27 julho 2012

A Máfia é uma Reação Contra os Governos

Hoje em dia é comum chamar-se qualquer organização criminosa ou até mesmo conluios de corruptos no governo de "máfia" ou "mafiosos". No entanto, a Máfia, no seu sentido original, refere-se apenas a uma organização ideológica e criminosa surgida no sul da Itália ainda durante a Idade Média e que foi crescendo com o passar dos anos e obtendo o seu objetivo primordial: a formação de uma instituição que tivesse as suas próprias leis e regras substituindo e desafiando as instituições do Estado e dos governos. O termo "Máfia" tem sua origem na palavra árabe "mafiusu" e pode significar desde "renegado" até "audacioso, corajoso, "aquele que não se submete".

Os italianos do sul sempre foram discriminados na Itália, por serem mais pobres e terem contato com os árabes. Os governos do norte exploravam os sulistas, com altas taxas de impostos e sem o devido retorno social. Abandonados, oprimidos e sem condições de tomar o poder, os sulistas italianos resolveram formar uma organização parcialmente secreta que através do fortalecimento de suas células familiares, da ameaça e da violência calculada pudesse proteger-se e combater os desmandos do governo central.

Portanto, a Máfia  desenvolveu-se como uma oposição aos governos e suas instituições, e suas regras, e suas leis. Não no sentido político, não com o intuito de tomar o governo, mas para ter o seu próprio governo, não obedecendo às determinações legais e institucionais. A Máfia procurou existir de uma maneira semi-oculta, infiltrando-se nas instituições do Estado para manter e ampliar seu poder e obter informações vitais para sua sobrevivência. Para tanto, a Máfia necessitou estabelecer um código de conduta rigoroso e inflexível, cuja transgressão era severamente punida. É  interessante notar que as leis da Máfia sempre foram mais respeitadas pelos seus membros do que as leis do Estado pelos cidadãos. Por que? Porque a punição da Máfia não falhava e a do Estado sim? Também por isso, certamente, mas há outros motivos.

A Máfia italiana (única e verdadeira Máfia, as demais são cópias degeneradas sem a mesma origem e comprometimento ideológico) baseou suas leis e regras nos princípios de união e respeito familiares. A família era o mais importante. O sangue, a honra e a dignidade dos familiares deveriam estar acima de tudo. Qualquer ofensa a isso deveria ser punido. Ninguém, fosse quem fosse, fosse do governo ou da justiça do Estado, tinha o direito de tocar em qualquer membro da família. Tal comportamento, que acarretava uma sensação de segurança pessoal absoluta (coisa que o Estado não oportunizava, e não o faz ainda hoje) permitiu e ensejou uma união entre os membros que muito raramente era quebrada. E, quando o era, a punição sempre vinha, terrível. E para manter a união das familias sempre impenetrável pelos órgãos do governo e das polícias, a Omertá, ou Código de Silêncio, foi estabelecido, sendo a sua violação punida com a morte. Tais características estavam presentes nas três principais máfias italianas: na Camorra, napolitana, na N'dranghetta, calabresa e, principalmente, na Cosa Nostra, siciliana. Para que as Máfias pudessem existir e se sustentar contra o combate dos governos, as práticas criminosas praticadas por elas foram se diversificando, principalmente quando de seu surgimento nos EUA.

A Máfia ítalo-americana, quando de seu surgimento, estabeleceu-se quase que exatamente igual às Máfias italianas, com os mesmos códigos de conduta, criando um submundo que desafiava o governo americano e só obedecia a si própria.  Aproveitando-se da Lei Seca que grassou nos EUA nos anos 30, as Máfias cresceram assustadoramente com o tráfico de bebidas alcoólicas. Afinal, todos queriam beber, não importava o que dizia a lei. A Cosa Nostra americana tornou-se poderosíssima e sempre fiel às suas origens italianas de honra, dignidade e respeito à família. Tanto que com o surgimento do lucrativo tráfico de drogas, as Máfias italianas recusaram por muito tempo praticá-lo, julgando-o vergonhoso e indigno. Mas, com o passar do tempo e com o crescimento da ganância de seus membros, afinal, encontravam-se no coração do mundo capitalista, a Máfia acabou por também traficar cocaína e heroína. O resultado foi a sua desestruturação com a consequente decadência. A Máfia italiana ainda sobrevive nos EUA, mas bem mal das pernas e já sem a grandeza e sem a honra dos seus áureos dias. Na Itália, a Máfia, também degradada, depois de perder muita força, vem novamente ganhando espaço na Sicília. Não adianta, a Máfia está no sangue dos sicilianos. 

Para finalizar, é bom lembrar-se do seguinte: a Máfia italiana surgiu, deu certo e cresceu de maneira assombrosa, basicamente,  por um motivo muito simples: suas leis eram respeitadas e suas promessas eram cumpridas. Se algum membro ou protegido precisava de algo, era certo que ele o teria. E os governos? Quem é que respeita a sua lei? E o que fazem os governantes quando um cidadão precisa do seu auxílio? 

4 comentários:

  1. Os governantes estão muito ocupados gastando o dinheiro absurdo que ganham para nos representar, consequentemente, não poderão ouvir nossa reivindicação! O governo, principalmente o brasileiro, é vergonhoso!

    Gostei da explicação da máfia!
    bjsss

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  2. Mas então?
    É isto que a família Cachoeira tem feito nos últimos 50 anos em Goiás (e agora se espalhando para o resto do país), só que com sotaque caipira e com nome de empresas de fachada.
    Bom, mais ou menos isto também é feito nos morros do Rio, há uns 50 anos. Com jeito de malandro e com outro nome.

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  3. Senhor, não, óbvio que não é a mesma coisa. Tens certeza que leste todo o texto? Há vários pontos em comum, todos são crime organizado, claro, mas também há várias e fundamentais diferenças. O Cachoeira e cia é simplesmente uma quadrilha, muito bem organizada, é verdade, mas com o único intuito de enriquecer cada vez mais enganando o Estado. Não há ideologia alguma de se criar um mundo próprio, dos princípios de honra e dignidade contra a opressão dos governos que ORIGINARAM a Máfia italiana. Perceba que estou falando da origem da Máfia. Tampouco há essa honra e dignidade nos traficantes do Rio, São Paulo, México, e por aí vai. Começa que a autêntica Máfia italiana não queria aceitar o tráfico de drogas, como já disse, quando aceitou, deixou de ser o que era. Segundo, os traficantes de drogas até podem ser também uma reação ao Estado, mas entre eles não há nenhum princípio de respeito aos valores de família. E ainda outras diferenças que não vou me dar agora o trabalho de explicar.

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  4. Perfeito, senhor. Li tudo sim. Com o devido respeito e atenção.
    Ocorre que eu não me referia aos primórdios das máfias. Referia-me aos dias atuais, depois que "liberou geral".
    Obrigado pela preocupação e atenção em esclarecer.

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