a)tino.
28 agosto 2010
Soneto ao Tempo
deixa que passe o que de mim se corre
verás então que cada vez mais rápido
cada vez mais o que se bebe ao trágico
é todo um sonho em correnteza em porre...
deixa que esguiche e que de mim se jorre
tudo que sinto ao cada vez mais ávido
verás então que é cada vez mais válido
este meu Fim que a outro Fim socorre...
verás ao não como ocultei meu lago
com som de pulso este meu sim pressago
inundará tudo o que em ti derrama...
o teu dormir eu sempre sou que trago:
quando se dorme o sangue queima em chama
quando se morre o rio de Deus se inflama...
verás então que cada vez mais rápido
cada vez mais o que se bebe ao trágico
é todo um sonho em correnteza em porre...
deixa que esguiche e que de mim se jorre
tudo que sinto ao cada vez mais ávido
verás então que é cada vez mais válido
este meu Fim que a outro Fim socorre...
verás ao não como ocultei meu lago
com som de pulso este meu sim pressago
inundará tudo o que em ti derrama...
o teu dormir eu sempre sou que trago:
quando se dorme o sangue queima em chama
quando se morre o rio de Deus se inflama...
27 agosto 2010
“Eu Estava Lá...” (poema-conto)
então, Ele fitou-me nos olhos e disse:
“eu estava lá
quando em símbolo
Adão e Eva foram expulsos do Paraíso
eu estava lá
simbolicamente
sendo a última gota
alastrada pelo final da cruz
do Cristo crucificado
eu gotejei com o sangue
da marcial espada romana
na forma do punhal
no rubro da força de César
eu estava lá
pairando sobre os cadáveres
de um terço da Europa
devastada pela Peste Negra
entre as sombras medievas
e sonhei nos delírios de Bosch
enquanto absurdos se derramavam
de sua visão apocalíptica
e estava na alma de Shakespeare
adejando ao final de suas tragédias
e deixei minha marca
na lâmina afiada da guilhotina francesa
e na neve russa
que aniquilou o exército de Napoleão
como também fiz ressoar meu canto
no último quarteto
que compôs Beethoven ensurdecido
estive em forma líquida
no delirium tremens de Poe
fui às duas grossas lágrimas
que derramou Brahms em seu leito de morte
e eu estava lá mais tarde
nas balas mortíferas da Máfia
e lancei-me em fúria
pelas metralhadoras dos alemães
durante o sangue da Segunda Guerra
espargido pelos buracos na carne dos soldados
eu voei segundos antes
das bombas atômicas sobre o Japão
eu estava lá
chegando ao coração das mães
que perderam seus filhos
no verde-fogo do Vietnã
e larguei ao vento os derradeiros gritos
dos animais mergulhados nos mares da extinção
e irradiei meus suspiros
pelo céu que encobria enfumaçado
o tombar das gigantes florestas
eu estava lá
e agora estou aqui
fitando fundo e firme e forte
os olhos encovados de toda humanidade...”
Ele então me disse todas essas coisas
e depois disse seu nome
e seu nome era Adeus...
“eu estava lá
quando em símbolo
Adão e Eva foram expulsos do Paraíso
eu estava lá
simbolicamente
sendo a última gota
alastrada pelo final da cruz
do Cristo crucificado
eu gotejei com o sangue
da marcial espada romana
na forma do punhal
no rubro da força de César
eu estava lá
pairando sobre os cadáveres
de um terço da Europa
devastada pela Peste Negra
entre as sombras medievas
e sonhei nos delírios de Bosch
enquanto absurdos se derramavam
de sua visão apocalíptica
e estava na alma de Shakespeare
adejando ao final de suas tragédias
e deixei minha marca
na lâmina afiada da guilhotina francesa
e na neve russa
que aniquilou o exército de Napoleão
como também fiz ressoar meu canto
no último quarteto
que compôs Beethoven ensurdecido
estive em forma líquida
no delirium tremens de Poe
fui às duas grossas lágrimas
que derramou Brahms em seu leito de morte
e eu estava lá mais tarde
nas balas mortíferas da Máfia
e lancei-me em fúria
pelas metralhadoras dos alemães
durante o sangue da Segunda Guerra
espargido pelos buracos na carne dos soldados
eu voei segundos antes
das bombas atômicas sobre o Japão
eu estava lá
chegando ao coração das mães
que perderam seus filhos
no verde-fogo do Vietnã
e larguei ao vento os derradeiros gritos
dos animais mergulhados nos mares da extinção
e irradiei meus suspiros
pelo céu que encobria enfumaçado
o tombar das gigantes florestas
eu estava lá
e agora estou aqui
fitando fundo e firme e forte
os olhos encovados de toda humanidade...”
Ele então me disse todas essas coisas
e depois disse seu nome
e seu nome era Adeus...
25 agosto 2010
A Destruição é a Essência do Desenvolvimento
É claro que não deveria. Mas é. No Brasil é, e não só no Brasil, mas em quase todo o mundo. Eu não preciso dizer que de norte a sul o Brasil arde em chamas. Está todos os dias nos noticiários.
Seca nesta época do ano é normal. O que não é normal é a umidade relativa do ar estar abaixo de 15% na Amazônia! A Amazônia, uma região equatorial, que aprendemos na escola que é úmida todo o ano. Isso nunca tinha sido visto. O que não é normal é uma das maiores reservas de cerrado do Brasil, o Parque Nacional das Emas, ter sido devastada pelo fogo em 70%. 70%! Vai precisar de 200 anos para se recuperar. Só isso. E não foi só essa reserva a ser quase totalmente destruída. O que não é normal é ter caído chuva ácida até em Porto Alegre, devido aos gases das queimadas concentrados nas atmosferas.
E as queimadas apocalípticas não foram só aqui. Há poucos dias, EUA, Rússia, Espanha, Portugal também tiveram enormes áreas aniquiladas pelo fogo, incluindo vilas e pequenas cidades. E depois há alguns intelectuais brilhantes que afirmam que não há aquecimento global, em sua ânsia consciente ou inconsciente de dar respaldo para que o homem continue explorando e consumindo o planeta.
O número de focos de queimadas em território brasileiro aumentou em quase 100% com relação a 2009. Por que tantos focos? Além do clima excepcionalmente seco, há uma outra explicação, dada pelo coordenador do Monitoramento de Queimadas do Inpe, Alberto Setzer. Ele afirma o seguinte:
"O aumento expressivo dos focos de queimadas de um ano para o outro também se deve à dinâmica do setor agropecuário e ao período eleitoral. O momento econômico favorável à expansão dos rebanhos e das áreas agrícolas leva ao aumento do uso de fogo pelos produtores rurais, para abrir pastagem e limpar a terra para o cultivo. Com a estiagem e a vegetação seca, o risco de perder o controle da queimada é quase inevitável. Já o período eleitoral influenciaria na fiscalização."
Vejam bem, amigos, "o momento econômico favorável à expansão dos rebanhos e das áreas agrícolas leva ao aumento do uso de fogo pelos produtores rurais..." É assim, lamentavelmente, que ocorre o "desenvolvimento". E agora, a bancada ruralista quer facilitar ainda mais esse sublime desenvolvimento, degradando o próprio Código Florestal. Já não chega tudo o que já foi destruído. Há que se destruir mais. Só estarão satisfeitos quando não houver uma só árvore em pé.
Mas não adianta. Só se pensa em "desenvolvimento" a qualquer custo. Quase todos pensam assim. Inclusive 90% dos políticos e dos candidatos a cargos públicos. E não me venham dizer que não é bem assim, que muitos se preocupam, e blá blá blá. Mentira. Só fingem que se preocupam. Porque é moda. No fundo não estão nem aí. E essas queimadas absurdas são a prova. Uma das provas. Porque há muitas outras. Diante dos fatos, não há argumentos.
Nada mais a declarar.
24 agosto 2010
Relação Oculta
quando ouço aquela sonata de Schubert
um cavalo vem bater na minha porta:
sinto que estou me insanecendo...
tenho que estranhar o peso
dos olhares dos sapos
enquanto escrevo poemas (que) não-sãos.
antes eu fosse aquele conto de Poe nunca-lido
ou um silêncio desolado de flauta na mata na tarde
tão tarde...
aquele detalhe de um quadro de Bosch
não me sai mais do meu pesadelo
e do meu sonho como sol cada vez mais ao norte
um vento que nunca foi visto
ou grande ave que plana em correntes
antes fosse...
carta com selos vermelhos
quem foi que me deste há final?
...planeta por trás dos espaços
e a ponta de um dedo em meu dedo
que não leu meu sinal...
um cavalo vem bater na minha porta:
sinto que estou me insanecendo...
tenho que estranhar o peso
dos olhares dos sapos
enquanto escrevo poemas (que) não-sãos.
antes eu fosse aquele conto de Poe nunca-lido
ou um silêncio desolado de flauta na mata na tarde
tão tarde...
aquele detalhe de um quadro de Bosch
não me sai mais do meu pesadelo
e do meu sonho como sol cada vez mais ao norte
um vento que nunca foi visto
ou grande ave que plana em correntes
antes fosse...
carta com selos vermelhos
quem foi que me deste há final?
...planeta por trás dos espaços
e a ponta de um dedo em meu dedo
que não leu meu sinal...
22 agosto 2010
e ainda Além...
não se pode buscar a inspiração
porque quem a busca não a encontra
que não se encontra o que já foi encontrado.
e o encontrado é o poeta:
a inspiração é que o busca
e não o contrário
como quer o desejo...
poeta é aquele
que a luz da inspiração o ofusca
a todo instante
é o que suporta nos ombros
da poesia o peso
carregada adiante...
a poesia não me pertence
nem a ninguém:
ela está lá em todo infindo
e ainda Além...
por isso
para poetizar horizontes abrindo
ou a cortina sentença do Fim
é mister finalizar-me
e horizontar-me em mim...
porque quem a busca não a encontra
que não se encontra o que já foi encontrado.
e o encontrado é o poeta:
a inspiração é que o busca
e não o contrário
como quer o desejo...
poeta é aquele
que a luz da inspiração o ofusca
a todo instante
é o que suporta nos ombros
da poesia o peso
carregada adiante...
a poesia não me pertence
nem a ninguém:
ela está lá em todo infindo
e ainda Além...
por isso
para poetizar horizontes abrindo
ou a cortina sentença do Fim
é mister finalizar-me
e horizontar-me em mim...
21 agosto 2010
... da Arte
os cintilares venuscêntricos das flores
extirpados pelas foices das queimadas
foram magos fulgurar no intocável
da tua aura:
nem tudo foi despido...
as sinfonias enigmáticas das aves
amordaçadas pela censura das lavouras
foram altas concertar no indizível
da tua voz:
nem tudo foi ferido...
os infinitos astrocósmicos dos céus
enfumaçados pelos vapores do progresso
foram claros refletir pelo intangível
dos teus olhos:
nem tudo é esquecido...
os sentimentos arquetípicos dos seres
estrangulados pelo vazio dos nossos tempos
foram vivos sublimar pelo inefável
da tua alma:
nem tudo está perdido...
extirpados pelas foices das queimadas
foram magos fulgurar no intocável
da tua aura:
nem tudo foi despido...
as sinfonias enigmáticas das aves
amordaçadas pela censura das lavouras
foram altas concertar no indizível
da tua voz:
nem tudo foi ferido...
os infinitos astrocósmicos dos céus
enfumaçados pelos vapores do progresso
foram claros refletir pelo intangível
dos teus olhos:
nem tudo é esquecido...
os sentimentos arquetípicos dos seres
estrangulados pelo vazio dos nossos tempos
foram vivos sublimar pelo inefável
da tua alma:
nem tudo está perdido...
20 agosto 2010
Minha Desgraça, de Álvares de Azevedo
Álvares de Azevedo foi o mais precoce dos grandes poetas brasleiros. Toda sua obra, extremamente radical e diferenciada para os padrões brasileiros da época, foi criada durante sua adolescência. Como todos sabem, Álvares faleceu antes de completar 21 anos.
Todos relacionam esse nosso trágico poeta ao Ultrarromantismo, por motivos claros, obviamente. Porém, a prova da genialidade de Álvares está no fato, também bastante claro para mim, de que o poeta foi não só além do Ultrarromantismo, como do próprio Romantismo, atingindo as raias do Realismo e do Simbolismo. Para testemunhar o "realismo" de Álvares de Azevedo, deixo o desolado e irônico poema abaixo. Acompanha o poema, a gravura "O Sono da Razão", de Goya.
Minha Desgraça
Minha desgraça, não, não é ser poeta,
Nem na terra de amor não ter um eco,E meu Anjo de Deus, o meu planeta,
Tratar-me como se trata um boneco…
Não é andar de cotovelos rotos,
Ter duro como pedra o travesseiro…
Eu sei… O mundo é um lodaçal perdido,
Cujo sol (quem mo dera!) é o dinheiro…
Minha desgraça, ó cândida donzela!
O que faz que o meu peito assim blasfema,
É ter para escrever todo um poema,
E não ter um vintém para uma vela!
Álvares de Azevedo
19 agosto 2010
América Tingida de Sangue
O INTER, o meu time, sagrou-se BICAMPEÃO DA AMÉRICA! Faço então uma pequena homenagem, publicando aqui um poema que está em meu livro "Poemas do Fim e do Princípio". O poema abaixo foi composto em 2006 e não foi escrito especificamente para o Inter. Mas serve para ele também, sem dúvida.
Deus Vermelho
Deus Marte!
capa vermelha
ígneas chamas
força sanguínea
punho de flama
espada vulcânica
febre de vinho
espinho de rosa
dente no sangue
corte profundo
peito inflamado
veia fervente
pulso cardíaco
glória de Roma
lenço encarnado
fêmea menstruada
garra da guerra
Eros e amor
fogo-fúria de Hercólubus
Deus Morte!
18 agosto 2010
Para que Dizer Algo?
deixai-me não dizer nada:
por que devo dizer alguma coisa
se o melhor que digo é o que não digo?
o que importa é o que se oculta no meu verso
é a palavra que não está lá
o que importa é a porta
que o verso abre ao não-dito
o que importa é o destino
dado por quem lê
ao que não foi escrito
o verso é enigma que se resolve em si
ele mesmo é que se escreve
nas cadências do impossível:
de independentes hieroglifos
o verso se torna mais brando
ou mais terrível...
por isso não digo nada:
deixo o verso dizer por mim
ou por si
o verso é um silêncio que canta sozinho
só ele percorre a estrada
e o que há
entre o olhar e o caminho...
para caminhar no que sinto
só
por um labirinto...
então escrevo além da minha consciência:
por que dizer algo
se o próprio Deus
é o mistério da ausência?
por que devo dizer alguma coisa
se o melhor que digo é o que não digo?
o que importa é o que se oculta no meu verso
é a palavra que não está lá
o que importa é a porta
que o verso abre ao não-dito
o que importa é o destino
dado por quem lê
ao que não foi escrito
o verso é enigma que se resolve em si
ele mesmo é que se escreve
nas cadências do impossível:
de independentes hieroglifos
o verso se torna mais brando
ou mais terrível...
por isso não digo nada:
deixo o verso dizer por mim
ou por si
o verso é um silêncio que canta sozinho
só ele percorre a estrada
e o que há
entre o olhar e o caminho...
para caminhar no que sinto
só
por um labirinto...
então escrevo além da minha consciência:
por que dizer algo
se o próprio Deus
é o mistério da ausência?
17 agosto 2010
O Meu Voto...
Algo que considero fundamental em um candidato político é sua real preocupação com as questões ambientais. De nada adianta o "desenvolvimento", se ele não levar em conta, antes de tudo, que sem ambiente não haverá nenhum tipo de desenvolvimento, nenhum melhoramento social, nenhuma forma de progresso. Há três pontos vitais que um político deve, ou deveria, procurar realizar durante seu mandato: preservação ambiental efetiva, distribuição de renda e educação. A partir disso, tudo o resto é natural consequência. Fora isso, é conversa fiada.
E outra coisa que deve estar sempre na mente de um político: ele não passa de um empregado do povo. E ao povo deve todas as satisfações.
Presidente: Marina Silva
Governador: Tarso Genro
Senador: Paulo Paim
Deputado Federal: legenda do PV
Deputado Estadual: legenda do PV
15 agosto 2010
Leve...
leve contigo
mesmo o que não tenho
o que não pude
o que não vou
o além de mim te deixo
em delírios transcendentais
leve contigo o meu mais
e o meu sou
leve contigo o meu limite
o que não será no meu destino
tudo aquilo que nunca me trará um sim
leve contigo o meu acima
e o meu fim
leve contigo
o que não poderei falar-te
o que não chego e o que fracasso
leve contigo a minha arte
leve contigo
até o que minha alma não escreve
o que não pude deixar livre pelos ares
leve contigo os meus pesares
no teu voo leve...
mesmo o que não tenho
o que não pude
o que não vou
o além de mim te deixo
em delírios transcendentais
leve contigo o meu mais
e o meu sou
leve contigo o meu limite
o que não será no meu destino
tudo aquilo que nunca me trará um sim
leve contigo o meu acima
e o meu fim
leve contigo
o que não poderei falar-te
o que não chego e o que fracasso
leve contigo a minha arte
leve contigo
até o que minha alma não escreve
o que não pude deixar livre pelos ares
leve contigo os meus pesares
no teu voo leve...
13 agosto 2010
Amen
“a Alma está morta.
fomos nós que a matamos.”
por isso o mundo vai de vento em popa:
vento de tempestade
em popa que ao mar se parte...
agora
viver é naufragar
cair como pedra vaga no vazio da água
baldes de ossos atirados nos poços
gelos de sangues abismados nos tanques
lágrima-riso cimentada em granizo...
não chora, humanidade, não chora
quem está morto não chora...
há que ser dura como a terra seca
na hora em que fores embora:
assim seja
de nada vale
a miséria da minha tristeza...
que nada mais em nós vibre
há que ser frio
como a fervente saliva do lobo
e como o fogo
do olho do tigre...
fomos nós que a matamos.”
por isso o mundo vai de vento em popa:
vento de tempestade
em popa que ao mar se parte...
agora
viver é naufragar
cair como pedra vaga no vazio da água
baldes de ossos atirados nos poços
gelos de sangues abismados nos tanques
lágrima-riso cimentada em granizo...
não chora, humanidade, não chora
quem está morto não chora...
há que ser dura como a terra seca
na hora em que fores embora:
assim seja
de nada vale
a miséria da minha tristeza...
que nada mais em nós vibre
há que ser frio
como a fervente saliva do lobo
e como o fogo
do olho do tigre...
12 agosto 2010
Murmúrios da Tarde, de Castro Alves
Castro Alves, obviamente, dispensa apresentações. Trata-se de um dos maiores poetas brasileiros, com certeza, um dos mais inspirados de toda literatura de língua portuguesa. A beleza lírica, a musicalidade e o ritmo empolgantes, a incrível naturalidade de fluência, a riqueza das imagens, a arrebatada grandiloquência fazem de Castro Alves um dos poetas mais adequados para a declamação. Sua obra é poesia pura, nascida do fundo da alma. Não tivesse morrido com apenas 24 anos, onde chegaria este gênio da poesia?
O poema abaixo é um dos meus favoritos de Castro Alves, impregnado de um profundo Romantismo. É, sem dúvida, um dos mais belos de nossa literatura. Na imagem que acompanha o poema, o quadro "A Floresta", de Camille Pissarro.
Murmúrios da Tarde
Ontem à tarde, quando o sol morria,
A natureza era um poema santo,
De cada moita a escuridão saia,
De cada gruta rebentava um canto,
Ontem à tarde, quando o sol morria.
Do céu azul na profundeza escura
Brilhava a estrela, como um fruto louro,
E qual a foice, que no chão fulgura,
Mostrava a lua o semicirc'lo d'ouro,
Do céu azul na profundeza escura.
Larga harmonia embalsamava os ares!
Cantava o ninho - suspirava o lago...
E a verde pluma dos sutis palmares
Tinha das ondas o murmúrio vago...
Larga harmonia embalsamava os ares.
Era dos seres a harmonia imensa,
Vago concerto de saudade infinda!
"Sol - não me deixes", diz a vaga extensa,
"Aura - não fujas", diz a flor mais linda;
Era dos seres a harmonia imensa!
"Leva-me! leva-me em teu seio amigo"
Dizia às nuvens o choroso orvalho,
"Rola que foges", diz o ninho antigo,
'Leva-me ainda para um novo galho. ..
Leva-me! leva-me em teu seio amigo."
"Dá-me inda um beijo, antes que a noite venha!
Inda um calor, antes que chegue o frio..."
E mais o musgo se conchega à penha
E mais à penha se conchega o rio...
"Dá-me inda um beijo, antes que a noite venha!
E tu no entanto no jardim vagavas,
Rosa de amor, celestial Maria...
Ai! como esquiva sobre o chão pisavas,
Ai! como alegre a tua boca ria...
E tu no entanto no jardim vagavas.
Eras a estrela transformada em virgem!
Eras um anjo, que se fez menina!
Tinhas das aves a celeste origem.
Tinhas da lua a palidez divina,
Eras a estrela transformada em virgem!
Flor! Tu chegaste de outra flor mais perto,
Que bela rosa! que fragrância meiga!
Dir-se-ia um riso no jardim aberto,
Dir-se-ia um beijo, que nasceu na veiga...
Flor! Tu chegaste de outra flor mais perto!. . .
E eu, que escutava o conversar das flores,
Ouvi que a rosa murmurava ardente:
"Colhe-me, ó virgem, - não terei mais dores,
Guarda-me, ó bela, no teu seio quente. . ."
E eu, que escutava o conversar das flores.
"Leva-me! leva-me, ó gentil Maria!"
Também então eu murmurei cismando...
Minh'alma é rosa, que a geada esfria...
Dá-lhe em teus seios um asilo brando...
"Leva-me! leva-me, ó gentil Maria!..."
Castro Alves
10 agosto 2010
à Tua Companhia...
não vás
sem mim
sentença
e fim...
tu és tudo que me resta pela estrada...
eu não
me vejo
sem teu
desejo...
tu és lábio que me paira pelo nada...
traguei
de um lago
meu sonho-
estrago...
no que sinto é onde está tudo que tenho...
teu beijo
abraço
com meu
cansaço...
nos teus olhos é que lua o meu empenho...
sem ti
sou fumo
que me
consumo...
na tua alma é onde Brahms melodia...
meu canto
alaga
de sono
e vaga...
no teu nome é que me erro: Melancolia...
sem mim
sentença
e fim...
tu és tudo que me resta pela estrada...
eu não
me vejo
sem teu
desejo...
tu és lábio que me paira pelo nada...
traguei
de um lago
meu sonho-
estrago...
no que sinto é onde está tudo que tenho...
teu beijo
abraço
com meu
cansaço...
nos teus olhos é que lua o meu empenho...
sem ti
sou fumo
que me
consumo...
na tua alma é onde Brahms melodia...
meu canto
alaga
de sono
e vaga...
no teu nome é que me erro: Melancolia...
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