13 março 2016

"Onze anos como um tiro na cabeça. Eu tinha visto o emprego devorar os homens."


Cartas na Rua é o primeiro romance de Bukowski, e um dos seus melhores. É uma obra carregada de humor ferino e desprezo pelo estilo de vida americano e pela sociedade em geral. O livro conta as suas experiências como funcionário dos correios dos EUA, abordando temas como a exploração do indivíduo pela sistema capitalista, a solidão, a falta de sentido na vida e a mecanização do homem moderno. Tudo permeado de uma sinceridade cruel e de hilárias ironias. Ler Bukowski é dar-se conta de que a civilização que criamos não tem nenhum fundamento. A seguir, um trecho do romance, em que o "Último Maldito" reflete sobre os efeitos inúteis e destrutivos do trabalho:

"Onze anos! Não tinha dez centavos a mais no meu bolso do que quando entrara ali pela primeira vez. Onze anos. Embora cada noite tivesse sido longa, os anos passaram rápido. Talvez por se tratar de um serviço noturno. Ou por fazer a mesma coisa vez após vez. 


Onze anos como um tiro na cabeça. Eu tinha visto o emprego devorar os homens. Eles pareciam derreter. Lá estava Jimmy Potts do Posto Dorsey. Da primeira vez que cheguei lá, Jimmy era um cara musculoso em sua camisa branca. Agora estava liquidado. Colocava seu banco o mais próximo do chão possível e se agarrava para não cair. Vivia de tal maneira cansado que nem cortava o cabelo e usava a mesma calça há três anos. Trocava de camisa duas vezes por semana e caminhava bem devagar. Tinham-no assassinado. Estava com 55 anos. Faltavam sete para ele se aposentar.
- Nunca vou conseguir -  ele me disse.

Ou derretiam ou engordavam, enormes, especialmente na bunda ou na barriga. Era o banquinho, e os mesmos movimentos e a mesma conversa. E lá estava eu, sofrendo de tonturas e dores nos braços, pescoço, peito, por toda parte. Dormia o dia para conseguir descansar e estar apto ao trabalho. Nos fins de semana tinha que beber para esquecer a rotina. Eu pesava 83 quilos quando cheguei. Agora estava com 101 quilos. A única coisa que você mexia por ali era o braço direito."

(Na imagem, "Evening on Karl Johan Street" de Edvard Munch.)

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