30 julho 2015

Patético*

Beethoven compôs
a Sonata Patética
na época
que patético
significava “trágico”
estando de acordo
com o romântico
daquela época

hoje mudou-se rápido
e patético
significa “ridículo”
e escrevo um poema patético
estando de acordo
com o homúnculo
desta época

agora
a humanidade é prática
como sinônimo de hipócrita:
as coisas passam súbitas
estúpidas
e logo o tudo é nada
atônito
fogo de palha
mísera
palha assada

* Poema reelaborado e republicado

28 julho 2015

Campanha de Camiseta

“seja você mesmo”
diz a sociedade
mesma
e diz a mesma coisa
a todos
seja você mesmo
desde que
seja o você mesmo
aceito pelos outros
mesmos
que
no fundo
são os mesmos mesmos

“seja você mesmo”
diz a mocinha mesma
autoajudante
pleonástica
e é tão mesma
em sua mesmice
quanto todo mundo
mesmo

e pensa que não é
como todo mundo
ensimesmado em ser igual
aos iguais

que gostam andam agem
pensam sentem fazem
o mesmo
sendo eles mesmos
como mandava a camiseta
que todos vestiam

a mesma

26 julho 2015

Lavouras de Soja, Destruição do Bioma Pampa e Envenenamento da População

Nesta postagem, retiro trechos de três matérias, todas publicadas no jornal Sul21, cujos temas estão intimamente relacionados, as quais demonstram o enorme risco que o Bioma Pampa vem correndo em função da sua progressiva e implacável destruição em nome do lucro financeiro sem limites. Tal destruição, logicamente, não afeta somente a flora e a fauna do bioma, mas também a saúde e a vida humana, a qual depende do equilíbrio ecológico para existir .Fato que as pessoas insistem em ou não enxergar ou em fingir que não estão enxergando.  Abstenho-me de maiores comentários e deixo as conclusões a cargo do leitores. Peço apenas que atentem para os trechos destacados em vermelho.

Matéria 1: Os Campos do Sul vão virar uma grande lavoura de soja?  Entrevista com Valério Pillar, professor do Departamento de Ecologia da UFRGS (A íntegra, aqui.)


Os campos que cobriam vastos territórios no Sul do Brasil, Uruguai e Argentina estão sofrendo uma profunda transformação que, além de alterar suas paisagens típicas, ameaça sua biodiversidade. Eles já desapareceram em muitas áreas e, em outras, correm o risco de desaparecer, sendo substituídos por lavouras (de soja, principalmente) e plantações de árvores. Nos três estados do Sul do Brasil, estima-se que esses campos já estejam reduzidos a menos de 40% de sua área original. Os riscos que essa transformação representa para a biodiversidade dessas regiões é um dos temas centrais do livro “Os Campos do Sul”, uma publicação da Rede Campos Sulinos, com apoio da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), que reúne trabalhos de mais de 80 autores e autoras de textos, imagens fotográficas e ilustrações.



São as lavouras, principalmente a lavoura de soja, que têm pressionado tremendamente os campos. Este ano, inclusive, isso está ocorrendo de maneira expressiva, em função do preço atraente. Está se plantando soja mesmo em regiões onde as condições de clima e solo não são as melhores para essa produção. A silvicultura, em um determinado momento, pressionou bastante os campos aqui no Estado, mas essa pressão diminuiu um pouco por questões econômicas. Com a silvicultura parece que a população percebeu melhor a importância dos campos, pois ela cria uma barreira visual e as pessoas percebem que alguma coisa aconteceu. Quando se transforma campo ou pastagem cultivável em lavoura parece que as pessoas não percebem o que está ocorrendo. Parece que antes da lavoura tinha algo ali que não tinha valor…



Muitas espécies que nem eram conhecidas podem já ter se extinguido em algumas regiões onde a transformação foi brutal como ocorreu no Planalto Médio. Nesta região, praticamente não temos mais campos. Há espécies ameaçadas e o livro mostra quais são. As ameaças geralmente decorrem destas mudanças que provocam fragmentação e perda de áreas campestres.


Matéria 2 : .MP ingressa com ação contra o estado para a proteção do bioma pampa. (A íntegra aqui.)



O MP questiona a distinção feita pelo governo do Estado entre as áreas rurais consolidadas por supressão de vegetação nativa por atividade pecuária e as áreas remanescentes de vegetação nativa. Na avaliação dos promotores, o decreto “desconsiderou evidências científicas no sentido de que a atividade pecuária não causa supressão do campo nativo, de modo que os remanescentes de vegetação nativa, no Bioma Pampa, convivem há 300 anos com a pecuária”.


A consequência prática desta distinção, segundo a Promotoria de Defesa do Meio Ambiente, é a dispensa da reserva legal para os imóveis rurais de até quatro módulos fiscais localizados no Bioma Pampa, já que o artigo 67 do Novo Código Florestal, considerado como inconstitucional na ação civil pública, prescreve que, para as áreas rurais consolidadas, a reserva legal será constituída com os remanescentes de vegetação nativa em 22 de julho de 2008.

A ação postula que, quando da aprovação da localização da reserva legal no CAR, o Estado do Rio Grande do Sul respeite o percentual de 20% da área do imóvel, mantida com campo nativo, ainda que ocorra a atividade de pecuária na área de vegetação nativa remanescente. Além disso, pede que “seja reconhecida a ilegalidade da anistia em relação às infrações administrativas praticadas no período de 22 de julho de 2008 a 25 de maio de 2012, já que esta anistia não está prevista no Novo Código Florestal”.

Matéria 3: Análise aponta que 90% de uma população argentina estava contaminada pelo glifosato. (A íntegra aqui.)

Uma pesquisa realizada pela Associação Civil BIOS diagnosticou que 90% das pessoas que participaram do estudo realizado na comarca bonaerense de General Pueyrredó tinham glifosato ou seu metabólito na urina. Participaram do estudo tanto moradores da zona rural como da urbana. Tendo em conta que muitos alimentos industrializados contêm soja, o resultado é preocupante. Também foi demonstrado que os agrotóxicos evaporam e caem com a chuva. E de todos eles, o glifosato foi o herbicida mais encontrado. Em março, a OMS qualificou o glifosato como uma substância “provavelmente cancerígena”. Além disso, pode provocar diabete, Mal de Parkinson e até Alzheimer.

A coordenadora da BIOS assegurou que “o problema é que o nosso corpo recebe centenas de substâncias em diferentes níveis, e moléculas que sozinhas eram relativamente inócuas, mas combinadas, podem ser tóxicas. Por exemplo, em Sierra de los Padres não há grandes plantações e, no entanto, foram encontrados restos de órgãos clorados que simulam ser um hormônio, mas que na verdade desestabilizam o organismo. E não há herbicidas ‘menos danosos’: tudo o que termina com o sufixo ‘cida’, mata. Lamentavelmente, os proprietários de terras, até em períodos de alqueive (quando se deixa de semear em um ou vários ciclos vegetativos) passam glifosato”.

Buján citou um estudo realizado pelo Centro de Pesquisas do Meio Ambiente (CIMA), da Universidade de La Plata, com a assinatura de Lucas Alonso, Alicia Ronco e Damián Marino, no qual se demonstrou que os agrotóxicos também evaporam e depois caem com a chuva. “É como dizer que chove agrotóxicos. O glifosato é um ‘apaixonado evaporador’ e foi encontrado em todas as amostras de água de chuva, que por derivas atmosféricas pode atravessar longas distâncias”.






24 julho 2015

“A esperança, demônio de olhos verdes...”

disse Machado de Assis.
irmã-gêmea do medo
esse demônio virado em olhos
digo eu:
quem o medo olha
mais é olhado
do que olha

o medo cega
e quem espera teme:
ter esperança é não ver
que o que há de vir
vindo ou não
sempre vem

o tormento do medo
é proporcional
ao tamanho da espera

mas há um algo a temer:
a Deus?
não sei se é certo
mas é certo
o Adeus

22 julho 2015

do que vê um verme

I - as pessoas
querem ser queridas
ser gostadas
agradáveis

já a mim não importa

a verdade
raramente agrada
bem poucos 
são os que a gostam
mais raros
os que a querem

II - as pessoas se importam
com que elas importem
como se houvesse importância
em ser-se importante

ser importante
implica em quem 
dá a importância

vermes

dão importância a vermes
não a águias
aliás as águias
os vermes nem as veem

20 julho 2015

Despromessa

que minha poesia
se funda
ou vazia
não tenha nenhum compromisso
nem com compra
nem com trocos
nem com missa

que minha poesia
se foda
ou vadia
seja qualquer vão de hospício
faz de conta
sem um conto
só preguiça

que minha poesia
não seja
nem cela
que só siga regras
nem sela
que alguém encilhe

a minha poesia
que só seja ela
e que eu possa  sê-la

18 julho 2015

O que é Literatura?

Literatura
é saber a arte forte
e o homem fraco
e ser desde beijo
dado em ambos
os lábios
ou o bater em político
com a ponta
de aço
de um taco

pode ser tiro
troco
traço
de bala
buraco
ou um brinde
e um acinte
junto
a Baco

um dia abraço
um laço
um frasco
longínquo
no espaço
outra vez tristeza
desprezo
cansaço
sem nenhuma
(anos) luz acesa
pela vida aos cacos

pode ser sublime
ou crime
volvido em névoa
tabaco
ou ser tragédia
ou tédio
trago
lago
dedicado ao vago

pode ser um bolso
vazio
em ruínas
de um casaco
ou droga
coca
sexo
mesmo
só tendo a noite
mesmo
nem tendo nexo

pode ser chute
na bunda
de algum ricaço
palhaço
velhaco
pode ser sangue
sopro
vento
atormentado

pode ser música
cósmico
ou túmulo
ou tóxico
pode ser alto
ou muito baixo
desde sorriso
até risada
de algum macaco

em Fim
Literatura
pode ser tudo
só não pode
puxar o saco


16 julho 2015

Sartori penaliza Funcionalismo Público, mas nada faz contra Sonegação Fiscal

O governo de Sartori já completou meio ano de absolutamente nada, ou melhor, antes fosse só de nada. Além de não ter efetivado uma única medida que favoreça a população gaúcha, vem sistematicamente penalizando o funcionalismo e os serviços públicos de uma forma que beira o absurdo e a desumanidade (se é que já não os atingiu). Por fim, como sempre, quem paga a conta é a sociedade, que verá o sucateamento progressivo de serviços fundamentais, como Educação, Saúde e Segurança.

Esta semana, a Assembleia Legislativa aprovou por 31 votos contra 19 o congelamento dos salários dos servidores estaduais, proposto por Sartori. No entanto, nosso governador, antes disso, não titubeou em aprovar o aumento de seu próprio salário, de seu vice, secretários, deputados e de arranjar um cargo de alto escalão para sua esposa. E, o que é ainda pior, enquanto promove o arrocho salarial do funcionalismo, não estabelece uma só medida efetiva contra a Sonegação Fiscal. Alguém sabe qual é o tamanho do prejuízo para os cofres do estado ocasionado pela sonegação? São números milionários, todos os meses. Mas quem paga a conta são os servidores estaduais e a sociedade. Por quê?


Como escreveu Antônio Escosteguy Castro no jornal digital Sul 21:


"Nem de longe o Estado do Rio Grande do Sul perdeu sua capacidade de intervir , positiva e fortemente , no processo de desenvolvimento econômico. O que de fato houve foi uma opção política e ideológica do Governo, agora formalmente enunciada naquela entrevista, em afastar-se deste cenário e concedê-lo à iniciativa privada, abrindo mão de sua capacidade de intervenção própria. 

Se é real que o Estado se encontra em crise, também o é que ainda há espaço fiscal para buscar recursos, graças à lei aprovada no final do ano passado. E há, igualmente, os recursos que podem ser buscados no reexame das isenções fiscais, reduzindo ou eliminando aquelas que não atingiram suas metas.


Acontece que Sartori não tem condições objetivas de fazer um reexame a fundo das isenções fiscais, porque é politicamente dependente dos grupos econômicos que se beneficiam destes 13 bilhões que o estado abre mão anualmente. Ele simplesmente não tem força política para fazê-lo."

Não só Sartori, mas todos os 31 deputados que aprovaram o congelamento de salários dos servidores são filhotes das grandes empresas, das grandes corporações privadas que financiam suas campanhas e depois exigem "resultados" de seus "marionetes". Porque é o que são tanto o governo Sartori quanto sua bancada de sustentação: marionetes de corporações privadas, que desejam o enfraquecimento do estado e de seus serviços para poderem assumir o seu controle através das privatizações (as quais já foram prometidas por Sartori) e da famosa "Terceirização". 


E então tais corporações implantam seus métodos de trabalho e de "progresso", que se resumem ao lucro a qualquer custo em cima da exploração do trabalhador e do descumprimento e revogação dos seus direitos. É por isso que Sartori, alegando sua fatídica "crise", instaura uma guerra contra os servidores públicos, mas não ataca a sonegação das empresas. 

Ao final de seu mandato, os dois terços de gaúchos que elegeram Sartori, iludidos por seu papo-furado de "amigo da galera", amargarão um arrependimento sem precedentes ao observar um estado sucateado e entregue à barbárie da sede de lucros da iniciativa privada. 


14 julho 2015

Como Ganhar Dinheiro com a Palavra

I – há três maneiras
de se ganhar dinheiro
com a palavra escrita:
- conte sobre fofocas
- conte sobre acidentes e tragédias
- escreva autoajuda
(que é tudo a mesma coisa:
está se querendo dizer
que a sua vida não é tão fodida
quanto você pensa)

II – há três maneiras
de se ganhar dinheiro
com a palavra falada:
- seja um homem público
- seja um pastor
- dê palestras motivacionais
(que é tudo a mesma coisa:
em qualquer dos casos
se está mentindo)

III – mas só há uma forma
de se ganhar dinheiro
escrevendo poesia:
- escreva algumas dezenas
de bons poemas
reúna-os num livro
publique-o
venda um exemplar:
com os 10 pilas
jogue na loteria
e reze para acertar
(que é tudo a mesma coisa:
poesia ou loteria
é tempo perdido)


12 julho 2015

rico só dá pra rico

dinheiro chama dinheiro:
que quem o tem quanto mais
no quanto mais quer retê-lo
(e esse é seu único anelo)

e te percebas que os ricos
sempre se unem a outros ricos
que se protegem em mútuos
pois o que importa é seus lucros

então conclui-se que os ricos
por em tudo estarem juntos
(sendo a menor minoria)
mantêm seu poder em dia

mas o pobre que é mais número?
foi convencido que é nada
que não pode apoiar pobre...
é a regra: pobre se fode


10 julho 2015

dos Tipos de Homens

I – há os homens de sucesso
e há os grandes homens

II – há os homens felizes
e há os profundos

III – há os homens corretos
e há os verdadeiros

IV – há os homens que sabem das coisas
e há os que sabem

V – há os homens que vivem com metas
e há os que vivem com alma

08 julho 2015

Desaforadas (ou Após Ouvir Shostakovich)

há risos gargalhadas
em cascatas cataratas
assanguinadas

cantatas de gargalhas
das risadas alastradas
em zombarias pelas águas

compassos de risadas
de asa garra e brasa
nas rubras russas geadas

o deboche dos abutres
o gaguejo de macacos
gorgolejo de galinhas

aquela língua de lagartos
o sarcástico dos asnos
macabras cabras gárgulas

ironias desbocadas
metralhas e sarcasmos
grotescos e catarras

há danças valsas facas
essa desgraça engraçada
a lembrar que a humanidade

é uma piada

(Na imagem, detalhe de "Cristo Carregando a Cruz" de Hieronymus Bosch)

06 julho 2015

Valores*

alguns
cobram-me que eu saiba
que o homem é essencialmente
nobre

mas pobre
e coberto o coração de moedas
o homem
só ouve um sino
de cobre limo
de toque mudo
de torto dobre

outros
cobram-me que eu saiba
que o homem é infelizmente
cobra

antes fosse
e talvez tivesse
sabedoria de sobra

mas podre
e coberto o coração de moedas
o homem não vale mais
que cobre


*Poema reelaborado e republicado.

04 julho 2015

"NOJENTO! FÉTIDO! ISTO NÃO É POESIA!"

É, ele de novo, Bukowski. Que posso fazer se o cara nos afronta com uma verdade atrás da outra? E as diz de maneira ofensivamente simples, direta, como um soco. Aqui, ele fala de poesia e da aceitação (ou não) da sua obra. Mais uma vez, chutes na bunda dos que acham que poesia é escrever sorrindo... Os trechos foram retirados do livro "Pedaços de um Caderno Manchado de Vinho".


"Não cabíamos, é claro, na forma agradável  e entorpecida de suas mortes. E então começou a gritaria dos mortos:
"NOJENTO! FÉTIDO! ISTO NÃO É POESIA!"
Para muitos, a poesia deveria dizer apenas coisas seguras, ou mesmo nada, pois a poesia é um mundo seguro e um caminho seguro para essas pessoas. A delicadeza de sua poesia reside em falar apenas sobre aquilo que não importa."

(...)
"Perguntei à minha mulher:
- O que sua mão achou do meu livro?

- Ela disse "Por que ele tem que usar esse tipo de linguagem"?
Era bem provável que ela se referisse aos diálogos, mas tenho certeza que ela também estava incomodada pelas frases entre elas: duras, quebradas, agitadas, estígias.


Eu tinha trabalhado com fé inabalável em cavernas abafadas para deixá-las assim. Sentia-me legitimado por haver desagradado pessoas como a minha sogra. Se ela tivesse aceitado meu trabalho, isso seria temeroso para mim, um sinal de que eu tinha me tornado palatável, ao modo dos profissionais. 
Eu passara por um longo e fodido processo de aprendizagem.

Eu queria resistir a todas as armadilhas para morrer junto à máquina de escrever, uma garrafa de vinho à minha esquerda, e o rádio tocando, quem sabe, Mozart, à direita."

02 julho 2015

a vida esmaga a Vida

pé por pé
no dia a dia
e passo a passo
de pouco em pouco
a vida esmaga a Vida
que não é vivida
só consumida

de sol a sol
de hora em hora
o que de alma
há-de ir embora
e de grão em grão
o homem chora
a encher o papo
a encher o bolso
a encher o saco
a encher o vácuo
do seu olho por olho
que o tempo traga

o homem
de queda em queda
dente por dente
vai decadente
entre lusco-fuscos
não mais que cuscos
em um a um
e quando se vê
nem se foi...
é fogo-fátuo
menos que fósforo
que avança ao dedo
deixando só...
da cinza à cinza
do pó ao pó