Eduardo Guimaraens. Alguém sabe quem foi ele? Que foi um poeta gaúcho nascido em Porto Alegre em 1892? Que escreveu sete livros e que foi considerado na época nosso maior poeta simbolista? E mais, que chegou a ser considerado uns dos maiores do país, comparado a Cruz e Sousa? Quem lembra dele? E dos que lembram, quem já o leu? Triste saber que um poeta de sua magnitude esteja relegado ao esquecimento até mesmo pelos gaúchos. Mas, quais seriam os motivos? A meu ver, faz parte da discriminação sofrida pelo Simbolismo em nossas terras; a verdade é que ainda hoje os brasileiros não lograram compreender os simbolistas.
O Simbolismo é considerado como o responsável pelo nascimento da poesia moderna, ainda mais se levarmos em conta que Baudelaire, um dos maiores autores simbolistas, foi o pioneiro da modernidade, quando uniu à linguagem sublimada do romantismo o grotesco da realidade humana. Devemos ainda considerar que uma das primícias simbolistas, isto é, sugerir e não afirmar, foi e continua sendo de vital relevância para o desenvolvimento da poesia contemporânea. Sobre o movimento simbolista, afirma Afrânio Coutinho: “Sua contribuição à literatura foi imperecível, havendo quem lhe empreste a categoria de movimento mais importante, pelo seu aspecto positivo e pela herança legada, da poesia moderna”. Se existe a poesia moderna, foi porque antes existiu o Simbolismo.
No entanto, no Brasil, o Simbolismo não atingiu o mesmo nível de relevância que adquiriu na Europa, sofrendo uma negligência e subestimação, onde se entende que o nosso movimento simbolista não chegou a ser devidamente compreendido e assimilado pela sociedade, não estabelecendo bases na mesma. Isso fez com que a grande maioria de seus autores não obtivesse o mesmo grau de divulgação e reconhecimento que escritores de outros movimentos e escolas. Tal fato é possível apreender-se da afirmação de Carollo, ao referir-se sobre os obstáculos ao acesso às fontes bibliográficas dos simbolistas: “...estes obstáculos permitem a proposição de novas indagações quando vistos como índices de preconceitos da crítica na interpretação do movimento...” Na mesma obra, adiante, Carollo observa: “Reconhecidas ainda as dificuldades de aceitação e avaliação do Simbolismo por parte da crítica ‘oficial’ contemporânea, orientada por todo um instrumental metodológico de origem cientificista...”
Sem dúvida, Eduardo Guimaraens também foi vítima desse “preconceito” para com o Simbolismo. Felizmente, grandes críticos, como Massaud Moisés, souberam considerá-lo como “autêntico poeta”, e que “alguns de seus poemas serão suficientes para situá-lo sem favor ao lado de Cruz e Sousa e Alphonsus de Guimaraens”. Da mesma forma, julgou Andrade Muricy que “a sua arte afastou-se do cunho clássico português e da ingenuidade da temática e da expressão... foi dos mais civilizados dentre todos eles e um dos mais meditativos e delicados”.
Eduardo Guimaraens foi um conhecedor profundo da literatura universal, tradutor de Baudelaire e Dante Alighieri, não por acaso suas maiores influências, sendo que em sua época sua obra foi amplamente valorizada, (ainda que pouco lida) como observa Zilberman, referindo-se a seu principal livro “A Divina Quimera”: “que o consagrou nacionalmente, obtendo reconhecimento de todos que historiam o Simbolismo brasileiro”. No entanto, o poeta que “foi uma das vozes mais altas e mais puras da lírica brasileira”, segundo o jornal Correio do Povo (14/12/1928), constitui-se também, conforme Mansueto Bernardi, em “o menos estudado”. Corroborando Mansueto, verifica-se hoje um escasso número de referências ao poeta gaúcho, imerso, talvez, no relativo ostracismo em que se encontram grande parte de nossos autores simbolistas.
Não obstante, a poesia de Eduardo Guimaraens nos apresenta um âmbito temático de inúmeros desdobramentos. Sua obra nos revela uma profunda sensibilidade e imaginação, uma sutileza e musicalidade da linguagem, um refinamento de emoções repleto de luzes e sombras. Seus poemas são intensamente humanos e espirituais ao mesmo tempo, situando-se entre a veia lúgubre de Alphonsus de Guimaraens e a ascensão vertiginosa de Cruz e Sousa. Eduardo é mais sereno que ambos, menos sombrio que o primeiro, mais terno que o segundo. Sem dúvida, merece que o conheçamos. Para finalizar, nada melhor que alguns de seus versos:
“Não despertes, porém, ainda que surja o dia!
Dorme perpetuamente o sono teu sem termo,
ó forma de vitral, Musa e Melancolia,
que és a quimera de um espírito enfermo!
Não despertes, porém, ainda que surja o dia!”
2 comentários:
Pois a poesia de Eduardo Guimaraens é mesmo relevante. Acontece que o simbolismo, no Brasil, choca-se com com uns afãs realistas muito ríspidos. Lembro-me da montagem de uma peça de Maeterlink - grande dramaturgo simbolista - Peleas e Melissanda. Fui ver o ensaio. Nele, Melissanda, de pé sobre um banquinho falava do anel que lhe caíra da mão e afundara-se na água, em meio das pedras. Que podia ver o brilho dele quando a luz do sol, vazando pela copa das altas árvores o iluminava de relance. Que quando inclinava a cabeça para olhar, seus longos cabelos tocavam a água e que tudo era sombrio, profundo, melancólico.
Eu podia imaginar perfeitamente a cena toda, embora os cabelos da atriz fossem curtos, a pedra sobre a qual ela estava fosse um banquinho, não existissem árvores, nem luzes, fosse apenas uma sala de ensaios.
Pois bem, fui ver a peça encenada.
Criaram um cenário realista. Havia árvores, luz vazando entre elas. Construíram pedras realistas, um lago com água de verdade, colocaram apliques nos cabelos da atriz de modo que quando ela se inclinava o cabelo realmemnte tocava na água.
A cena ficou óbivia, tola.
Toda a narrativa poética se perdeu afogada pela rispidez realista.
Paz e bom humor, sempre, mano blogueiro.
Olá A.Reiffer:
Chamo-me Jean e sou um fã das poesias do Ed.Guimaraens, q. descobri em 1994; tenho boa parte das poesias dele digitalizadas (extraí-as do livro "A Divina Quimera", q. descobri por acaso, na biblioteca municipal de minha cidade (Araraquara-SP). Já divulguei sua poesia pessoalmente e via internet, e volta e meia pesquiso sobre ele na net (foi assim q. me deparei com seu blog)
Conheci o sobrinho-neto (acho q. é isso...)dele em SP, o Eduardo Guimarães, q. é jornalista (muitos da família seguiram esse caminho, não sei por que...)e volta e meia escreve alguns comentários na Folha de SP (na coluna dos leitores..) Parte da família está tentando recuperar a obra dele, e já fizeram um livro com algumas poesias inéditas dele (creio q. o nome do livro é "Dispersos"); ele me deu um exemplar deste livro, isso já fazem alguns anos...)
Bom, caso se interesse, posso enviar as poesias por email. O meu email é: carvalho.jeanpaulo2@gmail.com
É sempre bom encontrar quem valorize a boa poesia, como a do Ed.Guimaraens. Parabéns pelo blog!
Abraços, Jean
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