24 abril 2019

Poético

reconheço como grande
o homem que NÃO reconhece como grande
os que se acham grandes

só os verdadeiros fortes
não ficam do lado dos mais fortes:
a força está
em não se dobrar à força
poder
é não se curvar ao poder
(não importa o que puderem)

de modo
que não convém a um poeta
estar do lado dos ricos
(e digam o que quiserem)

22 abril 2019

Sobremortos

I - na vida temos a ilusão da escolha
mas tudo nos é imposto:
desde os impostos
passando por custos e preços
desgraças desejos
até nossos postos
até nossos gostos

II – porque nossa vida está condicionada de uma maneira
que não haja maneira de haver vida
e de tal forma
que não se saia da fôrma

III – viver tornou-se apenas sobre:
sobretudo uma sobrevida
de sobremortos
na busca de um sem sentido
sobrenada

17 abril 2019

Assombração

a minha parte do que é
estará depois do que já não:
tenho a última máxima extrema
o final tornado lema
o que não foi tornado são

terei o alcanço (al)cansado
quando me tiver tornado vento
o tormento a me ventar tornado
em (re)voltas e (re)tornos
do Tempo em mil pedaços
triunfante e sobre-humano
sobre os  meus fracassos

a minha parte irei sem ela
como quem faz e deixa
como quem beija e passa
a graça a lábio a vela
só assombros e alarmas
só escombros e fantasmas


16 abril 2019

Agrotóxico*

o agro é pop?
o agro é pó
o agro é papo
o agro é podre

o agro é mórbido 
o agro é sádico
o agro é sórdido
o agro é estúpido 

(o agro é (só)lucro)

o agro é túmulo
o agro é tétrico
o agro é trágico
o agro é tóxico


*Este poema se refere somente aos setores e produtores do agronegócio que se beneficiam da brutal e absurda utilização de agrotóxico e pesticidas, a qual se encontra num crescimento desenfreado e monstruoso em nosso país, principalmente durante o governo Temer e MAIS AINDA, agora, com Bolsonaro. Pesquisas comprovam que estamos comendo alimentos e tomando água altamente contaminados. 

14 abril 2019

Dois Brasis

I - nesta era
(que logo já era)
de burros e ignorantes
em que escrever é tudo em vão
já está anos-luz adiante
quem lê
as linhas
da sua própria mão

II - existem dois Brasis:
o dos seres vivos
e o dos imbecis

12 abril 2019

(Há)mar

o amor
um quanto de alma
e um tanto de arma

um espanto vasto de tê-lo
e um quando rastro de achá-lo

amargaridas de areias pelas luas
amaremotos de azulado pelas rosas
amarelos de sonhos pesadelos
entre sangues oceanos e castelos

noites entre estrelas e cardumes
entre aromas ares águas e perfumes

amor no que se for
a mar (a)fundo
de armadura

que amar...
(h)ámargura
mas (h)ámar

(Poema escrito em 8 de abril de 2018.)



100 Dias (Desastrosos) de Governo Bolsonaro

O presidente Biroliro disse que 95% das metas do seu desgoverno para os três primeiros meses foram atingidas. E eu acredito. Vejamos suas metas:

- Aumentar a destruição ambiental deixando tudo na mão de ruralistas.

- Liberar o máximo possível de agrotóxicos cancerígenos.

- Puxar o saco do Trump e entregar o país pra os EUA.

- Demitir o fiscal que o multou por pesca ilegal.

- Brincar de guerrinha virtual contra a Venezuela.

- Zerar investimentos em educação, cultura e ciência, ajudando a estabelecer o culto à ignorância dele e sua trupe.

- "Facilitar a vida" de caçadores.

- Empenhar-se em aprovar a Deforma da Previdência e fazer as pessoas trabalharem mais recebendo menos.

- Continuar a destruição dos direitos dos trabalhadores iniciada por Temer, e mesmo assim aumentar o desemprego.

- Aumentar os índices de violência contra a mulher.

- Falar asneiras, absurdos, passar fiasco e envergonhar o país.

- Encobrir a corrupção de sua família e de seus ministros.

- Glorificar os horrores da ditadura.

- Colocar no governo um bando de corruptos e imbecis.

- Fazer de bobo você que votou nele.

09 abril 2019

Ave Averno!

"nada é tão ruim
que não possa ficar pior"
tudo já rui
em um poço de horror
nada é tão poço
que não possa afundar mais
nada que eu possa
vai afastar a cova
nada que eu faça
vai apagar o fogo
ou abrir a fumaça
já é muito esgoto
no fundo do posso
está tudo a um passo
dos corvos do morta
do nada do abismo
da beira do findo
não foi por falta
de verso e de aviso

a minha alma já torta
caiu de asas no mundo
nada é tão fundo
que possa abismar
o meu pessimismo

vendaval furacão
as cismas e os sismos
nada é tão mero
que não tenha ficado grave:
começar do zero
outros seres outros olhos
outras árvores outras aves
outras vezes outras vozes outras naves...
Ave!



07 abril 2019

Trompas e Trombetas

a céu que não descia
pairava um mas
aquém do verde negro
loucura em vão
um álcool lento a lento
do que mais fiz
um vento em som de adeus
do que não vou
em queda aquela estrela
quando me vi
desejo insana a vida
fracasso e luz
sangrar venena o azul
tristeza o sim
que seja o que escrevi
o que não sou

05 abril 2019

A Noite é Luz

quando a noite acaba além
além do dia que não venha
o dia continua sendo noite
e vemos a alma que nos resta
como se espiássemos por uma fresta
e assim vemos o que é vida
na noite que nunca termina

o dia é o massacre do que se vive
vidas aniquiladas por trabalho
espancadas por chicote e malho
sempre inútil por mais que se faça
responsáveis por menos que nada
trabalhos em busca de desejos
que não se realizam pelo jugo do trabalho

não é mais o dia que nos traz esperança
o dia mecânico monótono robótico
esmagado por sucessos e progressos
por problemas e pressões e decadências
o dia morreu como morre o homem

a Noite é a última resistência da vida
e o homem ainda vivo é livre na noite
como os animais que só saem quando anoitece
porque são caçados durante o dia:
o dia tornou-se a peste e a morte.
só na Noite é que existe Luz.

03 abril 2019

Alguma Definição de Literatura

se eu escrever otimismos e autoajudas
não terei escrito coisa nenhuma
se eu passar a mão na cabeça do leitor
nem terei sido escritor
literatura não se faz com sorrisos 
e gestos de coraçãozinho
não se escreve sob céu azul
não se pensa sobre a vida 
assistindo a comédias de finais felizes
literatura é o incômodo o soco no estômago
o ácido do limão o punhal revirando a ferida
a provocação para que se reaja

literatura não é um compêndio de esperanças
não é um manual prático para sucessos
literatura tem que escancarar o verme
que nos rói a alma na normalidade do dia a dia 
tem que ser a vela em nosso particular abismo
colocar o espelho diante do nosso horror

a literatura tem que me mostrar 
que o mal do mundo sou eu
que não é só o meu vizinho quem destrói o planeta:

quero literatura que me diga que estou morrendo
para que eu perceba que estou vivo

01 abril 2019

Corvo

Deus está morto:
fomos a nós que nos matamos.

meu olho absorto:
foi sempre horror por entre os anos

o mundo é este porco:
e fomos nós que o carneamos

o amor é um aborto:
foi entre pós que o causamos

o homem está morto:
somos adeus que nos mandamos

30 março 2019

Existe Brahms

a esperança
(que tem por princípio
bater na cara a porta)
e o fracasso
que nos debocha a cada passo
que importa?

que importa
o que se chama sonho
este irmão de sangue
do horror e do medonho?

que importa
isso de vida aquilo de morte?
isso vitória  aquilo derrota?
vitória ou sucesso
é só acaso destino boa sorte.

o nada que não veio
a ausência que não tive
o inútil que não pude?
que importa?

que importa a-final
os meus não desígnios 
os meus não ditames?

não tem importância.
o que importa
é que existe Brahms.

29 março 2019

Aos Caçadores Filhosdaputa

caçador filhodaputa montedebosta
por que não pega tua arma e te atira na cara
com os dois canos da tua espingarda?

caça-dor filhodaputa montedemerda
por que não te dá um tiro por trás
e deixa a vida selvagem em paz?

caça-horror filhodaputa montedeesterco
por que não pega tua arma e bate punheta
e deixa a vida viva em nosso planeta?

caça-desgraça filhodaputa montedefezes
por que não pega tua arma e te arrebenta a cabeça
e deixa que a vida entre a vida aconteça?

caçador filhodaputa montedenada
só quem deve ser caçado é tu:
pega tua arma e arrebenta teu cu.

27 março 2019

O Nosso Abismo é logo ali

Estrela que te és longe do que somos
tu que não nos sabes é que és feliz
aquilo que te vemos nem és tu
tua luz que a nós chega já passou
a tua verdade é sempre distante
e por ser distante é que é verdade
por não nos saberes não te fracassas
triunfas por nunca nos iluminares
ser indiferente é tua vitória
e nos dar as costas é o teu poder

Estrela, o que é isso onde tu estás?
onde tu estás nisso onde não nos és?

o que é que existe nesse teu abismo?
sim, 
porque o NOSSO abismo... é logo ali...

24 março 2019

Soneto Mau e Manco

como eu queria fazer poemas leves
daqueles que me congelassem
e esta minha eterna chuva
a transformassem em neve

como eu queria fazer poemas breves

daqueles que se leem sozinho
que quando em pensasse em uva
eu já me tivesse o vinho

mas eu só faço poemas graves:

como eu queria ao pensar em vida
que estivesse em eterna greve

mas nestes tempos de horror e febre

de caos e erros de sul ao norte
só se encontram rimas para a morte

23 março 2019

Versos a um Gatinho Morto

o filhodaputa que te matou
(porque quem mata um gato é um filhodaputa:
se for por acidente é filhodaputa por um tempo
se for por intenção é filhodaputa para sempre)
o filhodaputa que te matou
deixou mais triste a minha rua
(cada felino que morre
deixa mais triste o mundo)
o filhodaputa que te matou
tirou da minha rua a tua graça a tua dança
o teu alto a tua grandeza
arrancou da minha rua a tua presença de paz
arrancou do meu olhar a inocência do teu
extirpou o encantamento
em que me elevava com tua leveza
em que eu sorria com tua ternura
em que eu sonhava com teu mistério

minha rua ficou mais triste e o mundo ficou mais chato

onde quer que tua alma agora esteja
estão estes versos nos teus bigodes
ou tocados por tuas patas
enquanto retornas triunfante
para a próxima civilização

21 março 2019

Bach-Nosso

Bach Nosso que estais nos Sons 
interpretadas sejam as Vossas notas
venham a nós os Vossos concertos
sejam erguidas as Vossas cantatas
assim nas casas como nos seres

a Paixão nossa de cada dia
nos mandai hoje
perdoai as nossas supérfluas
assim como nós perdoamos aos que não têm te ouvido
e não nos deixeis ouvir música em vão
mas ensinai-nos a amar

em nome de Bach
Beethoven
e de Johannes Brahms

Amém.

Hoje, 334 anos de Johann Sebastian Bach, o Pai da Música.

19 março 2019

Fazer Parte da Humanidade

fazer parte da humanidade:
ser obrigado por lei
a viver de acordo com a lei
lei que foi acordada por outros
sem que você participasse do acordo

fazer parte da humanidade:
ter que trabalhar mais do que viver
durante as melhores horas do dia
quando não se pode quando não se deve
naquilo que não se quer
para fazer algo que se queira
quando já não há mais tempo de se fazer

fazer parte da humanidade:
ter que aparentar o normal
quando o normal é a doença
parecer com os parecidos
chafurdar na merda para ser aceito
e depois são preocupações e estresses
desesperos  e crises de nervos
para poder viver em paz

fazer parte da humanidade:
cansar-se uma vida inteira
para poder enfim descansar
deixar de fazer o que se quis
para dizer que tem a vida que se quer
até tornar-se responsável
pelo sua máscara de parecer feliz

fazer parte...
meu Deus, quanta miséria!
menos mal
que se faz Arte

17 março 2019

Beethoven batendo na Porta

seja a justiça não-feita
esteja a justiça torta
por mais que se saiba
ninguém se importa

quer passe por rio podre
quer passe por mata morta
por mais que se mate
ninguém se importa

se não pulsa alma nos olhos
nem corre sangue na aorta
por mais que se morra
ninguém se importa

ninguém se importa
até que se escute as quatro notas
do princípio da Sinfonia Quinta
de Beethoven
a bater na sua  porta

15 março 2019

Um Desastre

as pessoas querem ser agradadas acariciadas justificadas
querem autoajudas que lhe digam que suas merdas
não fedem tanto
e que podem seguir cagando ad infinitum 
até transbordar o planeta.

as pessoas querem ler coisas belas-bonitas
daquelas de se pendurar em paredes
como uma samambaia inofensiva
ou palavras-vassouras que varram seu próprio horror
para debaixo do tapete 
que encobre sua miséria.

as pessoas querem palavras light
que podem ser digeridas-lidas durante banquetes
que não pesem nem no estômago nem na consciência.

as pessoas querem palavras legais-boazinhas
de sorrisinho humilde como mordomo de palácio
que entregam cartinhas e flores
em bandejas de ouro.

enfim, as pessoas até gostam 
de escritores-poetas
desde que façam literatura de enfeite.
mas eu como sou um desastre
me bati contra a mesa
e derrubei todos os vasos.

13 março 2019

Infame

I- ser poeta é estar enchendo a cara 
no final da reta
ter chegado antes 
e contemplar já bêbado 
a chegada acabada e cágada 
aos trancos e aos rastejos 
do que resta dos humanos sãos 
com seus saudáveis e vãos desejos 

II- o verso é o outro caminho do paralelo ao fracasso 
onde sopra uma vida de vento e uma alma sem aço 

III- ser poeta é um ato infame e vil: 
é perceber indiferente e indignado 
olhando nos olhos de cada um e de mim 
o quanto há de humano 
e o quanto há de imbecil

11 março 2019

A Era da Superfície

I - época contraditória: 
pessoas tão sentimentais 
e insensíveis: 
se emocionam. mas só com merdas: 
choram pelo mocinho da novela 
cagam para o massacre do que é vida

II – a tarefa do artista 
é apenas ingrata e inútil:
atingir o sentimento humano (???)
é trabalhar cada vez mais com o nada 
seja de seu seja de outros

III - de modo que o artista 
que mais alcança o coração alheio 
é o que melhor esgota o seu

09 março 2019

Do Retorno dos Séculos

o fóton da tua luz 
não fala porque vela 
e flui por entre meu vale 
e é lá por onde 
o meu amor se esconde 

meu verbo versa 
porque se vaga em vento 
e se ruma aos teus rumores 
e é lá que sino 
o teu sinal destino 

meu sopro sobe 
porque te ouve além 
e se designa ao que te sinta 
e é lá que me escuro 
em teu dizer sussurro

atenta ao em torno 
dos teus ares 
que onde não estou 
em meus olhares 
meus versos te olham e te sentem
e febram em todos os lugares

07 março 2019

Sobre o Sangue

construí meu verso sobre o sangue
era tudo o que me restava
derramado duro pela terra aberta
coagulado seco pelo pó da enxada:
deserticamente meu sangue escorre

construí meu verso sobre o sangue
era uma força que me obrigava
de água morta derramada escura
sangue visco-negro pela areia:
poluidamente meu sangue escorre

construí meu verso sobre o sangue
era meu destino que amaldiçoava
de seiva-lágrima em derramada queda
verde sangue de imensidão tombada:
devastadamente meu sangue escorre

construí meu verso sobre o sangue
era um cosmos que me massacrava
do guará atropelado ao horizonte
sangue vivo-lago derramado das estradas:
extintamente meu sangue escorre

construí meu verso sobre o sangue
era só meu sangue o que continuava

05 março 2019

Dois Meses do (Des)Governo Bolsonaro

Dois meses de DESGOVERNO BOZOASNO:

* Filhos e ministros de Bolsonaro atolados em corrupção; 
* Desmatamento na Amazônia aumentou 54%; 
* Violência contra mulheres atingiu níveis recordes;
* Projetos A FAVOR da caça desarquivados; 
* Investimentos em Educação zerados e declarada guerra contra professores;
* Possibilidade real de expansão dos horrores da mineração para terras indígenas e reservas ambientais;
* Aposentadoria passando para 65 anos para homens e 62 para mulheres;
* Agrotóxicos altamente cancerígenos sendo liberados diariamente;
* Continuação piorada da guerra do governo Temer contra direitos trabalhistas; 
* Perdão de dívidas de ruralistas e de grandes empresas;
* NENHUMA ação efetiva a favor do povo;
* Combate e desmantelamento de programas sociais;
* Bobagens, confusões, gafes e desrespeitos sendo proferidos diariamente; 
* Puxassaquismo declarado ao governo Trump; 
* Desastres em relações internacionais frequentes prejudicando exportações;
* Total despreparo do presidente e de sua equipe para governar o país;

Faltou alguma coisa? Foi pra isso que você votou?

Na imagem, desmatamento para garimpo ilegal em terras indígenas no Pará.

03 março 2019

Filhos da mesma Terra

quando dizemos que somos todos irmãos
dizemos o quê?
que dividimos uma mesma essência
um ponto em comum em nossa substância?
eu sou o outro e vice-versa?

sou irmão do tigre
porque somos filhos da mesma Terra
e onde corre sangue que é rubro
ou porque o seu sangue
é uma parte do meu em elo espiritual? 
se ele morre
escorre
algo do meu vital...

se os homens se dilaceram na guerra
ou se degeneram em miséria
que sonho do meu ser é que se vai?
que olho do meu peito chora e se contrai
se a floresta se esvaece em fumaça?
quando o planeta sofre
que vida ou que porre
se derrama da minha taça?

o sangue derramado ao longe
sou eu derramado aqui?
o que é isso que goteja das minhas mãos
quando uma cabeça é esmagada?
é lágrima é sangue ou indiferença do nada?
quando o sol se obscurece no céu
anoitece uma luz no que sou eu?

e isso que digo é para algum fim
ou sou só eu que sinto assim?

02 março 2019

Schumann Morreu Louco

Schumann compôs seu sublime Concerto para Violoncelo e Orquestra
pouco antes de enlouquecer
e se internar ele mesmo num manicômio
porque sua loucura não lhe tirava a consciência.
a melodia que inicia seu Concerto para Violoncelo
é de uma sublimidade absurda e dilacerante
e logo depois Schumann tentou se matar
nas águas geladas do rio Reno.

Schumann compôs o seu tenso e nervoso Concerto para Violoncelo
na época em que dizia ouvir anjos e demônios
lhe ditarem músicas aos gritos em seus ouvidos
e dentro de sua cabeça.
o Concerto para Violoncelo de Schumann 
está entre as músicas mais belas já feitas
e foi uma das últimas coisas que Schumann compôs
pouco tempo depois decidiu se isolar do mundo por ser louco
e para não enlouquecer também sua mulher
e seus filhos:
foi uma forma de sacrifício.

o denso e inquietante Concerto para Violoncelo de Schumann
tem 169 anos
e é um dos concertos mais tocados ao redor do mundo
mas Schumann nunca pôde ouvir esse concerto
porque morreu antes 
aos 46 anos num manicômio.
os médicos diziam que ele sofria de "melancolia psicótica"
(os médicos não entendem porra nenhuma de arte
nem da vida).

Schumann foi um dos maiores nomes do romantismo musical
e quanto mais perto da loucura ele chegava
mais obras sublimes ele fazia
mas ele não podia dormir à noite
porque os anjos e demônios não deixavam
e ele tentou suicídio no rio Reno em 27 de fevereiro de 1854
quatro anos depois de finalizar
seu enlouquecido Concerto para Violoncelo e Orquestra 
Opus 129.

27 fevereiro 2019

Minha Não-Mensagem

aqui não há nada a ser dito:
não me procure razões
naquilo que nem me soube
não queira que eu dê ou que eu tome lições
naquilo que nem me sonha 
ainda que se diga coisa alguma
nunca será humano
permanecerá sendo o que nunca foi
pela miséria de coisa nenhuma

que este verso não seja nada
uma realidade noturna fora além nem existente
distante de tudo o que é
(como se alguma coisa fosse...)
nem dito para nem feito por
(seja lá o que for)
por que aqui alguma verdade
alguma filosofia alguma fé 
no que nem é?
(seja lá o que amor)

não procure aqui uma mensagem
não queira saber se estou certo
não tente fazer ver os meus erros
há tanto outro tanto
eu mesmo sou outra imagem
do que nunca nem me vi
então que isso não passe
de um canto sem letra
ou de pintura sem cor
um cansaço que se lança
pelo lago alado do ar
pelo lado amargo da dança
(ou seja lá o que dor)

deixa este verso bem longe
de tudo que se aproxima 
isso é só um aumento da dosagem
um longe rubro no horizonte 
não passa de passagem
ao lá do que me esconde
e o que me resta da alma que tive
deixo aqui sendo noite em profundo
abismada e reerguida
num prenúncio minúsculo
de que depois de tudo morto
nisso que se chama mundo
em milênios voltará a Vida

25 fevereiro 2019

De Mal a Pior

sempre é pior do que dizem
sempre há mais do que é dito:
a humanidade tem por princípio e precipício
não saber ou não deixar que se saiba

governo empresas trabalho
e todo diabo mais que o parta
são apenas controle:
controlar é decidir o que se pode saber

o que é o povo além de ignorância agradada?
para que o povo não saiba o que não pode
se passa a mão na sua cabeça
e dá-se um leitinho quente
para que ele durma e sonhe
porque só o sonho é sua vida real

até que um dia surge um gênio:
gênio é saber que há mais
onde não se suspeita de nada
e extrair desse nada
o que há de mais

ser gênio
não é ser grande na humanidade:
é NÃO ser a humanidade

mas estamos tão mal
que ou nem gênios surgem mais
ou nem mais ouvimos gênios

22 fevereiro 2019

O Mistério é uma Música

a música é um mistério
(mas só quando sendo música)
e como tal não se escuta
podê-lo ou sabê-lo

sem princípio ou precipício

está a sete notas acima na escala
ou sete palmos abaixo na terra
ou qualquer além que seja mais 
verbo não-verbalizado
sem (des)entendimentos
equivocados:
é o que se é
para cada ser que o seja

à música

não há necessidade de selo
ela não se carta
não se mensagem:
quem ouve é que deve sê-la
e só a si cabe o vale
quer seja um algo ou um vago

ainda que a música

diga dizeres
não se pode dizer
que foi sendo como dito.
o que vale é o que som
infinital e arquetípico
absoluto
desanalítico

desde o canto do galo

o corte do violino
ao ritmo do galope do cavalo
é um elevado alto
escrito de não-dizer
que é mister misteriá-lo
e vivê-lo