10 outubro 2009

E Todo Aquele Sangue (parte final)

(Na imagem, detalhe de "O Último Julgamento", de Hieronymus Bosch)

E em alguns canhestros e funestos dias, eu olhava para o céu e havia algo nele que não era normal... Nesses momentos, um rubro sino em desgraça reverberava por todo o azul decadente do céu. Quando digo decadente, é porque ele se avermelhava de forma lenta e implacável. E eu não sabia que vermelhidão era aquela. Quando se propagava pelo ar, o som do sino era um trovão, mas ao chegar aos meus ouvidos era um silvo sanguinolento de uma serpente escarlate.

E a serpente descia da mais alta das árvores, de um cipreste imenso e vetusto que perfurava o céu com seu cimo seco e pontiagudo. E o cipreste cortava o céu, e desse corte incurável jorrava uma tempestuosa chuva de sangue. Ela caía sobre meu pesar. E o silvo da serpente soava sangrento em meu desejo. Eu a sentia se aproximando, enroscando-se em minha perna e picando meu calcanhar. E da picada gotejava um sangue tão gélido que congelava as gotas sanguíneas da chuva.

Foi então que aves em chamas espiralizadas, aves nunca antes vistas, infelizes e devastadas, em bandos intermináveis, bicavam furiosamente, até que sangrasse todo o espaço celeste de forma definitiva. Ouvi grunhidos asfixiados do sol obscurecido por astros vermelhos. E o grunhido do sol era o retumbar do sino e o silvo da serpente. E das núpcias agourentas desses sons de morte, nasciam dos horizontes em fogo tartárico nuvens carregadas. Eram nuvens entrecortadas por veias onde eu via pulsar um sangue enfebrecido. As nuvens cresciam inexoravelmente, arrastadas com fúria por furacões ciclópicos de sopros cósmicos. E fundiam-se no centro do céu, e suas veias explodiam como no pior pesadelo. E toda a abóbada celeste tingiu-se do mais fatal vermelho de sangue. E eu queria saber por que essas coisas aconteciam comigo...

E, finalmente, em alguns canhestros e funestos dias, eu, na minha invisível solidão, saía massacrado a perambular pelas ruas de minha cidade. E diante de meus olhos ensanguentados, o desfile hediondo da civilização humana feria o mais íntimo de minha existência. Sim, eu via sangue em todos aqueles rostos, sangue que escorria de seus sorrisos de prazer, sangue que gotejava de seus olhos sem alma, sangue que brotava como orvalho de suor inútil de seus poros corrompidos.

E aqueles homens e mulheres, velhos e crianças, brancos e negros, ricos e pobres, esfaqueavam-se mutuamente contentes e diabolicamente satisfeitos. Mas não havia facas em suas mãos antes de esfaquearem-se. Porém, quando retiravam os dedos dos corpos de seus semelhantes, havia entre eles um punhal de ódio. E enquanto riam de prazer, eu observava todos os seus dentes caírem vermelhos na poeira do chão ardente.

E os prédios, casas, torres, igrejas, monumentos, tudo desmoronava infiltrado por um viscoso e ácido sangue que corroía suas estruturas. E sob as ruínas, eu contemplava milhares de corpos mutilados. Mas eles levantavam-se satisfeitos dos escombros e exibiam para que todos contemplassem os pedaços extirpados de seus organismos degradados. Enquanto isso, alguns homens corriam pelas ruas, masturbavam-se e ejaculavam sangue. E junto com eles, mulheres completamente nuas introduziam objetos não identificáveis em suas vaginas e sangravam copiosamente.

Não havia luz nos céus. Somente a luz mortiça, doentia e avermelhada de uma gigantesca lâmpada eletrônica projetada de forma macabra sobre a cidade. E ao seu redor, fervilhavam miríades de odiosas moscas, mosquitos, baratas e outros insetos que carregavam sangue enfermiço em suas patas. Então se alastrou uma música abominável. E havia nela uma risada demoníaca que me arrepiou impiedosamente. Era um deboche maligno que sangrava os ouvidos de todas as pessoas que eu avistava. E com a música odienta, um rio de sangue invadiu as ruas e arrastou com ele milhares de humanos. E naquele sangue, todos nadavam contentes, bebiam, comiam e defecavam, rindo e ostentando o ouro de seus dentes caídos, os quais eram recolhidos por entre o lixo infinito que trazia o sangue.

E todo aquele sangue era o sangue da morte do planeta. E eu... eu apenas delirava. E intuí porque essas coisas aconteciam comigo. É que existem alguns momentos em que se deve deixar o adeus para que se saiba quando a humanidade partirá para um novo destino...

09 outubro 2009

E Todo Aquele Sangue...

(Na imagem, o quadro "A Louca" de Hieronymus Bosch)

Eu não sabia por que essas coisas aconteciam comigo. Não sabia por que, em determinados dias em que a princípio não haveria nada de especial, e sem nenhum motivo aparente, o horror sangrento invadia as minhas retinas, os meus tímpanos, as minhas narinas. Eu não sabia por quê. E saber por que era o que eu mais buscava em minha vida...

Em alguns canhestros e funestos dias, diante das matas mais exuberantes, diante dos campos mais vastos, um fogo sanguinolento derramava-se como uma maldição por toda a vastidão que me defrontava. Surgiam olhos alarmantemente vermelhos nas árvores, e eles fitavam-me desesperados e gotejavam sangue. Ao longe, bem ao longe, um cavaleiro trazia uma trombeta. Sangue se derramava das patas retumbantes do cavalo de olhar sedento. Sangue se derramava dos cabelos incendiados do cavaleiro. E um trovão soou, seco, cortante. E o trovão nascia da trombeta do cavaleiro. E o seu cavalo ria. Era um riso sangrento, sangue que evaporava de seus dentes de tigre.

E um grito de morte úmido de sangue assomou-se devastador da mata. Naquele grito morriam todas as mortes. Bradavam todas as ânsias. Aquele grito lancinante de vingança obrigou-me a fechar com as mãos os meus ouvidos. E quando retirei as mãos, estavam em carne viva, sangrando copiosamente. Algo, então, atraiu minha atenção de forma ominosa. Voltei-me para trás e contemplei o fim dos horizontes. Tormentas vermelhas despencavam sobre os campos infelizes cobertos de cadáveres de milhares de animais de todas as espécies. E o seu sangue gerava rios. E os rios atingiam férvidos os meus pés. Horizontes em fim. Quentes de sangue. Soava e sangrava a trombeta. E as folhas pegajosas de sangue, do sangue vivo de todas as tragédias, caíam sobre a minha cabeça. E olhei para as árvores, e elas não tinham mais folhas, e seus olhos estavam fechados e costurados com fios de prata. E eu queria saber por que essas coisas aconteciam comigo...

E em alguns canhestros e funestos dias, diante do mar, eu via o sol em um fogo doentio e febrento cair e afundar nas águas turvas de um sangue perturbadoramente cintilante. Um anjo sanguinoso, férvido e sem misericórdia, ceifava as águas com uma espada flamígera. E toda a vida dos mares assomava irremediavelmente agonizante à superfície em violência de ciclones. E as águas dos mares eram túrgidas e convulsas de um sangue frio como um coração sem alma. E eu sentia que meu peito se abria, e dele escorria ainda mais sangue. O meu sangue de hemácias exaustas. Olhei para meu peito e vi meu coração partido. Em seguida, olhei para os mares e só pude chorar. Claro que chorei sangue. Mas era um sangue negro, um sangue repulsivo.

E novamente a trombeta soou e cortou meus tímpanos. E o cheiro de sangue da trombeta e o odor de sangue do mar ressecaram minhas narinas estertorantes. As águas do mar se abriram como o mar de Moisés, e eu vi o seu leito entristecido. E o seu leito era um abismo infinito de onde surgiam cânticos vermelhos de um inferno de desesperos. E um fogo fulvo como a guerra queimou a angústia de minhas retinas. Uma súbita lufada de medo soprou com hálito de fim e varreu sem piedade a totalidade do mar sangrento. Então me acordei. E não pude ver os esqueletos gementes que se ergueram com adagas e cortaram minha cabeça que sangrava. E eu queria saber por que essas coisas aconteciam comigo...

E em alguns canhestros e funestos dias, a noite caía mais rápido, caía pesarosa sobre meus ombros, em uma queda de vertigens que vibravam sanguinolentas nos éteres escurecidos. Pelo espaço imaculadamente negro, as estrelas expiravam asfixiadas no sangue cósmico das galáxias distantes. A lua escarlate menstruava incessantemente sobre a terra. A terra inteira ribombava com inexplicáveis explosões sanguíneas. Um laivo de sangue surgiu de súbito na escuridão e respingou em minha roupa. Eu podia sentir o gosto doce do sangue atingir a minha alma.

E um pesadelo despencou sobre minhas esperanças e as esmagou. Era um pesadelo sólido e noturno como um cometa de doença que passasse reverberando e espargisse pelo silêncio um vírus fatal por sobre a civilização. Uma moléstia em que se falecia esvaído em sangue. Vibrações de vozes fantasmais carregavam-se nos ares úmidos de sanguinosa névoa lunar. Deixavam avisos sentenciosos. Então, ferozmente, uma infinda estrada de desolação foi absurdamente construída diante de meus olhos enfebrecidos. E eu deveria segui-la. Seguir a estrada de sonhos sangrados que mergulhava na escuridão vermelha. O que reservaria aquele destino de sangue?

E quando eu caminhava sobre o pó da estrada pegajosa de sangue coagulado, ouvi na minha retaguarda passadas brutalmente rápidas que em assombro se aproximavam de minha tristeza. E ao dirigir meus olhos à escuridão que ameaçava minhas costas, lobriguei um lobo monstruoso de olhos de incêndio sangrento. Sua saliva era chamas. Mas ao cair no chão era sangue. Corri com todas as minhas forças por entre a densa e nervosa névoa sanguinolenta, porém escapar ao incêndio do lobo era impossível. E soou a tensão plangente de uma flauta sem amor por entre a lua menstruada. Aquela melodia cadenciada como morte lenta invadiu sensual e langorosa o silêncio tumultuado da noite. E uma fada escarlate em volúpias nefastas de sangue manchou minha fronte com um selo fatal. Beijou meus lábios derramando rosas. Rosas de sangue inebriadas de catastróficos venenos. Puxou-me pelo braço e, enquanto a flauta executava valsas mortais, dançamos alguma coisa extremamente perigosa. E enquanto o vermelho do amor agonizava em vapores sulforosos e chamejantes, o delírio da fatalidade escorria em sangue de meus lábios dilacerados. E eu queria saber por que essas coisas aconteciam comigo...
(Amanhã, a parte final)

08 outubro 2009

Variações sobre um Tema de Gide

“É com bons sentimentos
que se faz má literatura.”

André Gide

a Arte
é jantar à luz de raios
e vomitar à luz de velas

amar as hemácias do sangue
a te olhar na tempestade

a arte é a mais estranha rima
para o amor
é encontrar luzes onde não há-de
e sonhar a paz de tê-las
no horror

a Arte é o que resta:
não é pra acalmar-te os ânimos
é pra estragar-te a festa

Poemas do Término e Contos do Fim 36


A edição número 36 do zine literário Poemas do Término e Contos do Fim foi lançada ontem, dia 07/10/09, contendo o conto "A Picada", o qual é a 4ª história da série de sete contos que estou realizando, intitulada "O Fantástico na História do RS". O 5º conto da série já foi concluído e publicado aqui no blog. No momento, estou em fase de pesquisas para a elaboração do 6º conto. A edição 36 do zine também inclui três poemas estranhos.


Meu zine literário é gratuito e distribuído em várias cidades do RS e e algumas outras do restante do Brasil, por colaboradores. Em Santiago, em breve estará em todos os costumeiros pontos de distribuição, a saber: locadoras Fox, Classic e Stop, biblioteca pública, biblioteca da Uri, Ponto Cópias e Livraria Santiago. Pode ser enviado para qualquer cidade do Brasil ou exterior, mediante o pagamento das despesas de correio.


Agradeço à colaboração dos seguintes amigos na distribuição do zine em outras cidades: Luana Serafini (Santa Maria/RS), Alberto Ritter (Porto Alegre/RS), Gracieli Persich (Santo Ângelo/RS), Louise Wagner (São Leopoldo/RS), Lilene Leverdi (São Gonçalo/RJ), Héder Duarte (São Gonçalo/RJ), Agnes Mirra (Goiana/PE) e Paulo Soriano (Salvador/BA). Agradeço também ao amigo Guilhermes Damian pela excelente trabalho de design do zine.

06 outubro 2009

Não sei ser Prático

praticamente
não sei ser prático:
na vida prática
não há praticidade para mim
perdoem-me os práticos sensatos
mas eu sou assim

nem só de prático
vive o homem
a vida é além
que feijão no prato
que catar como rato
as migalhas do chão
talvez eu seja errado...
mas vocês não são?

pratico o não-prático.
que por onde pratica
o prático vê pratas
onde elas estão
já eu vejo pórticos
onde eles não hão...

a minha prática
é não ser prático:
sou só labirintos de sonhos
sem solução

04 outubro 2009

Crianças Cada Vez Menos Inteligentes


Algumas pessoas, e creio que a maioria delas, afirmam que as crianças dos dias de hoje estão cada vez mais inteligentes. Eu afirmo exatamente o contrário. E sustentarei minha posição.

A princípio, deve-se conceituar muito bem o que é ser inteligente. Ser inteligente é o mesmo que ser esperto? Ou inteligência é apenas raciocínio lógico? Claro que a “esperteza” é um tipo de inteligência. A inteligência lógica é outro, dentre muitos que devem ser considerados como um todo para que se conclua se uma pessoa é mais ou menos inteligente que outra, em termos gerais. Ou, como no caso em questão, se as crianças atuais são menos ou mais inteligentes que as de outros tempos. E nesse “todo”, concluo que são menos.

As pessoas possuem a tendência de classificar somente a inteligência racional como sendo a inteligência válida. Se assim fosse, a humanidade jamais destruiria o próprio planeta, a própria casa em que vive. Nada mais imbecil do que destruir a própria casa. A humanidade possui muito raciocínio lógico, e toda a nossa tecnologia é a maior prova disso. Porém, faltam-lhe as outras inteligências.

E faltam cada vez mais nas crianças de nosso tempo. Falta a inteligência emocional. A inteligência artística. A inteligência intuitiva. A inteligência da sensibilidade. Falta uma inteligência que torne as crianças mais sensíveis, mais conscientes de sua posição no mundo. Falta uma inteligência que faça as crianças perceberem que estão inseridas na humanidade, que possuem responsabilidade para com o planeta e para com seus semelhantes. Um inteligência holística, que perceba o todo, as interações entre todas as coisas existentes, sejam vivas ou inanimadas. Uma inteligência que se dê conta dos laços que nos unem com os cosmos, da consciência de nosso papel dentro do universo.

As crianças de hoje são muito “espertinhas”, raciocinativas, entendem de computadores, de máquinas, de tecnologias, das coisas práticas da vida, mas nada sabem sobre a vida em si. Nada sabem sobre seu papel no mundo. E não conseguem nem pensar sobre isso. Muito menos sentir. Parece que atrofiaram grande parte de suas inteligências. Não conseguem se sensibilizar com nada. Não falo de sentimentalismos, mas de uma sensibilidade consciente, madura, uma capacidade de captar as grandes questões do mundo, da humanidade, do universo. E de se posicionar dentro delas. As crianças de hoje não fazem mais isso. Não estão nem aí para nada. Isso é ser inteligente?

Antigamente faziam. As crianças medievais faziam. Eram conscientes de sua posição no mundo. Amavam a natureza. Compreendiam que faziam parte dela e que deveriam conviver com os animais e plantas de forma harmônica. Isso, para mim, é ser inteligente. Não é saber mexer em computadores.

As crianças de hoje são incapazes de desenvolver e de criar grandes pensamentos e sentimentos. Mal sabem escrever um texto. Não têm ideias, não têm imaginação. Os grandes gênios da arte e da filosofia jamais se repetirão nos dias de hoje. Nem mesmo os da ciência. Porque hoje a “inteligência” da humanidade está voltada para o prazer, para a aparência, para o lucro, para o hedonismo, para o egoísmo. E isso, para mim, não é ser inteligente.

Que me perdoem os otimistas, mas o que vejo é uma degradante involução em nossas crianças. Que o digam os professores. Eles sim conhecem como as crianças regrediram. Ou alguém chamará de inteligente o aluno que dá um soco no rosto de um professor, ou o ameaça com uma faca? Por isso aplaudo imensamente a corajosa professora que obrigou aquele “inteligente” aluninho, que acabou com uma parede muito bem pintada com suas pichações imbecis, a pintá-la novamente. O pessoal do conselho tutelar achou a decisão da professora exagerada, É claro, eles não dão aulas. Quando entrarem em uma escola de ensino básico e ministrarem algumas aulas, irão mudar de opinião. Aliás, deveriam fazer isso. Até porque, o conselho tutelar vem agindo com uma imensa imbecilidade. Está servindo para permitir a libertinagem em crianças e adolescentes nas escolas e impedir qualquer tipo de corretivo.
A verdade é que as crianças e adolescentes de hoje são estúpidas, violentas, insensíveis, desrespeitosas, egoístas, sem nenhum tipo de consciência de absolutamente nada, sem criticidade sobre qualquer assunto, sem opiniões, sem cultura, com ridículos e vergonhosos gostos artísticos, sem noção de humanidade, sem valores, sem sentidos para a vida, enfim, sem nada. Não passam de seres vazios. Muuuito inteligentes... Claro que há exceções. Mas a humanidade não é formada por exceções.

02 outubro 2009

Quando Tudo se Acabar...

quando tudo se acabar
que ficará suspenso no ar?

que gosto sopro de sangue
se alastrará por teu lábio langue?

que sonho cheiro de chamas
já brotará em teu olhar em lamas?

que piano crise de luz
se cravará em teu peito de cruz?

que taça verso de horror
visitará o teu raio de amor?

que grito tigre de estrela
se voará com tua ave ao vê-la?

que cristo flecha de inferno
mergulhará a retornar do eterno?

quando ao não cantar o enfim
Quem ficará suspenso no Fim?

01 outubro 2009

Revista Soturna - Entrevista

A revista digital SOTURNA é especializada em arte sombria e está em sua segunda edição. O responsável por sua realização é o poeta carioca Alexandre Souza. Em seu segundo número, a revista prova todo seu potencial, com matérias de peso, excelentemente elaboradas, abordando literatura, música, pintura, artesanato e ocultismo. Destaco as magistrais matérias sobre o poeta maldito austríaco George Trakl, sobre a pintura macabra de Bruno Amadio e o impactante trecho extraído do livro Bestas, Homens e Deuses, de Ossendowski. O download da revista pode ser feito no link: http://www.4shared.com/file/136531770/cb1e8ace/soturna_2.html

Para a revista SOTURNA, concedi a entrevista que está abaixo:

Alessandro Reiffer
o poeta do Fim

por Sr. Arcano

Seus contos trazem um estilo característico, uma marca em seu modo de escrever, que mescla a realidade com temas apocalípticos. Sua poesia é a personificação desse estilo, repleta de imagens que se misturam e ascendem às ilusões, loucuras e devaneios noturnos de sua mente, em um processo de criação onde o caos divide espaço com seu gênio criativo. Alessandro Reiffer, o arauto do Fim.

Espalha seus poemas e contos através do fanzine “Poemas do Término e Contos do Fim” para diversos leitores em todo o Brasil, e é autor do livro de contos “Contos do Crepúsculo e do Absurdo”. Conhecido por seu estilo inconfundível, Reiffer é atualmente uma das principais expressões poéticas e literárias em nosso meio, e um dos autores mais importantes em nossa cultura. Numa breve entrevista, ele nos fala um pouco de sua arte literária, onde também podemos conferir dois de seus textos mais recentes.

Alessandro, seus poemas e contos refletem bastante sua idéia sobre "O Fim". Poderia explicar melhor sobre esse termo que você tanto usa?

Vejo-me como uma espécie de arauto do fim, alguém que através da arte intenta mostrar ao homem que seus atos o estão levando ao fim de sua civilização. Esse tema com suas diversas variações centraliza minhas obras. Claro que ele é bastante abrangente. Assim, falo de tudo que acaba: da morte, do dia, do amor, enfim, englobo todos os temas dentro do “Fim”. Dessa forma torno minha obra ao mesmo tempo sombria, melancólica, trágica, catastrófica, e mais atual impossível.

Em seus folhetos "Poemas do Término e Contos do Fim" você costuma distribuir gratuitamente seus textos para diversas pessoas. Como tem sido o retorno dos leitores?

Tem sido excelente. O zine está em sua 35º edição e todas elas se esgotam rapidamente. Várias pessoas têm seu primeiro contato a partir do zine, e então me escrevem ou acessam meu blog. A tiragem média tem sido de 400 exemplares. Não faço mais por questões financeiras. O zine é distribuído em várias cidades do Brasil, principalmente no RS.

Em seu livro "Contos do Crepúsculo e do Absurdo" há contos que misturam realidade, fantasia e ficção, onde a narrativa é única, um estilo inconfundível que os leitores percebem logo como sendo seu. Seria uma forma de se expressar no conto algo que você consegue em poucas linhas na poesia?

Muitas pessoas dizem que uma das características de meus contos é que eles são bastante poéticos. Eu concordo, de fato a poesia é algo tão forte em mim que ela naturalmente é transmitida a meus contos. Às vezes isso é intencional, às vezes não. O certo é que vejo o conto como um momento literário a que se deve dar o máximo de efeito em poucas linhas. Esse efeito é a emoção, o choque, o delírio, o assombro, a imaginação, o suspense, enfim. Creio que em alguns casos, uma linguagem poética intensifica e enriquece os efeitos do conto.

Em seus poemas, a criatividade é fascinante. Mas há também todo um lado ideológico. Como você definiria o tipo de mensagem que você tenta passar aos leitores com sua poesia?

Seria difícil para mim falar sobre isso, pois a mensagem depende muito do entendimento do leitor, um poema nunca é totalmente do autor, mas também de quem o lê. Já houve pessoas que entenderam em meus poemas coisas que não intentei dizer. Isso faz parte e não significa que o leitor esteja errado. A literatura é assim mesmo, desperta inúmeras interpretações, a arte é assim, e é isso que faz dela algo tão fascinante. Costumo dizer que o artista não é o dono da arte. Ele é um instrumento dela. Pode, assim, dizer coisas que nem pensava em dizer. A arte é sempre maior que o artista. Eu sirvo a ela. No entanto, posso dizer que minha mensagem está ligada a dois pontos básicos: que tudo tem seu princípio e seu fim, mas o fim é também uma volta ao princípio, e que há muito mais coisas no universo que as da nossa vida cotidiana.

Sua poesia é admirada por um grande número de leitores, mas ainda não foi publicado um livro seu de poemas. Há previsão para que isso aconteça?

Estou com meu primeiro livro de poesias pronto, apenas esperando alguns patrocínios para publicá-lo. Isso deverá ocorrer até o final deste ano ou, no máximo, no início do outro. O livro deverá conter mais de 200 poemas, selecionados entre minha produção dos últimos 5 anos. Seu título é “Poemas do Fim e do Princípio”.

Atualmente, onde os leitores podem encontrar algo de seu trabalho?

Em meu blog: http://www.artedofim.blogspot.com/, em vários sites da net, cujos endereços se encontram em meu próprio blog. Eventualmente, também em alguns jornais e revistas, e no meu zine acima citado. Quanto ao meu livro, pode ser adquirido comigo mesmo pelo e-mail:
reiffer@gmail.com

Agradeço a meu amigo Sr. Arcano por essa oportunidade e o parabenizo por seu trabalho dentro da literatura sombria brasileira, o qual tem sido de fundamental importância.

29 setembro 2009

do Tempo

sinto saudades
de ser o ser que sou-me
de ser um ser que soube
de ser não-ser que some
saudades de tudo
que aconteceu
sem ter (me) acontecido

saudades
de árvores à beira de auroras
de aurora regada de aves
de ave em água à névoa sonhada
sonhada em limoeiros de gatos
gatos pairando por pátios
pátios por noites filtradas
filtrada essência de olhos
olhos de sóis pelos campos
campo que luz em meu peito
meu peito em cantar pela espera...

o Tempo saudade-me
quando me caso
com seu ocaso

27 setembro 2009

Antologia do Absurdo


O amigo Victor Meloni lançou seu primeiro livro de contos pelo Clube dos Autores, intitulado Antologia do Absurdo. O livro possui 196 páginas e está sendo comercializado no link: http://clubedeautores.com.br/book/4939--ANTOLOGIA_DO_ABSURDO_

O seguinte comentário sobre a obra está no link acima:

"As linhas desta obra prezam pelo delírio de uma mente prenhe de idéias que foram paridas nas turbulentas águas dos contos fantásticos, lugar assaz pertinente para as elucubrações que opugnam aqueles que estão irremediavelmente tomados por este gênero literário. O autor, Victor Meloni, é uma destas criaturas, e se atreve a levar ao leitor o resultado das vozes que crepitam, com inquietante regularidade, em sua obsedada cabeça."

Desejo sucesso ao amigo em seu competente trabalho, mais uma importante contribuição ao ainda pequeno e sempre discriminado mundo da literatura fantástica no Brasil. Infelizmente, aqui não é a Europa.

26 setembro 2009

O Livro que Explica Deus


(Uma humilde homenagem a Jorge Luís Borges)



Ao falecer aquele sábio, um de meus melhores amigos, fez-me uma assombrosa revelação. Disse-me que existia, em algum canto do mundo, um livro jamais lido que explicaria Deus em toda sua verdade e completude. Segundo meu amigo, eu era o homem destinado a encontrá-lo e lê-lo pela primeira vez. E não deveria tentar fugir à minha missão.

Após encontrar e ler o fantástico livro, eu deveria divulgá-lo à humanidade. E para cumprir esse supremo desígnio, eu teria que dedicar a integridade de minha existência, realizar tudo o que fosse necessário para encontrar o livro onde quer que ele estivesse. Para tamanho empreendimento, eu possuía apenas uma informação: o livro estaria em um local onde jamais pessoa alguma colocou os olhos ou as mãos, porém, tal local se encontraria em um lugar frequentado regularmente pelas mais diversas pessoas. Perguntei em que país do mundo se encontraria tal lugar, mas o sábio não soube me dizer. Descobri-lo seria uma parte, a mais difícil, de minha missão. Acrescentou apenas meu amigo que o livro apresentaria uma capa preta sem absolutamente nenhuma inscrição. Eu deveria verificar a primeira página, pois ali estaria o título dele: “O Livro que Explica Deus”.

Como último questionamento, quis saber o que aconteceria comigo se não procurasse o absurdo livro. O sábio advertiu-me que não aconteceria nada, mas que o peso de minha consciência seria tão intenso que iria esmagar a totalidade de minha vida. Em seguida, meu amigo faleceu.

Eu tinha 22 anos quando fui abalado pela revelação. Minha reação inicial, apesar de já estar familiarizado com as inaceitáveis verdades do Ocultismo, foi de absoluto ceticismo. Porém, esse ceticismo se transformou em estupefação. E esta, em um terrível peso na consciência que me impossibilitava de dormir, de comer, de trabalhar, de me divertir, enfim, de viver. Não havia saída para mim. Fosse real ou não minha missão, eu deveria fazer tudo para cumpri-la.

Encontrar o fantástico livro parecia algo impossível. A princípio, era-me quase inviável imaginar um local intocado e jamais visto situado nos limites de um lugar frequentado por muitas pessoas. Apenas concluí que deveria ser um local público onde houvesse muitos livros. Seria uma biblioteca? Uma livraria? Uma universidade? Talvez algum museu? Uma igreja? Um templo? Enfim, imaginando quantos lugares assim deveriam existir pelo mundo, procurar o livro era um trabalho para Hércules. Eu não poderia realizá-lo. No entanto, uma força maior e implacável em meu interior como que me obrigava a sair alucinado à procura do livro que explicaria Deus.

E eu o fiz. Porém, não sem antes planejar muito bem como poderia realizar minha inaceitável missão. Primeiramente, julguei mais sensato procurar o livro nos locais públicos de minha cidade e de cidades próximas, sempre investigando à exaustão aqueles locais mais escondidos e, teoricamente, raramente observados pelo público em geral. O livro poderia estar camuflado de alguma forma. Então, toda atenção seria pouca.

Trabalhava pela manhã, e durante as tardes e parte da noite, dedicava meu tempo para a procura febril do livro. Minha vida resumia-se a isso. Alimentava-me mal, dormia ainda pior. Minhas horas de lazer não existiam, não havia feriados ou fins de semana. Sempre que conseguia férias de meu emprego, ou em feriadões, eu viajava para as mais distantes cidades do país e de países vizinhos, com o óbvio intuito de encontrar o livro. E sempre foram nulos os meus resultados. Creio que em cinco anos vasculhei quase toda a América. Claro que não visitei todos os lugares possíveis. Porém o mundo era muito vasto. Havia ainda quatro continentes para vasculhar.

Felizmente, sendo o proprietário de uma lucrativa empresa, durante esses cinco anos reuni uma considerável soma de dinheiro que me permitiria viajar mundo afora. E eu o fiz. Fui para a Europa, em seguida para a África, Ásia e Oceania. Creio que visitei todos os seus principais museus, bibliotecas, universidades, livrarias e igrejas; eu não suportava mais ver livros na minha frente, estava me transformando em um verdadeiro louco. Minha vida era de uma total insanidade. Não possuía amigos, renunciei ao amor, não tinha olhos para as mulheres. Não me divertia, não aproveitava os lugares maravilhosos que visitava, unicamente preocupado em encontrar o livro. Enfim, minha vida não existia.

Havia deixado minha empresa sob a direção de meu irmão, e ele frequentemente me enviava, como eu solicitara, boas quantias de dinheiro para prosseguir em minha demente missão. Passaram-se oito anos desde que parti do Brasil para a Europa. O último país que visitei foi a Nova Zelândia, na Oceania. E não encontrara absolutamente nada do fabuloso livro, nenhum sinal, nem a mínima referência, ninguém nunca ouvira falar nele, não estava em lugar algum entre os que procurei. Estava exaurido, verdadeiramente acabado. Emagrecera mais de 20 quilos, minha saúde estava precária, e eu sentia que logo enlouqueceria total e definitivamente. Procurei o livro divino por 13 anos. E nada. Decidi pôr um fim à minha missão suicida. E retornei para casa.

Retornei e tomei a resolução de viver a vida que não havia vivido. Optei por não reassumir a direção da empresa, e pedi a meu irmão que me destinasse uma renda mínima que me permitisse viver com dignidade, porém sem luxo ou excessivo conforto. Passei a dedicar-me à pintura, arte para a qual sempre tive talento, mas que as tarefas da vida cotidiana jamais me permitiram. Curiosamente, mesmo não encontrando o livro e não cumprindo minha missão, minha consciência encontrava-se estranhamente aliviada.

Ao mesmo tempo em que me aprofundava mais e mais na pintura e divulgava meus quadros com muito esforço e dificuldade, intensifiquei minhas relações sociais e criei um bom e confiável círculo de amigos. Junto com alguns deles, principiei intensos estudos no Ocultismo durante as nossas longas e agitadas noites regadas à vinho e à arte. Em nenhum de meus estudos, no entanto, encontrei qualquer livro que explicasse Deus em sua totalidade.

Relacionei-me com algumas mulheres, mas nenhum dos relacionamentos foi duradouro e definitivo. Seguia procurando um amor para minha vida. Empreendi algumas viagens, agora não para procurar o livro, mas para aproveitá-las como lazer e como crescimento humano e espiritual. Creio que aos poucos fui tornando-me um homem sábio. Não um sábio que renunciou à vida, mas que procurava vivenciar de forma diversa e intensamente as experiências existenciais, não rechaçando suas inúmeras oportunidades, mas aprendendo com elas.

Até que finalmente amei. Amei total e profundamente uma mulher que também me amou da mesma forma. Porém, eu não era feliz. No fundo, eu era um eterno insatisfeito. Sempre me faltava algo, e eu não sabia exatamente o que era...

Quando estava com meus 47 anos realizei uma viagem a uma pequena cidade do interior gaúcho. Lá, dirigi-me a uma biblioteca, uma das raras que não havia ainda visitado em minha terra. Apesar de a cidade ser pequena, sua biblioteca possuía um número razoável de livros.

Quando eu folheava um livro de literatura estrangeira, mais precisamente um antigo exemplar em alemão do “Faust” de Goethe, que parecia nunca ter sido retirado da estante, tamanha era a quantidade de pó e bolor em suas páginas, encontrei um outro livro em seu interior, de reduzidas proporções. Sua capa era inteiramente negra. Abri-o, e, na primeira página, li: “O Livro que Explica Deus”. Possuía apenas 7 páginas. Rapidamente li todo o livro.

O que dizia nele? Dizia exatamente esta história que você, leitor, está lendo. Você está pensando que escrevi este relato? Não, não escrevi uma linha, nem uma palavra. Tudo o que fiz foi transcrever com o mais absoluto rigor aquilo que estava impresso no livro. Não havia autor. Tampouco, havia ano, editora ou local de publicação, somente havia o que você leu e está lendo. Não acrescentei uma letra sequer ao livro. Esta história, rigorosamente DO COMEÇO AO FIM, é o que estava no “Livro que Explica Deus”. E esta história acaba aqui.

24 setembro 2009

Não

nos atuais dias
de que serve
um coração?
enfeite?
de-coração?

não!
um coração
não serve pra nada:
coração não deve servir
deve ser Rei
de cetro
e Espada

23 setembro 2009

Marco Peixoto: Um Bom Moço?

Alguns acham que o jornalista Lasier Martins pegou pesado com o deputado Marco Peixoto. Eu não acho. Acho que ele fez os questionamentos que deveria fazer, foi insistente como qualquer gaúcho que queira saber a verdade. Eu sim teria pegado pesado se fosse o entrevistador. Teria dito, entre outras coisas, que não é a primeira vez que o deputado é acusado ou suspeito de alguns envolvimentos excusos. Teria perguntado por que ele não assinou a CPI. Se não há o que temer, deixa investigar.
Teria dito também que naquela gravação onde o deputado dialoga com um senhor do qual esqueci o nome, ele não parece tão bom moço quanto na entrevista do Lasier Martins... Na entrevista, para a qual ele foi preparado, soube se defender muito bem, bons argumentos, o que faz dele um ótimo conquistador de votos: sabe argumentar bem (e tem dinheiro...). Mas é como eu já disse aqui: o Diabo também sabe argumentar maravilhosamente. Já na conversa da gravação, vemos o deputado Marco Peixoto um tanto quanto... malandro. Não acharam? Claro que a gravação não prova nada. Mas que deixa suspeitas, ah isso deixa... Contra o Sarney também não provaram nada que o tirasse do governo. Mas todo mundo sabe que ele é culpado, até o presidente, que frequentemente gosta de afirmar "eu não sei di nada"...
Primeiro que o deputado Marco foi falar com a governadora na companhia do Otávio Germano, logo por quem há mais suspeitas e, segundo as investigações, seria o mais comprometido com a fraude do Detran. Depois, o deputado Marco fala na gravação com um tom tão de sem-vergonha... Cá entre nós, não acharam o deputado Marco com jeito de culpado naquela gravação? Eu achei. Isso não quer dizer que ele seja (embora eu ache que é), mas está aí a CPI para provar se ele é ou não, bem como os outros envolvidos. Mas provavelmente a CPI não vai dar em nada. A bancada aliada já infestou a CPI com o propósito de acabar tudo em pizza. É até uma falta de hombridade não comparecer para ouvir as gravações. Uma falta de coragem. Gaúcho que se preze nunca foi de fugir da briga (falando nisso, deixo um poema meu abaixo, em homenagem atrasada à semana do gaúcho). Pena que a governadora não é gaúcha. Inclusive fez fiasco na Semana Farroupilha. Mas isso já é outros quinhentos... Ah, e falando na Yeda, tem uma gravação lá onde um cara diz que 11% era para a governadora e para seu ex-marido. Hehe, só 11%, governadora? E para dividir com o marido ainda? Se eu fosse governador exigiria uns 30%, no mínimo. Mas a Yeda sim é uma boa moça, nada gananciosa. Já eu, eu não presto.
Mas, por enquanto, eu só queria saber que negócio tão bom foi aquele que os deputados Marco e Germano fizeram com a governadora... Diz aí deputado, só pra Santiago, ninguém vai espalhar na capital. Não esqueces que tu és só um representante, é empregado dos santiaguenses. E empregado deve satisfação ao patrão. A gente também quer a nossa parte da negociata...
Encarnado

no espírito do gaúcho
há o lenço encarnado...

mas se não há força
mas se não há luta
se não há combate
se não há coragem

não há espírito algum
encarnado no lenço

21 setembro 2009

Ignorantes Eruditos

criaram governos de intelectuais
e exércitos de materialistas
com a intenção irrevogável
de aprisionar o universo
dentro do próprio crânio
de limitar o infinito
a seus próprios olhos
de contar a eternidade
com seus próprios minutos

intentaram
pôr barreiras
nas estradas cósmicas
censurar
a voz dos sonhos
amordaçar
a música das esferas
exilar
corações
e por fim
torturar e executar
almas

intentaram...
mas triunfa sempre
a Lib(V)erdade

19 setembro 2009

Pulsação

o tempo
é a expulsão
de todas as certezas
o tempo
é a impulsão
de tudo o que é absurdo
em in-pulsos
pulsos ao Fim
o tempo pulsa
o tempo passa
o tempo pensa
o tempo puma
o tempo tuba
o tempo troa
o tempo trompa
o tempo Tarde
o tempo parte
o tempo Marte
tempo martelo...

o tempo Morte
o tempo porta
o tempo pó
o tempo pulso
o tempo passa
e o homem só
de passa tempo

Mundo à Beira de Colapso Ambiental


Texto do jornal Correio do Povo de 25 de outubro de 2006:

Mundo à beira de colapso ambiental

Excesso de consumo gera devastação em ritmo superior à capacidade de regeneração do planeta


A população mundial usará duas vezes mais recursos do que o planeta é capaz de produzir dentro de 50 anos a menos que haja uma mudança imediata no estilo de vida da humanidade, alertou o grupo ambientalista Fundo Mundial para a Natureza (WWF) no relatório Planeta Vivo, publicado ontem. Os países com mais graves índices per capita de devastação ambiental provocada por seres humanos são Emirados Árabes Unidos, Estados Unidos, Finlândia, Canadá, Kuwait, Austrália, Estônia, Suécia, Nova Zelândia e Noruega. A China aparece em 69º lugar no ranking, mas o tamanho do país e seu rápido crescimento econômico fazem dela um importante ator no uso de recursos naturais sustentáveis, avaliam os especialistas do WWF Internacional.


O relatório bienal do grupo sobre a situação da natureza conclui que, se for mantido o atual ritmo de consumo dos recursos naturais seriam necessários dois planetas Terra para atender à demanda mundial até 2050. 'Estamos gravemente além do limite suportado pela natureza, consumindo os recursos disponíveis muito mais rápido do que a Terra é capaz de repô-los', disse o diretor-geral do WWF Internacional, James Leape. 'As conseqüências disso são previsíveis e terríveis', acrescentou. Se forem confirmadas as previsões, bens ecológicos como florestas e locais de pesca estarão devastados de tal forma que poderão desaparecer plenamente. Um dos indicadores das marcas deixadas pelos seres humanos nos ecossistemas é o declínio de cerca de um terço na população de mais de 1,3 mil espécies de animais vertebrados em todo o mundo entre 1970 e 2003, segundo o grupo.

18 setembro 2009

Meu Dever

13º Arcano...

vinho fatal
de sentidos múltiplos
de um cálice de Fim
se derrama último
sobre os copos imundos
em que ri a humanidade
ria humanidade
em rio de vinho
venho...

alma
que é antena dos tempos
tempo de em fim
e tempo de pois
e depois?

voo em asas de corvo
ao alto te quero que sintas
que tu sintas é tudo que quero
que tu sintas em mais altos voos
que tu voes em mais vastas almas
tuas almas levar em mais asas
elevar em minha alma tuas asas
e com alma levar os teus olhos
e teu olho elevado na alma
acima do Fim te deixo que sintas
e sentindo acima de tudo
e voando em cósmico mar
além do Fim
verá teu olhar...

16 setembro 2009

à Arte


a Arte
vale a pena
que tudo mais
é menos

a Arte é o nada
que tudo pode
que o todo diz
e nunca fala
silêncio e fúria
de sol dois olhos
ao longe raio
jamais se cala
do eterno filha
do tempo mãe
de fogo asas
visão de anjos
sem deus nem guia
não ouve humanos
deusa de si
além limite
sem fim nem morte
de onde pulsa
espada ao alto
tormenta e lago
de noite e alma
verdade e Marte

com ela sou
eu sou eu só
só...
à Arte

14 setembro 2009

A História de Chapeuzinho Colorido e o Não-Lobo-Mau

A bela Chapeuzinho Colorido, contrariada e com muita má-vontade, levava em uma pequena sacola os remédios para sua avó, conforme ordenara sua mãe. Eram medicamentos contra a hipertensão e a diabete. Chapeuzinho detestava ir à casa de sua avó, porque ela deveria seguir uma trilha por entre a mata, e a menina não apreciava nem um pouco a natureza. Reclamava dos mosquitos, tinha medo das odiosas cobras, repugnava-lhe ter que atravessar a pontezinha sobre o riacho, pois receava que ela pudesse cair, já que era muito velha.

O canto dos pássaros não a comovia, e a beleza das árvores era indiferente para Chapeuzinho. Era uma menina urbana e moderna, preferia passear nos shoppings e contemplar as vitrines das lojas, como toda boa consumidora. De modo que somente visitava sua avó quando era obrigada por sua mãe. Nesses momentos maldizia aquela velha rabugenta que fedia a fumaça de fogão. E maldizia sua mãe também, aquela mulher antiquada e autoritária.

Porém, logo ao tomar a trilha que levava à casa de sua avó, Chapeuzinho foi surpreendida ao perceber que grande parte da mata havia sido cortada e queimada. A ausência da vegetação, no entanto, não a incomodava em absoluto, era até melhor, porque assim ela poderia pegar mais sol, bronzear-se mais. Só o que lhe perturbava era o cheiro de fumaça do mato queimado, que a deixava ainda mais irritada. Caminhando pela trilha, Chapeuzinho chutou o casco seco de um tatu que fora tostado. Logo adiante, viu o corpo de uma capivara que havia sido abatida a tiros. Chapeuzinho sorriu ironicamente. Sempre achara a capivara um animal feio e sem graça. Não faria falta aquela que estava ali morta.

Chapeuzinho estranhou não ouvir tantos cantos de aves como das outras vezes. Melhor assim, pensou. Já estava muito irritada mesmo, e o silêncio seria melhor, ou até cantarolar algum funk ou pagode. Caminhando um pouco mais, a menina avistou o cadáver de um cachorro-do-mato. Estava queimado. Nesse instante, Chapeuzinho lembrou das histórias de sua avó, quando contava sobre o lobo-guará, belo e antigo animal que nunca mais fora visto nas imediações. Apesar de sua avó insistir que o lobo-guará era um animal predominantemente dócil e inofensivo, Chapeuzinho não acreditava. A velha devia estar caduca, ou na sua insistente mania de defender a natureza, exagerou nas qualidades do lobo. Para Chapeuzinho, lobo era lobo. E lobo era sempre mau. Não merecia viver. Deu graças pelo animal não existir mais por aquelas bandas. Imaginem se ela cruzasse com um lobo-guará pelo caminho! O animal estúpido poderia agredi-la e até matá-la.

Finalmente, atravessando a floresta em grande parte queimada e devastada, Chapeuzinho chegou à casa de sua avó, que vivia sozinha. Como batera várias vezes à porta, e sua avó não atendia, resolveu entrar. Encontrou-a deitada inerte sobre a cama. Chapeuzinho tentou reanimá-la, mas foi inútil. Sua avó estava gelada, não respirava, devia estar morta. Chapeuzinho entrou em pânico. Não gostava muito de sua avó, não ficou realmente sensibilizada ao verificar sua provável morte, porém, não sabia o que fazer estando sozinha diante de uma pessoa sem vida. Não havia ninguém nas redondezas, porém, a menina correu para fora gritando por socorro. Um caçador que passava pelas imediações ouviu os gritos e dirigiu-se até a casa.

Chapeuzinho sentiu-se aliviada com a chegada do caçador, e pediu que ele fizesse algo para ajudá-la com a avó. O caçador disse que nada faria, e que era ótimo que a velha estivesse morta. Afinal, a avó de Chapeuzinho não passava de uma velha chata, rabugenta e impertinente, que com suas manias ecológicas vivia tentando impedir que os caçadores entrassem em suas matas. Felizmente, aquela velha retrógrada estava agora morta, e ele e seus amigos poderiam caçar à vontade e extrair a madeira de suas terras, coisa que já estavam fazendo há algum tempo de forma clandestina. Aquelas terras deveriam ser úteis para alguma coisa além de servir de abrigo para sapos e macacos barulhentos.

Chapeuzinho então, vendo que seria inútil pedir auxílio ao caçador, decidiu voltar para sua casa e comunicar à mãe sobre o ocorrido. No entanto, o caçador a impediu, puxando-a pelo braço e falando em seu ouvido:
- Que é isso, mocinha, fica mais um pouco. Sabe que você é muito bonitinha... Vamos, me dá um beijinho!

Chapeuzinho tentou resistir, empurrando o caçador, mas ele era muito mais forte e conseguiu subjugá-la, derrubando-a no chão. Mesmo com os gritos e com toda a resistência de Chapeuzinho, o caçador foi arrancando com fúria suas roupas e esbofeteando seu rosto delicado para que ela parasse de gritar. Baixou as calças e, segurando o pênis, exclamou com sua sórdida voz:
- Olha como é grande! Isso é pra te dar prazer melhor, hahaha!

E à força, penetrou brutalmente a indefesa Chapeuzinho. O estupro consumava-se com muita violência, a menina sangrava e, não suportando a dor, esperneava incessantemente, até que em um momento logrou acertar com força seu joelho nos testículos do caçador. Então, este se enfureceu ainda mais, agarrou a cabeça de Chapeuzinho e a bateu violentamente contra o chão por várias vezes, até que ouviu o barulho de seu crânio rachando e sentiu alguns respingos de sangue em seu rosto deformado pelo ódio e pelo monstruoso desejo sexual.

E, no corpo já sem vida de Chapeuzinho, o caçador prosseguiu com seu abominável estupro, prosseguiu até dilacerar repulsivamente o órgão sexual da menina, até deixá-lo em carne viva e expor as suas entranhas. Em seguida, apanhou sua espingarda que largara em um canto, e fugiu pelo que restava da mata, abandonando o cadáver ensanguentado de Chapeuzinho.

Quando saía da floresta e aproximava-se do riacho, o caçador assustou-se com a revoada de um enorme e agourento urubu inteiramente negro que estava pousado sobre uma rocha à beira d’água. Com o susto, o caçador escorregou nas pedras lisas e úmidas, bateu brutalmente a cabeça na rocha e estirou-se fulminado sobre as pedras. Seu crânio abriu-se com a violência do choque, e pedaços sanguinolentos de sua massa encefálica podiam ser vistos à beira do riacho, em uma poça de sangue.

Dias depois, seu corpo foi encontrado pela polícia. Os policiais tiveram trabalho para afugentar o bando de urubus que fazia um banquete arrancando os intestinos do caçador. Um dos policiais poderia jurar que os murmúrios lúgubres dos urubus quando afugentados assemelhavam-se muito a sombrias risadas...

Moral da história: o urubu tem razões que a própria razão desconhece.

12 setembro 2009

Advogado do Diabo

Acompanhando o blog do Júlio Prates, li sobre o senhor Políbio Braga, defensor do governo Yeda. O fato de seu governo precisar de um defensor tão ferrenho e capacitado, deixa ainda mais claro a fragilidade e incompetência do seu "novo jeito de governar". Yeda precisa de um bom jornalista para defender aquilo que é indefensável. É como o bandido óbvio que só se livra da cadeia porque contratou um excelente advogado. Argumentar contra ou a favor de alguma coisa, sempre é possível. Até mesmo a favor do Diabo é possível se argumentar. Para que melhor argumento para justificar sua queda que o de Satã, no "Paraíso Perdido" de Milton? Argumentou Satã: "Melhor ser rei no inferno que escravo no céu!". É como os que argumentam que não há aquecimento global. Os argumentos são ótimos, mas os fatos falam por si. Basta olhar para o planeta... Eu preciso falar algo sobre isso? Contra os fatos, não adiantam argumentos. E o fato é que o governo Yeda é um desastre em quase todas as áreas. É só olhar. E se ainda fosse bem sucedido em outras áreas, o descalabro, o caos vergonhoso e revoltante que seu governo implantou na educação já seria mais que suficiente para merecer o meu mais completo desprezo. Governo que não valoriza a educação é sempre um desastre. Sempre! Por mais que o senhor Políbio bem argumente, não apagará os fatos. O que o governo Yeda merece, com todo seu secretariado, é a lata de lixo. Basta de poluição no planeta.