É... até as estrelas um dia se apagam
e a face da lua é sempre fatal,
há um cisne que canta no bem e no mal
e avisos de anjos há muito me vagam...
De sonhos-fins minhas noites se alagam,
nos vales ao longe um selo e um sinal,
sussurram os ventos sentença mortal
e asas de loucas subindo me tragam...
Algo de estranho pousou sobre mim,
que olhos não vêem mas os olhos me sentem
e voa distante partindo enfim...
Mas... irei buscá-la em meu peito doente
antes que caia o derradeiro fim:
terei ainda alma e será suficiente.
25 fevereiro 2008
17 fevereiro 2008
Eduardo Guimaraens: um Grande Gaúcho Esquecido
Eduardo Guimaraens. Alguém sabe quem foi ele? Que foi um poeta gaúcho nascido em Porto Alegre em 1892? Que escreveu sete livros e que foi considerado na época nosso maior poeta simbolista? E mais, que chegou a ser considerado uns dos maiores do país, comparado a Cruz e Sousa? Quem lembra dele? E dos que lembram, quem já o leu? Triste saber que um poeta de sua magnitude esteja relegado ao esquecimento até mesmo pelos gaúchos. Mas, quais seriam os motivos? A meu ver, faz parte da discriminação sofrida pelo Simbolismo em nossas terras; a verdade é que ainda hoje os brasileiros não lograram compreender os simbolistas.
O Simbolismo é considerado como o responsável pelo nascimento da poesia moderna, ainda mais se levarmos em conta que Baudelaire, um dos maiores autores simbolistas, foi o pioneiro da modernidade, quando uniu à linguagem sublimada do romantismo o grotesco da realidade humana. Devemos ainda considerar que uma das primícias simbolistas, isto é, sugerir e não afirmar, foi e continua sendo de vital relevância para o desenvolvimento da poesia contemporânea. Sobre o movimento simbolista, afirma Afrânio Coutinho: “Sua contribuição à literatura foi imperecível, havendo quem lhe empreste a categoria de movimento mais importante, pelo seu aspecto positivo e pela herança legada, da poesia moderna”. Se existe a poesia moderna, foi porque antes existiu o Simbolismo.
No entanto, no Brasil, o Simbolismo não atingiu o mesmo nível de relevância que adquiriu na Europa, sofrendo uma negligência e subestimação, onde se entende que o nosso movimento simbolista não chegou a ser devidamente compreendido e assimilado pela sociedade, não estabelecendo bases na mesma. Isso fez com que a grande maioria de seus autores não obtivesse o mesmo grau de divulgação e reconhecimento que escritores de outros movimentos e escolas. Tal fato é possível apreender-se da afirmação de Carollo, ao referir-se sobre os obstáculos ao acesso às fontes bibliográficas dos simbolistas: “...estes obstáculos permitem a proposição de novas indagações quando vistos como índices de preconceitos da crítica na interpretação do movimento...” Na mesma obra, adiante, Carollo observa: “Reconhecidas ainda as dificuldades de aceitação e avaliação do Simbolismo por parte da crítica ‘oficial’ contemporânea, orientada por todo um instrumental metodológico de origem cientificista...”
Sem dúvida, Eduardo Guimaraens também foi vítima desse “preconceito” para com o Simbolismo. Felizmente, grandes críticos, como Massaud Moisés, souberam considerá-lo como “autêntico poeta”, e que “alguns de seus poemas serão suficientes para situá-lo sem favor ao lado de Cruz e Sousa e Alphonsus de Guimaraens”. Da mesma forma, julgou Andrade Muricy que “a sua arte afastou-se do cunho clássico português e da ingenuidade da temática e da expressão... foi dos mais civilizados dentre todos eles e um dos mais meditativos e delicados”.
Eduardo Guimaraens foi um conhecedor profundo da literatura universal, tradutor de Baudelaire e Dante Alighieri, não por acaso suas maiores influências, sendo que em sua época sua obra foi amplamente valorizada, (ainda que pouco lida) como observa Zilberman, referindo-se a seu principal livro “A Divina Quimera”: “que o consagrou nacionalmente, obtendo reconhecimento de todos que historiam o Simbolismo brasileiro”. No entanto, o poeta que “foi uma das vozes mais altas e mais puras da lírica brasileira”, segundo o jornal Correio do Povo (14/12/1928), constitui-se também, conforme Mansueto Bernardi, em “o menos estudado”. Corroborando Mansueto, verifica-se hoje um escasso número de referências ao poeta gaúcho, imerso, talvez, no relativo ostracismo em que se encontram grande parte de nossos autores simbolistas.
Não obstante, a poesia de Eduardo Guimaraens nos apresenta um âmbito temático de inúmeros desdobramentos. Sua obra nos revela uma profunda sensibilidade e imaginação, uma sutileza e musicalidade da linguagem, um refinamento de emoções repleto de luzes e sombras. Seus poemas são intensamente humanos e espirituais ao mesmo tempo, situando-se entre a veia lúgubre de Alphonsus de Guimaraens e a ascensão vertiginosa de Cruz e Sousa. Eduardo é mais sereno que ambos, menos sombrio que o primeiro, mais terno que o segundo. Sem dúvida, merece que o conheçamos. Para finalizar, nada melhor que alguns de seus versos:
“Não despertes, porém, ainda que surja o dia!
Dorme perpetuamente o sono teu sem termo,
ó forma de vitral, Musa e Melancolia,
que és a quimera de um espírito enfermo!
Não despertes, porém, ainda que surja o dia!”
O Simbolismo é considerado como o responsável pelo nascimento da poesia moderna, ainda mais se levarmos em conta que Baudelaire, um dos maiores autores simbolistas, foi o pioneiro da modernidade, quando uniu à linguagem sublimada do romantismo o grotesco da realidade humana. Devemos ainda considerar que uma das primícias simbolistas, isto é, sugerir e não afirmar, foi e continua sendo de vital relevância para o desenvolvimento da poesia contemporânea. Sobre o movimento simbolista, afirma Afrânio Coutinho: “Sua contribuição à literatura foi imperecível, havendo quem lhe empreste a categoria de movimento mais importante, pelo seu aspecto positivo e pela herança legada, da poesia moderna”. Se existe a poesia moderna, foi porque antes existiu o Simbolismo.
No entanto, no Brasil, o Simbolismo não atingiu o mesmo nível de relevância que adquiriu na Europa, sofrendo uma negligência e subestimação, onde se entende que o nosso movimento simbolista não chegou a ser devidamente compreendido e assimilado pela sociedade, não estabelecendo bases na mesma. Isso fez com que a grande maioria de seus autores não obtivesse o mesmo grau de divulgação e reconhecimento que escritores de outros movimentos e escolas. Tal fato é possível apreender-se da afirmação de Carollo, ao referir-se sobre os obstáculos ao acesso às fontes bibliográficas dos simbolistas: “...estes obstáculos permitem a proposição de novas indagações quando vistos como índices de preconceitos da crítica na interpretação do movimento...” Na mesma obra, adiante, Carollo observa: “Reconhecidas ainda as dificuldades de aceitação e avaliação do Simbolismo por parte da crítica ‘oficial’ contemporânea, orientada por todo um instrumental metodológico de origem cientificista...”
Sem dúvida, Eduardo Guimaraens também foi vítima desse “preconceito” para com o Simbolismo. Felizmente, grandes críticos, como Massaud Moisés, souberam considerá-lo como “autêntico poeta”, e que “alguns de seus poemas serão suficientes para situá-lo sem favor ao lado de Cruz e Sousa e Alphonsus de Guimaraens”. Da mesma forma, julgou Andrade Muricy que “a sua arte afastou-se do cunho clássico português e da ingenuidade da temática e da expressão... foi dos mais civilizados dentre todos eles e um dos mais meditativos e delicados”.
Eduardo Guimaraens foi um conhecedor profundo da literatura universal, tradutor de Baudelaire e Dante Alighieri, não por acaso suas maiores influências, sendo que em sua época sua obra foi amplamente valorizada, (ainda que pouco lida) como observa Zilberman, referindo-se a seu principal livro “A Divina Quimera”: “que o consagrou nacionalmente, obtendo reconhecimento de todos que historiam o Simbolismo brasileiro”. No entanto, o poeta que “foi uma das vozes mais altas e mais puras da lírica brasileira”, segundo o jornal Correio do Povo (14/12/1928), constitui-se também, conforme Mansueto Bernardi, em “o menos estudado”. Corroborando Mansueto, verifica-se hoje um escasso número de referências ao poeta gaúcho, imerso, talvez, no relativo ostracismo em que se encontram grande parte de nossos autores simbolistas.
Não obstante, a poesia de Eduardo Guimaraens nos apresenta um âmbito temático de inúmeros desdobramentos. Sua obra nos revela uma profunda sensibilidade e imaginação, uma sutileza e musicalidade da linguagem, um refinamento de emoções repleto de luzes e sombras. Seus poemas são intensamente humanos e espirituais ao mesmo tempo, situando-se entre a veia lúgubre de Alphonsus de Guimaraens e a ascensão vertiginosa de Cruz e Sousa. Eduardo é mais sereno que ambos, menos sombrio que o primeiro, mais terno que o segundo. Sem dúvida, merece que o conheçamos. Para finalizar, nada melhor que alguns de seus versos:
“Não despertes, porém, ainda que surja o dia!
Dorme perpetuamente o sono teu sem termo,
ó forma de vitral, Musa e Melancolia,
que és a quimera de um espírito enfermo!
Não despertes, porém, ainda que surja o dia!”
06 fevereiro 2008
É Lógico que a Vida Não Possui Lógica
“...não sei ser humano, conviver
De dentro da alma triste com os homens meus irmãos na terra.
Não sei ser útil mesmo sentindo, ser prático, ser cotidiano, ser nítido,
Ter um lugar na vida...”
Fernando Pessoa
Não, não possui. Talvez possua algum Equilíbrio, um equilíbrio sombrio, oculto, incompreensível, inacessível e absoluta e canhestramente ilógico. Mas um equilíbrio. E sempre acima de nossa mão. Por que deveria ser compreensível? Já alguns dirão que esse equilíbrio não existe. Eu não digo nada. Não gosto de dizer as coisas. Gosta de cantá-las. E de gritá-las. Mas não de dizê-las, dizer é tão fraco.
A Lua estava anômala ontem. Foi necessário que eu saísse às ruas naquele estado de sono que não era o sono. Era um sono em um estado alterado de consciência. Saí caminhando pelo dia não-diurno, sim, porque eu sentia um sono profundo e vertiginoso, algo como um desejo não-terráqueo nem fictício, mas dominado por todas as cores de beijos. Não, não sou sonâmbulo. Naquela praça, vi 4 homens lendo jornais. Jamais conseguiria defini-los, mas os defino: horríveis, todos eles: olhos esbugalhados, descabelados, tossindo, boca escorrendo sangue como um churrasco mal-assado, não falavam uns com os outros, não se movimentavam. Não sei se andei ou flutuei até eles, aliás, eu não sei nada. E pedi um jornal emprestado e li todas as manchetes. Horríveis, todas elas.
Como era mágico e salutar meu sono... Com as manchetes dos jornais fiz um poema, sem modificar uma só palavra. O poema mais trágico da história da humanidade. Sonhei... Não sei com o que sonhei, mas vivi o mais fundo possível o que sonhei. Que mais se pode fazer? E como saí das florestas felinas sem ter uma só palavra a dizer a ninguém, isso é que é de se admirar! E como senti os vapores nunca-vistos de tudo que tu me disseste aquele dia sem que me olhasses uma só vez nos olhos... E como olhei nos teus olhos com cheiros de músicas sem que tu me dissesses um só verbo divino ou caído.
Amanhã vai chover... Assim, percebi que a humanidade não vale a pena... Vale a pena aquele rio que nunca correu, aquela flor que nunca nasceu, aquela árvore que nunca cresceu, aquela música que nunca tocaram, aquele céu que nunca brilhou, aquele beijo que nunca se deram... Por isso voam aves de verde pelas ânsias perfumadas daquele inverno que nunca apagou sua luz. Nem a minha. Porém, o mais absurdo de tudo, algo realmente ilógico e que nunca me foi permitido entender é que a sociedade no fundo odeia os professores. Deve ser por que eles são os únicos capazes de melhorar seus filhos. Se o homem quisesse ser melhorado, eu não estaria aqui dormindo, sonhando e escrevendo.
Quantas estrelas caíram aquele dia do céu... Uma delas abriu ao meio minha cabeça, literalmente, e uns uivos-desejo flutuavam tensos ao longe, e perto de mim. Era uma noite sombria, mas tu não estavas sobre os altares. Como se iluminou todo o luar, como uma treva santa chocou-se contra os versos que uma águia largou do bico sobre a morte... Três mãos alucinadas ergueram-se de dentro de meu peito, e vi uma chuva de olhos com chifres brancos perfurarem todo meu coração, o sangue não-meu que lacrimejava ao espaço doente formou uma nuvem que aceleradamente ascendeu ao sonho onde eu dormia. Não esqueçam que eu estava dormindo, por favor, não percam o fio da meada. Corri. Tu não estavas lá. Tudo não estava lá.
E no Brasil odeia-se ainda mais os professores, e estou certo que isso é uma das principais características de nossa cultura, talvez a principal, aquela que define definitivamente o que é ser brasileiro, odiar um professor, afinal, sem isso o Brasil não seria Brasil. Mas um canto e um grito titânicos ergueram-se majestosos daquele planeta de luz que não vejo. Como soou apaixonado um violino de Brahms aos meus ouvidos, e todas as coisas se angustiavam de forma tão ciclonicamente sublime que um furacão passou pela minha cidade e arrasou com tudo, inclusive comigo. Por isso durmo e elevo meu coração na ponta de uma espada flamígera e atiro-o ao relâmpago que me beija... O fim é como o começo: “Sim, está tudo certo./Está tudo perfeitamente certo./O pior é que está tudo errado.” É do Álvaro de Campos, que nunca existiu e valeu a pena. E eu me acordei.
De dentro da alma triste com os homens meus irmãos na terra.
Não sei ser útil mesmo sentindo, ser prático, ser cotidiano, ser nítido,
Ter um lugar na vida...”
Fernando Pessoa
Não, não possui. Talvez possua algum Equilíbrio, um equilíbrio sombrio, oculto, incompreensível, inacessível e absoluta e canhestramente ilógico. Mas um equilíbrio. E sempre acima de nossa mão. Por que deveria ser compreensível? Já alguns dirão que esse equilíbrio não existe. Eu não digo nada. Não gosto de dizer as coisas. Gosta de cantá-las. E de gritá-las. Mas não de dizê-las, dizer é tão fraco.
A Lua estava anômala ontem. Foi necessário que eu saísse às ruas naquele estado de sono que não era o sono. Era um sono em um estado alterado de consciência. Saí caminhando pelo dia não-diurno, sim, porque eu sentia um sono profundo e vertiginoso, algo como um desejo não-terráqueo nem fictício, mas dominado por todas as cores de beijos. Não, não sou sonâmbulo. Naquela praça, vi 4 homens lendo jornais. Jamais conseguiria defini-los, mas os defino: horríveis, todos eles: olhos esbugalhados, descabelados, tossindo, boca escorrendo sangue como um churrasco mal-assado, não falavam uns com os outros, não se movimentavam. Não sei se andei ou flutuei até eles, aliás, eu não sei nada. E pedi um jornal emprestado e li todas as manchetes. Horríveis, todas elas.
Como era mágico e salutar meu sono... Com as manchetes dos jornais fiz um poema, sem modificar uma só palavra. O poema mais trágico da história da humanidade. Sonhei... Não sei com o que sonhei, mas vivi o mais fundo possível o que sonhei. Que mais se pode fazer? E como saí das florestas felinas sem ter uma só palavra a dizer a ninguém, isso é que é de se admirar! E como senti os vapores nunca-vistos de tudo que tu me disseste aquele dia sem que me olhasses uma só vez nos olhos... E como olhei nos teus olhos com cheiros de músicas sem que tu me dissesses um só verbo divino ou caído.
Amanhã vai chover... Assim, percebi que a humanidade não vale a pena... Vale a pena aquele rio que nunca correu, aquela flor que nunca nasceu, aquela árvore que nunca cresceu, aquela música que nunca tocaram, aquele céu que nunca brilhou, aquele beijo que nunca se deram... Por isso voam aves de verde pelas ânsias perfumadas daquele inverno que nunca apagou sua luz. Nem a minha. Porém, o mais absurdo de tudo, algo realmente ilógico e que nunca me foi permitido entender é que a sociedade no fundo odeia os professores. Deve ser por que eles são os únicos capazes de melhorar seus filhos. Se o homem quisesse ser melhorado, eu não estaria aqui dormindo, sonhando e escrevendo.
Quantas estrelas caíram aquele dia do céu... Uma delas abriu ao meio minha cabeça, literalmente, e uns uivos-desejo flutuavam tensos ao longe, e perto de mim. Era uma noite sombria, mas tu não estavas sobre os altares. Como se iluminou todo o luar, como uma treva santa chocou-se contra os versos que uma águia largou do bico sobre a morte... Três mãos alucinadas ergueram-se de dentro de meu peito, e vi uma chuva de olhos com chifres brancos perfurarem todo meu coração, o sangue não-meu que lacrimejava ao espaço doente formou uma nuvem que aceleradamente ascendeu ao sonho onde eu dormia. Não esqueçam que eu estava dormindo, por favor, não percam o fio da meada. Corri. Tu não estavas lá. Tudo não estava lá.
E no Brasil odeia-se ainda mais os professores, e estou certo que isso é uma das principais características de nossa cultura, talvez a principal, aquela que define definitivamente o que é ser brasileiro, odiar um professor, afinal, sem isso o Brasil não seria Brasil. Mas um canto e um grito titânicos ergueram-se majestosos daquele planeta de luz que não vejo. Como soou apaixonado um violino de Brahms aos meus ouvidos, e todas as coisas se angustiavam de forma tão ciclonicamente sublime que um furacão passou pela minha cidade e arrasou com tudo, inclusive comigo. Por isso durmo e elevo meu coração na ponta de uma espada flamígera e atiro-o ao relâmpago que me beija... O fim é como o começo: “Sim, está tudo certo./Está tudo perfeitamente certo./O pior é que está tudo errado.” É do Álvaro de Campos, que nunca existiu e valeu a pena. E eu me acordei.